Kamasutra - Vatsyayana

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Kāmasūtra
Copyright © 2023 Tordesilhas é um selo da Alaúde Editora Ltda, empresa do Grupo
Editorial Alta Books (Starlin Alta Editora e Consultoria LTDA).
Copyright © 2006 Alfredo Benavídez Bedoya.
ISBN: 978-85-7881-762-6

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reproduzida – em qualquer meio ou forma, seja mecânico ou eletrônico –, nem
apropriada ou estocada em sistema de banco de dados, sem a expressa autorização da
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1a Edição, 2023 — Edição revisada conforme o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa


de 2009.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) de acordo com


ISBD

V352k Vātsyāyana
Kāmasūtra / Vātsyāyana ; traduzido por Daniel Moreira
Miranda, Juliana Di Fiori Pondian ; ilustrado por Alfredo
Benavídez Bedoya. - Rio de Janeiro : Tordesilhas, 2023.
ePub3
ISBN: 978-85-7881-762-6
1. Sexualidade. 2. Kāmasūtra. I. Miranda, Daniel
Moreira. II. Pondian, Juliana Di Fiori. III. Bedoya, Alfredo
Benavídez. IV. Título.

2023-2503 CDD 306.76


CDU 392.6

Elaborado por Vagner Rodolfo da Silva - CRB-8/9410


Índice para catálogo sistemático:
1. Sexualidade 306.76
2. Sexualidade 392.6

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Tradução: Daniel Moreira Miranda, Juliana Di Fiori Pondian
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TABELA DE CORRESPONDÊNCIAS PARA
LEITURA DOS TERMOS EM SÂNSCRITO

k: c em ca
c: tch em tchau
ṭ: t com a ponta da língua no palato
t: t em ta
p: p em pa
ṅ: n em canga

ñ: n em canja
ṇ: n com a ponta da língua no palato
n: n em canta
m: m em ma

y: i em pia
r: r em ara
l: l em la
v: v em va

h: h no inglês house

ā, ī, ū: são versões longas de a, i, u e têm função de sílabas tônicas


e: ê
o: ô
ṃ: torna nasal a vogal precedente g: g em ga
j: dj em Djalma
ḍ: d com a ponta da língua no palato
d: d em da
b: b em ba
ś: x em caixa
ṣ: s com a ponta da língua no palato
s: s em sa

kh, gh, ch, jh, th, dh, th, dh, ph e bh: são pronunciadas com uma leve
aspiração após a consoante

ṛ: aproxima-se do r do inglês “cur”


SUMÁRIO

UM
Os tipos de união sexual segundo o tamanho, a duração e a intensidade
do desejo

DOIS
Abraços

TRÊS
Beijos

Q U AT R O
Arranhões

CINCO
Mordidas

SEIS
Posições sexuais

SETE
Golpes e gemidos

OITO
A mulher agindo como homem e as estocadas do homem

NOVE
Sexo oral
DEZ
O começo e o fim da relação sexual, os vários tipos de união e as brigas
entre os amantes

Cidades e regiões do Kāmasūtra

Nota dos tradutores

Posfácio
“ Os homens, de acordo com o tamanho de
seu órgão sexual, do menor para o maior,
podem ser classificados em ‘coelho’, ‘touro’ e
‘cavalo’.
UM

Os tipos de união sexual segundo o


tamanho, a duração e a intensidade do
desejo

Os homens, de acordo com o tamanho de seu órgão sexual, do


menor para o maior, podem ser classificados em “coelho”, “touro” e
“cavalo”; e as mulheres, por sua vez, em “gazela”, “égua” e “elefanta”. A
combinação entre cada um deles resulta em nove tipos possíveis de união
sexual. Desse modo, nas relações entre homens e mulheres cujos órgãos
têm tamanhos semelhantes, há três pares de uniões iguais, e, entre os
dessemelhantes, seis pares desiguais.
Nas uniões desiguais, quando um homem tem relações com uma mulher
de tamanho imediatamente inferior ao dele, ou seja, o “cavalo” com a
“égua” e o “touro” com a “gazela”, formam-se dois tipos de uniões
chamadas “altas”. E quando o homem de tamanho maior tem relações com
a menor de todas, tem-se uma união chamada “superalta”. Inversamente,
quando o homem tem relações com as mulheres de tamanho imediatamente
maior ao dele, ou seja, o “coelho” com a “égua” e o “touro” com a
“elefanta”, formam-se duas uniões chamadas “baixas”, ou ainda, quando a
relação é entre o homem menor com aquela que está mais distante dele, a
maior de todas, ocorre uma união chamada “superbaixa”.
Dentre essas, consideram-se melhores as uniões entre parceiros de
tamanhos iguais, e piores as que são marcadas com o termo “super”,
enquanto as demais são relações consideradas medianas.
Nesse quadro, as uniões chamadas “altas” devem ser mais prazerosas do
que as uniões chamadas “baixas”.
As pessoas são classificadas, também, segundo sua energia. Assim, no
sexo, aqueles que são indiferentes, têm pouco vigor e não suportam golpes,
são considerados de baixa energia sexual. Contrariamente a eles, existem
aqueles de energia mediana e os de energia intensa. Combinando, entre
homens e mulheres, esses três níveis, somam-se outros nove tipos de uniões
sexuais diferentes conforme a intensidade do desejo sentido pelos amantes.
Em relação à duração do ato sexual, o homem pode se comportar de três
modos: o demorado, o mediano e o rápido, mas esse quesito suscita
algumas questões quanto às mulheres.
Auddālaki[1] é da opinião de que a mulher não sente prazer da mesma
maneira que o homem. De acordo com ele, ela sente uma coceira[2] que,
quando estimulada continuamente por seu parceiro, e combinada com a
imaginação erótica feminina, produz uma sensação diferente, e é isso o que
ela entende como prazer. No entanto, ele mesmo lembra que também se
desconhece o prazer do homem e é impossível perguntar o que ele sente ou
tentar descrever essas sensações. Sabe-se apenas que quando o homem
atinge o orgasmo, ele interrompe a relação sexual e não tem mais interesse
pela mulher, mas o mesmo não ocorre com ela.
Por isso, é comum se ouvir dizer que as mulheres preferem estar com
homens de energia sexual duradoura, e ficam ressentidas com os muito
rápidos porque, ao fim, não podem obter prazer. Poderíamos dizer então
que todos esses seriam sinais de elas terem ou não atingido o orgasmo. Mas
não é bem assim, pois se sabe também que é prazeroso coçar uma coceira
por bastante tempo, logo, esse fator não pode ser considerado um sinal do
prazer da mulher.

com a imaginação erótica


a mulher sente uma coceira
que o homem estimula:
eis o prazer.[3]

Já os seguidores de Bābhravya[4] acreditam ser bastante claro que,


enquanto a mulher tem prazer continuamente desde o início, o homem, por
outro lado, só o atinge ao final do ato sexual. Além disso, dizem eles que a
gravidez[5] acontece apenas quando a mulher chega ao orgasmo.
Nesse aspecto, há muitas objeções e dúvidas. Podemos dizer que, se a
mulher tivesse prazer continuamente desde o começo da relação, ela logo se
tornaria indiferente e não aguentaria muito tempo. Mas nota-se que seu
corpo passa a tolerar mais à medida que seu ardor aumenta, e, apenas no
fim, ocorre o desejo de parar. Isso é tão incontestável quanto o fato de que
tanto no trabalho com as rodas de olaria como com as rodas de fiar, a
energia utilizada no início é baixa, mas ela vai aumentando gradualmente
até atingir a sua plenitude, e o desejo de parar surge com a exaustão dos
fluidos.

o prazer dos homens é pontual,


o das mulheres é durativo.
e o desejo se esgota
quando se esgotam os fluidos.[6]

Segundo Vātsyāyana, a partir desse argumento é visível que a


manifestação da sensação erótica tanto nos homens quanto nas mulheres é a
mesma. E surge então a questão: Como seres da mesma espécie, com um
objetivo idêntico, poderiam obter orgasmos diferentes? À qual poderíamos
responder: Pelos diferentes modos de excitação erótica e pela diferença nos
modos de agir.
Mas de onde vem a diferença dos modos de agir? Da natureza física: O
homem, por sua natureza física, é o agente, o que faz, e a mulher é o
recipiente, onde se faz. Mas ambos cumprem as suas atividades, cada um a
seu modo. Então, nesse caso, pela natureza física e pela diferença dos
modos de agir de um e de outro, existe a diferença da excitação. O homem é
atraído pelo “eu vou me unir a esta mulher”, e a mulher por “eu estou unida
a este homem”.
Por causa desse argumento surge então outra questão: Se há diferença
nos modos de agir, por que não há diferença no orgasmo?
Mas não é bem assim, pois a diferença nos modos de agir tem uma razão de
ser, já que se dá a partir das características que diferenciam o agente do
recipiente. No entanto, a diferença do resultado seria inapropriada, uma vez
que ambos são da mesma espécie.
Pode-se dizer: um único objetivo é atingido por aqueles que o buscam,
quando estão unidos, mas cada um promove os próprios objetivos
separadamente. Pois é sabido que, em alguns casos, mesmo quando há
vários objetivos em jogo, eles só podem ser atingidos em parceria, como na
briga entre dois carneiros, ao cortar uma maçã em dois pedaços ou no
combate entre dois lutadores. Então, alguém objetaria: Nesses exemplos
não há distinção entre os agentes. Sim, aqui não há distinção na essência
deles, mas ocorre a diferença dos modos de agir de cada um dos envolvidos
por causa de sua natureza, como já foi dito anteriormente, e a obtenção do
prazer é semelhante nos dois por esse motivo.

sendo o casal da mesma espécie,


sentem um prazer similar
cuida-se para que a mulher
chegue ao orgasmo antes do homem.

Assim, admitindo-se que homem e mulher experimentam igual prazer,


há nove tipos de união sexual em relação à intensidade do desejo, outros
nove em relação à duração da energia sexual, assim como vimos que
também havia nove em relação ao tamanho.
São sinônimos de prazer sexual (rati): “sensação/gosto/sabor”
(rasa), “prazer sexual/orgasmo” (rati), “amor/êxtase” (prīti),
“desejo/orgasmo” (bhāva), “ardor da paixão/sentimento” (rāga),
“impetuosidade/energia sexual” (vega), “satisfação” (samāpti). E são
sinônimos de ato sexual (surata): “sexo/fazer amor” (saṃprayoga),
“cópula” (rata), “ato secreto/mistério” (rahas), “ir para a cama” (śayana) e
“tentação/sedução” (mohana).
Finalmente, dada a enorme quantidade de combinações, torna-se
impraticável a enumeração das variedades dos atos sexuais a partir da
mistura de cada um dos nove tipos (segundo o desejo, a duração e o
tamanho). Então, apenas a partir das especulações sobre cada um deles,
segundo Vātsyāyana, pode-se saber a melhor conduta a ser empregada.
No início da relação o homem possui uma intensa energia sexual e a
duração do ato é rápida. No fim, ocorre o inverso. Já com a mulher, por sua
vez, acontece o contrário. Sempre até que os fluidos se esgotem.
Diz o provérbio: “antes que se esgotem os fluidos da mulher, que se
esgotem os do homem”.

dizem os mestres que a mulher


por causa de sua suavidade,
natureza e voracidade
atinge o prazer rapidamente.

até aqui o sexo era explicado


aos eruditos. Mas passa agora
a ser explicado em detalhe
aos de pouco conhecimento.

peritos na doutrina dizem


haver quatro formas de amor:
da prática, da excitação,
da transferência e das sensações.

o amor que vem da prática é


marcado pela repetição,
expressado por palavras e ações.
É parecido com a caça.

o amor que vem da excitação


bem surge da imaginação
não pela ação habitual
nem como dado dos sentidos.

manifesta-se
no sexo oral com as mulheres
com os da terceira-natureza[7]
nos beijos, nos abraços etc.
os conhecedores da ciência

chamam o amor de transferido


quando, estando com uma,
pensam “esta aqui não é aquela”.[8]

o amor que emerge dos sentidos


é realizado no tangível,
tem os frutos mais importantes,
sendo o objetivo dos três outros.

refletindo sobre os sinais


que estão descritos neste texto
as pessoas usam as regras
conforme cada sentimento.
[1] N. dos T. Auddālaki Śvetaketu é o autor, possivelmente mítico, de uma versão longa do
Kāmasūtra em 500 capítulos, conforme afirma Vātsyāyana no Livro I (1.1.9) do
Kāmasūtra.
[2] Sobre isso há um verso: Pequenos vermes, nascidos do sangue menstrual,/ alguns com
poderes fracos, outros médios, outros terríveis,/ causam uma coceira nas zonas erógenas,/
de acordo com sua força.
[3] Canção de Auddālaki.
[4] N. dos T. Segundo Vātsyāyana no Livro I (1.1.10), Bābhravya é autor anterior do
Kāmasūtra e resumiu em 150 os 500 capítulos de Auddālaki.
[5] Os seguidores de Bābhravya acreditam que tanto o homem como a mulher ejaculam,
mas a dela acontece desde o momento em que é penetrada pelo pênis, e é contínua, sem
nenhuma interrupção, enquanto ele tem seu clímax apenas no final. E é a união do sêmen
de ambos a matéria da concepção.
[6] Canção de Bābhravya.
[7] N. dos T. “terceira-natureza” é normalmente traduzido por eunucos, no entanto, no
Capítulo 9, “Sexo oral”, eles são definidos como homossexuais que podem ter uma
natureza feminina (travestis) ou masculina.
[8] Quando alguém diz “Esta não é aquela”, referindo-se a outro homem ou mulher que
tiveram como objeto de desejo no passado, então, o amor do passado é transferido para
algum outro homem ou mulher. A ideia é que as qualidades e as causas do amor, que
existiam na pessoa amada no passado, estejam também na pessoa do presente.
DOIS

Abraços

Interlúdio
O “Livro do sexo” é também chamado por algumas pessoas de
“64”, porque ele possuiria 64 divisões, mas os sábios chamam a obra
completa do Kāmasūtra de “64”.[9] Um dos motivos seria o fato de “64” ser
uma referência às artes,[10] por existirem nessa quantidade e por serem parte
da arte do sexo. Além disso, o “Livro do sexo” é também conhecido como
“As 10 maṇḍalas do Ṛgveda”,[11] porque tem objetivos comuns aos do
Ṛgveda e por ambos terem sido compostos por autores da região de
Pañcāla.[12] Alguns usam o termo “64” para prestar homenagem ao
Kāmasūtra.
De acordo com os seguidores de Bābhravya, o livro é chamado de “64”
porque há oito variedades de ações para cada uma das oito atividades
eróticas: abraço, beijo, arranhão, mordida, posição sexual, gemido, a mulher
fazendo o papel do homem e sexo oral. A combinação de atividades e ações
gera o número “64”. Mas, segundo Vātsyāyana, embora a divisão de cada
atividade erótica em oito ações diferentes possa ser excessiva para algumas
categorias e ínfima para outras, o sexo também envolve ainda outras ações
tais como golpes, gritos, as investidas do homem e atos sexuais incomuns.
Por isso, considera esta nomenclatura apenas uma maneira de se falar, assim
como se fala da árvore do diabo de sete folhas, ou da oferenda do arroz de
cinco cores.
O abraço
Quando um homem e uma mulher ainda não tiveram um encontro
sexual, eles podem utilizar quatro tipos de abraços como sinais de atração
entre si: “toque”, “esbarrão”, “estímulo” e “pressão”. Em qualquer um dos
casos, a ação praticada deriva do seu nome.
Os dois primeiros tipos são recomendados para os casais que ainda não
tiveram oportunidade de conversar muito. No “toque”, os amantes ficam
cara a cara e, aproximando-se com um pretexto qualquer, um toca o seu
corpo no corpo do outro. Já o “esbarrão” ocorre em um lugar ermo. A
mulher, ao pegar alguma coisa, esbarra os seios em um homem que pode
estar sentado ou em pé, e então nesse momento ele a abraça.
Os outros dois tipos de abraços são para os casais que já entenderam os
sinais um do outro. O “estímulo” deve acontecer em um lugar escuro, cheio
de gente ou vazio. O homem e a mulher se aproximam suavemente e
estimulam o corpo um do outro por um bom tempo. E no abraço “pressão”
ocorre a mesma ação anterior, mas um deve abraçar o outro contra uma
parede ou um pilar.
Há também outros quatro tipos de abraços que são empregados durante
o sexo. Dois são praticados em pé: no “videira entrelaçada”, a mulher,
enroscada no homem assim como a videira se enrosca em uma árvore,
move a face dele para baixo para beijá-lo. Quando ele se levanta, ela ofega
suavemente e, apoiada nele, contempla-o com amor; no “subir na árvore”, a
mulher pisa com um pé no pé do homem e, com o outro, pisa ou se enrosca
na coxa dele; com um braço ela segura as costas dele, deixando o outro
braço cair de sobre o ombro de seu parceiro, então, murmurando e ofegando
suavemente, deseja elevar-se para beijá-lo.
E os outros dois tipos são usados em momentos de paixão: o “arroz com
gergelim”, quando os amantes estão deitados na cama, com braços e pernas
emaranhados, e se abraçam cerradamente como se estivessem brigando; e o
“leite com água”, no qual a mulher está sentada no colo do homem olhando
para ele, ou deitada, e eles se abraçam como se estivessem se diluindo um
no outro, cegos de paixão e ignorando qualquer dor.
Para os seguidores de Bābhravya, esses são os modos de abraçar
intimamente. Mas Suvarṇanābha descreve mais quatro abraços em relação a
uma única parte do corpo:

“abraço das coxas”: um utiliza suas coxas como uma pinça e aperta
com muita força uma ou as duas coxas do outro;
“abraço da pélvis”: a mulher, com as flores do cabelo desarrumadas,
salta por cima do homem, e, pressionando pélvis contra pélvis, eles se
beijam, se arranham, se mordem e se golpeiam;
“abraço dos peitos”: a mulher pressiona seus seios contra o peito do
homem e deixa cair seu peso;
“abraço das faces”: um se agarra ao outro, boca com boca, olho com
olho, fronte com fronte.

Algumas pessoas acreditam que a massagem também é um tipo de


abraço, pois exige contato mútuo. Mas Vātsyāyana diz que não, pois ela
tem outras características, outros propósitos e acontece em momentos
específicos.

o homem sempre se excita


ao perguntar sobre os abraços,
ouvir alguém falar
ou ele mesmo falando disso.

outros tipos de abraços,


não descritos no texto,
servem para incitar o desejo
mas com prudência.

o terreno dos manuais


serve enquanto o desejo é baixo,
mas, quando a roda da paixão
gira, não há regras, nem ordem.
[9] N. dos T. Afirma-se no Livro I (1.1.23) do Kāmasūtra: “Este texto tem 64 sessões, 36
capítulos e 7 livros e consiste em 1250 passagens”. Toda a obra Kāmasūtra é dividida em
sete livros e o segundo, apresentado aqui, é chamado “Livro do sexo”.
[10] N. dos T. Nessa passagem, o autor faz referência às 64 Artes citadas no livro I, mas
também, às 64 artes do sexo citadas por Bābhravya em 1.3.16: “As 64 artes do amor
citadas por
Bābhravya de Pañcāla são diferentes. Voltaremos a elas e falaremos sobre suas técnicas
quando discutirmos sobre o sexo, pois elas são uma parte essencial do prazer”.
[11] N. dos T. O Ṛgveda é também chamado de 64. Segundo o Dicionário Monier-
Williams: “O Ṛgveda, ou mais antigo livro sagrado dos Hindus – isto é, o corpo coletivo de
versos sagrados chamados “ṛcas” –, consiste em 1017 hinos organizados em oito aṣṭakas ou
dez maṇḍalas”. Kāmasūtra 1.1.17: “O Livro 2, sobre o sexo, contém 17 seções em 10
capítulos”, Comparação das 10 maṇḍalas do Ṛgveda com os 10 capítulos do Livro 2, que é
a presente obra.
[12] N. dos T. O Ṛgveda foi composto por um sábio de Pañcāla e Bābhravya também é de
Pañcāla. Assim o que ocorre aqui é uma referência à conexão com o local. O Kāmasūtra
em
1.1.10 diz que Bābhravya de Pañcāla foi o autor que dividiu o Kāmasūtra em sete livros.
TRÊS

Beijos

Segundo Vātsyāyana, no momento da união sexual vale tudo,


não há regras, pois o que é inesperado é próprio do ardor da paixão. Por
isso, não há um momento ideal para beijar, arranhar e morder, porque estas
são ações inerentes ao desejo, praticadas principalmente nas preliminares,
enquanto os golpes e gemidos são praticados durante o sexo.
No entanto, recomenda-se que essas atividades eróticas sejam realizadas
alternadamente e com moderação no primeiro encontro sexual, e com uma
mulher de confiança, levando em conta a intensidade do desejo dela. Depois
do primeiro encontro, aquilo que é diferente deve ser praticado com mais
variedade e quantidade para aguçar a paixão.
Pode-se beijar a testa, os cabelos, as bochechas, os olhos, o tórax, os
seios, os lábios e a boca. O povo de Laṭa costuma beijar também o ventre,
as axilas e a virilha. Vātsyāyana afirma que há vários locais que podem ser
beijados, conforme a força da paixão e os costumes locais de cada povo,
mas nem todos são praticados por todas as pessoas. Quando se trata da
relação de um homem com uma moça virgem, há três tipos de beijos: o
“imóvel”, o “palpitante” e o “pincelado”.
No primeiro, “imóvel”, o homem toma a mulher com força pelas mãos,
e ela recebe a boca dele em sua boca, mas os lábios não se movem. No
“palpitante”, ela, desejando deixar um pouco a timidez de lado, e com o
lábio dele colado em sua boca, treme o lábio inferior, mas não consegue
movimentar o superior. Em seguida, no “pincelado”, a mulher abraça o
homem de olhos fechados e cobre os olhos dele com as mãos para, então,
tocá-lo nos com a ponta da língua.[13]
Há também outros quatro tipos de beijo: “igual”, “oblíquo”, “invertido”
e “apertado”.[14] E há ainda um quinto tipo de beijo “apertado”, quando,
com a ponta dedos, um pressiona os lábios do outro para fazer um bico, e
beija sem tocar os dentes.
Os amantes também podem brincar de alguns jogos. Num tipo de jogo,
aquele que primeiro pegar o lábio do outro será o vencedor. Quando a
mulher é derrotada, finge chorar, agita as mãos, empurra o homem para
longe, morde, dá as costas para ele, discute, e, aproximando-se
impetuosamente, diz: “Vamos jogar de novo!”. Se ela perde uma segunda
vez, finge que está cansada e, quando ele já está confiante ou indiferente,
prende o lábio dele com os dentes de modo que ele não consiga se soltar.
Então ela ri, grita, ridiculariza-o, pula, chama-o para perto, dança e,
levantando a sobrancelha, revirando os olhos, sorri fazendo graça e diz
coisas sem importância. Essa é a briga do jogo do beijo.
Do mesmo modo, há relatos sobre brigas nos jogos de arranhar, morder
e golpear. Esses jogos são utilizados quando os dois têm intensa energia
sexual, pois são adequados à natureza deles.

Há ainda alguns outros beijos. Quando um homem beija uma mulher,


prendendo o lábio superior dela, esse é o “beijo do lábio superior”. Também
podem ser beijados os dois lábios do outro, prendendo-os com força, como
uma pinça. Esse beijo, chamado “encaixado”, pode ser praticado por
meninos e meninas que ainda não atingiram a puberdade. Na “guerra das
línguas”, um dos parceiros utiliza a língua e toca os dentes, o palato ou a
língua do outro. E nesse tipo de beijo também se diz que um pode
pressionar os dentes contra a boca do outro com força.
Assim, pode-se beijar suavemente, fazendo pressão, com os lábios
curvados ou docemente, em qualquer parte do corpo e segundo as diferentes
práticas de cada região. Estas são as principais características de cada beijo.
E, além desses, existem beijos para provocar situações amorosas
específicas. O “beijo para atiçar”, por exemplo, é aquele dado pela mulher
que contempla a boca do homem enquanto ele dorme, com a intenção de
despertar-lhe o desejo. O “beijo que excita” serve como um chacoalho para
as emoções: quando um está calado, indiferente, sonolento ou olhando para
o nada, e o outro quer tirá-lo da letargia. O “beijo para acordar” ocorre
quando o homem chega tarde da noite em casa e beija a mulher, que já está
dormindo, para acordá-la. Nesse caso, às vezes a mulher, percebendo que
seu parceiro está chegando, finge estar dormindo para testá-lo e saber o que
ele sente por ela.
Assim, para essa mesma finalidade, o homem pode beijar o reflexo ou a
sombra feitos pela mulher em um espelho, em uma parede, ou na água. Este
se chama o “beijo do reflexo”. Já um beijo ou abraço que marcam o amor
“transferido” pode ser dado em uma criança, um retrato ou uma estátua. E,
por fim, há o “beijo dos dedos”, que acontece à noite, num espetáculo ou
numa reunião, quando o homem se aproxima da mulher e beija os dedos de
sua mão; ou, sentado ao lado dela, inclina-se e beija os dedos do pé de sua
amada.
Da parte da mulher, existe o “beijo do ataque”, quando, fingindo estar
sem desejo e sonolenta enquanto massageia o homem, deita a cabeça nas
coxas dele, beijando-o das coxas até os dedos do pé.

para todo movimento, um contramovimento;


para todo golpe, um contragolpe;
e como consequência disso,
para todo beijo, um contrabeijo.
[13] Ela o pincela com a boca, tocando-o em todos os lugares.
[14] O “igual” ocorre quando os parceiros estão frente a frente e fazem contato labial; o
“oblíquo” quando um deles dá um beijo de lado; o “ao contrário”, um dos parceiros
estando atrás do outro, toma-o com as mãos pelo queixo e traz os lábios para os seus. No
beijo “apertado”, diferentemente dos anteriores, os parceiros têm os lábios pressionados
fortemente.
QUATRO

Arranhões

Quando o desejo aumenta, homem e mulher se arranham um ao


outro. É comum os amantes trocarem arranhões ao estarem juntos pela
primeira vez, ao saírem de casa, ou no reencontro da volta, e, ainda, quando
a mulher se acalma depois de ter ficado brava ou quando ela está
embriagada. No entanto, ele nunca é praticado por aqueles que têm baixa
energia sexual, e o mesmo é válido para as mordidas, pois ambas as ações
têm a mesma natureza.
Aqueles que têm energia sexual intensa devem ter as unhas da mão
esquerda cortadas em dois ou três pontos, e se considera de boa qualidade
as unhas que são alinhadas, iguais, brilhantes, limpas, bem cortadas lisas,
com aspecto delicado e que não estejam quebradas. O povo de Gauḍa usa
unhas compridas que ressaltam as mãos e conquistam o coração das
meninas. O povo do sul tem unhas curtas aptas a realizar trabalhos e que
podem produzir qualquer tipo de figura desejada. O povo de Marāṣṭra tem
unhas de tamanho médio, e que possuem as mesmas qualidades das duas
anteriores.

Os arranhões podem adquirir oito formas distintas: “arrepio”, “meia-


lua”, “círculo”, “linha”, “garra de tigre”, “pata do pavão”, “pulo do coelho”
e “a pétala do lótus”. As partes do corpo para serem arranhadas são as
axilas, os seios, o pescoço, as costas, as nádegas e as coxas. Porém, segundo
Suvarṇanābha, quando a roda do desejo já está em movimento, não há lugar
certo para arranhar e ser arranhado.

O “arrepio” é feito no queixo, nos seios ou no lábio inferior com as


unhas próximas umas das outras, a partir de um leve toque, sem deixar
marcas. Ao final, quando as unhas se encontram, ouve-se um estalo que
produz um arrepio. É usado pelo homem enquanto ele massageia o corpo da
mulher, faz cafuné, espreme espinhas ou quer desnorteá-la com algo
impactante.

“Meia-lua” é a marca que tem esta forma. Pode ser gravada no pescoço
ou na parte superior dos seios, e, quando são feitas duas, uma frente à outra,
torna-se o arranhão chamado “círculo”, que é aplicado no ventre, na virilha
ou nos quadris.

A “linha”, não sendo muito longa, pode ser feita em todos os lugares. Se
for curvada e carinhosamente aplicada aos mamilos, ela se torna a “unha do
tigre”. O “pé do pavão” é a linha vai em direção ao mamilo, e é feita com as
pontas dos cinco dedos unidas. E, quando são feitas cinco marcas desse tipo
próximas ao mamilo de uma mulher elogiada por seu desempenho sexual,
será o “pulo do coelho”. Finalmente, uma marca deixada na parte superior
dos seios ou em volta dos quadris de uma mulher chama-se “pétala do
lótus”, pois se apresenta nesta forma.

Ao sair de casa, o homem sempre faz três ou quatro riscos nas coxas e
na parte superior dos seios da mulher, para que ela se lembre dele. Todos
esses são os modos mais comuns de usar as unhas, mas existem também
outros tipos de arranhões, que resultam em diferentes figuras.

Os sábios se perguntam se alguém seria capaz de aprender todos os


tipos de arranhões, uma vez que eles estão diretamente relacionados ao
ardor da paixão, e, além disso, podem ser aplicados em todas as partes do
corpo, existem em formas inumeráveis, e são aprendidos pela experiência e
pela prática constante.
Segundo Vātsyāyana, mesmo na paixão existe a busca pelo diferente e
inusitado, e, por meio disso, os amantes despertam o desejo um no outro. É
o uso de todas essas variedades, por exemplo, que faz com que as cortesãs
de luxo e seus amantes permaneçam desejáveis uns aos outros. E, além
disso, se até mesmo na arqueria e nas outras artes as regras dos manuais
almejam variedade, o que dizer sobre os domínios da paixão?

Mas fica aqui um aviso: um homem não deve deixar tais marcas nas
esposas dos outros. Ele faz marcas especiais em lugares escondidos para
aumentar o desejo e manter-se na lembrança dela.

quando a mulher encontra marcas


de arranhões em lugares escondidos,
mesmo tendo sido deixadas há tempos,
o amor é doce como se fosse novo.

quando o ardor da paixão se apaga


o amor pode chegar ao fim
se não existem marcas de arranhões
para despertar as memórias do desejo.

a paixão e o respeito surgem


até mesmo em um estranho
quando ele vê uma mulher ao longe
com marcas de unhas nos seios.

o homem que tem todo o corpo


estampado com marcas de unha
agita os pensamentos de uma mulher,
por mais que ela se mantenha firme.

não existe nada mais afiado


para aumentar a paixão
que as investidas
feitas com unhas e dentes.
CINCO

Mordidas

Os lugares para morder são os mesmos para beijar, exceto no


lábio superior, dentro da boca e nos olhos. Os dentes de boa qualidade são
iguais, brilhantes, afiados, sem lascas, de proporções corretas e podem ser
pintados.[15] E os dentes de má qualidade são desalinhados, sujos,
irregulares, pequenos ou muito grandes, separados e não possuem corte.
E existem as seguintes variedades de mordidas: “escondida”, “inchada”,
“ponto”, “guirlanda de pontos”, “joia e coral”, “guirlanda de joias”, “nuvem
desfeita” e “mordida do javali”. Outras ações servem como adornos para a
bochecha esquerda,[16] como o “beijo do brinco”, algumas mordidas e os
arranhões.
A mordida “escondida” deixa uma marca pequena, sem muita
vermelhidão.[17] Semelhante a essa, mas dada com pressão, é a “inchada”.
Uma ou outra, quando feita no meio do lábio inferior, equivale ao “ponto”,
e a “inchada” e a “joia e coral” são dadas na bochecha. A “joia e coral” é
assim chamada porque é feita com os dentes superiores e com o lábio
inferior;[18] e quando se morde o mesmo local muitas vezes, deixando
marcas próximas umas das outras, chama-se “guirlanda de joias”. O
“ponto” é um beliscão dado com dois dentes em uma pequena parte da pele,
e, quando feito muitas vezes um ao lado da outro, passa a ser “guirlanda de
pontos”. Essas duas guirlandas são feitas em lugares como a virilha, a axila
e o pescoço; e a “guirlanda de pontos” pode ser feita também nas coxas ou
na fronte.
A “nuvem desfeita” é a mordida aplicada na parte superior do peito, em
forma de círculo, do qual emergem pontas desiguais. A “mordida do javali”
também é feita na parte superior do peito e consiste em uma série de marcas
de linhas contíguas deixada pelos dentes, com um tom avermelhado. Esses
dois tipos de mordida são para pessoas com energia sexual intensa.
Quando um homem morde, arranha ou beija os adornos da fronte, a
folhagem do betel, o buquê de flores, ou os brincos utilizados por uma
mulher, ele está fazendo investidas sexuais.

Os costumes nas diferentes regiões da Índia


O homem deve tratar a mulher de acordo com os hábitos locais. Na
parte central do norte da Índia,[19] as mulheres de origem nobre e que têm
hábitos puros não gostam de marcas de dentes ou unhas, nem de beijos. As
mulheres de Bāhli e Avanti também não, mas elas se interessam pelas
práticas sexuais incomuns. Agora, as de Mālava e Ābhīra são conquistadas
com golpes, desde que não as machuquem, e gostam principalmente de
abraços, beijos, arranhões, mordidas e chupões. As mulheres que habitam
entre os seis rios do Vale do Indo gostam de sexo oral. E as mulheres do
oeste de Laṭa têm energia sexual intensa e gemem docemente. As que
vivem em
Kosala e as do “Reino das Mulheres” fazem uso principalmente de
instrumentos artificiais para obter prazer, pois têm uma energia sexual
muito intensa e usam golpes violentos. Em Andhra, elas têm hábitos
bárbaros, têm gosto pelo impuro, gostam de sexo e são delicadas por
natureza. As mulheres de Māhārāṣṭra, são aficionadas pela prática de todas
as 64 artes, gostam de um linguajar baixo e vulgar, e agem impetuosamente
na cama. Iguais a essas são as mulheres da cidade,[20] mas só se mostram
em segredo. As mulheres dravidianas que são tocadas desde as preliminares
bem devagar ficam molhadas. As mulheres de Vānavāsī têm energia sexual
média, aguentam tudo, riem do corpo dos outros e escondem o próprio, e
desprezam a rudeza e a vulgaridade. Em Gauḍa elas falam delicadamente,
se apaixonam e têm o corpo macio.
Apesar dessa classificação, Suvarṇanābha diz que a natureza do
indivíduo é mais forte do que a natureza do local, então a abordagem aqui
não deve ser regional. Além disso, é preciso saber que, com o tempo, o
comportamento, a moda e os jogos migram de uma região para outra. Em
relação aos abraços e a todos os outros atos que foram enumerados até aqui,
[21]
deve-se primeiramente utilizá-los para aumentar a paixão e,
posteriormente, para surpreender.

se um homem machuca a mulher


mesmo ela tentando impedi-lo,
ela não aceita
e devolve em dobro.

“guirlanda” é o troco do “ponto”;


“nuvem desfeita”, da “guirlanda”.
e fingindo estar cheia de raiva
a mulher responde com brigas.

encostada no peito do amado,


a mulher, ao se levantar,
faz nele uma guirlanda de joias
e outras mordidas conhecidas.

na multidão, mesmo de dia,


sempre que vê no homem
as marcas que ninguém vê,
ri sozinha dos outros.

exibe, fingindo ciúmes,


as marcas feitas em seu corpo,
como se ela franzisse o rosto,
como se ela desprezasse o homem.

se o casal se envergonha
pela cumplicidade que há entre os dois,
o amor nunca deixa de existir
por nada, nem mesmo em uma centena de anos.
[15] Os dentes podem ser pintados ao se mascar folha de betel etc.
[16] Estas marcas embelezam a bochecha assim como um brinco adorna a orelha.
[17] Não há muita vermelhidão, pois não é feito um machucado. É feito com a ponta de
apenas um dente da frente.
[18] Os dentes superiores são como uma joia branca, o lábio inferior, como um coral
vermelho. Ambos são pressionados num local repetidamente até deixarem uma marca.
[19] N. dos T: na região das cidades atuais de Allahabad, Ágra, Délhi etc, segundo o
dicionário
Monnier-Williams.
[20] Da cidade de Pāṭalīputra.
[21] A lista dos seis atos externos: abraço, beijo, arranhão, mordida, golpe e gemido.
SEIS

Posições sexuais

As posições sexuais

Nas chamadas uniões “altas”,[22] a gazela deve se posicionar de


tal modo que alargue o seu órgão sexual no momento da união. Já nas
uniões “baixas”, a elefanta, por sua vez, posiciona-se como se diminuísse o
seu órgão sexual. A união “justa”, quando os
órgãos têm tamanhos idênticos, é realizada de qualquer maneira. E,
finalmente, a égua posiciona-se de acordo com as explicações dadas para
qualquer um dos dois outros tipos de mulheres, ou seja, por ser a de
tamanho intermediário, alarga-se com o homem de tamanho maior, e
contrai com o menor.
A partir dessas ações, a mulher recebe o homem dentro de si, e nas
uniões “baixas”, em particular, ela pode utilizar também instrumentos
artificiais para obter mais prazer.
Os seguidores de Bābhravya definem as seguintes posições sexuais. As
três principais posições da gazela são a “arreganhada”, o “grande bocejo” e
a “esposa de Indra”. Na primeira, a pélvis da mulher deve ficar numa
posição superior à da sua cabeça, ou, em outras palavras, quando deitada de
costas, ela eleva o quadril e fica levemente inclinada. Essa posição deve
facilitar os movimentos do homem. No “grande bocejo”, a mulher eleva as
pernas, mantendo-as suspensas e abertas para receber o homem. E, na
“esposa de Indra”, ela dobra as pernas trazendo as coxas paralelas e abertas
para juntá-las às laterais de seu tronco. Essa posição requer prática
frequente e serve também para o enlace na união “superalta”.
Nas uniões “baixas”, a mulher recebe o homem em “caixa”,[23] e o
mesmo se aplica também à união “superbaixa”. Desse modo, existem
quatro principais posições para a elefanta: a “encaixada”, a “apertada”, a
“envelopada” e a “posição da jumenta”.

Na “encaixada”, o homem e a mulher estendem as duas pernas e a


penetração pode ser realizada de dois modos distintos: “de lado” ou com
um deles “deitado de costas”, e estes nomes indicam a forma como essas
duas variantes são realizadas. Apenas quando o homem se deita de lado, a
mulher deve deitar-se sobre o seu lado direito,[24] e isso se aplica à elefanta,
à égua e à gazela. Agora, tendo penetrado-a a partir da posição da “caixa”,
se o homem pressiona fortemente as coxas da mulher, tem-se a posição
“apertada”. E quando um cruza a perna sobre a perna do outro, torna-se a
“envelopada”. Já na “posição da jumenta”, a mulher prende fortemente o
pênis do homem com a vagina, como uma jumenta. Essa posição também
exige prática e é normalmente utilizada pelas mulheres de Andhra.
[22] N. dos T.: nas uniões “altas”, o homem possui um pênis maior que a profundidade da
vagina, nas “baixas” o pênis é menor (cf. Capítulo 1).
[23] N. dos T.: “caixa” é o termo utilizado por Vātsyāyana para se referir à vagina da
mulher quando contraída. O uso do termo é interessante se pensarmos também na
correlação do termo em português “boceta” (segundo o dicionário Houaiss, verbete
[boceta]: “caixinha redonda, oval ou oblonga, feita de materiais diversos e us. para guardar
pequenos objetos”) com o significado que ele adquiriu no português contemporâneo.
[24] Para dormir, todas as mulheres (gazela, égua e elefanta) deitam sobre o seu lado
direito, e os homens, sobre o seu lado esquerdo. Mas, no momento do sexo, ocorre o
oposto: ele deita sobre o seu lado direito para que possa usar a mão esquerda para tocar a
mulher.
*

Entretanto, os seguidores de Suvarṇanābha classificam ainda


outros tipos de posições. A primeira, chamada “curva”, é quando a mulher
eleva as pernas. Em seguida, a partir dessa posição, tem-se o “bocejo”,
quando o homem segura firmemente as pernas levantadas da mulher; a
“superapertada”, se ela está com as pernas dobradas; ou a “semiapertada”,
se ela está com apenas uma das pernas esticada.
Existem, ainda, a “divisão do bambu”, na qual a mulher deitada coloca
uma perna sobre o ombro do homem e deixa a outra esticada, alternando as
pernas repetidamente; e a “pilha de lanças”, quando, nessa mesma posição,
ela coloca a perna em cima da cabeça dele. Essa última exige prática.
Finalmente, na posição “apertada” de Suvarṇanābha, a mulher levanta
as pernas e cruza uma sobre a outra; na “flor de lótus”, as pernas cruzadas
ficam na posição do lótus; e na “invertida”, o homem está em cima da
mulher e gira seu corpo ficando com o rosto voltado para os pés dela,
abraçando-a.
Segundo Suvarṇanābha, as diferentes posições sexuais que são
praticadas pelo casal sentado, deitado ou em pé poderiam ser feitas com
mais facilidade na água. Mas Vātsyāyana considera isso irrelevante, uma
vez que as práticas na água nunca foram incluídas pelos estudiosos em seus
textos.[25]
“ O conhecimento adquirido por meio dos
jogos eróticos e por meio dos animais
aumenta o repertório de práticas sexuais.

[25] N. dos T.: Segundo Manu (Cap. 5, v. 135 das Leis de Manu), é proibido expelir sêmen
na água, pois ele faz parte das substâncias impuras, e o autor chega até mesmo a indicar
uma penitência para quem o pratica (id. Cap. 11, v. 174).
*

As práticas sexuais incomuns

A primeira prática inusual é a do “sexo em pé”, na qual dois


jovens têm relações em pé, recostados um no outro, ou em um pilar ou em
uma parede. A seguinte, chamada “sexo suspenso”, é quando o homem está
encostado na parede e a mulher abraça o pescoço dele com seus braços, e a
pélvis dele com suas coxas. Desse modo, o corpo dela é sustentado pelas
mãos dele e movimenta-se como se caminhasse com os pés na parede. Logo
após, tem-se a “vaca leiteira”, em que a mulher fica de quatro no chão como
se fosse uma vaca, e o homem a monta como um touro. Nessa posição, ele a
toma pelas costas e faz o mesmo que faria de frente.
Há ainda outros tipos diferentes de práticas sexuais não mencionadas,
considerando o comportamento do cachorro, do antílope, do bode, a
investida do burro, a languidez do gato, o ataque do tigre, a pisada do
elefante, o esfregão do javali ou a montada do cavalo. E se pode lembrar
também o “sexo em conjunto”, quando um homem faz sexo com duas
mulheres que gostam uma da outra; ou o “rebanho de vacas”, se for
praticado com muitas mulheres. Além dessas, existem ainda as brincadeiras
aquáticas, que têm origem na imitação do antílope e do bode.
Finalmente, nas regiões onde existem vilas de mulheres, no “Reino das
Mulheres” e entre o povo de Bāhli, os jovens servem às mulheres como se
estivessem em um harém. Um por um ou todos juntos, amam-nas de acordo
com os desejos de cada uma delas e de acordo com as circunstâncias. Há
casos em que, enquanto um homem segura uma mulher, outro faz sexo com
ela e lhe dá prazer; ou, enquanto um está em sua vagina, outro está na boca,
e outro no meio de seu corpo. Assim, eles a tomam alternadamente, um
após o outro. Diz-se que esse tipo de sexo em grupo, tal como praticado por
essas mulheres, é realizado tanto por prostitutas que o fazem com toda uma
assembleia de homens, quanto por homens que foram aliciados pelas
mulheres dos reis. E, na região sul, sabe-se que também se pratica o “sexo
anal”.
“Como o cavalo em disparada que atinge o
quinto grau de movimento e cego pela sua
velocidade não vê os postes nem as
trincheiras nem os buracos
Esses foram os tipos de práticas sexuais incomuns. Outras aparecerão
ainda no Capítulo 8, quando falarmos sobre as investidas do homem.

o conhecimento adquirido
por meio dos jogos eróticos,
por meio dos animais selvagens,
domesticados e dos pássaros,
e por meio das técnicas utilizadas
por uns e outros,
aumenta o repertório de práticas sexuais.

da utilização dessas técnicas


e dos sentimentos ditados
tanto por hábitos locais
quanto pela natureza da mulher,
surge o amor, a paixão
e a admiração das mulheres.
SETE

Golpes e gemidos

Dizem que o sexo é uma forma de briga, por sua natureza


agressiva e pelo caráter ávido do amor. Por esse motivo, os golpes fazem
parte do sexo e são aplicados nos ombros, na cabeça, entre os seios, nas
costas, na pélvis e nos flancos, de quatro modos distintos: com “as costas da
mão”, com “a mão em concha”, com “a mão em punho” e com “a palma da
mão aberta”.

E ainda, quando uma pessoa é golpeada ela produz sons, pois eles
traduzem a dor e podem se manifestar de várias formas: “choramingo”,
“urro”, “arrulho”, “lamúria”, “ofego”, “chiado” e “choro aos soluços”.[26],
[27]
Também são utilizadas palavras que possuem significados, como as que
servem para chamar a mãe, para resistir, para liberar-se e para mover-se. E
ainda poderia ser utilizado, alternativamente, um grande número de sons
que imitam animais, por exemplo, a pomba, o cuco indiano, o pombo da asa
verde, o papagaio, a abelha, o cuco jacobino, o ganso, o pato ou a perdiz.

No golpe com “a mão em punho”, o homem bate com a mão fechada


nas costas da mulher quando ela está sentada no colo dele. Nesse golpe,
como se estivesse com raiva do homem, ela irá reprimi-lo com “urros”,
“lamúrias” e “arrulhos”.

O homem golpeia com “as costas da mão” entre os seios da mulher


enquanto a penetra. Ele começa devagar e não para, fazendo com que ela
fique cada vez mais excitada. Nesse momento, ela pode “choramingar” e
fazer todos os outros sons ao mesmo tempo, sem se preocupar com regras,
hábitos ou alternâncias.
Se a mulher está brigando com o homem durante o sexo, ele curva os
dedos e bate com a “mão em concha” na cabeça dela. Nesse momento, a
mulher faz dentro da boca o som de “arrulho” e “chora aos soluços”. No
fim do sexo, faz “lamúrias” e suspira.

O “chiado” é a imitação do som de um bambu sendo partido ao meio e o


“choro com soluços” é um som semelhante à queda de uma pequena fruta
na água.

Sempre, no momento dos beijos e de todos os outros artifícios,


esquivando-se, a mulher geme e dá uma resposta ao homem do mesmo
modo.

Quando o homem utiliza repetidos golpes movidos por um desejo


intenso, a mulher, para se libertar do domínio dele, grita e diz coisas como
“Mãe do Céu!”, desfaz-se em “lamúrias”, “urra”, ao mesmo tempo que
respira com dificuldade e suspira.[28] À medida que o desejo se esgota,[29] o
homem golpeia os flancos e a pélvis da mulher com mais rapidez, até o
clímax. Nesse instante, ela “arrulha” em ritmo acelerado, como um ganso
ou uma perdiz.

diz-se que a rudeza e a força


são a essência do homem.
e a falta de energia, a fuga da dor
e a fraqueza são a essência da mulher.

pela natureza da prática sexual


pela intensidade do desejo,
às vezes a mulher faz o papel do homem
às vezes o homem faz o papel da mulher,
mas não por um muito tempo
pois, no fim,
a união sexual
retoma suas características.

Segundo o povo do sul, a “cunha no tórax”, a “tesoura na cabeça”, o


“furo na bochecha” e a “pinça nos seios e nos flancos”, com os anteriores já
mencionados, formam oito tipos de golpes. Nessa região, podem-se ver
marcas feitas em cunha nos seios das mulheres, pois este é um hábito local.
Mas, segundo Vātsyāyana, isso é desrespeitoso, vulgar e maldoso.
Alguns hábitos que são próprios de um lugar não devem ser
necessariamente praticados em outros lugares. Mas, onde quer que seja,
deve-se evitar aquilo que pode ser maléfico. O rei dos Colas, por exemplo,
matou Citraseṇā, uma cortesã de luxo, com a “cunha no tórax” durante o
sexo.[30] E o rei dos Kuntala, Śātakarṇi Śātavāhana, matou sua esposa,
Malayavatī, utilizando a “tesoura na cabeça”.[31] Naradeva, que tem uma
mão deformada, fez um furo em uma dançarina por praticar o “furo na
bochecha” erroneamente.[32]

neste domínio, não existem catálogos


nem os ensinamentos dos manuais,
pois, no momento da união sexual,
apenas a paixão é quem conduz.

mesmo nos sonhos não se pode


ver as emoções e as perturbações
que são fabricadas num átimo
durante a união sexual.

como o cavalo em disparada


que atinge o quinto grau de movimento
e cego pela sua velocidade não vê
os postes nem as trincheiras nem os buracos,

dois amantes, cegos pela paixão,


na fricção do sexo
vão em frente com intensa energia
e não percebem o perigo.

então, o homem que conhece a delicadeza,


a ferocidade e a força da mulher,
e também a sua própria força,
deve utilizar o manual a partir disso.

as técnicas sexuais não devem ser empregadas


com todas as mulheres, nem a qualquer hora.
a prática é determinada por cada região,
por cada lugar do corpo e pelo tempo.
[26] O “choramingo”, hiṃkāra, é um som nasal que vem da garganta e do nariz e ecoa
suavemente; o stanita é como o retumbar profundo das nuvens e vem da garganta; o
lamurio, rudita, é bem conhecido e deve ser feito de forma a despedaçar corações; sūtkṛta
(“ofego”) é outro nome dado ao suspiro. Vātsyāyana explicará os outros três (arrulho,
chiado e choro aos soluços) da lista.
[27] N. dos T. Quatro desses gemidos são de difícil tradução, pois são onomatopeias
culturais, isto é, o nome é uma tentativa de imitação do som que se faz nos momentos
descritos. Em sânscrito, literalmente, significam: “fazer o som ‘him’ (choramingar) ou
‘phut’ (chorar aos soluços) ou ‘sut’ (ofegar) ou ‘dut’ (chiar)”.
[28] “Para todo movimento, há um contramovimento” (Capítulo 3).
[29] O desejo se aproxima do fim quando o homem percebe que está próximo do orgasmo.
[30] Ele a abraçou com tanta força no início do sexo que ela sofreu demasiadamente, já que
ela era muito delicada. E, mesmo tendo percebido que ele deveria tratá-la delicadamente,
ele estava tão cego de desejo que não percebeu sua própria força e a destruiu utilizando a
“cunha no tórax”.
[31] Śātakarṇi Śātavāhana, nascido em Kuntala, encontrou sua rainha Malayavatī
recuperando-se de uma doença e ainda um pouco fraca. Ela estava vestida para o festival
do Kāma e isto despertou o desejo dele e ele fez amor com ela. Mas, carregado pelo ardor
da paixão, ele utilizou uma “tesoura” com muita força e a matou.
[32] Naradeva foi general do rei dos Pāṇḍya e possuía uma mão deformada pelo golpe de
uma espada. Sua paixão cresceu ao ver Citralekhā, uma dançarina que estava na casa do
rei. Ao fazer amor, ele utilizou o “furo” de modo desajeitado por causa de sua mão. Ele
errou a bochecha e acertou o olho, cegando-a imediatamente.
OITO

A mulher agindo como homem e as


estocadas do homem

Quando o homem está cansado por causa da prática sexual


contínua, mas ainda sente desejo, a mulher pode ajudá-lo assumindo o papel
dele, rolando-o para baixo dela quando ele assim permitir, ou quando ela ou
ele desejarem. Uma forma de se fazer isso é quando a mulher, com o pênis
ainda dentro dela, ergue-se para ficar em cima do homem. Assim, a
excitação sexual permanecerá ininterrupta. Ou então, ela pode também
recomeçar a atividade sexual desde o início.[33]
A mulher, com as flores do cabelo desarrumadas e um sorriso
entrecortado por sua respiração ofegante, pressiona seus seios contra o peito
do homem para que ao final seus rostos se encontrem e, jogando a cabeça
para trás muitas vezes, ela retribui todos os gestos que ele fez antes. Então,
ela rindo, provocando e tirando a desforra, diz: “Eu fui derrubada e agora te
derrubo”. Ao final, demonstra timidez, cansaço e desejo de parar. É assim
que a mulher age sexualmente utilizando as investidas próprias do homem.
Quando ela está deitada na cama, extasiada pelas palavras do homem,
ele puxa a saia dela. Se ela responde negativamente, ele poderá tentar
excitá-la com beijos na bochecha. Nesse momento, com o pênis ereto, ele
poderá tocá-la em várias partes do corpo.
No primeiro encontro dos amantes, o homem acaricia por entre as coxas
fechadas da mulher.[34] Se ela ainda for virgem, ele acaricia os seios que
estão pressionados pelos braços cruzados dela, e afaga as mãos, axilas,
ombros e nuca. Já as mulheres mais experientes são acariciadas de acordo
com os hábitos e com as circunstâncias. Em seguida, ele agarra
apaixonadamente os cabelos da mulher para beijá-la, e segura o queixo dela
com a ponta dos dedos. Nesse momento, sua amante fecha os olhos de
vergonha, por ser o primeiro encontro sexual do casal ou por ela ainda ser
virgem.
Quando o homem quer saber o que dá prazer à mulher na união sexual,
ele deve observar atentamente as suas reações. Por esta razão, ao se
movimentar com o membro dentro dela, se ele encontra pontos que a fazem
virar os olhos, então ele a pressiona mais nesses lugares. Segundo
Suvarṇanābha, esses pontos são o segredo das jovens.
Além disso, outros sinais do clímax das mulheres são a lassidão dos
membros do corpo, os olhos fechados, a perda da timidez e a farta prática
do sexo.[35] Por outro lado, se fica sexualmente insatisfeita estando com um
homem, a mulher agita as mãos, fica suada, morde, não deixa ele se
levantar e o chuta.
De volta às preliminares, antes de penetrá-la, o homem massageia a
vagina da mulher com as mãos em forma de tromba de elefante[36] até que
ela fique macia e úmida, e somente então ele a penetra[37] com um dos
seguintes tipos de estocadas:
“aproximação”: é a penetração normal e costumeira.
“rodopio”: o homem roda o pênis com as mãos para todos os lados
dentro da vagina.[38]
“adaga”: o homem abaixa os quadris da mulher e a penetra de cima
para baixo.
“opressão”: é o mesmo movimento anterior (“a adaga”), mas invertido;
ou seja, o homem levanta os quadris da mulher e a penetra de baixo
para cima impetuosamente.
“pressão”: o homem se mantém por um longo tempo com o membro
dentro da mulher pressionando-a.
“furacão”: o homem eleva o seu próprio quadril e retira seu membro a
certa distância da mulher, para em seguida deixar cair seu corpo de
uma vez e penetrá-la com força novamente.
“investida do javali”: o homem roça o pênis muitas vezes apenas em
um lado da vagina.
“investida do touro”: é o mesmo movimento anterior, mas o homem
roça o pênis em ambos os lados da vagina alternadamente.
“pulo do pardal”: estando completamente dentro da mulher, o homem
dá duas, três, quatro estocadas sem tirar o pênis inteiramente.
“encaixada”: é realizada quando o desejo está no fim. Tal como
descrito anteriormente no Capítulo 6, os amantes estendem as duas
pernas de tal modo que o homem possa realizar a penetração.

Nesse contexto, dentre todas essas variedades de estocada, o homem


deve saber escolher a melhor opção segundo as características de cada
mulher. Inversamente, quando é a mulher quem está fazendo o papel do
homem, existem ainda outras variedades:

“pinça”: a mulher, na “posição da jumenta”, prende o pênis com a


vagina por bastante tempo, comprimindo-o ou trazendo-o ainda mais
para dentro.
“gira-gira”: é quando a mulher está sentada em cima do homem, com o
pênis dele dentro dela, e, apoiando-se com as mãos, gira em círculos
tal como uma roda em volta de um eixo. Essa posição exige prática, e
o parceiro deverá levantar o seu quadril.
“balanço”: ela balança para todos os lados movendo o quadril para a
frente e para trás.
Quando a mulher está por cima, fazendo o papel do homem, sem tirar o
pênis de dentro de sua vagina, ela poderá descansar colocando seu rosto
junto ao rosto dele. E depois de descansar, ela recomeça.

mesmo a amante que não demonstra sinais


e mantém seus desejos escondidos,
revela as próprias fantasias
quando está em cima, movida pela paixão.

o modo de ser da mulher se manifesta


por meio de suas características
e pelo modo de se entregar ao prazer sexual,
por isso ele deve observar os movimentos dela.

mas ela não deve fazer o papel do homem


após o parto ou quando estiver menstruada,
se for uma gazela, ou estiver grávida,
ou caso ela seja uma mulher muito grande.
“ A pinça”: a mulher, na “posição da
jumenta”, prende o pênis com a vagina por
bastante tempo, comprimindo ou trazendo-o
ainda mais para dentro.

[33] Não há uma terceira forma. Assim, ou ela muda de posição sem retirar o pênis de sua
vagina ou, no intervalo, ela retira o pênis de dentro de si, muda de posição e inicia o sexo
novamente, assumindo o papel do homem.
[34] Por timidez as coxas dela estão fortemente fechadas e ele a acaricia para que ela as
abra.
[35] Ela o possui profundamente deixando sua vagina extremamente próxima do órgão
sexual dele e este é o sinal de que ela está tendo um orgasmo ou está próxima disso.
[36] Junta-se o dedo indicador com o anelar e deixa-se o médio um pouco acima.
[37] Ele presta atenção nos movimentos dela antes de penetrá-la e percebe que caso ele
atinja o orgasmo antes, então a continuidade do orgasmo dela será interrompida.
[38] Ele, com as mãos, faz seu pênis rodar como se estivesse batendo um bolo.
NOVE

Sexo oral

As pessoas do terceiro sexo[39] se mostram de duas maneiras:


uma em forma de homem, outra em forma de mulher. Na forma feminina,
elas imitam o charme, o sentimento, a delicadeza, a timidez, a inocência, a
fragilidade, a vergonha e o modo de se vestir e de conversar de uma mulher.
A fim de obter prazer, excitação, ou mesmo garantir o seu sustento, tal
como uma cortesã, essas pessoas são praticantes do sexo oral, quando se
utiliza a boca para fazer o que é normalmente feito na região pélvica.
Já na forma masculina, as pessoas do terceiro sexo, ao sentirem desejo
por um homem, mantêm seu amor em segredo e ganham seu sustento
apenas como massagistas. Durante as sessões de massagem, elas podem
pressionar as coxas do homem com o seu corpo, como se o estivessem
abraçando. Assim que ganham bastante intimidade com ele, tocam sua
pélvis e virilha, e riem insolentemente como se o desprezassem.[40] Ao
perceber que o homem já deu sinais claros e, além disso, que sua excitação
é óbvia – mesmo que ele não tenha solicitado algo a mais – elas avançam
por conta própria. No entanto, quando o homem pede para que façam
alguma coisa, discutem nervosas, e consentem apenas com dificuldade.
Em relação à técnica, o sexo oral reúne oito tipos de ações, que são: a
“imóvel”, a “mordida nos lados”, a “pinça externa”, a “pinça interna”, o
“beijo”, o “polimento”, o “chupar a manga” e o “devorador”. Sempre que
termina uma, a pessoa do terceiro sexo manifesta desejo de parar, mas o
homem pede que ela faça o próximo tipo, e assim por diante. A sequência é
descrita deste modo:
Começa pela “imóvel”, na qual, segurando o pênis do homem com a
mão, coloca-o entre os lábios, e, depois de fazê-lo penetrar em sua boca,
utiliza as mãos para movê-lo para a frente e para trás. Em seguida, passa
para a “mordida nos lados”, em que ela empunha a glande com a mão e
mordisca os lados do pênis sem utilizar os dentes, e o incita dizendo: “Só
vou até aqui”. Mas o homem pede mais, então ela faz a “pinça externa”,
cerrando os lábios pressionando-os contra a glande do homem. Em seguida
ela o beija como se estivesse indo embora. Nesse instante, o homem
implora que ela continue e penetra o pênis um pouco mais, ao que ela
responde pressionando a glande dele com os lábios, até que o tira da boca
como se cuspisse, esta é a “pinça interna”. Depois, faz o “beijo” ao segurar
o pênis dele em suas mãos e o agarrar como se fossem os lábios de seu
amante, para, em seguida, no “polimento”, lambê-lo todo com a ponta da
língua e colocar a glande em sua boca. A partir disso, com um desejo
apaixonado, e com o pênis penetrado pela metade, pressiona e pressiona
sem piedade até soltá-lo: este é o “chupar a manga”. Por fim, quando o
homem manifesta a sua vontade, ela faz o “devorador” e aperta o pênis
dele, sugando-o como se o devorasse, até a ejaculação.
Também são empregados, conforme a conveniência, os golpes e
gemidos (como descritos no Capítulo 7), e assim é o sexo oral.
As mulheres promíscuas, as livres, as servas e as massagistas também
praticam sexo oral. Mas, segundo os mestres, esta não é uma prática
recomendável, porque é vulgar e porque é contra o código moral, e, além
disso, quando o homem entra em contato com a boca dessas mulheres, ele
poderá cair em desgraça.
Porém, segundo Vātsyāyana, aqueles que gostam de prostitutas não
devem sentir culpa, apesar de ser recomendável evitá-las. Por causa disso, o
povo do leste não faz sexo com as mulheres que praticam sexo oral. Já os
homens de Ahicchattra, por sua vez, não fazem sexo com prostitutas, mas,
quando por acaso se unem a elas, evitam qualquer contato com a boca. Os
homens de Saketa são indiferentes a essas coisas, os cidadãos de Pāṭalīputra
não praticam sexo oral e o povo de Surasena faz qualquer ato sem hesitar,
pois dizem o seguinte: quem pode confiar nos hábitos, na pureza, no
comportamento, nas convicções ou nas palavras de uma mulher? Por sua
própria condição, elas têm um olhar impuro, mas nem por isso se deve
rejeitá-las, e, por esse motivo, a tradição religiosa diz que devemos vê-las
como puras. E dizem também que:

assim como o bezerro quando mama é puro,


o cachorro quando captura uma gazela é puro,
ou ainda o pássaro quando derruba o fruto de uma árvore,
também é pura a boca da mulher na união sexual.

Vātsyāyana, considerando as divergências entre os sábios, os textos


religiosos, os costumes da região onde se vive e as disposições pessoais a
respeito dessa matéria, acredita que as pessoas devem agir de acordo com o
que elas acreditam ser uma boa conduta para cada um.

até mesmo os jovens servos,


que usam brincos brilhantes,
só praticam o sexo oral
com alguns homens escolhidos.

e, também, alguns cidadãos[41]


que buscam o bem-estar mútuo
e já têm uma relação de confiança
tomam-se reciprocamente.

os homens fazem sexo oral


nas mulheres
utilizando, para isso,
seus conhecimentos do beijo na boca.

homem e mulher, frente a frente,


mas com os corpos em direções opostas,
excitam-se simultaneamente,
esse é “o amor dos corvos”.[42]
por isso, as prostitutas rejeitam
os homens virtuosos, generosos e inteligentes
e encontram prazer com os malfeitores,
os escravos, os condutores de elefantes, e outros.

Brâmanes, sábios, conhecedores dos textos sagrados,


encarregados dos assuntos do rei,
e aqueles que obtiveram a confiança dos outros,
não devem praticar sexo oral.

a existência de um texto sobre o assunto


não é suficiente para que se realize tal prática,
é preciso saber que os objetivos do texto são gerais,
mas a prática pertence a cada região particular.

a medicina, por exemplo,


recomenda até mesmo carne de cachorro
por suas propriedades e sabor.
mas qual homem inteligente a comeria?

há homens, e lugares e épocas,


para os quais
tais práticas
não são insignificantes.

por isso, ao levar em conta


o lugar, a época,
o emprego do tratado e a si mesmo,
o homem faz uso dessas práticas, ou não.
mas, como estes assuntos são secretos
e a mente é instável,
quem é capaz de saber o que fazer?
e quando? e como?
[39] N. dos T. O autor chama de terceiro sexo os homossexuais travestidos (forma
feminina) e os não travestidos (forma masculina). As pessoas do terceiro sexo são tratadas
por Vātsyāyana com o pronome feminino, o que foi mantido por nós ao longo deste
capítulo.
[40] Ela diz em tom jocoso: “Você é tão fácil de excitar que já fica excitado só com um
toque nas coxas”.
[41] Alguns cidadãos que são praticamente mulheres se tomam um ao outro em amizade e
se entregam ao prazer da ejaculação. Eles dizem: “Você faz isso por mim agora e eu farei
por você mais tarde”. Ou ainda, ambos fazem simultaneamente virando seus corpos em
posição oposta e, por causa do ardor que sentem, perdem todo sentido do tempo. Assim
existem dois modos de praticar o ato. As mulheres também podem fazer sexo oral umas
nas outras. É dito: “Algumas mulheres do harém, impossibilitadas de utilizarem outros
instrumentos e confiando umas nas outras, excitam-se com a boca na vagina”.
[42] São como corvos porque ambos têm simultaneamente algo impuro em suas bocas.
DEZ

O começo e o fim da relação sexual, os


vários tipos de união e as brigas entre os
amantes

O começo e o fim da relação sexual


Num quarto da casa destinado ao prazer sexual, adornado com
flores e perfumado com incensos, o homem, na companhia de amigos e
empregados, receberá uma mulher embriagada, que já se banhou e se
adornou, e oferecerá a ela mais bebidas, dizendo-lhe palavras doces. Ele se
sentará à direita dela e tocará os cabelos, a barra do sári e o cinto dela, para
abraçá-la gentilmente com o braço esquerdo, pois deseja iniciar a relação
sexual.

os amantes conversam sobre coisas do dia a dia,


trocam segredos, e o homem avança com palavras doces,
lembrando momentos felizes de amor
e tudo o que passaram juntos.

Antes, no entanto, ainda na companhia dos amigos, acontecem recitais e


performances musicais, com ou sem danças, além de conversas sobre as 64
artes, enquanto o homem seduz a mulher com mais bebidas. Quando
percebe que ela o deseja, manda os outros homens embora com flores,
unguentos, bétel (noz-de-areca) e presentes. E então, enfim sozinhos, ele a
excita com abraços e todas as outras ações eróticas já descritas
anteriormente. Ele tira o cinto dela e depois todas as outras roupas, e a
abraça. Assim é o início da união sexual.
Já em relação ao fim do sexo, quando o desejo já se apagou, eles vão
para a sala de banhos sem se olharem, um com vergonha do outro. Quando
voltam, agora já sem sentir vergonha, sentam-se em um lugar agradável,
mascam a noz-de-areca, e ele passa óleo de sândalo ou de alguma outra
essência no corpo dela. Abraçando-a com o braço esquerdo, segurando um
copo na mão, dizendo palavras doces, oferece-lhe água para beber. Eles
comem petiscos ou outras coisas de acordo com os costumes e as
preferências de cada um. Comem sopas com pequenos pedaços de carne
assada, mingau azedo de arroz, grelhados, sucos, mangas, carne-seca e
frutas cítricas com açúcar mascavo, entre outras coisas conforme os hábitos
da região. O homem, experimentando pedacinhos disso e daquilo, oferece
petiscos a ela dizendo: “este é doce”, “este é suave”, “este é macio”... E, às
vezes, quando estão no terraço da casa, sentam-se e contemplam a luz da
lua. Então, ele segue contando histórias para agradá-la. Ela deita no colo
dele para observar a Lua, e ele mostra algumas estrelas e constelações a ela,
apontando a estrela Alcor,[43] a estrela Polar[44] e a constelação dos Sete
Sábios (ou Ursa Maior). Assim termina a relação sexual.

o amor cresce por meio do cuidado


e da atenção de um com o outro.
o prazer sexual mais elevado
surge quando os amantes trocam confidências,
surge pelo amor inspirado mutuamente,
surge quando eles seguem o próprio sentimento:
mesmo que em um momento sinta raiva, noutro,
olhe com amor;
surge das brincadeiras com a Hallīśaka,[45]
surge pelo canto, pelas músicas de Laṭa,
pela contemplação do círculo da Lua,
pelos olhos úmidos e ávidos de paixão.
E os amantes conversam
sobre o primeiro encontro de seus olhares
quando se fez o desejo,
e depois sobre a dor que sentiram
quando se separaram,
até que, no fim da conversa, eles se beijam e se abraçam
apaixonados.
por meio de toda sorte de sentimentos,
os jovens casais se apaixonam cada vez mais.
Os vários tipos de união sexual
Existem diversos tipos possíveis de união sexual: a “apaixonada”, o
“condutor da paixão”, a “paixão artificial”, a “paixão transferida”, o “sexo
servil”, o “sexo baixo” e o “sexo livre”.
A “apaixonada” é o amor que surge à primeira vista e a paixão do casal
se intensifica a partir do esforço de cada um para ficarem juntos, quando
um deles que está fora da cidade volta pra casa ou quando retomam a
relação após terem se separado por causa de uma briga. Esse tipo de amor
acontece a partir do desejo individual até atingir o clímax.
O “condutor da paixão” é quando o desejo dos amantes começa
indiferente e vai crescendo com o tempo. Ele se desenvolve a partir do
emprego das técnicas das 64 artes e da disposição de cada um, e faz arder o
desejo pouco a pouco.
Na “paixão artificial” os amantes fazem amor por uma razão particular
ou o fazem pensando em outra pessoa. Neste caso, eles devem empregar
todas as técnicas descritas nos tratados sobre o amor (uma vez que a
verdadeira roda da paixão não está em movimento).
Se o homem tem em seu pensamento outra mulher a quem ele ama de
coração, e transpõe seu pensamento para ela desde o início da relação
sexual até atingir o orgasmo, chama-se “paixão transferida”.[46]
O “sexo servil” é praticado com mulheres de classe social inferior ou
com servas e empregadas em geral apenas até que se atinja o objetivo.
Neste caso, não se leva em consideração a educação da mulher.
O “sexo baixo” é a união de uma cortesã com um homem do campo ou
a união de um cidadão com uma jovem que vive nos limites das grandes
cidades ou nos vilarejos agropastoris.
Finalmente, o “sexo livre” acontece quando há uma relação de
confiança estabelecida por causa da amizade entre duas pessoas.

As brigas entre os amantes


Quando uma mulher dedica todo o seu amor a um homem, ela não
suporta ser chamada pelo nome de outra esposa dele, nem ouvi-lo dizer
qualquer coisa sobre ela ou mesmo pronunciar o nome dela por acaso. E
também não suporta a hipocrisia de um homem. Nesse caso, ela briga
vigorosamente, chora, fica cansada, balança a cabeça, golpeia, joga-se da
cama ou da cadeira, arranca os colares e joias e dorme no chão. Então, o
homem, que está com a mente tranquila, aproxima-se da mulher com
palavras doces e com jeito. Ele se curva aos pés dela querendo fazer as
pazes e a levanta do chão para colocá-la de volta na cama. Ela responde às
palavras dele com muito mais raiva, pega-o pelos cabelos e o chuta nos
braços, na cabeça, no peito e nas costas... uma, duas, três vezes em
sequência... Depois corre para a porta, senta-se e debulha-se em lágrimas.
Segundo Dattaka, mesmo estando com muita raiva, ela não vai além da
porta, porque se fosse seria considerada culpada. Então, aqui, tendo sido
persuadida por meio de algum artifício dele, ela deseja a reconciliação. Mas
mesmo quando já está calma, deseja o prazer tranquilo e é abraçada pelo
homem, ainda finge provocá-lo com palavras duras.
Se a mulher está em sua própria casa e briga com o homem por alguma
razão, ela tem os mesmos gestos e comportamentos já descritos. Nessa
ocasião, ele pede ajuda a seus amigos e, com eles, consegue acalmá-la e
convencê-la a voltar reconciliada para a casa dele.

e assim, empregando as 64 artes


enunciadas por Bābhravya,
o homem terá sucesso
com as mulheres mais desejadas.

mesmo falando sobre outras ciências,


aquele que ignora as 64 artes
não será muito honrado
nas reuniões dos sábios.

mesmo destituído de quaisquer outros conhecimentos,


mas ornamentado com as 64 artes,
o homem tem proeminência nas conversas
com homens e mulheres nas assembleias.

pelos sábios ela é honrada,


mesmo pela população em geral, ela é muito honrada,
ela é honrada por todas as cortesãs,
pois, quem não honraria a felicidade?
a felicidade é a fortuna, o sucesso
e o fazer felicidade;
(a felicidade) é cara às mulheres,
(a felicidade) é descrita pelos sábios.

quem é versado nas 64 artes


é contemplado com o respeito de muitos
e é amado pelas virgens,
pelas esposas dos outros e pelas prostitutas.

[43] N. dos T.: Segundo o dicionário Monnier Williams: arundhatī é “a pequena e


parcamente visível estrela Alcor (pertencente à Ursa Maior, e personificada como a esposa
de uma de suas sete estrelas principais); em cerimônias de casamento arundhatī é invocada
pela esposa como padrão de excelência conjugal.
[44] N. dos T.: A estrela polar é personificação do neto de Manu. Manu é o progenitor da
humanidade.
[45] Diz-se da Hallīśaka: “é uma dança em que as mulheres ficam em um círculo e o
homem é o líder, assim como Kṛṣṇa com as vaqueiras”. Kṛṣṇa ao reencarnar dançou em um
círculo com vaqueiras. Ele criou duplos de si mesmo e as mulheres dançaram e fizeram
amor com ele, como se ele fosse vários.
[46] A mulher também pode ter uma paixão transferida.
CIDADES E REGIÕES DO KĀMASŪTRA

ābhīra: Região no noroeste da Índia.


Ahicchattra: Cidade ao norte da Índia.
Andhra: Região no sudeste da Índia entre os rios Godavari e Krishna.
Avanti: País ao nordeste da atual Bombaim, capital Ujjain.
Bāhli: Nordeste da Índia, atual Paquistão e Afeganistão.
Cola: Região no sul da Índia.
Dākṣiṇā́ : Povo do sul.
Drāviḍa: Sul da Índia.
Gauḍa: Atual Bengala Ocidental.
Kosala: Região no nordeste do Ganges.
Kuntala: Antiga região do sudoeste indiano.
Laṭa: Cidade ao sul da atual Gujarati.
Madhyadeśya: Índia Central.
Māhārāṣṭra: Estado do centro-oeste da Índia, cuja capital é Bombaim.
Mālava: Região central da Índia.
Pañcāla: Antiga cidade do nordeste indiano.
Pataliputra: Cidade do noroeste da Índia.
Saketa: Antiga cidade de Kosala.
Surasena: Região ao norte da Índia.
Sindhu-ṣaṣṭhāna: Entre Rios do Vale do Indo.
Strīrājya: Reino das Mulheres.
Vānavāsī: Cidade ao sul e a leste de Bombaim.
NOTA DOS TRADUTORES

As traduções do Kāmasūtra existentes em português consistem em


transposições da versão inglesa, traduzida por Sir Richard Burton e
publicada originalmente em 1883. A tradução de Burton incorpora ao texto
os comentários feitos ao livro original do Kāmasūtra (escrito por
Vātsyāyana aproximadamente no século III) por um autor chamado
Yaśodhara, no século XIII.
Na presente edição, traduzida diretamente do original sânscrito, preferimos
manter integralmente apenas o texto de Vātsyāyana e apresentar em notas,
quando pertinentes, alguns comentários de Yaśodhara. Dessa forma, todas
as notas que não estão marcadas com “N. dos T.” são traduções de
passagens desse comentador.
Vale dizer ainda que a obra original divide-se em sete livros, da qual
apresentamos a tradução do segundo, chamado “Livro do sexo”.
Posfácio

Por uma erótica da existência: o Kāmasūtra

O que tem a nos dizer, hoje, um livro como o Kāmasūtra?


Escrito nos primórdios da nossa era, na remota Índia clássica, esse texto
antigo e estranho pode suscitar leituras equivocadas na atualidade, ainda
mais quando folheado por mãos ocidentais. A começar por quem busca um
estimulante sexual e, em vez de deparar com a sonhada versão milenar da
pornografia contemporânea, é surpreendido por um estudo técnico e
sistemático do erotismo, expresso por meio de uma linguagem tão espartana
quanto imagética. Diante de tal evidência, restam duas opções: ou bem o
leitor fecha o livro, concluindo que ele nada tem a lhe dizer, ou se abandona
à aventura de descobrir um outro mundo, estrangeiro e fascinante.
Um mundo, diga-se de passagem, que se conhece há relativamente
pouco tempo, sobretudo se levarmos em conta que sua origem remonta a
dezoito séculos. A primeira tradução europeia do
Kāmasūtra – a versão inglesa de 1883, assinada por Sir Richard F. Burton –
foi a única a circular no Ocidente durante mais de cem anos, tendo se
tornado a matriz por excelência de outras traduções, que acabaram
reproduzindo não só seus acertos, mas também seus erros. A rigor, são bem
recentes as iniciativas de traduzir o livro direto do sânscrito, a reforçar o
sentido de descoberta que esta edição brasileira propõe ao leitor.
Considerado o mais antigo tratado da arte de amar do sul da Ásia, o
Kāmasūtra foi escrito por volta do século III d. C., no apogeu da dinastia
Gupta, que marcou um período de paz e prosperidade na região. Seu autor
foi o enigmático Vātsyāyana, de quem nada se sabe
afora a redação desse volume que, por sua vez, compila escritos
anteriores de especialistas no tema, cujos nomes são igualmente
desconhecidos para além dessas páginas.
Dividido em sete partes, das quais apenas a segunda é aqui apresentada,
o livro tinha por objetivo a educação de uma elite urbana, culta e refinada,
que dispunha de tempo e meios suficientes para se dedicar a uma minuciosa
pesquisa dos prazeres, fossem carnais ou espirituais. Aliás, uma tal
distinção era descabida naquele contexto, uma vez que a vida sexual não era
jamais concebida fora de sua dimensão religiosa.
Ora, é justamente esse aspecto sagrado do erotismo, vale dizer, que
marca a distinção capital entre os antigos tratados de práticas amorosas e a
sexologia atual, esta limitada a uma pragmática triste, sem qualquer
ambição de transcendência. Prova disso está nesse notável estudo em prosa
e verso que, mesmo nos momentos de maior exaltação dos sentidos, não
deixa de lembrar que:

O terreno dos manuais


Serve enquanto o desejo é baixo.
Mas, quando a roda da paixão
Gira, não há regras, nem ordem.

Para os contemporâneos de Vātsyāyana, o saber erótico fazia parte de


uma “ciência da vida” que implicava não só a arte do amor (kāma), mas
também o dever da virtude (dharma) e o objetivo da prosperidade (artha).
Verdadeiro ideal daquela civilização, o cultivo desses três planos prometia
aos educandos originais do Kāmasūtra uma vida plena de recompensas. É,
por certo, a partir dessa promessa que este livro deve ser lido. Por isso
mesmo, ao leitor de hoje, importa menos saber se esses ensinamentos foram
ou não praticados, do que vislumbrar o encanto de uma erótica da existência
concebida no passado, da qual só nos restaram esses rastros.

Eliane Robert Moraes

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