Evasão - Não Colocação Da Tornozeleira Eletrônica

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ILMOS. SRS.

MEMBROS DA COMISSÃO TÉCNICA DE CLASSIFICAÇÃO DA PENITENCIÁRIA


JONAS LOPES DE CARVALHO.

CI SEAP/DIVTPDG SEI N. 16128 DE 17/12/2021


Apenado: SAMUEL DA SILVA RIBEIRO
RG: 0341900397 IFP/RJ

SAMUEL DA SILVA RIBEIRO, já qualificado nos autos do


processo disciplinar em epígrafe, por intermédio do Núcleo do Sistema Penitenciário da
Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, com fundamento no art. 59 da Lei de
Execuções Penais e nos artigos 28, I e 80, II do Decreto ERJ nº 8897/86, apresenta

DEFESA

de acordo com os fatos e fundamentos aduzidos a seguir.

Trata-se de procedimento disciplinar instaurado para apurar


suposta evasão que teria ocorrido na SEAP/EB em 23/07/2020.

O preso teria sido recapturado em 05/12/2020 na SEAPFM.

No depoimento prestado à CTC afirmou que não COLOCOU A


TORNOZELEIRA ELETRÔNICA porque quando foi assinar não estavam colocando o
equipamento, esclarecendo que não retornou outro dia para tentar ser atendido.

DANIELLA ANDRADE GIRARDI:8967143 Assinado em 31/01/2022 14:48:20


PRELIMINAR – DA APLICAÇÃO DA RESOLUÇÃO Nº 874 DE 04 DE MAIO DE 2021:

Enquanto a legalidade da Resolução 874/2021 da SEAP/RJ não for


judicialmente questionada, não pode haver dúvida que a mesma é aplicável, no que tange
aos procedimentos a serem adotados exclusivamente pela SEAP/RJ e seus servidores.

Entretanto, é igualmente claro que a Defensoria Pública, uma que


é, não pode arguir nulidades as quais tenha dado causa, sob pena não só de grave
incoerência, mas de conduta processualmente censurável.

Nesse contexto, considerando a situação descrita na parte e o


contato mantido com a UP em questão sobre o presente processo administrativo
disciplinar, o Defensor Público signatário não considerou necessário estar presente à
oitiva do interno e, portanto, anuiu com a colheita do Termo de Declaração do interno
pela CTC da Unidade Prisional, não havendo possibilidade de arguição de vício quanto ao
ato em questão.

Nesse contexto, necessário ressaltar que, nos termos previstos no


artigo 33 da citada Resolução, a ausência do Defensor Público na oitiva do interno, de
nenhuma forma, impede que o mesmo apresente a necessária defesa escrita, o que ora
se realiza.

DO MÉRITO

A atitude do interno de forma alguma pode ser aplaudida, no


entanto, não se pode igualmente anuir com a aplicação de uma falta disciplinar, senão
vejamos.

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Deve ser aplicada à presente hipótese o princípio da razoabilidade
que se traduz como um norte na solução de casos em que deve haver ponderação de
interesses. O interno não recebeu a informação necessária para o regular cumprimento
de sua pena.
Como sabemos, a maior parte dos internos do sistema prisional mal
sabe ler e escrever, sendo pessoas extremamente pobres.

Desta forma, como o Estado não provem educação, nem


possibilidade de qualificação e ingresso em mercado de trabalho para pessoas sem
estudo, sendo assim este preso, mais uma vítima do sistema capitalista inescrupuloso,
assim como sua família que sequer conseguem ter discernimento para se adequar às leis
vigentes no país por falta de conhecimento formal.

Não há como negar a prática da infração disciplinar por parte do


interno, eis que, o mesmo, admite que não retornou ao setor responsável pela colocação
das tornozeleiras, todavia, alguns fatores devem ser considerados no momento da
aplicação de eventual futura sanção administrativa.

Assim, deve haver uma interpretação restritiva em relação à


previsão da fuga como falta grave (art. 50, II da LEP), de modo que tão-somente aqueles
que fogem com intenção de não mais voltarem a cumprir a pena é que merecem sofrer
as sanções da lei e não aqueles, como no presente caso, que cientes das normas da
unidade, não retornam por outras razões.

Cabe informar que o interno não retornou após ou se entregou à


delegacia espontaneamente, por estar trabalhando como biscate e estra sem tempo.

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No mais, cabe fazer certos apontamentos: é que vale a regra,
inclusive nos processos administrativos, da presunção da inocência, encontrando
fundamento no Pacto de São José da Costa Rica, que integra o nosso ordenamento
jurídico através do Decreto Legislativo 678, de 06/11/1992, em seu artigo 8º; e no art. 5°,
LVII da Constituição Federal:

ARTIGO 8º. Garantias Judiciais. 2. Toda pessoa acusada de delito tem


direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove
legalmente sua culpa.

Art. 5°, LVII - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LVII -
ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória;

A natureza jurídica desse princípio é uma garantia individual,


repercutindo diretamente no processo em favor do acusado, seja em processo de
natureza cível, criminal ou administrativo, dentre outros, como já se expôs.

Inclusive, o festejado professor Paulo Rangel em sua obra afirma


que: “A visão correta que se deve dar à regra constitucional do art. 5º, LVII, refere-se ao
ônus da prova. Pensamos que, à luz do sistema acusatório, bem como do princípio da
ampla defesa, inseridos no texto constitucional, não é o réu que tem que provar sua
inocência, mas sim o Estado-administração que tem que provar a sua culpa.”

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Este é o programa constitucional, porém, a realidade de nosso
sistema penitenciário está muito longe de cumprir com o mesmo. Ao contrário, a
realidade mostra-nos que existe uma presunção de culpabilidade e que aqueles que são
submetidos a processo são tratados como culpados.

Assim, para que não haja subversão ao estabelecido pela nossa


Constituição e pelos diversos tratados de direitos humanos, cabe à CTC provar o dolo do
apenado, e caso não comprovando, deve absolvê-lo, em razão da aplicação do princípio
do in dubio pro reo.
Vale lembrar que a aplicação de uma penalidade disciplinar provoca
consequências nefastas para o interno, tais como o rebaixamento de seu
comportamento, o que prejudicaria de sobremaneira a postulação para a progressão de
regimes, livramento condicional e até mesmo indulto/comutação de penas, não podendo
de forma alguma ser aplicada indiscriminadamente.

Assim, é evidente que as consequências da aplicação da referida


pena não guardam qualquer proporcionalidade com a suposta infração ocorrida, o que
revela sobremaneira a impropriedade de sua aplicação.

DOS PEDIDOS

Por todo o exposto, requer:

a) caso se entenda pela prática de falta disciplinar, Requer, a


suspensão da sanção, na forma do art. 71 e seguintes do
Decreto ERJ nº 8897/86.
b) a intimação pessoal da Defensoria Pública acerca das
decisões proferidas neste processo disciplinar, a fim de

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viabilizar eventual recurso administrativo, na forma do art.
28, VI, do RPERJ, ou impugnação judicial.

Rio de Janeiro, 31 de janeiro de 2022.


Daniella Andrade
Defensora Pública

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