CW Criminologia Contemporânea
CW Criminologia Contemporânea
CW Criminologia Contemporânea
NEOLIBERAIS
Aula 1
INTRODUÇÃO À CRIMINOLOGIA MODERNA
A criminologia é a ciência que estuda a criminalidade.
INTRODUÇÃO
IDEAIS CRIMINOLÓGICOS
O Direito Penal tem por objeto as normas penais e por método o técnico-jurídico.
Interpretando o dever/ser, a criminologia volta-se ao fenômeno da criminalidade,
investigando suas causas segundo o método experimental, ou seja, o mundo do ser,
estabelecendo um fundamento científico para que a política criminal possa transformá-lo
em opções e estratégias concretas de fácil assimilação ao legislador para criar normas
penais e aos poderes públicos para agir na prevenção, repressão do crime e na
ressocialização do delinquente.
A criminologia não concorre com o Direito Penal. Como ciências autônomas, debatem
juntas os assuntos relacionados ao crime, cada qual com a sua vertente. A criminologia
atual não mais se define como uma ciência que investiga as causas da criminalidade, mas
sim as condições da criminalização, o sistema penal, os mecanismos do controle social
formal e informal, analisando o comportamento de criminoso funcionalmente relacionado
às estruturas sociais. Não existe atualmente a imagem de que a criminologia está em
segundo plano, enquanto o Direito Penal é que traça as vertentes do crime. A criminologia
deixa de ser considerada como um saber auxiliar do Direito Penal para se tornar um saber
crítico, analisando o objeto criminológico.
A ciência da criminologia possui um papel decisivo para o ensino do Direito, auxiliando na
compreensão do poder e do controle social e penal, estudando o crime, a criminalidade, a
pena, a vitimização, a impunidade e a cifra negra. O saber criminológico é a formação de
uma consciência jurídica crítica e responsável, capaz de tirar o jurista de sua zona de
conforto, adormecido no seu ponto de partida, que é a norma válida, e traçar novas
diretrizes, visando ao enfretamento da violência individual, institucional e estrutural.
Não resta dúvida de que o sistema criminal brasileiro enfrenta na atualidade uma grave
crise. Não existem vagas para todos os presos e presas em penitenciárias com os
milhares de mandados de prisão expedidos e não cumpridos. Se todos fossem
cumpridos, onde colocaríamos os detentos? O sistema aponta falhas em todos os seus
segmentos, desde a formação da lei até a sua real aplicação. Profissionais do Direito
chegam à exaustão, sem, contudo, encontrar solução imediata para tal problemática.
Para tanto, encontramos na criminologia uma resposta convincente para todas essas
questões. O domínio do saber criminológico possibilita ao profissional do Direito um real
conhecimento da realidade, aplicando de maneira madura e consciente a lei dentro da
atualidade da pátria. Aliás, o saber criminológico distingue-se do saber comum ou
popular, que está ligado às experiências práticas, distanciando o profissional do Direito
dos achismos que traz arraigados na mente.
É assim que a interdisciplinaridade da criminologia faz o seu papel no sistema criminal.
Muitas vezes, a lei nos torna cego face à realidade. Para tanto, os ensinamentos da
Sociologia, Economia, Psicologia ou qualquer outra ciência não jurídica, que estude a
realidade do comportamento humano na sociedade, formam uma nova diretriz a ser
seguida pelo operador do Direito. É nesse momento que a criminologia desempenha o
seu papel com maestria, auxiliando a sociedade no combate ao crime e ao criminoso,
buscando uma intervenção positiva para ressocializá-lo.
A INTERDISCIPLINARIDADE
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Aula 2
GLOBALIZAÇÃO, POLÍTICAS NEOLIBERAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS
A criminologia e a política criminal, atualmente, são responsáveis
pela elaboração de dados criminalísticos com base em estatísticas
quantitativas e qualitativas que contribuem sobremaneira para a
prevenção e uma efetiva política de combate preventivo ao crime.
INTRODUÇÃO
Caro estudante, a teoria do direito penal do inimigo foi proposta por Günter Jakobs, um
doutrinador alemão, em 1985. Segundo essa teoria, o Direito Penal tem a função
primordial de proteger a norma e só indiretamente tutelar os bens jurídicos mais
fundamentais.
O autor alemão procura fazer uma distinção entre o Direito Penal do cidadão e o Direito
Penal do inimigo, sendo o primeiro garantista, seguindo todos os princípios fundamentais
de um estado democrático de direito que lhe são pertinentes, isto é, a contar com todas
as garantias penais e processuais, observando na integralidade o devido processo legal
(é o Direito Penal de todos), enquanto o Direito Penal do inimigo é um Direito Penal
despreocupado de seus princípios fundamentais, já que estaríamos diante de inimigos do
Estado e não cidadãos. O Direito Penal do inimigo caracteriza um verdadeiro estado de
guerra, em que as regras do jogo devem ser diferentes para o cidadão do bem e o
inimigo.
Jakobs apresenta a distinção entre o cidadão do bem e o inimigo:
ALCANCE SOCIAL
A doutrina dominante entende que a criminologia é uma ciência aplicada que se subdivide
em dois ramos:
PENALIDADES
A pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma
infração (penal) como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem
jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos. A pena apresenta a característica da retribuição,
de ameaça de uma mal contra o autor de uma infração penal, cuja finalidade é preventiva,
no sentido de evitar a prática de novas infrações, sob os aspectos:
O Artigo 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) alerta que todos são iguais perante à
lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, e nos termos dos incisos XXXIX, XLV, XLVI, XLVII, XLVIII e
XLIX. Com isso, estabelece que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena
sem prévia cominação legal; nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo
a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da
lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do
patrimônio transferido; caracterizando o Princípio da Pessoalidade da Pena; a lei regulará
a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição
da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou
interdição de direitos; não haverá penas, ou seja, as penas serão proibidas em caso de a)
de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do artigo 84, XIX; b) de caráter
perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis.
A pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito,
a idade e o sexo do apenado; e ainda é assegurado aos presos o respeito à integridade
física e moral.
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Aula 3
TEMAS CONTEMPORÂNEOS DA CRIMINOLOGIA
Caro, estudante, a teoria “queer” surgiu no final dos anos 80, em
decorrência de estudos de pesquisadores e ativistas de movimentos
baseados em discussões quanto à identidade de gênero e
heteronormatividade.
INTRODUÇÃO
Caro, estudante, a teoria “queer” surgiu no final dos anos 80, em decorrência de estudos
de pesquisadores e ativistas de movimentos baseados em discussões quanto à
identidade de gênero e heteronormatividade. Tal conceito elevou a discussão do binômio
“macho/fêmea” como formas impositivas de se viver uma identidade no seio social. A
teoria feminista está pautada na luta pela igualdade de gênero a partir dos papéis sociais
impostos pela sociedade machista às mulheres, isto é, a desconstrução do ideal de
masculinidade que inferioriza e oprime a mulher. A teoria feminista não se sustenta
apenas no processo de objetificação da mulher, que a torna vulnerável à violência no
âmbito privado, mas também denuncia o sexismo institucional, que evidencia diversas
formas de violência contra a mulher na elaboração, na interpretação, na aplicação e na
execução da lei.
IDENTIDADE DE GÊNERO
Vamos estudar neste tópico a teoria queer, que surgiu no final dos anos 80 em
decorrência de estudos de pesquisadores e ativistas de movimentos baseados em
discussões quanto à identidade de gênero e heteronormatividade. Essa tese elevou a
discussão do binômio “macho/fêmea” como formas impositivas de se viver uma identidade
no seio social.
O termo queer, oriundo do vernáculo inglês, numa tradução livre significa “estranho,
esquisito, excêntrico ou original”, e está associado à agressão voltada aos homossexuais
e às questões homofóbicas.
Salo de Carvalho, professor de ciências criminais, sustenta que o processo da violência
heterossexista pode ser dividido em: a) violência simbólica – trata-se de uma cultura
homofóbica, que parte da construção social de discursos de inferiorização da diversidade
sexual e de orientação de gênero; b) violência das instituições – oriunda da violência
das instituições estatais, ou seja, homofobia do Estado, com a criminalização e a
patologização das identidades não heterossexuais; c) violência interpessoal – trata-se
da homofobia individual, em que se busca a anulação da diversidade por meio de atos
brutos de violência, isto é, a violência propriamente dita.
Uma importante teoria que necessariamente precisa ser estudada é a teoria feminista,
que está pautada na luta pela igualdade de gênero a partir dos papéis sociais impostos
pela sociedade machista às mulheres, ou seja, a desconstrução do ideal de
masculinidade que inferioriza e oprime a mulher.
Para Welzer-Lang (2001), trata-se do conjunto social que atribui aos homens funções
nobres e às mulheres tarefas de pouco valor ou pouca relevância, sendo que essa divisão
é mantida e regulada por distintas formas de violência.
A teoria feminista não se sustenta apenas no processo de objetificação da mulher, que a
torna vulnerável à violência no âmbito privado, mas também denuncia o sexismo
institucional que evidencia diversas formas de violência contra a mulher na elaboração,
interpretação, aplicação e execução da lei.
A teoria dos instintos defende que os instintos delituosos são reprimidos, mas não
destruídos, pelo superego, permanecendo sedimentados no inconsciente. Tais instintos
são acompanhados, no inconsciente, por um sentimento de culpa e uma tendência a
confessar. Então, mediante o comportamento criminoso, o sujeito supera o sentimento de
culpa e realiza sua tendência à confissão. É a teoria freudiana do delito por sentimento de
culpa.
Ainda temos que analisar a teoria da identificação diferencial desenvolvida por Daniel
Glaser, que defende que a aprendizagem da conduta delitiva não ocorre por via da
comunicação ou interação pessoal, mas pela identificação. Um indivíduo inicia ou segue
uma carreira criminal na medida em que se identifica com outros indivíduos reais ou
fictícios, a partir da perspectiva de que sua própria conduta delitiva parece aceitável.
(GOMES; MOLINA, 2008)
O indivíduo absorve os modelos de comportamento daqueles grupos de referência com
os quais se identifica, não necessariamente pela proximidade, podendo ocorrer à
distância.
Isso mostra como é encarada a criminologia nos tempos atuais, com uma visão de
ciência, auxiliando o poder público na implementação de políticas públicas capazes de
solucionar ou amenizar os problemas criminais da sociedade.
Criminologia interseccional
No século XXI desponta a criminologia crítica alternativa em busca de enfrentar algumas
questões das classes vulneráveis, dando origem à criminologia feminista, a criminologia
étnico-racial, a criminologia queer, a criminologia das migrações, a criminologia verde e a
criminologia cyber, dentre outras.
No final da década de 1990, floresce a criminologia interseccional como corolário dos
estudos de gênero e do feminismo, notadamente, o feminismo negro, para compreender a
coexistência de variantes sociais que suportam as mulheres.
Sob a visão de Kimberlé Crenshaw, os elementares que integram a identidade – de
classe, raça, gênero, sexualidade, nacionalidade, religião etc. demonstram as diferenças
que as mulheres vivenciam, notadamente, no que diz respeito à desigualdade e à
violência.
Criminologia interseccional consiste em investigar, de forma crítica, a maneira que as
identidades dos sujeitos, intersectadas por marcadores das desigualdades, refletem em
suas vivências e experiências com a violência, o crime e as instituições do sistema de
justiça criminal enquanto vítimas ou infratoras.
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Aula 4
XENOFOBIA E DISCRIMINAÇÕES
Caro estudante, a xenofobia é uma forma de preconceito, fazendo
referência ao ódio, receio, hostilidade e rejeição em relação aos
estrangeiros.
INTRODUÇÃO
PRECONCEITO
A criminologia tem buscado junto à psicologia entender como esses fatores influenciam o
indivíduo em desenvolvimento, propiciando situações que o predisponham ao
envolvimento futuro com o mundo do crime, notadamente, os praticados com violência ou
grave ameaça.
O termo bullying é de origem inglesa e significa ameaçar ou intimidar.
Bullying é a prática reiterada de atos agressivos, verbais ou físicos, por um ou mais
indivíduos contra um ou mais sujeitos. Isto é, concentra-se na combinação entre
intimidação e humilhação de pessoas geralmente mais acomodadas, passivas ou que não
possuem condições de exercer poder sobre alguém ou sobre um grupo.
O fenômeno bullying representa o desejo consciente e intencional de maltratar uma
pessoa ou colocá-la sob tensão, apresentando-se não só no ambiente escolar, mas sim
com uma abrangência mais ampla, por ser algo agressivo e negativo executado quando
há um desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas, podendo o comportamento ser
gerado em vários outros ambientes além da escola, como no trabalho ou até mesmo entre
vizinhos.
É oportuno destacarmos que o bullying não se confunde com as brincadeiras habituais
entre as crianças e os adolescentes, isto é, a simples atribuição de apelidos pejorativos.
Bullying representa os casos de violência, que, em muitas situações, são ações
realizadas pelos agressores de forma velada contra as vítimas. Esses casos ocorrem no
interior de salas de aulas, corredores, pátios de colégio ou até menos nos arredores das
instituições de ensino com certa frequência. As agressões são praticadas de maneira
repetitiva e com desequilíbrio de poder. Essas agressões morais ou até mesmo físicas
podem ocasionar danos psicológicos às crianças e aos adolescentes, facilitando
posteriormente o seu ingresso no mundo do crime.
A Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017, em seu art. 4º, definiu as formas de violência
praticadas contra a criança e o adolescente. A violência psicológica foi tratada no inciso II,
alíneas “a” usque “c”. A propósito descreveremos: alínea a – qualquer conduta de
discriminação, depreciação ou desrespeito em relação à criança ou ao adolescente
mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, agressão
verbal e xingamento, ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática
(bullying) que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou emocional.
Cyberbullying é a prática de bullying através dos meios eletrônicos e virtuais, ou seja, por
meio de mensagens difamatórias ou ameaçadoras circuladas por e-mails, sites, blogs,
redes sociais e celulares.
O termo stalking, também conhecido por perseguição persistente, tem origem nos
Estados Unidos, e designa uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade
reiteradamente a esfera de privacidade da vítima, empregando táticas de perseguição e
de diversos meios, isto é, por meio de ligações nos telefones, celular, residencial ou
comercial, mensagens de texto com conteúdo amoroso, telegramas, ramalhetes de flores,
e-mails indesejáveis, espera na saída do trabalho ou de escola, publicação de fatos ou
boatos em sites da internet, remessa de presentes etc., causando, assim, dano à sua
integridade psicológica e emocional, restrição à sua liberdade de locomoção ou lesão à
sua reputação.
ASSÉDIO MORAL
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Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE
DISCRIMINAÇÃO
Olá, estudante!
Você aprendeu nesta unidade o conceito de criminologia, as suas características e seu
aspecto político. A criminologia é a ciência que estuda a criminalidade. Sem desejar
transformar-se em mera fonte de dados, a criminologia, como ciência empírica, baseada
na realidade, e interdisciplinar, ou seja, somando ensinamentos da Sociologia, Psicologia,
medicina legal e o próprio Direito, apresenta como objeto de estudo o crime, o criminoso,
a vítima e o controle social. A ciência da criminologia possui um papel decisivo para o
ensino do Direito, auxiliando na compreensão do poder e do controle social e penal,
estudando o crime, a criminalidade, a pena, a vitimização, a impunidade e a cifra negra. O
saber criminológico é a formação de uma consciência jurídica crítica e responsável, capaz
de tirar o jurista de sua zona de conforto, adormecido no seu ponto de partida, que é a
norma válida, e traçar novas diretrizes, visando ao enfretamento da violência individual,
institucional e estrutural. Você também aprendeu a teoria do Direito Penal do inimigo, que
foi proposta por Günter Jakobs, um doutrinador alemão, em 1985. Segundo essa teoria, o
Direito Penal tem a função primordial de proteger a norma e só indiretamente tutelaria os
bens jurídicos mais fundamentais. O autor alemão procura fazer uma distinção entre o
Direito Penal do cidadão e o Direito Penal do inimigo, sendo o primeiro garantista,
seguindo todos os princípios fundamentais de um estado democrático de direito que lhe
são pertinentes. Ainda falamos sobre a teoria queer, que surgiu no final dos anos 80, em
decorrência de estudos de pesquisadores e ativistas de movimentos baseados em
discussões quanto à identidade de gênero e heteronormatividade. Tal tese elevou a
discussão do binômio “macho/fêmea” como formas impositivas de se viver uma identidade
no seio social. A teoria feminista está pautada na luta pela igualdade de gênero a partir
dos papéis sociais impostos pela sociedade machista às mulheres, isto é, a
desconstrução do ideal de masculinidade que inferioriza e oprime a mulher. A teoria
feminista não se sustenta apenas no processo de objetificação da mulher, que a torna
vulnerável à violência no âmbito privado, mas também denuncia o sexismo institucional
que evidencia diversas formas de violência contra a mulher na elaboração, na
interpretação, na aplicação e na execução da lei. Você também aprendeu sobre a
xenofobia e sua atual criminalização.
REVISÃO DA UNIDADE
Vamos falar neste vídeo sobre tudo que você estudou nesta unidade, como a criminologia
e seu conceito, as teorias da discriminação, como a teoria queer e a teoria feminista, além
da xenofobia, prática repugnante que passou a ser criminalizada após decisão do
Superior Tribunal de Justiça no final do ano de 2022.
ESTUDO DE CASO
Imaginemos que no mês de janeiro de 2023, na cidade de São Paulo, Luiz Antunes,
comerciante conhecido no bairro da Luz, naquela cidade, decide abrir o seu comércio de
comida pela manhã, com a finalidade de atender as pessoas interessadas em se
alimentar antes do trabalho. Com isso, passou a oferecer café com leite, lanches diversos
e bolos. Dois imigrantes venezuelanos começaram a brigar na porta do estabelecimento
comercial, procurando comida de graça, proferindo palavras de baixo calão em desfavor
do proprietário do local, bem como de seus familiares e funcionários. Luiz Antunes
acionou a Polícia Militar. No final, ninguém ficou machucado, porém a porta do
estabelecimento comercial foi danificada. Os autores do dano eram venezuelanos, que
não foram identificados. Luiz Antunes, após refletir bastante, decidiu colocar panfletos
com a história ocorrida, ofendendo os agressores. Após esse fato, nordestinos se
revoltaram com a atitude do comerciante e foram até o estabelecimento questionar sobre
os motivos que o levaram a adotar tal conduta. Criou-se, assim, um ambiente ruim entre o
proprietário do estabelecimento comercial de alimentos e os moradores de rua daquela
região paulistana. Dessa forma, no início do mês de fevereiro de 2023, Luiz Antunes
decide tomar uma decisão extremamente radial. Resolve colocar um aviso em seu
estabelecimento ofendendo a dignidade de todos os nordestinos e venezuelanos que ali
transitavam, incitando a discriminação contra eles. Você concorda com a atitude de Luiz
Antunes? Sendo acionada, a polícia deverá adotar qual providência?
Reflita
Vamos analisar como devemos solucionar esse impasse. Ocorreu um crime. No mês de
janeiro de 2023, na cidade de São Paulo, Luiz Antunes, comerciante conhecido no bairro
da Luz, naquela cidade, decidiu abrir o seu comércio de comida pela manhã, a fim de
fornecer café com leite, pão com manteiga na chapa, além de misto quente, misto frio,
lanches diversos e bolos aos interessados com preços promocionais. Porém
venezuelanos e nordestinos começaram a causar confusão na porta do estabelecimento,
fazendo com que Luiz Antunes colocasse um aviso em seu estabelecimento ofendendo a
dignidade de todos os nordestinos e venezuelanos que ali transitavam, incitando a
discriminação contra eles. A polícia foi acionada. A conduta do comerciante se enquadra
na Lei 9.459, de 13 de maio de 1997, que altera os artigos 1º e 20 da Lei nº 7.716, de 5
de janeiro de 1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, e
acrescenta parágrafo ao art. 140 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que
cuida da injúria racial. Estabelece a presente legislação que serão punidos, na forma da
Lei 7.716, de 5 de janeiro de 1989, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito
de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Dessa forma, cria o Artigo 20, com a
conduta de praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia,
religião ou procedência nacional, prevendo uma pena de reclusão de um a três anos e
multa. A conduta de Luiz Antunes se enquadra no conceito de xenofobia, que é uma
forma de preconceito, fazendo referência ao ódio, receio, hostilidade e rejeição em
relação aos estrangeiros. A palavra também é utilizada como a fobia em relação a grupos
étnicos diferentes ou face a pessoas cuja caracterização social, cultural e política se
desconhece. Esse preconceito de classe se expressa em comportamentos que beiram o
fascismo, destilando discursos de ódio e de repulsa ao “diferente”, ao estrangeiro, ao não
familiar, uma vez que demonstra uma grande ameaça à ordem pública. Em novembro de
2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou a considerar como crime de racismo os
atos que discriminam brasileiros que vivem no Nordeste.
RESUMO VISUAL
SEGURANÇA NACIONAL
As mudanças históricas enfrentadas até nosso modelo atual de política levaram à queda
de um Estado absolutista, em que o poder econômico e político eram centralizados nas
mãos de uma pessoa, geralmente um monarca ou ditador, e o surgimento de um estado
democrático de direito que, em linhas gerais, é a soberania popular regida por uma
Constituição elaborada pela vontade popular, com garantia dos direitos humanos,
eleições livres e periódicas e a divisão dos poderes, independentes e harmônicos entre
si.
Dessa forma, coube ao Estado o monopólio do uso da força e consequente aplicação da
lei penal visando à prevenção criminal e à proteção de direitos.
A partir disso, surge a criminologia clássica, que definia o crime com um conceito
reducionista. Para os estudiosos, o delito era a luta do bem contra o mal, o enfrentamento
do criminoso contra a sociedade. Já para a criminologia contemporânea, o conceito é
dinâmico e foca no crime, no criminoso, no papel da vítima e nas formas de controle
social.
Outro conceito relevante para a criminologia é o da segurança nacional. Não há
atualmente um conceito concreto, porém é de extrema importância mencionar que a
segurança nacional não se confunde com o conceito de segurança pública, que são as
instituições e disposições, de responsabilidade do Estado, que visam à proteção da
sociedade e à manutenção da ordem pública por meio de uma sociedade livre de crimes,
ameaças e violência. Entende-se por segurança nacional a capacidade de o Estado
fornecer materialmente a estabilidade e inviolabilidade de seus limites fronteiriços, de
exercer a soberania nacional e projetar poder no exterior proporcionando ganhos sociais e
econômicos para a população, a solidez da Constituição, mesmo diante de pressões
externas, e a garantia legal nas relações eleitorais, políticas e econômicas.
Assim, a segurança nacional, em resumo, é uma condição relativa de proteção coletiva e
individual de uma sociedade contra ameaças que atentam contra a sobrevivência e
autonomia. Desse conceito surge a importância das relações internacionais como fator de
manutenção da segurança nacional, visto que é preciso viver em um estado capaz de
neutralizar ameaças por meio de negociações, da coleta de informações sobre a
capacidade e intenção de determinado Estado e até mesmo do uso de medidas
extraordinárias e emprego de meios de força.
O Brasil iniciou a repressão contra atentados à ordem política e social a partir de 1935,
durante o governo de Getúlio Vargas, através da aprovação da Lei nº 38/1935,
considerada o primeiro conjunto de regras voltado a punir tais crimes. Após o golpe militar
de 1964, o governo redigiu um ato institucional que devolveu à Justiça Militar a
competência para julgar todos os crimes políticos cometidos contra civis e militares. Em
1967, foi publicado o Decreto nº 314/1967, que acarretou a primeira Lei de Segurança
Nacional e refletiu no surgimento da Doutrina de Segurança Nacional, que tinha por
objetivo a proteção da ordem capitalista do Estado brasileiro contra uma ameaça
comunista. Ainda durante a ditadura, o Congresso Nacional aprovou a Lei de Segurança
Nacional nº 7.170/1983 e em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, a
competência para julgar crimes contra o Estado passou a ser exercida pela Justiça
Federal. Atualmente, a lei que dispõe sobre a segurança nacional é a 14.197/2021,
responsável por acrescentar o Título XII no Código Penal para tratar sobre dos crimes
conta o estado democrático de direito.
Eugenio Raúl Zaffaroni menciona que o Direito Penal tem como função em todo estado de
direito a redução e contenção do poder punitivo tomando como base os limites menos
irracionais possíveis, ou seja, o Direito Penal só será utilizado como a ultima ratio quando
nenhum outro ramo do Direito for capaz de coibir determinada conduta (CALHAU, 2009,
p. 90). Entretanto, apesar de ser função do Estado prevenir a ocorrência delituosa, em um
estado democrático de direito os fins não justificam os meios e por isso os direitos
fundamentais devem ser priorizados em grande parte das ocasiões.
A prevenção criminal não pode ser confundida com o controle social. A primeira utiliza
mecanismos para evitar que o delito aconteça e para moldar o comportamento em
sociedade, já o segundo tem como intenção influenciar os indivíduos para que não
pratiquem crimes.
Para ficar mais claro, veja o exemplo trazido por Eduardo Viana:
Quando uma mãe diz para o seu filho: “É errado bater no irmão mais novo
porque ele é mais fraco que você e só os covardes agridem os mais fracos”,
ela está adotando uma medida de controle social (preventiva); se, ao revés,
ela instala uma câmera de vigilância no quarto onde os irmãos dormem, ela
está adotando uma medida de prevenção.
EVOLUÇÃO LEGISLATIVA
Como estudamos anteriormente, o Brasil adota medidas contra os atos que atentam
contra a segurança nacional e o estado democrático de direito desde 1935.
A antiga Lei de Segurança Nacional, nº 7.170, de 1983, passou a ser alvo de discussão a
partir de 2021, tendo em vista que ocorreu, com base na lei, a abertura de investigações
sobre políticos e personalidades públicas que criticaram as autoridades.
A referida lei tinha por objetivo apresentar os crimes que causam danos ou lesões à
integridade territorial, à soberania nacional, ao regime democrático adotado no país, à
Federação, ao estado de direito e, também, aos chefes dos poderes da União, além de
indicar o trâmite processual para julgamento de tais crimes.
A Lei nº 7.170/83 foi elaborada durante o período da ditadura militar e desde que ocorreu
a redemocratização do Estado, havia sido usada poucas vezes. A Lei de Segurança
Nacional não é utilizada apenas no Brasil, mas sim em muitos países, com regras
próprias, com a intenção de estabelecer prescrições referentes à segurança do Estado.
Durante o governo de Jair Bolsonaro, a Lei nº 7.170/83 foi substituída pela Lei nº
14.197/21, sancionada com alguns vetos, o que ocasionou a revogação por completo da
lei anterior. A antiga lei passou a receber mais atenção por conta dos crescentes
inquéritos que a utilizavam como respaldo. Pesquisas indicaram que setenta e sete
inquéritos foram abertos, o que corresponde à soma de processos dos dez anos
anteriores.
Grande parte da doutrina, apesar das críticas, considera a Lei 14.197/21 mais moderna,
pois prioriza a defesa do regime democrático, da soberania e da integridade do país,
sendo cautelosa em não criminalizar a liberdade de expressão.
A nova lei trouxe alterações no Código Penal e ocasionou a inclusão do Título XII no
Código, denominado “Dos crimes contra o estado democrático de Direito”, que vão do
artigo 359-I ao 359-R.
O Título foi dividido em quatro capítulos, sendo o primeiro voltado aos crimes contra a
soberania nacional, criminalizando o atentado à soberania, atentado à integridade
nacional e espionagem. O segundo capítulo trata dos crimes contra as instituições
democráticas e criminaliza a abolição violenta do estado democrático de direito e o golpe
de Estado. O terceiro capítulo trabalha os crimes contra o funcionamento das instituições
democráticas no processo eleitoral e criminaliza a interrupção do processo eleitoral e a
violência política. Por fim, o quarto capítulo trata dos crimes contra o funcionamento dos
serviços essenciais e criminaliza a sabotagem.
Os posicionamentos favoráveis à lei se deram por esta deixar claro que manifestações
críticas aos poderes, atividades jornalísticas ou reivindicações de direitos e garantias
constitucionais realizadas em reuniões, greves, passeatas e manifestações políticas não
são consideradas crimes contra o Estado. Além disso, a nova lei é menos autoritária do
que as anteriores que vigoraram no Brasil. Por diversos anos, durante a ditadura Vargas e
ditadura militar era permitido que a justiça militar mantivesse a incomunicabilidade dos
indiciados por mais de dez dias, além das previsões de pena de morte e prisão perpétua.
Assim, o Brasil vem evoluindo para ajustar a legislação e garantir os direitos fundamentais
previstos na Constituição Federal, e conseguir manter o estado democrático de direito.
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Aula 2
SOBERANIA E SEGURANÇA INTERNACIONAL
A criminologia contemporânea aborda diversos conceitos de extrema
importância para a compreensão dos conflitos e situações
vivenciadas atualmente.
INTRODUÇÃO
Dentre esses conceitos, está o da soberania moderna, que atribui aos Estados, tanto no
âmbito interno quanto externo uma superioridade que não admite outra força senão a dos
poderes juridicamente constituídos. Dessa forma, o poder do Estado não está limitado às
fronteiras geográficas estabelecidas no território, sendo necessário que se reconheça o
poder soberano dos demais Estados para que haja, de forma recíproca, o reconhecimento
da supremacia, possibilitando uma melhor integração econômica e política entre os
territórios.
Caro estudante, desejamos boas-vindas à matéria de criminologia contemporânea, que
ampliará sua visão para os conceitos atuais que impactam na realidade social.
Estudaremos o conceito moderno de soberania, o direito de guerra no plano internacional
e a segurança coletiva no contexto internacional.
Aula 3
DIREITO INTERNACIONAL E AS POLÍTICAS CRIMINAIS DE CONTROLE SOCIAL
A criminologia aborda diversos conceitos que impactam diretamente
na sociedade moderna e na resolução de conflitos e redução da
criminalidade.
INTRODUÇÃO
O Direito Penal Internacional é uma matéria que engloba os mais variados temas, dentre
eles a aplicação da lei no espaço, temas relativos à nacionalidade, extradição,
cooperação penal internacional, proteção penal da sociedade internacional e dos bens
jurídicos supranacionais.
O desenvolvimento do ramo se deu por meio de mais de trezentos tratados, elaborados
desde 1815. São os tratados que definem um crime internacional e inserem os Estados
signatários na obrigação de punir quem feriu tal determinação ou extraditá-lo para outro
Estado que esteja disposto a aplicar a punição.
Visando à punição e à elaboração de políticas de combate ao crime surge a política
criminal, que consiste na sistematização de estratégias e meios de controle da
criminalidade. O tema passou por inúmeras mudanças com a evolução da sociedade.
Inicialmente era adotado o chamado paradigma inquisitorial ou da intolerância, com os
movimentos de lei e ordem (law and order), maximalismo penal (panpenalismo), Direito
Penal do Inimigo e teoria das janelas quebradas.
Os movimentos de lei e ordem surgiram com a intolerância observada nos Estados
Unidos, na década de 70. Seu objetivo era o combate à criminalidade por meio de uma
repressão intensa, visto que se acreditava que o problema da delinquência se deve,
prioritariamente, à falta de repressão criminal. Assim, adota-se um modelo de Estado
policialesco com a função de controlar as condutas criminais e punir com rigor quem não
se enquadrasse no modelo de sociedade proposto.
O maximalismo penal é adotado como um modelo político-criminal de apelo emergencial.
Aqui ocorre a centralização da solução criminal com a exacerbação do poder dos órgãos
de controle social formal, ou seja, os órgãos responsáveis por estipularem as políticas a
serem adotadas para o controle da violência. Ambos os modelos supramencionados
criam um Estado autoritário e o distanciamento do Estado democrático com a formação
de leis repressivas, sem uma análise voltada para o conteúdo social, com o investimento
em políticas públicas sociais, educacionais e inclusivas.
O Direito Penal do Inimigo reconhece dois tipos de sujeitos no Direito Penal, sendo os
praticantes de crimes comuns e os de crimes graves que afetam a estrutura da
sociedade, como terroristas, criminosos organizados, autores de crimes sexuais etc.,
propondo um tratamento diferenciado para esses dois grupos. Para essa teoria, o
segundo grupo de criminosos deveria ser considerado como “inimigo da sociedade” e
poderiam ser punidos sem a observância do Direito Penal e suas garantias.
A teoria das janelas quebradas foi vista por muitos autores como uma boa proposta de
redução da criminalidade. A teoria se baseia na conexão entre a desordem e a
criminalidade. Entende-se que a falta de controle e a desordem levam à ocorrência da
criminalidade e, como consequência, a não repressão a crimes leves leva à prática de
grandes infrações.
A política criminal atual toma como base o paradigma garantista, que busca a mínima
intervenção penal e a máxima intervenção social. O estudo apresenta uma proposta
humanística, respeitando os direitos assegurados pela Constituição, utilizando o Direito
Penal como a ultima ratio, formulando políticas sociais que evitem o cometimento de
crimes, como o investimento em programas sociais, educação e maior oferta de emprego.
Saiba mais
Aula 4
DIREITOS HUMANOS E POLÍTICAS DE COMBATE À CRIMINALIDADE
No âmbito do Direito Internacional, o período pós-guerra, em razão
das atrocidades cometidas pelo homem, foi o marco inicial para a
consolidação e aprimoramento dos direitos humanos.
INTRODUÇÃO
Segundo Norberto Bobbio (1992, p. 32), os direitos humanos não nascem todos de uma
vez, por isso é preciso analisar a evolução sofrida para compreender a concepção
contemporânea dos direitos humanos. Para Luigi Ferrajoli (2002, p. 338), os direitos
humanos simbolizam a lei do mais fraco contra a lei do mais forte e a doutrina menciona a
necessidade da evolução desse direito como uma construção e evolução constante para
assegurar a dignidade humana e evitar os sofrimentos causados pela brutalidade
humana.
A concepção mais moderna dos direitos humanos se deu a partir da Declaração Universal
de 1948, reiterada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993. A
internacionalização dos direitos humanos se deu a partir do pós-guerra como resposta
aos atos cometidos durante o nazismo, considerados como a maior violação do Estado,
levando à morte de 11 milhões de pessoas. Nesse período, a titularidade de direitos era
condicionada ao pertencimento de uma raça, no caso, a raça pura ariana.
Esse cenário levou a esforços que visam reconstruir o conceito de direitos humanos e
elevá-lo a um referencial ético para orientar a ordem internacional contemporânea, visto
que os Estados compreenderam que se existisse um efetivo sistema de proteção
internacional de direitos humanos, as violações da era Hitler não teriam acontecido.
Para que a reconstrução dos direitos humanos do pós-guerra pudesse acontecer, surgem
duas vertentes que devem ser observadas, o Direito Internacional dos direitos humanos e
o Direito Constitucional ocidental, com ênfase na dignidade humana. O Direito
Internacional passa a delinear sistemas normativos internacionais de proteção dos direitos
humanos, limitando o poder dos Estados por meio desse aparato internacional. O Direito
Constitucional elabora textos constitucionais com prioridade na dignidade humana. Em
resumo, é como se o Direito Internacional fosse o parâmetro de validade para as
constituições nacionais.
Assim, a proteção dos direitos humanos não fica restrita ao domínio do Estado, pois é um
tema de interesse internacional e cabe, dessa forma, uma revisão do conceito tradicional
de soberania absoluta que precisa ser relativizado em casos específicos e a ideia de que
o indivíduo deve ter seus direitos protegidos na esfera internacional e não apenas
nacional.
Em face da relativização da soberania dos Estados, é de extrema importância tratar da
autodeterminação dos povos. O princípio da autodeterminação é visto como um dos
pilares do Direito Internacional que preza pela livre deliberação dos povos em relalaçao à
sua organização como um Estado, ficando a cargo deste a escolha da forma de governo,
a formação cultural e de seu sistema econômico.
A globalização teve grande influência na autodeterminação dos povos como princípio.
Com o desenvolvimento econômico e tecnológico, gerou-se uma ampliação na difusão de
ideias, parcerias entre os Estados, mescla de culturas etc., o que resultou na “eliminação
das fronteiras”, que, por vezes, impacta no âmbito interno e na organização dos Estados.
Assim, é preciso observar e respeitar o princípio, mas também compreender a sua
limitação frente à relativização da soberania dos Estados para a proteção dos direitos
humanos.
GLOBALIZAÇÃO E A POBREZA
A globalização pode ser vista sob diversas óticas, sendo econômica, política, social e
cultural. No meio econômico, o mercado passou por diversas transformações com a
abertura dos mercados e negociações entre Estados, o que resultou na incorporação da
tecnologia aos fatores produtivos e ocasionou uma rotatividade de produtos e serviços.
No âmbito político, a globalização pode ser vista como redutora de fronteiras, pois os
Estados se aproximaram, o que impacta na soberania. No aspecto social, a globalização
pode gerar ameaças aos direitos humanos e na dimensão cultural temos a expansão das
culturas além de seus territórios.
Todas as modificações ocasionadas pela globalização, apesar de muitas serem
benéficas, devem ser analisadas, pois também podem resultar no aumento da
desigualdade e crises sociais. A globalização trouxe novos direitos e aperfeiçoou os
existentes, porém também auxiliou na eliminação de regras e na transformação de ideias.
A sociedade, tomada pelos avanços tecnológicos, passou a valorizar cada vez mais o
acesso à informação, o embasamento em pesquisas científicas, o que acaba por
modificar o perfil do empregado e até mesmo da mercadoria consumida. Desse modo,
ocorre uma valorização do trabalho que envolve o intelecto, em detrimento do trabalho
manual.
Um problema que pode ser observado em decorrência da globalização é o aumento do
desemprego e a flexibilização da mão de obra. A criminologia aponta a falta do mínimo
existencial como um dos fatores que podem levar ao aumento da criminalidade, visto que
a população passa a praticar transgressões para buscar meios de viver. Assim, cabe ao
Estado a garantia da proteção social às populações necessitadas, mesmo com recursos
limitados, para que a crise social não se amplie.
A relação entre globalização e pobreza é reconhecida mundialmente. O Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Banco Mundial concluem que a
globalização econômica tem sido responsável por agravar ainda mais as desigualdades
sociais e criar marcas profundas de pobreza absoluta e exclusão social.
Programas internacionais, como o PNUD, Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, criado em 1965, por meio da resolução do Conselho Econômico e
Social das Nações Unidas, visam o combate à pobreza e melhorias no desenvolvimento
humano. Atualmente, o programa atua em 166 países do mundo em colaboração com os
governos, inciativa privada e sociedade civil, na tentativa de construir uma vida mais digna
às pessoas.
No Brasil, o programa está presente desde 1960 e, dentre os temas, aborda o
desenvolvimento de capacidades, ciência e tecnologia, fortalecimento e modernização do
Estado, combate à pobreza e à exclusão social etc.
Além desse programa, ao longo dos anos a ONU criou diversos padrões e normas
relacionados à prevenção do crime e à justiça criminal. Desde 1955 ocorrem congressos
das Nações Unidas sobre o tema. Apesar dos sistemas de justiça criminal diferirem de um
país para o outro, assim como a resposta aos comportamentos criminais, as Nações
Unidas têm utilizado padrões para prevenção ao crime e justiça criminal, visando criar um
método coletivo de como o sistema criminal deve ser estruturado.
Esses padrões têm demonstrado significativa contribuição em três dimensões. Primeiro,
adoção de reformas necessárias na justiça criminal no aspecto nacional; segundo, no
auxílio aos países no desenvolvimento de estratégias regionais e sub-regionais e terceiro,
de forma global, estabelecer padrões que representam as melhores práticas que podem
ser adotadas pelos Estados para resolver problemas e necessidades nacionais.
Saiba mais
Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE
SEGURANÇA E SOBERANIA
Olá, estudante!
Você relembrará os conteúdos tratados ao longo da unidade como uma forma de fixação
da matéria. Iniciamos o estudo analisando a diferenciação entre a criminologia clássica e
contemporânea. Para a criminologia clássica, o crime deve ser analisado com base em
um conceito reducionista, ou seja, apenas o enfrentamento do criminoso contra a
sociedade. Já para a criminologia contemporânea o conceito passou a ser dinâmico, com
foco no crime, no criminoso, no papel da vítima e nas formas de controle social.
Da análise dos crimes cometidos em sociedade surge a necessidade de compreensão da
segurança nacional, que é a capacidade do Estado em fornecer a estabilidade e
inviolabilidade de suas fronteiras, exercer soberania no plano nacional e projetar poder no
âmbito internacional. Fica, desse modo, a cargo do Estado a proteção coletiva e individual
de uma sociedade.
Assim, em 1967, durante a ditadura militar, foi publicado o decreto nº 314/1967, que gerou
a primeira Lei de Segurança Nacional do Brasil, com o objetivo de proteger a ordem
capitalista do Estado brasileiro contra uma ameaça comunista. Após diversas evoluções
legislativas, a Lei 14.197/2021 é a atual Lei de Segurança Nacional tendo, inclusive,
gerado mudanças no Código Penal com a inserção do Título XII, que trata dos crimes
contra o estado democrático de direito.
Posteriormente, analisamos o conceito moderno de soberania, considerado um dos
elementos basilares do Estado hodierno, entendido como o poder concebido aos Estados
que não reconhece nenhum outro acima de si. Já a soberania internacional reflete o poder
observado nas relações entre os Estados, em que não há subordinação nem
dependência, mas sim igualdade.
Quando falamos em soberania internacional ocorre a relação entre Estados e por vezes
discordâncias, sendo necessário tratar sobre o direito de guerra. Ao longo dos anos,
diversos tratados e convenções internacionais foram firmados na tentativa de humanizar
os conflitos existentes. Atualmente, o uso da força pelos Estados só é admitido como
legal quando analisado e autorizado pelo Conselho de Segurança da ONU.
Estudamos também a distinção trazida pela doutrina sobre o Direito Penal Internacional e
o Direito Internacional Penal, bem como a crítica feita pela doutrina minoritária sobre a
distinção entre os termos, visto que na prática há um direito internacional que abrange
tanto o estudo dos crimes internacionais como a aplicação espacial do Direito Penal no
âmbito internacional, razão pela qual não seria necessária a divisão dos conceitos.
Verificamos a aplicação do Direito Internacional e políticas criminais na sociedade
moderna, compreendendo a evolução das teorias que visavam combater o crime. A
política criminal mais moderna adota uma postura garantista e busca a mínima
intervenção penal e a máxima intervenção social. Com isso, procura-se assegurar os
direitos garantidos pela Constituição, a utilização do direito penal como a ultima ratio e
políticas sociais voltadas para o investimento em programas sociais, educação e maiores
ofertas de emprego.
Por fim, analisamos a proteção dos direitos humanos no contexto internacional, que se
deu a partir da Declaração Universal de 1948, reiterada pela Declaração de Direitos
Humanos de Viena, de 1993, com a intenção de evitar a recorrência de atos como os que
aconteceram no período pós-guerra e nazismo. A necessidade do princípio da
autodeterminação dos povos e sua importância na manutenção da liberdade dos Estados
e relação da globalização com a pobreza e maior desigualdade social.
REVISÃO DA UNIDADE
Neste vídeo você poderá realizar uma revisão sobre os conteúdos tratados ao longo de
nossa unidade e relembrar os conceitos primordiais para a criminologia contemporânea.
Você será capaz de entender a aplicação no cenário internacional de conceitos como
segurança e soberania e verificar políticas criminais modernas que podem ser utilizadas
frente ao mundo globalizado.
ESTUDO DE CASO
Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você trabalha como juiz para a Corte
Internacional de Justiça (CIJ), principal órgão judiciário da Organização das Nações
Unidas, composto por quinze juízes. Sua função, juntamente com os demais colegas de
trabalho, é resolver, de acordo com o Direito Internacional, conflitos e controvérsias
jurídicas entre nações. Além disso, a Corte pode atuar na mediação de disputas jurídicas
entre Estados quando acionada e emitir pareceres consultivos a respeito de conflitos
jurídicos quando solicitado pelos órgãos que compõem a Organização das Nações Unidas
e suas agências especializadas. Lembre-se de que a Corte tem como medida respeitar a
soberania de cada nação.
No ano de 2022, você toma conhecimento acerca de uma invasão russa, ordenada pelo
presidente do país, à Ucrânia. O conflito não é atual e deve ser analisado desde os
tempos mais remotos. Antes de se tornar um Estado-nação independente, a Ucrânia
pertencia à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Após a Guerra Fria e os
conflitos travados com os Estados Unidos, a URSS não possuía mais força para se
manter e os países que compunham a União Soviética começaram a se desvincular.
A Ucrânia alcançou sua independência, mas passou por períodos de instabilidade
econômica e recorreu ao apoio de outros países, como os Estados Unidos e a própria
Rússia, que buscou a manutenção da influência sob os países do Leste Europeu, antigos
integrantes da URSS. Em 1994, a Ucrânia assinou, juntamente com a Otan (Organização
do Tratado do Atlântico do Norte), um tratado de parceria pela paz e em 1996 um tratado
de parceria especial, o qual a Rússia se opõe, visto que a Otan é uma organização
político-militar criada pelos Estados Unidos, Reino Unido, França, Itália, Portugal,
Holanda, Islândia, Dinamarca, Noruega e Luxemburgo.
Além disso, houve uma aproximação da Ucrânia com a União Europeia, o que foi visto
pela Rússia como perda de influência sob esta. Após anos de conflitos, em 2022, estudos
apontam como motivo para a invasão à Ucrânia a expansão da Otan pelo Leste Europeu,
a possibilidade do ingresso do país na aliança militar e a não concordância com a
independência. Já a Rússia alega querer impedir o cerco à sua fronteira, como a adesão
da Ucrânia à Otan.
Durante o conflito, que ainda se estende, diversos direitos humanos foram violados, há
centenas de vítimas fatais entre civis e militares, e houve um aumento da migração com
mais de 8 milhões de pessoas buscando abrigo em outros países. Como membro da
ONU, quais ações podem ser realizadas na tentativa de paralisação do conflito? Quais
sanções podem ser adotadas por outros Estados visando à proteção dos direitos dos civis
e à paralisação da guerra?
Reflita
Você analisará todos os conteúdos tratados na unidade como forma de resolução do
estudo de caso. Com base no caso narrado, lembre-se de pensar de forma global,
incorporando todos os tópicos tratados ao longo da matéria. Relembre o conceito de
soberania dos Estados e em quais casos é possível a sua relativização, a atuação da
ONU e dos Estados-membros como mecanismo de controle de conflitos internacionais e
formas de torná-los cada vez mais humanizados; as consequências econômicas que
podem ser utilizadas na tentativa de contenção de conflitos e das sanções que podem ser
aplicadas nos casos de violações internacionais e aos direitos humanos. Por fim, reflita
sobre as consequências de um conflito internacional para os civis e como o caso pode
afetar não só os países integrantes da guerra, mas também o mundo globalizado em
razão do aumento no fluxo migratório com pedidos de refúgio.
Você analisará formas de atuação no conflito entre Rússia e Ucrânia por parte da ONU e
dos Estados-membros. Inicialmente, como vimos ao longo das aulas, após o período do
pós-guerra e do nazismo o mundo se mobilizou para criar medidas que impedissem a
ocorrência de atrocidades contra a humanidade, causando a violação dos direitos
humanos. A Convenção de Genebra é a junção dos tratados assinados entre 1864 e
1964, que objetivou proteções mínimas, garantias fundamentais e normas de tratamentos
humanos aos indivíduos vítimas de conflitos armados.
No conflito entre Rússia e Ucrânia foram cometidos ataques generalizados e sistemáticos
contra os civis, o que por si só já viola as estipulações presentes na Convenção de
Genebra. Além disso, estudiosos consideram que a Rússia utilizou a força armada como
forma de violar a soberania e independência da Ucrânia. Assim, é possível identificar o
cometimento de crimes internacionais.
De forma geral, a punição da Rússia poderia se dar em duas jurisdições internacionais, a
CEDH (Corte Europeia de Direitos Humanos) e a CIJ (Corte Internacional de Justiça).
O artigo 2º da CEDH prevê que o direito à vida é protegido por lei e considera como
violação quando o direito à vida é ferido em casos de crimes de guerra e crimes contra a
humanidade. Através da Corte Europeia, os atos são puníveis pela reparação civil e não
condenação penal, ou seja, caberia indenização e multa por meio de ações individuais
movidas por pessoas afetadas contra o Estado violador.
Entretanto, a crítica da doutrina se dá com relação à competência de julgamento, pois no
início da guerra a Rússia foi expulsa do Conselho da Europa e por isso não estaria mais
sujeita à jurisdição da CEDH. Assim, a sanção aplicada pelo Direito Internacional acabou
trazendo uma vantagem para o Estado. Já na CIJ, como a Rússia é membro da ONU,
estaria sujeita às punições pelo órgão jurisdicional máximo das Nações Unidas e a ação
poderia ser ajuizada pela Ucrânia, um Estado contra outro, mas seria necessário
enquadrar a prática de crime contra a humanidade, de guerra ou agressão em uma
convenção internacional firmada nas Nações Unidas e que preveja a jurisdição da CIJ.
Os demais Estados-membros impuseram sanções como proibição de viajar dentro da
União Europeia, o congelamento de bens e contas em bancos europeus, proibição de
exportação de tecnologia de ponta para a Rússia, máquinas e equipamentos de
transportes, bens e tecnologias para refinação de petróleo, equipamentos para a indústria
energética, armas de fogo e matérias do exército, além de proibição de importação de
petróleo bruto e produtos petrolíferos refinados, carvão e combustíveis fósseis, aço, ouro
etc.
RESUMO VISUAL
TEORIAS DA CRIMINOLOGIA CONTEMPORÂNEA E
SEUS PRECURSORES
Aula 1
PSICOLOGIA CRIMINAL
Olá, estudante!
Você já parou para pensar que a criminologia é uma ciência interdisciplinar que se
aproxima da Psicologia, e que a psicologia criminal se relaciona com outras duas áreas
do saber, a Psicanálise e a psicopatologia?
Os indivíduos podem apresentar alguns transtornos e patologias que determinam seu
comportamento e alguns desses comportamentos podem se mostrar violadores das
normas sociais?
Nesta aula, convido você a conhecer os principais aspectos dos modelos da psicanálise e
da psicopatologia do crime, bem como identificar as características dos diversos
transtornos e patologias que poderão influenciar na prática de condutas delinquentes por
parte do indivíduo.
Vamos aprender mais sobre o tema?
PATOLOGIAS DO CRIMINOSO
• Esquizofrenia
a. Tipo paranoide: predominam as alucinações e os delírios.
b. Tipo desorganizado: discurso e conduta inadequada.
c. Tipo catatônico: bizarrices, mutismo, negativismo, imobilidade motora.
d. Tipo indiferenciado: não se encaixa nos tipos anteriores.
e. Tipo residual: discurso pobre, afeto enfraquecido.
Psicopatia
Penteado Filho (2014) traz as características da psicopatia:
Saiba mais
E para aprimorar ainda mais sua aprendizagem, vale a pena pesquisar a diferença entre
serial killer e assassino em massa:
GIMENES, E. V.; FILHO, N. S. P. Manual esquemático de criminologia. São Paulo:
Editora Saraiva, 2022. p. 92-96.
Aula 2
TEORIAS SOCIOLÓGICAS
Olá, estudante!
Você já ouviu falar nas teorias de conflitos e nas teorias de consenso?
Nesta aula, convidamos você a compreender as principais teorias sociológicas da
sociologia criminal e como elas justificam a criminalidade.
Dentre as teorias de conflito, estudaremos as teorias do etiquetamento e da reação social,
o contexto histórico em que elas surgiram e suas principais características.
Também abordaremos importantes aspectos de três grandes teorias de consenso: teoria
da associação diferencial, teoria da anomia e teoria da subcultura delinquente.
Assim, vamos juntos descobrir a contribuição que cada teoria trouxe para a criminologia
contemporânea.
TEORIAS DE CONFLITO
• Não utilitarismo: a conduta não possui utilidade, pois se trata de mero ato de
contestação, sem qualquer motivação racional.
• Malícia: é o prazer em ver a outra pessoa sofrer, de forma gratuita.
• Negativismo: nega os valores dominantes da sociedade.
• Conduta flexível: a modalidade criminosa não é específica, podendo ser qualquer
uma que atinja a busca pelo prazer do grupo.
• Conduta hedonista: ligada ao desejo de se divertir dos jovens.
• Conduta reforçadora: a prática do crime tem por finalidade alcançar o reforço, a
aprovação do grupo ou a adesão àquele grupo.
Saiba mais
Você já conheceu várias teorias sociológicas, e para ampliar seu conhecimento vale a
pena pesquisar sobre os fatores sociais de criminalidade:
GIMENES, E. V.; FILHO, N. S. P. Manual esquemático de criminologia. São Paulo:
Editora Saraiva, 2022. p. 64-66.
Aula 3
ANTROPOLOGIA CRIMINAL MODERNA
Olá, estudante!
Nesta aula convidamos você a conhecer as modernas teorias da antropologia criminal,
em especial as teorias endocrinológicas, e no que elas se diferenciam da teoria
lombrosiana.
Também convidamos você a conhecer um pouco mais os importantes estudos da
hereditariedade criminal e as conclusões obtidas por meios de anos de pesquisas sobre
as famílias criminais, gêmeos e adotados, e malformação cromossômica.
E por fim, aprenderemos a importância da neurociência na criminologia, afinal, foi por
meio dela que se chegou às várias patologias existentes na atualidade.
Assim, vamos juntos descobrir a contribuição que cada uma dessas ciências trouxe para
a criminologia contemporânea.
TEORIAS ANTROPOLÓGICAS MODERNAS
Com base nos estudos dessas teorias foi possível chegar às seguintes conclusões:
Por tais razões, os defensores das teorias endocrinológicas indicam a influência indireta
do mau funcionamento glandular na prática de comportamentos delituosos, pois as
disfunções hormonais poderiam provocar reações físicas e comportamentais não
controláveis, capazes de violar as normas sociais e as leis.
HEREDITARIEDADE CRIMINAL
Foi a partir do Projeto Genoma e dos avanços na engenharia genética que os estudos
sobre a hereditariedade criminal ganharam força.
Embora esses estudos tivessem concluído que nem todos os dados biológicos devam ser
atribuídos à hereditariedade, vários percentuais de indivíduos ligados por questões de
consanguinidade, entre doentes mentais, bem como a presença de fatores hereditários
degenerativos ou doentios foram estatisticamente comprovados como determinantes do
comportamento delinquente.
As linhas de pesquisas sobre a carga hereditária na prática de comportamentos
delituosos foram as seguintes: famílias criminais, gêmeos e adotados, e malformação
cromossômica.
Famílias criminais ou genealogia criminalO método de pesquisa utilizado foi o da
observação em longo prazo, vez que o estudo em comento se preocupou em acompanhar
a evolução dos integrantes de famílias específicas ao longo de anos. Em tais famílias
havia histórico de descendentes criminosos.
Os estudos comprovaram cientificamente que a maioria dos criminosos condenados por
crimes graves possuíam pais delinquentes. Contudo, não se podia afirmar que a
degeneração hereditária era a causa da criminalidade.
Nessa área, restaram dúvidas se a prática delinquente era determinada pela influência do
ambiente familiar ou de transmissão de fatores hereditários.
Estudo dos gêmeos ou delinquência gemelarSegundo Penteado Filho (2014, p. 150),
dois foram os dados objetos de estudos dos gêmeos: “maior semelhança da carga
genética (univitelinos ou idênticos) e menor semelhança (bivitelinos ou fraternos) e
respectivos dados criminais”.
Em se tratando de gêmeos univitelinos (idênticos), os estudos concluíram que de fato eles
possuem quase a mesma carga genética. Assim, se a influência da ação do meio
ambiente em que vivem prevalecer, haverá maior diversificação comportamental. Do
contrário, se prevalecer a herança genética, o meio ambiente será ineficaz para a
diversificação comportamental.
Da mesma forma, em que pese os gêmeos bivitelinos (fraternos), os estudos se
basearam tanto em relação ao comportamento ajustado como ao comportamento
delinquente, tanto em gêmeos que apresentavam padrões genéticos de normalidades
como de anormalidade.
Os estudos trataram de observar 705 pares de gêmeos, pesquisados por escolas alemãs,
holandesas e norte-americanas.
Assim, restaram maior incidência comprovada de casos delituosos nos gêmeos idênticos
e menor nos bivitelinos.
Filhos adotadosEm suma, os estudos constataram que os filhos biológicos de
delinquentes tendem a cometer crimes com maior frequência do que os filhos adotados.
Malformação cromossômica Todo ser humano possui 23 pares de cromossomos, sendo
que um desses pares é o cromossomo sexual: XX, para designar a mulher, e XY para
designar o homem. Assim, podem ocorrer anomalias quando houver excesso de
cromossomo sexual.
As principais são:
Síndrome de Turner: trata-se de doença genética que atinge somente as mulheres. Em
vez de possuírem o par de cromossomos sexuais XX ou XY, há a presença de apenas um
cromossomo X. A anomalia pode causar complicações, como, por exemplo, baixa
estatura e alterações cardiovasculares.
Síndrome de Klinefelter: trata-se de anomalia acometida aos homens, quando se
verifica a presença de dois ou mais cromossomos X, junto com um cromossomo Y. Várias
são as complicações, como, por exemplo, testículos pequenos, desenvolvimento de
mamas, distribuição de gorduras corporais que seguem o padrão feminino, tendência a ter
estatura mais elevada, infertilidade, dentre outros.
Sobre essas anomalias, as pesquisas foram inconclusivas acerca da influência que
exercem sobre os comportamentos delinquentes, não se podendo afirmar serem fatores
determinantes para a prática delituosa.
NEUROCIÊNCIA E CRIMINOLOGIA
Por fim, Penteado Filho (2014, p. 153) afirma ainda que outra importante descoberta da
neurociência foi que em certas regiões do cérebro humano adulto há células-tronco
neurais persistentes e que podem originar vários outros neurônios e células gliais (células
não neurais do sistema nervoso central que nutrem os neurônios), que podem substituir
as células danificadas ou doentes por outras sadias.
Essa importante descoberta pode chegar à cura de várias doenças neurológicas, pois as
células gliais possuem capacidade de se multiplicarem em larga escala.
Saiba mais
Para ampliar seu conhecimento sobre o assunto, leia o artigo Neurociência e o Direito
Penal: repensando o ‘livre arbítrio’ e a capacidade de culpabilidade.
Aula 4
TEORIAS BIOPOLÍTICA, TANATOPOLÍTICA, AGNÓSTICA E O BIOPODER
Olá, estudante!
Nesta aula convidamos você a conhecer algumas teorias desenvolvidas por Michel
Foucault e como elas se evidenciam na sociedade moderna.
Trata-se da biopolítica, tanatopolítica e biopoder. Embora os conceitos trabalhados por
essas teorias tenham sido elaborados na década de 1970, você descobrirá que se trata
de temas bem presentes na sociedade atual, inclusive diante de acontecimentos bem
recentes no plano internacional.
Convido você também a aprender um pouco sobre a teoria agnóstica da pena e as
críticas feitas ao sistema penal latino-americano pelo grande jurista argentino Eugenio
Raúl Zaffaroni.
Vamos aprender mais?
Utilize nossos materiais e aprofunde seu conhecimento sobre o assunto.
Bons estudos!
TEORIA BIOPOLÍTICA
TEORIA TANATOPOLÍTICA
Saiba mais
Para ampliar seu conhecimento leia mais sobre direito, Disciplinas e as “artes de
governar” , de Michael Foucaut:
FONSECA, M. A. da. Michel Foucault e o direito. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. p.
53-80.
Aula 5
Olá, estudante!
Você estudará a seguir algumas importantes teorias da criminologia contemporânea.
Para começar, é importante destacar que a criminologia se trata de ciência interdisciplinar
que se relaciona com o Direito, com a Psicologia, a Psiquiatria, a Sociologia, dentre outras
áreas do saber.
A criminologia estuda a criminalidade como problema social, tentando identificar os
fatores que contribuem para a prática delitiva.
Esses fatores sociais estão diretamente ligados às várias teorias criminológicas, pois são
elas que identificam possíveis causas para a criminalidade. Vejamos as principais que
nortearão os nossos estudos: na psicologia criminal, tem-se o modelo psicanalítico, que
se preocupa em estudar a personalidade psicodinâmica do indivíduo, identificando os
seus conflitos internos, suas frustrações e motivações para a delinquência, que segundo
Sigmund Freud, na maioria das vezes, estão relacionados aos traumas de infância
reprimidos no inconsciente do indivíduo.
Além do modelo psicanalítico, o modelo psicopatológico também tem papel importante no
estudo da criminologia, uma vez que tem por finalidade investigar as diversas
enfermidades que acometem os indivíduos, que, inclusive podem determinar seu
comportamento delinquente, e ainda, os diversos transtornos de personalidade. Estes
últimos não são doenças propriamente ditas, mas anomalias do desenvolvimento mental,
que também podem influenciar o comportamento do indivíduo.
Com base no modelo psicopatológico, é possível estudar as diversas patologias e
transtornos de personalidade que podem causar o comportamento desviante do indivíduo.
Em que pese as teorias sociológicas da criminologia, merecem destaque as teorias de
conflito, que partem da premissa que os membros de determinados grupos sociais não
compartilham dos mesmos interesses, e, por isso, os conflitos seriam inevitáveis, pois é a
partir de tais conflitos que a sociedade se desenvolverá. As principais são: teoria crítica,
teoria de etiquetamento e teoria da reação social.
As teorias de consenso também são espécies de teorias sociológicas da criminologia e
desenvolveram a ideia de que os seres humanos vivem em sociedade porque possuem
objetivos comuns. As principais teorias de consenso são: teoria da associação diferencial,
teoria da anomia e teoria da subcultura delinquente.
Outro importante estudo dentro da criminologia é o da antropologia criminal, ciência que
se preocupou em estudar as características físicas do criminoso enquanto fator
determinante para a delinquência. Aqui, merecem destaque algumas teorias
contemporâneas da antropologia criminal, como as teorias endocrinológicas, que partiram
de estudos biológicos para encontrar respostas à criminalidade com base em alterações
hormonais e endócrinas.
O estudo da hereditariedade criminal também contribuiu para se chegar a algumas
respostas sobre a criminalidade, por exemplo, ao se estudar as famílias criminais pôde-se
comprovar que a maioria dos criminosos condenados possuíam pais delinquentes. Assim
como na delinquência gemelar, os estudos identificaram maior índice de criminalidade nos
gêmeos idênticos, e em menor grau, nos gêmeos fraternos.
A neurociência também contribuiu para o estudo da criminologia, pois se preocupou em
analisar condutas delinquentes utilizando imagens de escaneamentos cerebrais e outros
instrumentos, auxiliando na identificação de anomalias mentais.
Por fim, temáticas superatuais, como a biopolítica, tanatopolítica e biopoder contribuem
de forma significativa para se compreender as mais variadas situações de violências
existentes no plano internacional diante da existência de conflitos interfronteiriços.
REVISÃO DA UNIDADE
Olá, estudante!
Nesta unidade aprendemos as várias teorias da criminologia contemporânea e sua
importância ao identificar os fatores que influenciam o comportamento do indivíduo.
Vimos que vários são esses fatores, desde endócrinos até hereditários. Assim, a
criminalidade pode receber influência de fatores físicos, biológicos e sociais.
Por fim, é possível identificar várias espécies de violências inseridas na própria sociedade
moderna, principalmente os conflitos internacionais, que segregam e marginalizam
pessoas tidas como rejeitadas para o Estado.
ESTUDO DE CASO
Para contextualizar sua aprendizagem, imagine que você, um estudioso do fenômeno
criminológico, foi convidado a analisar a história de Ricardo.
Ricardo, dentista, perdeu sua esposa e filho recém-nascido em um acidente de trânsito.
Após o acidente, Ricardo, desolado, sentindo que não havia mais motivo para viver,
deixou o emprego, abandonou sua casa e foi morar nas ruas.
Depois de três anos morando nas ruas, e em situação de total miséria, Ricardo se viu
motivado em deixar “essa vida” ao passar por um comércio e ver o anúncio de vaga de
emprego para dentista.
Animado, Ricardo procurou a administração do edifício onde ficava localizada a clínica
odontológica, que divulgou a vaga de emprego para ter maiores informações. Descobriu
que as entrevistas ocorrerão dali a três dias e por ordem de chegada dos candidatos.
Assim, ficou extremamente preocupado, pois não possuía roupas adequadas para a
entrevista. Logo, teve a brilhante ideia de furtar uma loja de roupas situada na feira local.
Ricardo traçou várias estratégias para a prática do furto, de forma que não fosse pego.
Contudo, no dia do furto, policiais à paisana faziam o patrulhamento da vizinhança, e sem
saber, Ricardo se desbravou na difícil missão: a de furtar roupas para usar no dia da
entrevista.
Ricardo entrou em uma loja, já visualizando uma camisa gola polo e calça jeans escura.
Rapidamente, se apropriou das roupas e fugiu. O vendedor da loja, aos gritos, alertou os
demais feirantes e acionou a polícia. Ricardo conseguiu fugir até a rua de trás da feira,
mas, antes que pudesse se esconder, foi encontrado pelos policiais à paisana que faziam
ronda na localidade. Dessa forma, Ricardo acabou sendo preso em flagrante pela prática
de crime de furto. Na delegacia, Ricardo confessou o furto ao delegado, e quando
questionado sobre a motivação do crime, explicou que era dentista e com as roupas
novas pretendia concorrer à vaga de emprego que viu no comércio por onde andara.
Considerando a situação hipotética, qual teoria que melhor explica a pretensão de
Ricardo? Por quê? Para essa teoria, o crime tem origem patológica do indivíduo?
Explique o que diz essa teoria.
Reflita
Você aprendeu que as teorias sociológicas se preocupam em entender como a sociedade
pode influenciar o ser humano na prática de crimes, já que os delitos não se limitam às
características físicas ou são determinados tão somente por fatores biológicos do
indivíduo.
Cada teoria se preocupa em entender a criminalidade analisando fatores sociais sob
perspectivas diferentes. Por exemplo, a teoria do etiquetamento procura compreender o
porquê de o Estado criminalizar certos comportamentos; já a teoria da associação criminal
chegou à conclusão de que o comportamento criminoso é aprendido por meio da
interação social; na visão de Durkheim, o crime é útil para a sociedade, pois é a partir dele
que haverá a progressão/evolução social.
Assim, será que no contexto apresentado, Ricardo sofreu influência do meio ambiente
social em que vive?
Analisando a história de Ricardo, é possível concluir que a própria sociedade impõe
padrões de comportamentos, que se o indivíduo não se adequar, ficará excluído e
marginalizado?
E como resolver essas questões sociais, tendo em vista que são as pessoas das classes
mais desfavorecidas que sofrem com esses padrões impostos pela sociedade?
RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO
Nosso estudo de caso retrata a teoria da anomia, desenvolvida por Robert King Merton. A
teoria da anomia é uma das espécies de teorias estruturais-funcionais, que afirmam que o
crime é social, normal e funcional, decorrente do próprio progresso da sociedade.
Para Merton (2023), a falta de sucesso em alcançar metas culturais, como ter
propriedade, carro, família etc., chamada de meios institucionais, gera a conduta
desviante.
Assim, são os membros das classes menos favorecidas que cometem a maiorias dos
delitos, pois será por meio da conduta desviante que essas pessoas tentarão atingir as
metas culturais.
Merton prevê cinco tipos de adaptação individual (ANDRADE; MEDEIROS, 2023, p. 96):
Nesse caso, a origem do crime não é patológica, e sim decorre do normal funcionamento
de toda a ordem social.
Na situação hipotética, a motivação da prática de crime por Ricardo tinha como finalidade
estar visualmente apresentável para o dia da entrevista, padrão esse imposto pela
sociedade. Assim, seria inconcebível a ele que se apresentasse na entrevista com roupas
maltrapilhas.
O estar bem vestido representa a meta cultural almejada por Ricardo. Ele mesmo sabia
que deveria estar à altura dos demais candidatos para que fosse possível a concorrência
justa entre eles, caso contrário, não teria a menor chance.
Quanto às adaptações, Ricardo se enquadra na adaptação inovação, pois ele absorveu
as metas culturais, ou seja, a necessidade de se apresentar bem vestido para a
entrevista, mas não possuía os meios institucionais para alcançá-las, isso porque vivia em
situação de miserabilidade, sem dinheiro, sem posses, já que era morador de rua, e, na
sua concepção, não restou alternativa senão a de praticar o furto.
RESUMO VISUAL
elaborada pelo autor.
Olá, estudante!
Nesta aula convidamos você a conhecer o conceito da criminologia crítica, dialética ou
radical, bem como suas principais características.
A criminologia crítica nasceu em um momento de intensa crise política, decorrente do
surgimento do sistema capitalista.
Como forma de se opor ao capitalismo, esse movimento fez duras críticas ao sistema
político de dominação da classe burguesa em relação à classe trabalhadora, enxergando
o fenômeno criminal a partir de outros fatores, como as desigualdades sociais, a luta de
classes, dentre outros.
Com base nessa teoria, outras teorias surgiram, também com o intuito de criticar a gestão
do poder estatal em relação às classes menos favorecidas.
Vamos aprender mais sobre o tema?
Por fim, como já dito anteriormente, é importante ressaltar que a criminologia crítica, em
decorrência do método produtivo e do sistema político de dominação oriundos do sistema
capitalista, defende, arduamente, a restruturação e reformulação da sociedade,
principalmente no que se refere aos graves problemas relacionados às desigualdades
sociais.
Criminologia da pacificação
Defendida pelo criminólogo americano Richard Quinney, a criminologia da pacificação,
pacificadora ou da compaixão defende a busca de uma sociedade justa e livre de delitos e
castigos, propondo um sistema de justiça criminal baseado no diálogo.
Trata-se de criminologia fundada em concepções religiosas de bondade e compaixão.
Criminologia verde
É uma vertente da criminologia crítica que se preocupa com problemas relacionados ao
meio ambiente, defendendo sua integral proteção, pois representa direito difuso, inerente
a toda coletividade.
Assim, a teoria se preocupa com o estudo da criminalidade ambiental, daí o nome
criminologia verde, que partindo da mesma premissa que os crimes de colarinhos
brancos, são praticados por grandes corporações.
Andrade e Medeiros (2023, p. 104) sustentam que essa teoria denuncia a prática de
grandes empresas que, supostamente, dizem preservar meio ambiente, mas que, na
verdade, cometem crimes de lavagem de dinheiro (greenwashing).
Aqui, os crimes ambientais podem chegar ao conhecimento do Estado, e este por sua
vez, fazendo vista grossa, deixa de punir essas grandes empresas, ou esses tipos de
crimes sequer chegam ao conhecimento do poder estatal. Os crimes ambientais que não
chegam ao conhecimento do Estado são chamados de cifra verde.
Criminologia pós-moderna
Por fim, a última vertente da criminologia crítica tem por finalidade criticar a modernidade,
que coisifica o crime e sua produção. Essa teoria foi desenvolvida por Dragan Milovanovic
e Stuart Henry.
Saiba mais
Para ampliar seu conhecimento, convidamos você a pesquisar sobre a diferença entre o
realismo de esquerda (neorrealismo de esquerda) e o realismo de direita
(neorretribucionismo): VEIGA, M. Criminologia. Coleção Método Essencial. Rio de
Janeiro: Grupo GEN, 2022, p. 107-110.
Aula 2
DEFENSORES DA CRIMINOLOGIA CRÍTICA
Olá, estudante!
Você sabia que a criminologia crítica, dialética ou radical também influenciou os países
latino-americanos?
Nesta aula convidamos você a conhecer um pouco mais sobre a criminologia crítica e
vários outros defensores, inclusive brasileiros.
Iremos estudar os principais defensores da teoria crítica e como esses grandes nomes se
destacaram na sociedade da época e influenciaram a sociedade contemporânea.
Dentre eles, vários nomes podem ser citados, como Nilo Batista, Juarez Cirino dos Santos
e Roberto Lyra Filho, que contribuíram com a sociedade brasileira com base em
pensamentos marxistas em oposição à dominação de classes perpetrada pelo sistema
capitalista.
Vamos aprender mais sobre esses teóricos?
A criminologia crítica, dialética ou radical é uma teoria inspirada por ideais marxistas (Karl
Max) em contraposição ao sistema capitalista. Tal teoria traça duras críticas às
desigualdades sociais, ao sistema de produção, em face da intensa exploração da mão
de obra e, sobretudo, à política de criminalização, uma vez que o sistema penal se
traduzia em criminalizar as classes mais desfavorecidas da sociedade da época.
Vários são os defensores dessa teoria, e alguns se destacaram ao longo da história.
Vamos conhecê-los?
Juarez Cirino dos Santos ficou conhecido como o pioneiro da criminologia crítica no
Brasil. Nascido na cidade de Rio Azul, no estado do Paraná, em 24 de setembro de 1942,
tornou-se professor universitário, pesquisador, escritor e advogado brasileiro.
As obras de Juarez Cirino dos Santos se aproximam muito do diálogo enfrentado pelas
teorias defendidas por Karl Marx, Foucault, Alessandro Baratta, Max Weber, Erwing
Goffman, Kirchhheimer, dentre outros.
Escreveu A Criminologia da Repressão, em 1979, e se identificou com o marxismo.
Também escreveu As Raízes do Crime: um estudo sobre as estruturas e as instituições
da violência, em 1984. E não diferente dos demais defensores da criminologia crítica, se
preocupou em estudar as relações sociais da estrutura de classe do sistema capitalista,
bem como o sistema político-jurídico, voltados para a análise de seu principal objeto, o
crime e o controle social (PENTEADO FILHO, 2014, p. 118).
Assim, para o jurista, a base da criminologia crítica é composta pelas classes de
trabalhadores, consideradas oprimidas, justificando a luta contra o sistema capitalista, a
busca pela construção do socialismo, e ainda, a criação de uma teoria materialista do
Direito Penal e do crime no plano do sistema capitalista.
Suas obras retratam uma postura de radicalismo extremo, pois para o autor, o processo
de criminalização, tanto na produção como na aplicação das normas protege
seletivamente os interesses das classes dominantes, selecionando os indivíduos
rotulados e estigmatizados, que estavam distribuídos nas classes sociais subalternas.
Nucci sustenta que, para Juarez Cirino, a criminologia crítica é uma reação à criminologia
tradicional, da mesma forma que o marxismo foi para a clássica economia política:
Dessa forma, a criminologia radical tem por finalidade abolir tudo o que for considerado
inimigo da classe trabalhadora.
Assim, Juarez Cirino e os demais defensores da criminologia radical se voltam contra a
exploração de classes e o racismo, defendendo a transformação da estrutura social, bem
como a solidificação do socialismo.
No que se refere à pena privativa de liberdade, para Juarez Cirino, a prisão não reduz a
criminalidade, porém contribui com o aumento da reincidência e das organizações
criminosas, bem como com o surgimento de novos delinquentes, se mostrando um
fracasso (NUCCI, 2021, p. 124).
Por fim, seria necessário adotar uma política para criminalizar as classes dominantes e
descriminalizar as classes inferiores, além de se criar penas alternativas para os crimes
menos graves.
Roberto Lyra Filho foi um jurista brasileiro, formado em Letras e Direito, que possuía
grandes produções literárias, algumas sob o pseudônimo de Noel Delamare. Foi
advogado no estado do Rio de Janeiro, exerceu a função de conselheiro penitenciário e
dedicou parte da sua vida profissional à carreira de docente na Faculdade de Direito do
Rio de Janeiro, lecionando a disciplina de Direito Penal. Na Faculdade Brasileira de
Ciências Jurídicas assumiu a cátedra de Direito Processual Penal.
O jurista chegou a lecionar também na Universidade de Brasília, em 1963. Ajudou a
fundar o Centro Universitário de Brasília (CEUB) e, em 1984, se mudou para o estado de
São Paulo, onde atuou em cursos de graduação e pós-graduação, lecionando as
disciplinas de Direito Penal, Direito Processual Penal, Filosofia Jurídica, Direito
Comparado, Criminologia e Sociologia Jurídica.
O autor foi considerado um dos grandes pensadores da esquerda, destacando-se por
estudos dogmáticos ligados ao humanismo dialético e à Filosofia e Sociologia Jurídica.
Defendia a abolição da sociedade de classes e sofreu grande influência do “Direito
achado na rua”, que pregava a validade das normas jurídicas individuais a partir do
socialismo democrático.
Observe alguns ideais de Roberto Lyra Filho descritos em sua obra:
Saiba mais
Para ampliar seu conhecimento, convidamos você a ler sobre o criticismo na obra de
Guilherme de Souza Nucci:
NUCCI, G. de S. Criminologia. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. p. 122-129.
Aula 3
CRIMINOLOGIA CRÍTICA E O SISTEMA PENAL
Olá, estudante!,
Você já ouviu falar em Alessandro Baratta?
Alessandro Baratta foi um grande expoente da criminologia crítica. Sua obra Criminologia
Crítica e Crítica do Direito Penal, escrita em 1982, retrata sua visão sobre a sociedade da
época.
Baratta se destacou por apresentar uma proposta de política alternativa ao Direito Penal,
além de ter tecido duras críticas aos métodos de ressocialização implementados pelo
Estado por se mostrarem ineficientes.
Nesta aula, convidamos você a conhecer um pouco mais sobre esse grande filósofo,
sociólogo e jurista italiano, que norteia o estudo da criminologia crítica.
Vamos aprender mais?
Utilize nossos materiais e aprofunde seu conhecimento sobre o assunto.
Bons estudos!
Vamos entender um pouco mais sobre a proposta de política alternativa ao Direito Penal,
de Alessandro Baratta?
Ao se falar de uma criminologia crítica e interacionista, Baratta (2011) defende que o
processo de criminalização é o mais poderoso mecanismo de reprodução das relações de
desigualdades sociais.
Assim, o sistema penal possui uma função seletiva que se dá tanto na criminalização
primária (criação dos tipos penais) como na criminalização secundária (aplicação da pena
a um caso concreto), pois não irá processar todos os crimes. Isso porque essa
seletividade é direcionada para a camada mais pobre da sociedade, não para os mais
ricos, salvo pouquíssimas exceções.
A seletividade em escolher quais condutas serão processadas ocorre tanto no momento
da criação de um tipo penal, dando prioridade a tipos penais direcionados à criminalidade
de rua, quanto no momento de o juiz aplicar a sanção penal ao caso concreto, ou ainda,
no momento do oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, e quando a autoridade
policial sai às ruas e escolhe quem são os possíveis autores de crimes.
Nucci (2021) relata que Alessandro Baratta trata de ponto relevante para sua teoria, que
diz respeito à igualdade formal existente no Direito Penal. Nesse ponto, destaca-se o
princípio da fragmentariedade para deixar à margem do Direito Penal algumas condutas,
que podem ser absorvidas por outros ramos do Direito. Assim, não criminalizar certos
comportamentos, praticados, sobretudo pelas classes dominantes, demonstra que o
sistema político somente criminaliza comportamentos típicos de classes pobres e
subalternas:
Quanto a esse aspecto, torna-se difícil refutar, tendo em vista que a simples
observação dos tipos penais incriminadores demonstra a imensa diferença de
pena, quando destinada a um crime patrimonial, como o furto, que, após
sucessivas reformas no Código Penal, conseguiu a proeza de ganhar cinco
circunstâncias qualificadoras, a ponto do furto de galinha poder ser apenado
com reclusão de dois a cinco anos (art. 155, § 6º). É praticamente a mesma
pena cominada a delitos tributários e econômicos, previstos pela Lei 8.137/1990
(arts. 1º e 4º). Sob outro aspecto, BARATTA completa ser hoje a função do
cárcere o demonstrativo da desigualdade sistêmica, captando presos das
camadas mais depauperadas da sociedade, marginalizados socialmente e
estigmatizados pelo sistema punitivo estatal. Assim, o cárcere seria a ponta do
iceberg que é o sistema penal burguês.
É nesse contexto que Alessandro Baratta defende a implantação de uma política criminal
alternativa, em que os delitos seriam diferenciados pela posição social do autor.
Essa política alternativa seria subdividia em duas (BARATTA, 2011):
Agora que você já sabe quais foram as críticas feitas por Baratta ao sistema penal, vamos
estudar as críticas tecidas pelo autor aos métodos de ressocialização realizadas pelo
Estado?
Alessandro Baratta (2011) defende que o atual sistema carcerário produz efeitos
contrários àDessa forma, Alessandro Baratta sustenta ainda que, para esses crimes dos
poderosos, as penas deveriam ser mais duras. Por outro lado, para a criminalidade de
rua, o Direito Penal deveria ser menos cruel.
Por fim, o conceito de direitos humanos assume uma dupla função: função negativa,
marcando os limites da intervenção penal, e função positiva, definindo quais são os
objetivos possíveis de serem tutelados pelo Direito Penal, devendo-se incluir os
interesses coletivos, como saúde pública, ecologia e melhores condições de trabalho.
ressocialização e à reinserção do condenado no seio social:
(BARATTA, 2011).
Saiba mais
Olá, estudante!,
Nesta aula estudaremos as teorias abolicionistas de Louk Hulsman, Thomas Mathiesen e
Nils Christie.
Louk Hulsman defende a completa abolição do Direito Penal, pois, na visão do autor, ele
não serve para proteger a sociedade; enquanto Thomas Mathiesen defende a abolição do
sistema carcerário e das penas privativas de liberdades, uma vez que se mostram
ineficientes e incapazes de ressocializar os condenados; por outro lado, Nils Christie
defende o fim das penas que causam sofrimento, primando pela reparação dos danos
causados à vítima como punição ao infrator.
Vamos aprender mais sobre a teorias desses grandes criminólogos? Utilize nossos
materiais e aprofunde seu conhecimento sobre o assunto.
Bons estudos!
Você já aprendeu que a teoria abolicionista se origina a partir das teorias críticas, em
especial, da teoria do etiquetamento, defendendo o fim do Direito Penal da forma como se
conhece hoje.
Dentro das escolas abolicionistas pode-se se destacar a teoria de Louk Hulsman,
criminólogo holandês que defende a total abolição do Direito penal, uma vez que não
protege a sociedade, não consegue prevenir a delinquência e carece de fundamento e de
racionalidade. Conforme tal teoria, antes, essa criminalização deveria ser abolida
internamente em cada indivíduo, pois seria necessário mudar a percepção, atitudes e
comportamentos que cada um tem em si mesmo relacionados a preconceito racial,
preconceito de gênero etc. (HULSMAN; DE CELIS, 1993).
Para Louk Hulsman (HULSMAN; DE CELIS, 1993), os conflitos sociais poderiam ser
perfeitamente solucionados pelas partes, sem que houvesse a participação do Estado. O
criminólogo em questão defende ainda que o termo “crime” deveria ser substituído por
“situações-problemas”, porque é a favor da completa descriminalização das condutas
consideradas criminosas e descarcerização dos indivíduos.
Dessa forma, em vez de “crime”, “criminoso”, “criminalidade”, ou “política criminal”, se
deveriam utilizar as expressões “atos lamentáveis”, “pessoas envolvidas”, situações-
problemas” ou “comportamentos indesejados”. Isso porque o sistema criminal dá origem a
novos conflitos na sociedade, em decorrência da exclusão, da estigmatização e da
dominação de classes. Esse mesmo sistema criminal é investido de poder, que produz
um mal à sociedade, pois não procura entender as reais necessidades das populações.
Assim, o Direito Penal poderia ser imediatamente abolido e substituído por outros
métodos de solução de conflito, como a reparação e a conciliação. A criminalização do
indivíduo deve se apresentar como evento raro e excepcional. Dessa maneira, as partes
seriam protagonistas das soluções conciliatórias e, caso o conflito tivesse que passar pelo
juiz, este deveria pertencer a um tribunal de natureza administrativa ou civil, atuando em
defesa das garantias e liberdades individuais.
Andrade e Medeiros (2023) citam um caso emblemático de Hulsman:
Agora que você já estudou a teoria abolicionista de Louk Hulsman, vamos entender a
diferença apresentada pela teoria de Thomas Mathiesen, também defensor do
abolicionismo do Direito Penal.
Sociólogo norueguês, Thomas Mathiesen, ao contrário de Louk Hulsman, defende a
extinção da pena privativa de liberdade e do sistema carcerário, por se mostrarem
ineficazes, e não a extinção do Direito Penal como um todo. Sua postura abolicionista
apresenta profundas críticas às prisões.
Para o sociólogo, o problema do sistema carcerário se encontra na finalidade geral da
pena, pois não haveria sentido castigar um indivíduo que comete delitos com o objetivo de
evitar que outras pessoas venham a delinquir. Ainda que se voltasse ao utilitarismo, o
sistema carcerário padeceria de imparcialidade, na medida em que se apresenta seletivo,
favorecendo as classes abastadas e sacrificando indivíduos das classes menos
favorecidas (MATHIESEN, 1965).
A partir dessa ideia, Mathiesen se propôs a tecer intensas críticas aos sistemas de
prevenção à criminalidade. Num primeiro momento, analisando a prevenção individual, a
interdição e a dissuasão, os defensores dessas ideologias sustentam que para encarcerar
poucos indivíduos que realmente são perigosos seria necessário encarcerar também
muitos indivíduos que provavelmente não cometeriam nenhum crime. Esse seria um
efeito colateral normal. Assim, discordando de tal cenário, o sociólogo sustenta que essa
ideologia seria desprovida de ideais humanitários, sem se preocupar em melhorar a vida
do indivíduo, de forma a reinseri-lo na sociedade (MATHIESEN, 1965).
A teoria da interdição tem por finalidade a condenação de indivíduos baseado em atos
que poderão ser cometidos no futuro. Por exemplo, o Estado poderia impor a pena
privativa de liberdade para um grupo inteiro de pessoas, sem fazer qualquer distinção
entre elas, pouco importando o grau de perigo que cada uma representa para a
sociedade. Tal teoria se baseia em possibilidade futura, e por esse motivo, Mathiesen
sustenta que não há como predizer a periculosidade de um indivíduo que justificasse o
castigo, mostrando-se o sistema carcerário totalmente desumano.
Por último, a dissuasão utiliza o encarceramento para dissuadir o indivíduo a não cometer
mais crimes. Contudo, para o sociólogo, essa teoria não funcionará de forma individual.
Desse modo, as teorias que são utilizadas para fundamentar o sistema carcerário não
conseguem defender sua existência. Diante do fracasso do sistema prisional, é
necessário reduzir seu papel de forma progressiva até a sua total extinção.
A proposta para abolição do sistema carcerário e das penas privativas de liberdade deve
seguir dois planos: legislativo e de preparação política.
No plano legislativo, o Estado precisa despenalizar e descriminalizar as condutas, criando
soluções de natureza civil no lugar da pena.
No plano de preparação política, é necessário criar meios para que as populações
entendam e aceitem as mudanças nas leis, levando-as a compreender que a ideologia do
cárcere não irá mudar as questões de criminalidade, mas apenas cometer injustiças ao
impor regimes tão severos às pessoas das classes sociais menos favorecidas
(MATHIESEN, 1965).
Por fim, é necessário abrir os espaços públicos para debates, a fim de que as populações
se conscientizem sobre a ineficácia do sistema carcerário.
Você aprendeu que Louk Hulsman defende a abolição completa do Direito Penal e que
Thomas Mathiesen defende a abolição progressiva do sistema carcerário, por se mostrar
ineficaz.
Agora, falaremos sobre a teoria de Nils Christie, sociólogo e criminólogo norueguês, que
defendeu a extinção de penas que causassem dor ou sofrimento às pessoas.
Apesar de não se considerar um abolicionista propriamente dito, a doutrina criminológica
o considera. Christie afirma que o crime não existe, pois o que existem são atos, e que a
partir de uma construção social esses atos foram classificados como crimes. Dessa
forma, o conceito de crime foi criado por um grupo de pessoas que escolheram
criminalizar certos atos (CHRISTIE, 2004).
O sociólogo defende também o diálogo entre vítima e infrator, a fim de que compreendam
a posição, as circunstâncias e características de cada um, dando a oportunidade de
contarem o seu ponto de vista e entenderem suas motivações e sentimentos (CHRISTIE,
2004).
Ao possibilitar esse diálogo, o Estado evitará que as comunidades tratem o infrator com
ódio e alcançará resultados mais satisfatórios à vítima.
Para Nils Christie, os infratores não são monstros. Na verdade, são pessoas normais
como quaisquer outras, mas que fizeram coisas erradas, e, portanto, seria possível
manter um diálogo aberto com eles (CHRISTIE, 2004).
A justiça criminal se divide em justiça horizontal e justiça vertical. A primeira se trata de
decisões de âmbito local, que visam à compensação ou à reparação no lugar da punição.
A segunda se refere à busca pela punição. Contudo, a punição deve ser o último recurso
imposto pelo Estado.
Primeiro deve-se buscar um sistema de solução civil de conflitos para as situações em
que não for possível o perdão e a conciliação entre as partes, para somente depois
aplicar uma punição ao infrator voltada à reparação dos danos causados por atos
indesejados. As punições que causam sofrimentos, como as penas privativas de
liberdades, devem ser extintas da sociedade, pois podem tornar as pessoas mais cruéis
do que já são.
Assim, deve-se primar pela reconciliação a partir de um sistema reintegrador, com a
finalidade de reparar o dano, ainda que de forma simbólica, sem causar sofrimento ao
condenado. Por tais razões é que a punição que cause sofrimentos aos condenados deve
ser a última alternativa, e não a primeira.
Para concluir, Andrade e Medeiros (2023, p. 177) afirmam que Christie sugere uma
espécie de justiça comunitária ou restaurativa para solucionar o caso da criminalidade ou
situações-problema, com a reparação dos danos causados pelos atos indesejados à
vítima, seja por meio da conciliação, seja pela mediação, ou até mesmo, pelo que ele
chama de reconciliação, sempre com a finalidade de evitar qualquer pena que cause dor
ao infrator.
Saiba mais
Aula 5
REVISÃO DA UNIDADE
Olá, estudante!
A criminologia crítica, dialética ou radical nasceu a partir da Revolução Industrial,
contrapondo-se aos ideais capitalistas.
A teoria crítica também ficou conhecida como teoria marxista diante da forte influência dos
ideais de Karl Marx, que sustentava que o capitalismo serviu para aumentar as
desigualdades sociais.
Nesse contexto, para os defensores da teoria crítica, com o surgimento do sistema
capitalista e do sistema de dominação entre classes sociais houve um considerável
aumento no índice de criminalidade, tendo em vista que o sistema penal se preocupava
tão somente com os interesses das classes dominantes, e para conter seus opositores,
que pertenciam às classes menos favorecidas, direcionavam a criação das leis penais
para esse grupo de pessoas.
Por tais razões, os criminólogos críticos afirmavam haver forte estigmatização da
população pobre, pois a burguesia também dominava o poder estatal, que se voltava
apenas aos interesses da classe dominante.
Assim, podemos apontar as principais características do movimento crítico:
• A concepção conflitual da sociedade e do direito (o direito penal se ocupa de
proteger os interesses do grupo social dominante).
• Reclama compreensão e até apreço pelo criminoso.
• Critica severamente a criminologia tradicional.
• O capitalismo é a base da criminalidade.
• Propõe reformas estruturais na sociedade para redução das desigualdades e
consequentemente da criminalidade. (ANDRADE; MEDEIROS, 2023, p. 101).
Várias ramificações surgiram a partir do movimento crítico, dentre elas podemos destacar
a criminologia da pacificação, a criminologia realista ou realismo de esquerda e a
criminologia verde. A primeira prega a busca de uma sociedade justa e livre de delitos e
castigos, propondo um sistema de justiça criminal baseado no diálogo; a segunda
defende que o conceito abstrato de crime deve ser substituído por políticas comunitárias
de enfrentamento às desigualdades sociais para proteger os direitos e os interesses dos
grupos vulneráveis; e a terceira se preocupa com o estudo da criminalidade ambiental.
Além disso, alguns precursores se destacaram ao longo da história enquanto defensores
do movimento radical no Brasil: Nilo Batista, José Cirino dos Santos e Roberto Lyra Filho.
Esses criminólogos radicais brasileiros também receberam forte influência de Alessandro
Baratta, filósofo, sociólogo e jurista italiano, que traçou fortes críticas à criminologia
tradicional, sob o argumento de que o Direito Penal, por meio das normas e de suas
aplicações, reproduz as relações sociais ao marginalizar a população dos setores mais
pobres da sociedade. O jurista apresentou uma proposta de política alternativa, no intuito
de atender às classes desfavorecidas (BARATTA, 2011, p. 86).
Por fim, a teoria abolicionista nasceu a partir das teorias críticas, em especial, da teoria de
etiquetamento, defendendo o fim do Direito Penal da forma como se conhece hoje. Os
principais defensores dessa teoria são: Louk Hulsmans, que defende a total abolição do
Direito Penal, pois entende que os conflitos sociais podem ser solucionados pelas
próprias partes, sem a participação do Estado; Thomas Mathiesen, que defende a
extinção da pena privativa de liberdade e do sistema carcerário, traçando intensas críticas
às finalidades gerais e especiais das penas; e Nils Christie, que defende a extinção das
penas que causem sofrimento às pessoas.
REVISÃO DA UNIDADE
Olá, estudante!
Nesta unidade estudamos o conceito, as características e os principais ideais da
criminologia crítica, dialética ou radical.
Aprendemos que a teoria crítica nasceu a partir da Revolução Industrial, contrapondo-se
aos ideais capitalistas, e recebeu influência marxista. Isso porque, com o surgimento do
sistema capitalista, houve um considerável aumento no índice de criminalidade, pois o
sistema penal, dominado pela burguesia, direcionava a criação das leis penais para as
classes menos favorecidas.
ESTUDO DE CASO
Reflita
O jurista e criminólogo Alessandro Baratta buscou dialogar com a criminologia crítica e a
crítica do Direito Penal, afirmando ser necessário superar o sistema punitivo tradicional
em defesa de um sistema de garantias dos direitos humanos.
Dessa forma, ao analisar a situação hipotética, seria possível afirmar que o sistema penal,
no modelo em que se apresenta, está preparado para solucionar os problemas sociais
enfrentados pelas comunidades mais pobres das sociedades?
Aplicar a lei penal pura e simplesmente resolveria os problemas de falta de educação,
oportunidade de trabalhos, dentre outros, enfrentados pelas comunidades
desfavorecidas?
Condenar Marcos, no contexto de sua história de vida, é a melhor solução para ele e para
outros adolescentes que estão na mesma situação?
Nesse contexto, seria importante, a partir de um modelo integrado entre o Direito Penal, a
criminologia e a sociologia, entender as reais funções da justiça criminal, de modo a
afastar as desigualdades nas relações sociais.
RESOLUÇÃO DO ESTUDO DE CASO
Dessa forma, Alessandro Baratta sustenta ainda que, para esses crimes dos poderosos,
as penas deveriam ser mais duras. Por outro lado, para a criminalidade de rua, o Direito
Penal deveria ser menos cruel.
Por fim, o conceito de direitos humanos assume uma dupla função: função negativa,
marcando os limites da intervenção penal, e função positiva, definindo quais são os
objetivos possíveis de serem tutelados pelo Direito Penal, aqui, devendo-se incluir os
interesses coletivos, como saúde pública, ecologia e melhores condições de trabalho.
Na situação concreta, Marcos não teve oportunidade de estudar, logo, não teria
oportunidade para trabalhar, e diante de seu contexto social, a aplicação pura da lei não
se mostra razoável, pois seria necessária a criação de políticas criminais alternativas,
primeiro, para tirar esses adolescentes das ruas, e segundo, para terem acesso à
educação.
Resumo Visual