Nietzsche Educador
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D541n
Livro em PDF
ISBN 978-65-5939-930-7
DOI 10.31560/pimentacultural/2024.99307
CDD 370.7
PIMENTA CULTURAL
São Paulo • SP
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CONSELHO EDITORIAL CIENTÍFICO
Doutores e Doutoras
Introdução...................................................................................................12
CAPÍTULO 1
Nietzsche Professor
a escolaridade de Nietzsche.................................................................................15
O professor Nietzsche................................................................................. 20
O projeto filosófico
de Nietzsche educador................................................................................ 25
Considerações extemporâneas................................................................ 31
Ruptura com Wagner
e afastamento da universidade............................................................... 35
Nietzsche:
uma lembrança querida....................................................................................................40
CAPÍTULO 2
A incultura moderna................................................................................ 47
A individualidade para Nietzsche........................................................... 57
Como educar a si mesmo........................................................................... 59
A descoberta de Schopenhauer............................................................. 63
A imitação criadora........................................................................................ 65
Os preconceitos da educação................................................................. 69
O gênio..................................................................................................................72
Os três egoísmos............................................................................................ 73
A ciência e o cientista...................................................................................75
Uma nova concepção de cultura............................................................ 78
CAPÍTULO 3
Educação e cultura.................................................................................. 81
Tendências que minam a educação..................................................... 82
“A língua é minha pátria”............................................................................ 85
Críticas aos estabelecimentos de ensino ......................................... 93
A ciência e a arte............................................................................................ 96
A filosofia............................................................................................................ 98
O filósofo e o artista
reclamam seus direitos.............................................................................. 104
Conclusão.................................................................................................108
Referências................................................................................................111
Índice Remissivo......................................................................................114
CRONOLOGIA
1844 15 de outubro: Friedrich Wilhelm Nietzsche nasce em Roecken, na Saxônia. Era o primeiro filho do
pastor luterano Larl Ludwig Nietzsche com Franziska.
1845 Nascimento de sua irmã, Elizabeth.
1849 Morte de seu pai.
1850 A viúva e os filhos instalam-se em Naumburg.
1858 Ingressa na escola de Pforta.
1861 Conhece Gersdorff; compõe músicas; toma conhecimento de “Tristão e Isolda”, de Wagner.
1864 Diploma-se em Pforta com distinção em quase todas as matérias, menos matemática. Matricula-se na
Universidade de Bonn, no curso de teologia, onde permanece por dois semestres, estudando teologia e filologia.
1865 Abandona a teologia e transfere-se para a Universidade de Leipzig. Descobre Schopenhauer.
1866 Janeiro: primeira conferência sobre Teógnis na Sociedade Filológica. Conhece Erwin Rohde.
1867 Outubro: começa o serviço militar. É dispensado em consequência de uma queda de cavalo. Publica
seu primeiro ensaio de filologia.
1868 Novembro: conhece Richard Wagner.
1869 É nomeado professor de filologia clássica na Universidade de Basiléia (Suíça) e ensina grego nas
classes superiores do Pädagogium. Em maio, primeira visita a Wagner e a Cosima, em Tribschen, perto
de Lucerna. Conhece o historiador Jacob Burckhardt.
1870 Faz palestras sobre o Drama musical grego e Sócrates e a tragédia. Redige “A visão dionisíaca do
mundo”. Conhece o teólogo Franz Overbeck. Serve como enfermeiro voluntário na guerra franco-
prussiana. Atacado de difteria, regressa à Basiléia.
1871 Redige, em Lugano, “O nascimento da tragédia no espírito da música”.
1872 Publica “O nascimento da tragédia”. Profere cinco conferências, intituladas: “Sobre o futuro de nossos
estabelecimentos de ensino”.
1873 Redige “A filosofia na época trágica dos gregos” e “Sobre verdade e mentira no sentido extramoral”.
Publica sua primeira “Extemporânea: David Strauss, o devoto e o escritor”.
1874 A segunda e a terceira extemporâneas são publicadas: “Da utilidade e desvantagem da história para a
vida” e “Schopenhauer como educador”.
SUMÁRIO 10
1875 Escreve a quarta “Extemporânea: Richard Wagner em Bayreuth”. Em novembro, conhece aquele que
será seu amigo até o final de sua vida, Peter Gast.
1876 Assiste ao Festival de Bayreuth. Decepcionado e doente deixa Bayreuth e Wagner.
1878 Publica “Humano, demasiado humano” – um livro para espíritos livres.
1879 Demite-se da Universidade da Basiléia. Começa sua vida de errante. Publica “Opiniões e sentenças
variadas”, primeiro complemento de “Humano, demasiado humano”.
1880 Durante o inverno de 1879-80, publica “O andarilho e sua sombra”, segundo complemento de “Humano,
demasiado humano”.
1881 Publica “Aurora”. Em agosto, próximo de um rochedo, à beira do lago de Silvaplana (Engandine), tem a
revelação do “Eterno retorno”.
1882 Publica “A gaia ciência” – as quatro primeiras partes. A quinta parte aparece em 1886.
1883 Em janeiro, escreve a primeira parte de “Assim falou Zaratustra” – um livro para todos e para ninguém.
Richard Wagner morre em Veneza, aos 69 anos. Em julho, escreve a segunda parte de “Zaratustra” e
publica as duas partes.
1884 Redige a terceira parte de “Assim falou Zaratustra”.
1885 Com suas pequenas economias, manda imprimir 40 exemplares da quarta parte de Zaratustra e não
consegue reunir sete nomes interessados em ler o livro.
1886 Publica, também à próprias custas, “Para além do bem e do mal”. Escreve prefácios para livros já
publicados: “Humano, demasiado humano”, “O nascimento da tragédia”, “Aurora” e “A gaia ciência”.
1887 Publica a “Genealogia da moral” e redige o “Niilismo europeu”.
1888 Escreve o “Caso Wagner”, “O crepúsculo dos ídolos”, “O Anticristo”, “Ecce homo”. Elabora “Nietzsche
contra Wagner” e “Ditirambos de Dionísio”.
1889 Crise de demência em Turim. É levado pra a Basiléia e internado na clínica psiquiátrica. É transferido para Iena.
1890 Nietzsche deixa a clínica de Iena.
1897 Morte da mãe. Elizabeth leva Nietzsche para Weimar.
1900 Em Weimar, morre no dia 25 de agosto. Três dias depois, é sepultado em Roecken.
SUMÁRIO 11
INTRODUÇÃO
“Um dia virá
em que só se terá
um único pensamento:
a educação.”
Nietzsche, Fragmentos póstumos (1875)
SUMÁRIO 12
Privilegiaremos seus trabalhos compreendidos entre 1870 e
1876 para evitar o equívoco de algumas interpretações, as quais, por
analisarem diversos trechos sem fazer referências às datas em que
foram escritos, induzem o leitor a ver contradições onde há apenas
pontos de vista diferentes de um autor cujo pensamento está sem-
pre em constante evolução. Por vezes, citaremos trechos de “Ecce
homo”, texto autobiográfico de 1888, no qual Nietzsche, num olhar
retrospectivo, fala de aspectos de sua vida e do conjunto de sua obra;
só utilizaremos, contudo, aquilo que puder servir de esclarecimento
para o período escolhido. Depois de 1876, encontraremos reflexões
esparsas acerca de problemas educacionais, mas não mais relacio-
nadas às instituições de ensino.
SUMÁRIO 13
mais é do que um simulacro de outras culturas. Cultura e educação
são sinônimos de “adestramento seletivo” e “formação de si”; para
a existência de uma cultura, é necessário que os indivíduos apren-
dam determinadas regras, adquiram hábitos e comecem a educar-se
a si mesmos e contra si mesmos – ou melhor, contra a educação
que lhes foi inculcada.
1 O Gymnasium equivale aos antigos ginásio e colegial, que atualmente, no Brasil, equivale ao
segundo segmento do ensino fundamental, que abrange do 6º ao 9º ano.
SUMÁRIO 14
1
NIETZSCHE
PROFESSOR
A ESCOLARIDADE
DE NIETZSCHE
Em Naumburg, na Turíngia, começa a escolaridade de
Nietzsche. Depois da morte de seu pai, quando Friedrich tinha ape-
nas cinco anos, a família sai de Roecken, na Saxônia Prussiana, e ins-
tala-se em Naumburg. Nietzsche é criado num meio exclusivamente
feminino: mãe, irmã, avó paterna e duas tias. Em Naumburg, recebe
o ensino elementar. Sobressai-se como uma criança de inteligência
superior, apaixonada pelos livros e pela música, a qual, mais tarde,
exercerá uma decisiva influência em sua vida e em seu pensamento.
Em 1858, aos 14 anos, é enviado ao internato de Pforta, a fim de pre-
parar-se para a profissão de pastor, a mesma de seu pai, Karl Ludwig.
SUMÁRIO 16
Em 1860, ainda no colégio Pforta, funda com dois amigos a
Germânia – sociedade cuja proposta era discutir questões ligadas à
arte, à música e à literatura e incentivar a produção de textos, poe-
mas e composições musicais que seriam submetidos à apreciação
sincera desse círculo de amigos.
2 Johann Cristian Friedrich Hölerlin (1770-1843), escritor alemão, conhecido como “Werther da
Grécia”. Influenciado por Schiller, escreveu seus hinos aos ideais da humanidade: à liberdade, à
harmonia, à beleza, à amizade, ao amor, à audácia, ao destino. Encontrou em Susette Gontard
seu ideal feminino e por ela se apaixonou. Celebrou-a na poesia sob o nome de Diotima, como
encarnação da beleza eterna. Nessa fase da criação artística de Hölderlin, sobressai-se o romance
“Hyperion”. O herói do romance, Hyperion, aspira a harmonia com a natureza, compreendida como
manifestação divina. Ele encontra a realização desse ideal na Grécia Antiga, descobrindo o lado
dionisíaco, exaltado depois por Nietzsche. Também influenciado pelo estudo dos gregos, compôs
o drama Empédocles, que permaneceu inacabado. Em 1801, apareceram os primeiros sintomas de
alienação mental, e em 1806 foi internado no manicômio de Tübingen, de onde saiu pouco depois.
Morreu em 1843, em estado de total alienação. A morte de Hölderlin passou quase despercebida;
pouco mais de um terço de sua produção poética se encontrava publicada.
SUMÁRIO 17
Em 1868, pouco antes de se tornar professor de filologia clás-
sica na Universidade da Basiléia, Nietzsche escreve sobre o período
que passara em Pforta:
Eu mesmo, em grande parte, fui encarregado de minha
própria educação. Meu pai [...] morreu prematuramente:
faltou-me a direção firme e refletida de uma inteligência
masculina. Quando, ao sair da infância, entrei no colégio de
Pforta, só conhecia um sucedâneo da educação paterna:
a disciplina uniforme de uma escola bem organizada. Mas
essa rigidez quase militar, que, destinada a agir sobre a
massa, trata o indivíduo de maneira fria e superficial, só
fazia com que eu me refugiasse em mim mesmo. Contra
um regulamento cego, preservei minhas aspirações e
meus gostos particulares, vivi no culto secreto de algu-
mas artes, esforcei-me em quebrar o rigor de uma rotina
inflexível, entregando-me à busca exacerbada do saber
universal e de suas alegrias. Por pouco não me tornei
músico. Desde a idade de nove anos, de fato, sentia pela
música o mais vivo interesse, [...] tinha adquirido conhe-
cimentos teóricos que não podiam ser considerados os
de um simples diletante. Entretanto, somente perto do
final de minha escolaridade em Pforta, observando-me,
abandonei inteiramente a ideia de uma carreira artística:
esse lugar foi logo ocupado pela filologia.
SUMÁRIO 18
estudante de teologia. Ali, porém, permanece pouco tempo. No ano
seguinte, muito a contragosto de sua mãe, abandona o curso.
SUMÁRIO 19
em criar um círculo de alunos atentos, que seguissem indiferentes
à vida que os rodeava. Pretendia, isso sim, incentivá-los a um olhar
singular sobre determinada ciência, conduzi-los de modo a poderem
criar uma humanidade rica e transbordante de vida.
O PROFESSOR NIETZSCHE
Aos 24 anos, por recomendação de Ritschl, Nietzsche é
convidado para ser professor de filologia clássica na Universidade
e no Pädagogium3 da Basiléia, na Suíça. Para obter o diploma de
fim de curso, faltava a tese de doutorado, mas os professores de
Leipzig, levando em consideração seus trabalhos publicados na
revista “Rheinisches Museum”, dirigida por Ritschl, concedem-
-lhe o título de doutor.
3 “Pädagogium era como se denominava a escola secundária humanista, o liceu clássico. Na Universidade
de Basiléia, os docentes da Faculdade de Filosofia tinham de lecionar também às classes superiores do
Pädagogium.” Nota de Paulo César Souza, tradutor para o português de “Ecce homo”, p. 167.
SUMÁRIO 20
que mal participamos, esse tempo passou irrevogavel-
mente. Reina agora a dura deusa, a obrigação cotidiana.
“Bemooster Burche zieh’ich aus...” Conhece essa emocio-
nante canção de estudante? Sim, sim, chegou a minha
vez de ser um filisteu. Um dia ou outro, aqui ou além, o
ditado realiza-se sempre. As funções e as dignidades
são coisas que nunca se aceitam impunemente. Todo o
problema reside em saber se as cadeias são de ferro ou
de linha. Tenho ainda suficiente coragem para romper,
se necessário, qualquer elo e recomeçar, de uma outra
maneira ou em outro lugar, uma nova vida. Não adquiri
ainda a postura curvada tão característica do professor.
Zeus e todas as musas me preservem de ser filisteu,
homem abandonado pelas musas, homem de rebanho!
Não vejo como me poderei tornar no que não sou. É certo
que a partir de agora faço parte do gênero dos filisteístas,
do “homem especializado”, e é natural que uma ocupação
diária, uma concentração incessante do pensamento em
certos conhecimentos e certos problemas entorpeçam
um pouco a livre sensibilidade do espírito e ataquem, em
suas raízes, o senso filosófico. Mas imagino que posso
aceitar o perigo mais tranquilamente do que a maior
parte dos filólogos: a seriedade filosófica está em mim
enraizada muito profundamente. Os verdadeiros e essen-
ciais problemas foram-me sempre mostrados pelo grande
mistagogo Schopenhauer, de modo que não corro o risco
de desviar-me de forma desonrosa da “Ideia”. Injetar
esse novo sangue à minha ciência, comunicar aos meus
ouvintes essa seriedade schopenhauriana, que brilha na
fronte do homem sublime, esse é o meu voto, a minha
esperança audaciosa. Quero ser mais que um instrutor de
bons filólogos. Penso nos deveres dos mestres de hoje:
preocupo-me com a geração que vem depois de nós.
Tudo isso me ocupa o espírito. Uma vez que temos de
suportar a nossa vida, que ela seja estimada pelos outros,
quando tivermos a felicidade de escapar dela.4
4 Numa carta dirigida ao amigo Paul Deussen (20 de outubro de 1868), Nietzsche diz que a filologia
era para ele uma ocupação secundária, que estava a serviço de sua vocação filosófica: “Falando
mitologicamente, vejo a filologia como um aborto da deusa Filosofia.”.
SUMÁRIO 21
Com esses objetivos, chega à Basiléia em 19 de abril de 1869.
No começo de maio, já está em plena atividade. Todos os dias da
semana, a partir das sete horas da manhã, dá cursos na universi-
dade sobre a história da lírica grega e sobre as “Coéforas”, de Ésquilo,
para um grupo de sete alunos. No Pädagogium, ministra dois cursos
às terças e sextas e outro às quartas e quintas. Lê com os alunos
o “Fédon”, de Platão.
SUMÁRIO 22
Em Tribschen, às margens do lago dos Quatro Cantões, numa
encantadora solidão rodeada de montanhas, tinha Nietzsche a sua
Itália, o seu refúgio de artista. Na Basiléia, a poucos quilômetros da
vila de Wagner, exercia sua cansativa profissão.
SUMÁRIO 23
melhor forma de vida, coloca-o em função de si próprio, de criar mais
saber, independentemente do que isso possa significar para a vida.
5 É deste modo que Gilles Deleuze, no seu livro Nietzsche, refere-se ao ideal de educação de Nietzsche.
SUMÁRIO 24
e Paul Deussen, nos tempos de ginásio, e pensa em organizar, nes-
ses mesmos moldes, uma espécie de “convento laico”, uma “escola
para educadores”, onde os amigos serviriam de professores uns
aos outros, discutiriam e trabalhariam juntos pela cultura alemã. A
confraria de amigos não chegou a se realizar, pelos motivos mais
diversos e certamente mais corriqueiros, mas Nietzsche não desiste
de seus projetos de renovação cultural6.
O PROJETO FILOSÓFICO DE
NIETZSCHE EDUCADOR
Durante o inverno de 1870-71 Nietzsche adoece. Sofre de
tal modo que tem de pedir licença de suas obrigações, retirando-se
para Lugano7, de onde escreve para Rohde:
É certo que Vischer me escreveu para aqui uma vez,
mas sua carta não continha uma só palavra referente a
nossa solicitação. Em contrapartida, soube por alto, em
Basiléia8, depois de ter-te escrito e antes da minha par-
tida, que o “filósofo” Steffensen vê o projeto com má von-
tade. Imagina como fiquei vulnerável a partir do momento
em que ficou claro o meu schopenhauerismo, o que, aliás,
nunca escondi. Tenho, além disso, e antes de mais nada,
6 A posição de Nietzsche diante da guerra sofre uma mudança bem rápida, como se pode observar
nessas duas cartas endereçadas a sua mãe, datadas com apenas cinco meses de diferença. Na
primeira, de 16 de julho de 1879, mostra-se entusiasmado: “Temos vivido muito alegres no crepús-
culo da paz. E agora estala esta tempestade, a mais horrível de todas. Como estou triste de ser
suíço. Trata-se de nossa cultura! E para isso não há sacrifício que seja suficiente! Ah! Esse maldito
tigre francês!” Na segunda, de 12 de dezembro de 1870, escreve: “Cada vez são menores minhas
simpatias pela atual guerra de conquista empreendida pela Alemanha. Cada vez me parece mais
ameaçado o futuro de nossa cultura alemã.”
7 Carta para Erwin Rohde, 29 de março de 1871.
8 Nietzsche refere-se ao projeto de ceder a Rodhe sua cátedra de filologia, encarregando-se ele da
de filosofia, na mesma Universidade da Basiléia.
SUMÁRIO 25
que me dar a conhecer e legitimar-me como filósofo. Com
esta intenção, terminei um pequeno escrito, intitulado
“Origem e fim da tragédia”, a que só faltam alguns reto-
ques. Acredito que teremos que esperar ainda um pouco,
pelo menos até a festa de S. Miguel, época em que, se
tudo correr bem, se resolverá nosso assunto. A verdade
é que, assim, se prolongará ainda mais o triste estado de
excitação e de insatisfação – nosso perpetuum mobile –, e
teremos ainda muito tempo, nesta expectativa tão pobre
de esperanças, para pôr à prova nosso sangue-frio de
filósofos! [...] Entre muitos momentos de desencoraja-
mento e de depressão, tenho gozado alguns de grande
elevação, cujo eco pode ser encontrado no pequeno
ensaio de que te falei. Em relação à Filologia, sinto-me
cada vez mais distante, tendo por ela o maior desprezo
que se possa imaginar. Tudo o que pudesse alcançar por
esse lado – elogios, censuras, e até as mais altas glórias
– me faz tremer de horror. Habituo-me progressivamente
a viver como filósofo e já creio em mim! Estou preparado
para tudo. E não me causaria a mínima surpresa se viesse
a me tornar poeta. Não disponho de uma bússola capaz
de me indicar a que estou destinado e, no entanto, no fim
das contas, tudo me parece ter sido guiado por um gênio
bom. Nunca imaginei que, não tendo uma clara visão dos
meus fins, nem ambicionando nenhum cargo público,
alguém pudesse sentir-se tão sereno e lúcido como me
encontro. [...] Ora é um trecho de uma metafísica, ora
de uma nova estética que vejo delinear-se; após o que
me dedico ainda a um novo princípio de educação, que
implica a total negação de nossos Gymnasium e universi-
dades. [...] Orgulho e extravagância são palavras que mal
exprimem meu “estado de vigília” espiritual. Este estado
permite-me considerar minha posição universitária como
coisa secundária e mesmo penosa, e até a cátedra de
Filosofia só me preocupa por tua casa, pois a considero
também como coisa provisória.
SUMÁRIO 26
estudante em Leipzig, Nietzsche não tinha mais dúvidas quanto a sua
vocação de filósofo. Quis doutorar-se em filosofia, chegando mesmo
a redigir, com esse objetivo, um texto intitulado “Esquemas funda-
mentais da representação”. Mas, por estar inscrito na universidade
como filólogo, não lhe foi concedida permissão para elaborar sua tese
em filosofia. Desde essa época, vive um conflito incessante entre sua
profissão de filólogo e seu instinto filosófico. Assim, na Basiléia, com
a possibilidade de deixar a cátedra de filologia para Rohde e assumir
a de filosofia, a qual se encontrava vaga com a saída de Teichmüller,
entrevê a oportunidade de trabalhar mais próximo de seus interesses
pessoais, mesmo sem grandes esperanças e com a firme convic-
ção de que também essa cátedra seria coisa provisória. Nietzsche
redige um pequeno texto, “Origem e fim da tragédia”, gênese de O
nascimento da tragédia, para “legitimar-se como filósofo”. Mas algo
de que já suspeitava se concretizou: Vischer, o diretor administrativo
da universidade, ao saber que o nome de Nietzsche não receberia a
aprovação do professor oficial de filosofia da Basiléia, Karl Steffensen,
deixou de colocá-lo entre os concorrentes à cátedra, temendo que,
com a recusa oficial de seu nome, Nietzsche renunciasse a seu posto
de professor na universidade e no Pädagogium.
SUMÁRIO 27
entende o homem a quem eu quis dedicar este livro, como um luta-
dor sublime que me precedeu neste caminho.”
SUMÁRIO 28
quem Nietzsche admira. Verdades irrefutáveis, críticas veementes ao
sistema educacional alemão estavam sendo ditas. Depois das confe-
rências, Burckhardt comenta com um amigo:
O senhor deveria tê-lo ouvido! Em alguns momentos, dei-
xava-se tomar pelo entusiasmo; depois, ressurgia numa
profunda aflição; e, a bem da verdade, não vejo ainda
como os humaníssimos ouvintes devem ter tomado par-
tido na questão. De um fato, pelo menos estávamos certos:
tratava-se de um homem altamente dotado, que possui
tudo de primeira mão e tudo distribui da mesma maneira.9
SUMÁRIO 29
Nietzsche havia atraído curiosos. Mas a rejeição de filólogos a sua
obra repercutiu muito mal no mundo acadêmico alemão. Se durante
três anos fora um mestre que merecia ser conhecido, agora se tor-
nava um dos que convinha esquecer.
10 A Santa Vehme era um tribunal secreto estabelecido na Alemanha para atingir aqueles que esca-
pavam da justiça comum. Os condenados eram enforcados ou apunhalados pelos iniciados, que
eram muito numerosos.
SUMÁRIO 30
CONSIDERAÇÕES EXTEMPORÂNEAS
Durante os últimos meses de 1872, Nietzsche prepara cursos
para a universidade e redige “A filosofia na época trágica dos gregos”,
um estudo sobre os filósofos pré-platônicos: Tales, Anaximandro,
Heráclito, Parmênides e Anaxágoras. Investiga-os não com o olhar
do filólogo que se debruça sobre os textos para vasculhá-los em suas
minúcias, mas com a visão do “filósofo médico”, que se preocupa
com a cultura. O estudo dos pré-platônicos levou-o a perceber o
quanto era inútil à vida a “compulsão do saber a qualquer preço”,
tão frequente nos meios universitários. Ensinou-lhe também que o
saber deveria servir a uma melhor forma de vida, como o era entre
os gregos. Por isso, sente que lhes deve um tributo: mostrar ao povo
alemão a verdadeira cultura. Pensa, a princípio, em publicar alguns
capítulos de seu livro, mas desiste. Tornara-se demasiado severo
consigo mesmo, e não achava que seu manuscrito já pudesse ser
publicado como livro. Leva-o para Bayreuth, para lê-lo com amigos,
entre eles Wagner, que ali se instalara para acompanhar de perto a
construção do “Festspielhaus” (casa de espetáculos)11.
11 Em suas anotações de 1874, Nietzsche define o filósofo como “o médico da civilização”. Nesse
sentido, filosofar significa interpretar e diagnosticar os “males da civilização”, encontrar remédios
para curá-la ou então envenenar aquilo que a destrói.
SUMÁRIO 31
O primeiro adversário é o teólogo David Strauss, que dá o
nome a sua primeira “Extemporânea: David Strauss, o devoto e o
escritor” (1873). A burguesia alemã considerava Strauss o seu pensa-
dor por excelência. Nietzsche ataca as ideias e a forma de sua obra “A
antiga e a nova fé”. Ao criticá-lo, é à cultura alemã que Nietzsche visa;
cultura que, a seus olhos, nada tem de próprio, sendo “desprovida de
sentido: sem substância, sem meta, uma mera opinião pública”.
SUMÁRIO 32
saber, meros expectadores do passado, e não criadores da vida e
cultura. Protesta contra a educação histórica com que os professores
pretendiam instruir seus alunos, tornando-os, pelo acúmulo de saber,
incapazes de recriar a vida a partir de suas experiências. Convida os
jovens a se educarem a si mesmos, de tal modo que pudessem se
desfazer de seus hábitos e da educação que lhes fora inculcada.
SUMÁRIO 33
Nietzsche tinha a intenção de escrever ainda nove
“Extemporâneas”, mas decide interromper esse trabalho. Inspiradas
em um projeto nitidamente educativo, as quatro “Extemporâneas”
lhe pareciam suficientes como “grito de alerta e de advertência
à juventude”.
SUMÁRIO 34
RUPTURA COM WAGNER
E AFASTAMENTO DA UNIVERSIDADE
Outro problema de saúde, no início de 1876, afasta Nietzsche
por três meses de suas atividades acadêmicas. Sua saúde piora muito
e ele tem certeza de que sofre de uma doença cerebral, a mesma que
matara seu pai aos 36 anos. O médico proíbe as leituras e prescreve
repouso e um único alimento: leite. Não se deixa abater; sobretudo,
não se desespera. Tem uma filosofia para a doença; já sabe como
transfigurá-la: “Ela traz esperanças, e não é uma obra de arte”, diz
ele, “ainda ter esperanças?”12 Sabe também que os sofrimentos cor-
porais vêm sempre misturados a crises espirituais e, por isso, não
pode conceber que se possa recuperar a saúde só com remédios
e regimes. É preciso mais, é preciso uma atitude diante da doença:
“Para nós”, escreve a Malwida von Meysenburg:
[...] o segredo de toda possível cura consiste em adquirir
uma determinada dureza de epiderme que diminua nossa
grande vulnerabilidade e nos permita suportar melhor os
sofrimentos íntimos. Não nos deve contrariar, nem nos
abater tão facilmente, o que nos venha do exterior. Pelo
menos, a mim já não me atormenta, assim como não
sofre com fogo aquele que arde exterior e interiormente.
O meu lar, preparado pela minha irmã, e no qual entrarei
dentro de alguns dias, terá de ser para mim como uma
nova pele forte e dura. Faz-me feliz o “ver-me” já na minha
12 Em “Ecce homo”, num olhar retrospectivo sobre a sua doença, nos anos que passou na Basiléia,
afirma que considerava sua enfermidade um dom benéfico, pois por meio dela pôde escapar aos
obstáculos que entravavam seu próprio destino. “Tomei a mim mesmo em mãos, curei a mim
mesmo; a condição para isso – qualquer fisiólogo admitirá – é ser no fundo sadio. Um ser tipica-
mente mórbido não pode ficar são, menos ainda curar-se a si mesmo; para alguém tipicamente
são, ao contrário, o estar enfermo pode ser até um enérgico estimulante ao viver. De fato, assim
me aparece agora aquele longo tempo de doença: descobri a vida e a mim mesmo, saboreei todas
as boas e pequenas coisas, como outros não as teriam sabido saborear – fiz da minha vontade de
saúde, de vida, a minha filosofia... Pois atente-se para isso: foi durante os anos de minha menor
vitalidade que deixei de ser um pessimista: o instinto de auto-restabelecimento proibiu-me a uma
filosofia da pobreza e do desânimo...” (Por que sou tão sábio, 2).
SUMÁRIO 35
casinha de caracol, da qual estenderei com carinho meus
tentáculos para você e para poucos mais. Perdoe-me a
animalidade da expressão.
13 A Tetralogia é composta das seguintes peças: “Ouro do Reno”, “Tristão e Isolda”, “Os mestres canto-
res de Nuremberg” e “Crepúsculo dos deuses”.
SUMÁRIO 36
não era a cada da cultura, e o drama musical wagneriano não tinha
condições de promover o renascimento da arte alemã.
14 Paul Rée é autor de “Observações psicológicas” (1875) e “Origens dos sentimentos morais”. Foi,
durante alguns anos, amigo e companheiro de leitura de Nietzsche, mas a paixão dos dois amigos
por Lou Salomé fez com que se desentendessem no final de 1882.
15 Malwida von Meysenburg era admiradora de Wagner e de Schopenhauer. Conhecera Nietzsche
em 1872, na festa de lançamento da pedra fundamental do Festspielhaus em Bayreuth. Fundou o
primeiro jardim de infância em Hamburgo. Escreveu uma autobiografia, intitulada Memórias de
uma idealista (1876), que muito impressionou Nietzsche.
SUMÁRIO 37
também o “Novo Testamento”. Nietzsche concluiu sempre o debate,
não deixando de fazer comentários como filósofo e como filólogo16.
Mas não é ainda nesse ano que deixa seu posto de professor.
Em setembro, antes de retomar suas aulas, Nietzsche dita e seleciona
16 Quando recebe de Wagner o livreto de “Parsifal”, Nietzsche comenta-o com Seydlitz, em uma carta
de 4 de janeiro de 1878: “Ontem recebi o ‘Parsifal’, que me foi enviado por Wagner. As minhas
primeiras impressões, à primeira leitura, foram as seguintes: toda a obra está cheia do espírito
da Contra-Reforma, e nela há muito mais de Liszt do que de Wagner. Além disso, acostumado
ao grego e ao demasiado humano, acho a produção wagneriana limitada em excesso, dentro
do cristianismo e do tempo. Sobretudo, há no ‘Parsifal’ uma absoluta falta de carne e, em troca,
demasiado sangue. [...] Por último dir-lhe-ei que não me agradam as mulheres histéricas. Muito do
que se suporta no cotidiano, já não o é em cena.”
SUMÁRIO 38
com Peter Gast a massa de aforismos que compõem a primeira parte
do “Humano, demasiado humano”, trabalho que se prolongará até o
final de janeiro de 1878, quando o livro é publicado17.
17 Em “Ecce homo”, Nietzsche fala da ajuda que o amigo e músico Peter Gast lhe dera quando pre-
parava a publicação de “Humano, demasiado humano”: “ no fundo é o senhor Peter Gast, então na
Universidade da Basiléia, e a mim muito afeiçoado, quem tem este livro na consciência. Eu ditava,
a cabeça enfaixada e dolorida, ele escrevia, e corrigia também – ele foi, no fundo, o verdadeiro
escritor; eu fui apenas o autor.” (p. 76).
18 Franz Overbeck (1837-1905) era professor na Universidade da Basiléia. Ensinava Teologia e Crítica
ao Cristianismo do século XIX.
SUMÁRIO 39
Em julho de 1879, após dez anos como professor, Nietzsche
deixa definitivamente Basiléia, “em estado de quase desesperação,
mas ainda com alguma esperança”. Viverá os dez anos seguintes
como filósofo errante, como “o virtuose dos passeios solitários”.19
NIETZSCHE:
UMA LEMBRANÇA QUERIDA
Poucos professores foram tão estimados pelos alunos
quanto Nietzsche. Seu temperamento, suas maneiras, o charme de
sua personalidade afável fascinava-os. Tinha o poder de entusiasmar
os jovens para a disciplina que ensinava. Excelente professor, não
visava ao simples acúmulo de conhecimento – pelo contrário, insis-
tia no desenvolvimento do senso crítico e da atividade criadora de
cada um. Incitava os alunos a exprimirem livremente suas opiniões,
incentivava-os a fazerem suas leituras pessoais e as controlava fre-
quentemente. Não precisava castigar, porque punha para trabalhar
mesmo os alunos mais relapsos.
19 Em carta a Peter Gast, datada de 4 de abril de 1883, Nietzsche parece ver com bons olhos a propos-
ta que Overbeck lhe faz de voltar a ensinar na Basiléia. Atente-se para o que ele diz: “Agora dê-me
um conselho: Overbeck preocupa-se muito comigo [...] fez-me recentemente a proposta de voltar
para a Basiléia, para ocupar um posto não na universidade, mas no Pädagogium, na qualidade
de professor de alemão. Esta proposta é boa a tal ponto que quase conseguiu me convencer; e
as minhas razões para aceitá-la fundamentam-se no clima e no ambiente. Overbeck diz-me que,
no caso de eu aceitar, não faltariam meios de renovar meu trabalho na Basiléia. Recordam-se de
mim com prazer e, para falar a verdade, não fui dos seus piores professores. Tomar-se-iam em
consideração, para regular a duração de meu trabalho, o estado de meus olhos e a minha pouca
resistência. A presença de Jacob Burckhardt, um dos poucos homens ao lado de quem gosto de
me sentir, incita-me também a aceitar a proposta de Overbeck.” (19). Mas, apesar da insistência de
Overbeck, Nietzsche nunca mais retomou sua profissão de professor.
SUMÁRIO 40
Tais elogios foram extraídos de relatos deixados pelos alunos
de Nietzsche. Para não perder a singularidade de cada olhar e sentir
afetividade com que foram ditos, nada melhor do que do que ler os
próprios depoimentos.
20 Esses depoimentos foram extraídos do livro de Genevieve Bianquis, “Nietzsche devant ses contem-
poraines”, e da biografia de Nietzsche por Curt Paul Janz.
SUMÁRIO 41
que estivesse ali para nos iniciar no mundo da beleza e do pensa-
mento grego, e, sempre que o abordávamos, o fazíamos com o maior
respeito. Sua maneira de se dirigir aos alunos nos era absolutamente
nova e despertava em nós o sentimento de nossa própria personali-
dade. Soube, desde o início, estimular-nos para que tivéssemos um
maior interesse pelo estudo, talvez mais ainda de maneira indireta,
pelo seu saber e pelo seu exemplo, do que de maneira direta, ao nos
declarar, por exemplo, que todo homem deveria pelo menos uma vez
na vida se dar ao trabalho de consagrar ao estudo um ano inteiro,
fazendo da noite o dia, e que esse ano tinha chegado para nós. Ele
não nos considerava em bloco, como uma classe ou um rebanho,
mas como jovens individualidades, e também nos convidava a
visitá-lo em sua casa.
Sua maneira de se exprimir, ponderada, solene, tão cui-
dada e, no entanto, tão natural, do mesmo modo que
todas as suas atitudes e seu comportamento, sua maneira
de abordar alguém, de cumprimentá-lo, era realmente
harmoniosa, de uma grande unidade de estilo, se isto
se pode dizer. Além disso, um de seus principais obje-
tivos era de nos estimular para uma atividade pessoal.
[...] O mais engraçado foi quando um dia nos apresen-
tou o seguinte enigma: Que é Filosofia, ou um filósofo?
Ninguém conseguiu responder e o próprio Nietzsche se
esquivou diante da pergunta. [...]
SUMÁRIO 42
imperfeição era uma forte miopia. Finalmente, o som
especial de sua voz, a rica modulação da fala, a espantosa
capacidade de síntese e a propriedade de expressão e
particularmente a sonoridade simpática de seu riso, tão
cordial, tão franco, tão sadio, sem vulgaridade, sem mal-
dade – um riso que jamais ouvi igual e que guardei intacto
na minha memória. [...]
SUMÁRIO 43
No semestre de 1872-73, éramos apenas dois alunos no
curso de retórica grega e latina. Por isso, Nietzsche nos
propôs ministrar o curso em sua casa. Reuníamo-nos
três noites por semana naquela casa confortável e ele-
gante, onde escutávamos, anotando-as, as frases que
ele nos ditava de seu caderno encapado de fino couro
vermelho. Às vezes, parava de falar, ora para refletir
sobre o que ele mesmo acabara de dizer, ora para nos
deixar assimilar bem o que fora dito. [...] Em cada curso,
sua exposição se concentrava exclusivamente sobre o
tema tratado, mas nós tínhamos, no entanto, por vezes,
a oportunidade, antes ou depois da exposição, de ouvi-lo
discorrer sobre os assuntos mais diversos. Claro que não
faltei a uma única aula.
SUMÁRIO 44
Outro depoimento aparece sob a forma de um artigo anô-
nimo num suplemento de domingo de 13 de outubro de 1929:
No início de 1869, o professor Visher, presidente do conse-
lho administrativo da Universidade da Basiléia, entrou na
classe seguido de um jovem de ombros largos, aspecto
robusto, altura média, pele bronzeada, cabelos castanhos,
testa alta e expressiva, com um grande bigode cuidado-
samente penteado. Através de grossos óculos de aro de
ouro, ele observava com seus grandes olhos, com um ar
um pouco tímido e assustado, os 18 jovens que fixavam
sobre ele olhares curiosos. [...] A despeito de seu gênio
calmo, tímido e modesto, Nietzsche podia, ao falar, deixar-
-se levar pela beleza de seu tema, a modo Sófocles, das
três às quatro. Nietzsche deu uma magnífica aula sobre
a tragédia grega. O entusiasmo o impedia de parar. Às
quatro e vinte, falava ainda, e nós o escutávamos mudos
de entusiasmo. Um aluno que tinha às quatro horas aula
de música olhava muitas vezes para o relógio. Nietzsche,
encabulado, retirou-se da sala, desculpando-se mil vezes.
Mas nós teríamos gostado de ouvi-lo ainda mais. [...]
SUMÁRIO 45
Um outro aluno de Nietzsche, também anônimo, deixa
seu relato, dessa vez para contar fatos engraçados ocorri-
dos em sala de aula:
Nietzsche pedira a seus alunos que lessem durante as
férias a descrição do escudo de Aquiles e que fizessem
espontaneamente um trabalho sobre ele. Na volta às
aulas, perguntou a um aluno: “Você leu a passagem em
questão?” O aluno, embaraçado, respondeu que sim, que
tinha lido o texto, embora não o tivesse lido. “Bem, então”,
disse Nietzsche, “descreva-nos o escudo de Aquiles”.
Durante o silêncio que se seguiu, Nietzsche deixou pas-
sar os dez minutos que lhe teriam sido necessários para
expor completamente o assunto, andando pela classe
lentamente, com um ar atento, como tinha costume de
fazer. Depois, sem perder uma palavra a mais, disse:
“Bom, agora que o senhor nos descreveu o escudo de
Aquiles, continuemos.”
SUMÁRIO 46
2
A INCULTURA
MODERNA
Toda reflexão de Nietzsche sobre a educação tem como
finalidade principal denunciar o fato de o saber ter se tornado
um luxo, um capital improdutivo com o qual nada se tem a fazer,
e protestar contra a “formação histórica” imposta à juventude na
Alemanha de Bismarck.
SUMÁRIO 48
filologia no nosso tempo, senão para lançar uma ação intempestiva
contra esta época, sobre esta época e, assim o espero, em benefício
do tempo que há de vir.”23
SUMÁRIO 49
Nas anotações feitas durante a primavera de 1873, um ano
antes da publicação da segunda “Extemporânea”, Nietzsche define
o filósofo como “médico da civilização”. Se a história faz parte, por
princípio, da natureza humana e seu excesso deixa o homem doente,
então se trata de vê-la segundo uma perspectiva médica. É preciso
saber até que ponto o estudo da história é comandado pela vida e
não por uma necessidade de “conhecimento puro”. O que Nietzsche
propõe para a cultura histórica é uma questão de dosagem. Não se
trata de negar o sentido histórico, mas de conter o seu domínio, de
conduzi-lo a uma justa medida. Absorvida em pequenas doses, ela
não envenena a vida nem a cultura, embora, em doses excessivas,
mate tudo o que quer nascer:
Para determinar em que medida o passado deve ser
esquecido, sob pena de se tornar o coveiro do presente,
é necessário conhecer a medida exata da força plástica
de um homem, de uma nação, de uma civilização, quer
dizer, a capacidade de crescer por si mesmo, de transfor-
mar e de assimilar o passado e o heterogêneo, de cica-
trizar suas feridas, de reparar suas perdas, de reconstruir
as formas destruídas.24
SUMÁRIO 50
daquele que vai ser.”25 Mas o homem de cultura histórica, diferente
do artista, utiliza-se da história para alijar o presente de sua efetivi-
dade: por toda parte, arrasta consigo as “indigestas pedras do saber”.
Desconhece a “força plástica” de que dispõe para digerir a multiplici-
dade de conhecimentos que pode armazenar sem perigo para o seu
desenvolvimento harmonioso, pois é ela que transforma em sangue
e carne todo o alimento intelectual e, de uma maneira geral, todas as
suas experiências. Orgulha-se de sua cultura histórica, porque esta o
coloca no fim da história.
SUMÁRIO 51
transformar os indivíduos em seres aptos a ganhar dinheiro e servir
de maneira eficiente a cultura vigente, fica a questão: onde encon-
trar educadores que possam trazer de novo para a vida a “ciência
da história”? A educação alemã tem como fundamento o saber, e a
utilidade – sua alma – exige de seus servidores uma atitude passiva
e receptiva. Como fundar, então, uma cultura autêntica?
SUMÁRIO 52
desenvolver “um sistema vivo e completo de experiências pessoais”,
tal desejo deverá ser abafado. Em compensação, terá a possibilidade
de, em poucos anos, acumular em si mesmo as experiências memo-
ráveis do tempo passado.
SUMÁRIO 53
artes. Pedem aos seus artistas que os sirvam como pratos
apimentados e temperados, condimentam-se com todas
as especiarias do Oriente e do Ocidente e, certamente,
exaltam então um perfume dos mais interessantes, chei-
ram ao mesmo tempo a Oriente e a Ocidente.30
SUMÁRIO 54
O homem moderno oscila entre dois polos: o exterior e
o interior. Ora apresenta-se, como diz Zaratustra, com “basófias e
enchendo o peito” para dissimular a pobreza do interior; ora quer
fazer acreditar que tem um rico interior e não o manifesta por modés-
tia. Desagregado e em ruína, dividido, desconfiando das sensações
que ainda não receberam o selo das palavras, o homem passa a ser
um organismo sem vida, que tem o direito de dizer “cogito ergo sum”
(penso, logo existo), mas não “vivo ergo cogito” (vivo, logo penso)32.
SUMÁRIO 55
hábitos, de tal modo que diga: “Que Deus me defenda de mim, da
natureza que me foi inculcada.” 33
SUMÁRIO 56
e medida. Ele tem de mostrar por que nasceu em determinada época
e não em outra, pois só desse modo fará justiça a seu próprio tempo.
Portanto, só deve respeitar uma única instituição: sua própria alma.
SUMÁRIO 57
sempre muitas outras máscaras; por trás de cada pele, muitas outras
peles: “Se é verdade que a lebre tem sete peles, o homem pode des-
pojar-se de setenta vezes sete peles e ainda não poderá dizer: eis
realmente o que você é, não é mais um invólucro.”34
SUMÁRIO 58
se tudo é testemunha de nosso ser, nossas amizades
e inimizades, nosso olhar e a pressão de nossa mão,
nossa memória e o que esquecemos, nossos livros e os
traços de nossa pena?36
SUMÁRIO 59
Quando outrora eu me abandonava à minha fantasia, a
fazer projetos, acredita que o terrível esforço, o temível
dever de me educar a mim mesmo, me seria poupado
pelo destino, porque, no momento oportuno, encontraria
um filósofo para me educar, um verdadeiro filósofo ao
qual se pudesse obedecer sem mais reflexão, em quem
se teria mais confiança do que em si mesmo. Em seguida,
é verdade, perguntava-me por quais princípios ele pode-
ria nortear minha educação. Perguntava-me o que ele
diria das duas máximas que estão em voga na nossa
época. Uma exige que a educação identifique desde cedo
o ponto forte de seus alunos e dirija então todas as suas
energias, todas as suas forças e todo o brilho do sol sobre
ele a fim de tornar madura e fecunda esta única virtude. A
outra máxima quer, ao contrário, que o educador tire par-
tido de todas as forças existentes, cultive-as e faça reinar
entre elas uma relação harmoniosa.38
SUMÁRIO 60
Na tentativa de superar sua época, Nietzsche sonhava encon-
trar um filósofo-educador que o ajudasse a educar a si mesmo. Esse
filósofo deveria ter por princípio ajudá-lo a descobrir sua “força cen-
tral” e impedi-la de exercer um domínio sobre todas as outras forças,
a ponto de excluí-las; um verdadeiro filósofo, capaz de elevá-lo acima
da deficiência do tempo presente, alguém que o ensinasse a ser
“simples e honesto no pensamento e na vida, portanto intempestivo
no sentido mais profundo da palavra.”39 Embora tal filósofo-educador
lhe faltasse, ele continuava procurando-o.
SUMÁRIO 61
Diante da desolação em que se encontra a cultura con-
temporânea, e na falta de verdadeiros “médicos da civilização”, de
“educadores liberadores”, Nietzsche busca um modelo, um iniciador.
Alguém que pudesse imitar, que não fosse um “manual encarnado”
nem uma “abstração encadernada”. O exemplo que procurava deve-
ria ser dado “pela vida visível e não apenas pelos livros; deveria, pois,
ser dado, como ensinavam os filósofos da Grécia, pela expressão do
rosto, atitude, vestuário, alimentação, costumes, mais ainda do que
por aquilo que é dito ou escrito.”42
SUMÁRIO 62
A DESCOBERTA DE SCHOPENHAUER
Em 1865, Nietzsche descobre Schopenhauer; não a presença
viva dele, mas um livro, “O mundo como vontade e representação”,
exposto na vitrine de uma livraria em Leipzig. Toma-o nas mãos e exa-
mina uma página. O vigor de uma frase, a exatidão com que as pala-
vras estavam escritas o perturbam. Sem saber quem era o demônio
que soprava a seu ouvido “Volta para casa com este livro”, compra-o.
SUMÁRIO 63
mesmo”45. Se quisermos imaginar um leitor para Schopenhauer, “que
fala para si mesmo”, devemos supor um filho sendo instruído pelo
pai: um discurso rude diante de um ouvinte que escuta com amor.
SUMÁRIO 64
O pensador solitário sabe que, em qualquer circunstância, continu-
ará a perecer ainda mais diferente do que é; ainda que só queira
ser leal consigo mesmo, estará privado de tudo o que o homem
normalmente deseja: a segurança de uma carreira fácil, a honra e
o reconhecimento. Seu destino será o isolamento; onde quer que
viva, viverá num deserto ou numa caverna. Se por medo da solidão
abdicar de seu “gênio” e deixar afrouxar as rédeas de seu talento,
sucumbirá como homem e viverá como um fantasma em meio às
opiniões científicas.
A IMITAÇÃO CRIADORA
À primeira vista, pode parecer estranho ouvir Nietzsche
recomendar aos que querem se educar que procurem um modelo
para imitar. É bom lembrar que Nietzsche critica o “filisteu da cultura”
justamente pelo fato de ser um imitador, um espectador da vida e do
pensamento alheio, e não autor de sua vida e de seus pensamentos.
Para evitar mal-entendidos, é preciso compreender a que tipo de
SUMÁRIO 65
imitação Nietzsche se refere, e como se aproximar de um modelo
que ao mesmo tempo eduque e eleve.
48 Lacoue-LABARTHE, Philippe, “L’Imitation des Modernes”, p. 101. Labarthe usa, neste texto, o conceito de
mimesis como sinônimo de imitação e também de imitação ativa, isto é, de recriação da realidade.
SUMÁRIO 66
tornou possível sua criação. É a imitação da “história monumental”,
isto é, do que é exemplar e digno de ser imitado, e deve visar “a
superar o modelo”. Imitar o modelo quer dizer mimetizar sua força
criadora e transformadora. O exemplo é um estímulo para a ação e
para uma nova configuração.
SUMÁRIO 67
compreender um pouco melhor através de Schopenhauer; é por
isso que lhe devo o maior reconhecimento.”51 Em segundo lugar,
tornar-se ele mesmo – Nietzsche. Para resolver um problema de
educação, para exprimir ideias inusitadas, Nietzsche foi obrigado a
balbuciar em voz estrangeira, a usar a máscara de Schopenhauer.
Para tornar-se um, para fazer a psicologia do erudito, teve necessi-
dade de ser muitas coisas em muitos lugares, teve necessidade de
ser também um erudito.
SUMÁRIO 68
OS PRECONCEITOS DA EDUCAÇÃO
Duas correntes, aparentemente opostas, mas igualmente
nefastas em seus resultados, dominam os estabelecimentos de ensino
alemães. De um lado, a ampliação tanto quanto possível da cultura;
de outro, a sua redução e enfraquecimento. A primeira tendência
procura levar à cultura um número cada vez maior de indivíduos. A
segunda exige que a cultura abandone suas pretensões à soberania
e se consagre à defesa dos interesses do Estado. Assim, adquirir
cultura significaria capacitar os indivíduos a ganhar dinheiro, pôr
rapidamente mãos à obra ou então ingressar nos quadros do Estado.
SUMÁRIO 69
Como ela é menos esbanjada?”53 De antemão, descarta a possibili-
dade de a vida adquirir valor devotando-a ao Estado; pois o Estado,
diz ele em “Assim falou Zaratustra”, é o lugar “onde o lento suicídio
de todos chama-se ‘vida’.” A vida só tem sentido quando se vive
pelo exemplar mais raro, e não em proveito do grande número, que,
tomado isoladamente, constitui-se de exemplares de menor valor. Se
a natureza tem por finalidade criar o “exemplar individual superior”,
por que a cultura não teria o mesmo objetivo? Afinal, a meta da cul-
tura não seria ajudar a natureza em sua tarefa?
SUMÁRIO 70
deveriam tocar a todos, e mesmo estas poucas não são atingidas
com a força que o filósofo e o artista imprimiram ao seu projétil.”55
SUMÁRIO 71
O GÊNIO
SUMÁRIO 72
investido de uma missão cósmica de preservar a vida e fazê-la fruti-
ficar. Ultrapassa a compreensão, mas não a percepção dos homens.
OS TRÊS EGOÍSMOS
Os setores que promovem a cultura deveriam ter como
meta a criação do gênio. Entretanto, sua finalidade é outra. Esse
desvio ocorre, segundo Nietzsche, por interferência de três egoís-
mos: o egoísmo das classes comerciantes, o egoísmo do Estado e
o egoísmo da ciência.
SUMÁRIO 73
do negócio, eles devem ser educados de modo a saber exatamente
o que exigir da vida e aprender a ter um preço como qualquer outra
mercadoria. Assim, para que os homens tenham uma parcela de feli-
cidade na Terra, não se deve permitir que possuam mais cultura do
que a necessária ao interesse e ao comércio mundial.
■ O egoísmo do Estado
■ O egoísmo da ciência
SUMÁRIO 74
próprias botinas; preocupado com as mais minúsculas questões
– por exemplo, com o “cérebro da sanguessuga” –, transforma o
próprio conhecimento numa sanguessuga que escarifica e mutila a
própria vida. Com a pretensão de tudo julgar objetivamente, disseca,
apalpa, despedaça; em suma, anatomiza o que chama de realidade e
reza a ladainha dos “coveiros do presente”: “Tudo merece perceber”.
A CIÊNCIA E O CIENTISTA
A concepção de ciência não se mantém inalterada ao longo
da obra de Nietzsche. No período que vai aproximadamente de
1870 a 1876, a ciência é o saber que destrói as ilusões salutares à
sobrevivência dos homens.
SUMÁRIO 75
Nietzsche, com a acuidade de um grande psicólogo, fareja
as entranhas da alma do cientista e revela suas qualidades mais
fundamentais. Destas, a primeira é a retidão e simplicidade. A sim-
plicidade do cientista não vale grande coisa. No campo da ciência,
raras vezes é fecunda, pois se prende ao habitual. Como tudo o que
é novo exige uma mudança de ponto de vista, a honestidade da
qual os cientistas costumam gabar-se venera a opinião em curso,
acusando a falta de juízo de quem defende o novo. A doutrina de
Copérnico, por exemplo, encontrou oposição porque tinha contra ela
o hábito. A segunda qualidade do cientista é a perspicácia para as
coisas que se encontram ao alcance de seus olhos, aliada à maior
miopia quando trata de julgar algo fora de seu campo de visão. Só
vê pedaços e limita-se a deduzir sua coesão. Está condenado a ver
fragmentos e nunca a totalidade.
SUMÁRIO 76
cientista comum não sabe o que fazer com ele. Procura os livros,
escuta o que os outros pensaram e se diverte com tal ocupação.
SUMÁRIO 77
humanas. Conclui-se daí que não existem instituições para a verda-
deira cultura, ou seja, para aperfeiçoar a natureza e acelerar a vinda
do filósofo e do artista – em suma, do gênio.
SUMÁRIO 78
A educação moderna é, para Nietzsche, sinônimo de domes-
ticação. O ideal desse tipo de educação é formar o jovem para ser
“erudito”, comerciante ou funcionário do Estado, transformá-lo em
uma criatura dócil e frágil, indolente e obediente aos valores em
curso. Quando concebida como “adestramento seletivo”, a educa-
ção tem outros objetivos. Adestrar um jovem significa fazê-lo obe-
decer a certas regras e adquirir novos hábitos, torná-lo senhor de
seus instintos e hierarquizá-los, de modo que o instinto de “saber a
qualquer preço” não se sobreponha. O produto desse adestramento
não é um indivíduo fabricado em série, adaptado às condições de
seu meio, a serviço das convenções do Estado e da Igreja, mas um
ser autônomo forte, capaz de crescer a partir do acúmulo de forças
deixadas pelas gerações passadas, capaz de mandar em si mesmo,
sem precisar recorrer a qualquer instância autoritária. Tem-se, então,
alguém que se atreve a ser ele mesmo e a destacar-se do homem
comum, capaz de agir voltado para o futuro, e não apenas para a
sociedade existente.
SUMÁRIO 79
com esta questão: o que é a ciência para nós?, e não: o que somos
nós pra a ciência?” 64
SUMÁRIO 80
3
EDUCAÇÃO
E CULTURA
TENDÊNCIAS QUE MINAM A EDUCAÇÃO
Em suas conferências “Sobre o futuro de nossos estabele-
cimentos de ensino”, Nietzsche examina, tal como um arúspice, as
entranhas do sistema educacional de sua época. O Estado e os
negociantes são os primeiros grandes responsáveis pela depau-
peração da cultura. Eles entravam a lenta maturação do indivíduo,
a paciente “formação de si”, que deveria ser a finalidade de toda a
cultura, exigindo uma formação rápida, para terem a seu serviço fun-
cionários eficientes e estudantes dóceis, que aprendam rapidamente
a ganhar dinheiro. Mas isso não é tudo. Exigem também uma educa-
ção aprofundada, que lhes permita boa especialização para poderem
ganhar ainda mais dinheiro. A pressa indecorosa leva os estudantes,
numa idade em que ainda não estão amadurecidos o suficiente, a se
perguntarem qual profissão devem escolher.
SUMÁRIO 82
seja seguido o dogma da economia política: “tanto conhecimento
e cultura quanto possível – logo tanta produção e necessidade
quanto possível – daí tanta felicidade quanto possível: eis mais
ou menos a fórmula.”65
SUMÁRIO 83
Nietzsche adverte: não confundam cultura de massa com cul-
tura popular67. Elas não são sinônimas: “Pela instrução elementar obriga-
tória para todos, não se chega ao que se chama de cultura popular a não
ser de uma forma grosseira e artificial.” Segundo Nietzsche, a cultura
popular é a que está ligada à terra natal e aos costumes locais: “onde
o povo conserva seus instintos religiosos, onde continua a trabalhar no
sistema poético de suas imagens míticas, em que permanece fiel aos
seus costumes, ao seu direito, ao solo de sua pátria, a sua língua.”68
SUMÁRIO 84
se poder fundar nenhuma “hierarquia natural”, nenhum privilégio,
nenhum respeito ao gênio.
SUMÁRIO 85
para uma reformulação desse ensino. Ele vê na aprendizagem cons-
cienciosa da língua materna e da arte de escrever uma das tarefas
essenciais da escola secundária. O tempo em que se falava bem pas-
sou. A língua alemã encontra-se contaminada pelo “pretenso estilo
elegante” do jornalismo. Todas as pessoas falam e escrevem mal. O
acesso dos semiletrados ao poder provocou uma drástica redução
da riqueza e dignidade da língua. A questão, no entanto, não é ape-
nas de pobreza vocabular – trata-se também da má utilização dos
recursos oferecidos pela língua.
SUMÁRIO 86
São meses penosos; teme-se que as fibras se rompam,
perde-se toda esperança de executar algum dia cômoda
e facilmente os movimentos e posições dos passos que
se aprendem artificial e conscientemente; vê-se com
terror como se é grosseiro e desajeitado em colocar um
pé diante do outro e teme-se ter desaprendido qual-
quer forma de caminhar e de nunca aprender a correta.
E súbito se percebe que os movimentos artificialmente
estudados tornaram-se um novo hábito e uma segunda
natureza e que a segurança e a força que tinha antiga-
mente o passo vêm reforçadas e mesmo acompanhadas
de uma certa graça; sabe-se então como é difícil marchar
e pode-se debochar do empírico grosseiro ou do diletante
da marcha com gestos elegantes.72
SUMÁRIO 87
língua, mas não forma; combinaram engenhosamente a gramática e a
ausência de humor; transformaram a palavra alemã num peso morto.
SUMÁRIO 88
para isso. É no trabalho com a língua que se pode perceber o apreço
ou o despareço de uma cultura pela arte. Nas escolas alemãs, quase
nada resta da herança de Goethe, nem se sente a preocupação em
se formar uma língua artística.
SUMÁRIO 89
si mesmos antipedagógicos. Nietzsche alerta para o pecado origi-
nal que a pedagogia comete contra o espírito do educando, quando
exige que este produza redações a partir de uma lista de temas; essa
atividade, além de estéril, vai comprometer todo texto literário que
ele porventura venha a escrever.
SUMÁRIO 90
formar e exercer as qualidades indispensáveis à criação. Todos
os escritores são grandes trabalhadores, escreve Nietzsche em
“Humano, demasiado humano”. Por isso, “evitem falar de dons natu-
rais, de talentos natos. Podem-se citar nomes de grandes homens,
em diferentes domínios, que foram pouco dotados, mas eles
adquiriram essa grandeza, tornaram-se, fizeram-se gênios.”74 E isso
graças a uma paciente consciência do trabalho do artesão, daquele
que aprende perfeitamente a formar as partes, antes de se arriscar a
formar um grande conjunto.
SUMÁRIO 91
Há, segundo Nietzsche, um “remédio escondido” na insti-
tuição do Gymnasium, remédio que, de certa forma, pode contribuir
muito para a renovação do estudo da língua alemã – os exercícios
de tradução do latim: “É com eles que se aprende o respeito por
uma língua ficada pelas regras, pela gramática e pelo léxico. É aí que
se aprende o que é um erro.”77 A disciplina gramatical certamente
não pode proporcionar o sentimento de beleza helênica, escreve
Nietzsche, mas dá uma noção de erro gramatical e de regra. O hábito
da tradução afina os ouvidos para as nuanças da palavra, fecunda a
língua e, embora não ensine a escrever com originalidade, habitua o
estudante a ler com sentimento artístico. Infelizmente, esse remédio
aos poucos está desaparecendo do Gymnasium – ou, então, não vem
sendo ministrado corretamente.
SUMÁRIO 92
CRÍTICAS AOS ESTABELECIMENTOS
DE ENSINO
Nietzsche não vê com hostilidade a implantação e a pro-
liferação na Alemanha das escolas técnicas. Pelo contrário: ali, os
indivíduos aprendem a calcular convenientemente, a dominar a lin-
guagem para a comunicação e adquirem conhecimentos naturais e
geográficos. Em suma, de certo modo, elas cumprem, e com retidão,
seu objetivo, que é o de formar negociantes, funcionários, oficiais,
agrônomos, médicos e técnicos. O que Nietzsche censura, ao afir-
mar que a cultura não é “serva do ganha-pão e da necessidade”, é
o fato de o Gymnasium e a universidade se terem voltado para a
profissionalização e, apesar disso, continuarem a acreditar que são
lugares destinados à cultura, quando na verdade não se distinguem
muito da escola técnica em seus objetivos.
79 Friedrich August Wolf (1759-1824) fez uma reforma no ensino secundário alemão e muito contribuiu
para o desenvolvimento dos estudos clássicos na Alemanha.
80 Friedrich NIETZSCHE, Sobre o futuro de nossos estabelecimentos de ensino, p. 150.
SUMÁRIO 93
de nossas universidades, ele pergunta primeiramente, com insistên-
cia: “Como o aluno está ligado à universidade?” Respondemos: “Pelo
ouvido, é um ouvinte.” O estrangeiro se espanta. “Apenas pelo ouvido?”,
pergunta mais uma vez. “Apenas pelo ouvido”, respondemos mais
uma vez. “O estudante ouve.”81 Neste pequeno diálogo, está contido
o essencial do ataque de Nietzsche à universidade. Os estudantes
creem-se livres e autônomos, quando, na verdade, estão presos pelo
ouvido e deixados a sua própria sorte: sem guias e autossuficientes.
SUMÁRIO 94
O estilo “acromático”86 de ensino é justamente o oposto do
que Nietzsche entende que deva ser a educação na universidade. Ali,
onde se deveria exigir do aluno um treinamento rigoroso, inventou-se
a autonomia. Tal autonomia nada mais é do que uma domesticação
do aluno, para torná-lo uma criatura dócil e submissa aos interesses
do Estado e da burguesia.
86 Nietzsche denomina acromático o método de ensino que privilegia a exposição oral do professor
e a audição do aluno.
87 Friedrich NIETZSCHE, Sobre o futuro de nossos estabelecimentos de ensino, p. 152.
SUMÁRIO 95
É necessário conter a tendência histórico-científica e pro-
fissionalizante na universidade – tendência que exige da educação
um preparo mais rápido, aprofundado apenas o bastante para trans-
formar os indivíduos em servidores eficientes – e fazer com que a
instituição se volte para os problemas da cultura, ou seja, para as
questões essenciais colocadas pela condição humana. Dessa forma,
Nietzsche propõe que se investigue como essas questões estão
colocadas no conjunto da arte e da filosofia, as únicas disciplinas
capazes de moderar a feição histórico-científica que se espa-
lha pela universidade.
A CIÊNCIA E A ARTE
A universidade não tem nenhum comportamento que indi-
que seu apreço pela arte, afirma Nietzsche. Isso não quer dizer
que ali não haja professores com inclinação ou gosto pela arte. O
problema é que, apesar de existirem matérias que ensinem histó-
ria da arte, a universidade não pode dar ao estudante um “ades-
tramento artístico”88.
SUMÁRIO 96
Ao instinto desenfreado da ciência, que tudo quer conhecer,
que revira a vida e a vasculha em seus mínimos detalhes, Nietzsche
opõe a arte. Esta, ao contrário da ciência, não se interessa por tudo o
que é “real”, não quer tudo ver, nem tudo reter – é anticientífica.
SUMÁRIO 97
A FILOSOFIA
Se a universidade não abre suas portas para a arte, tam-
bém não as abre para a filosofia. A esse respeito, a tese principal de
Nietzsche é a seguinte: o ensino universitário da filosofa não prepara
o estudante para pensar, agir e viver filosoficamente; pelo contrá-
rio, o “instinto natural filosófico” é imobilizado pela cultura histórica.
Na universidade, a filosofia está “política e policialmente limitada à
aparência erudita”. Por isso, “permanece no suspiro ‘mas se...’, ou no
reconhecimento: ‘era uma vez’. 89
SUMÁRIO 98
da filosofia, interessados em pensar no que seus interesses materiais
exigem e no que convém ao Estado e à religião. Nietzsche retoma e
aprofunda as críticas de Schopenhauer quanto à relação da filosofia
com o Estado e a cultura histórica.
SUMÁRIO 99
um público como mestres no assunto, especialistas em filosofia e,
portanto, verdadeiros filósofos, que podem escolher e ensinar o que
julgam ser digno da atenção de suas audiências.
SUMÁRIO 100
por exemplo, uma forma determinada de religião, a ordem
social, a organização militar.93
SUMÁRIO 101
dizer, pois nem o professor nem o aluno pensam por si mesmos. A
cultura histórica e científica foi planejada pelo sistema universitário
para preencher qualquer lacuna. Há mesmo quem acredite que o
filósofo universitário não precisa ser um pensador, constituindo no
“máximo um repensador e um pós-pensador”95, um conhecedor eru-
dito de todos os pensadores, com os quais sempre poderá contar
para poder dizer algo aos seus alunos.
SUMÁRIO 102
nunca verá as coisas pela primeira vez e nunca será ele próprio uma
tal coisa vista pela primeira vez.”97
SUMÁRIO 103
O FILÓSOFO E O ARTISTA
RECLAMAM SEUS DIREITOS
Se a filosofia deixou de ter um lugar ao sol, como restituir-lhe
seus direitos? Em “A filosofia na época trágica dos gregos”, Nietzsche
incita o homem corajoso a repudiar e a banir a filosofia com palavras
semelhantes às que Platão utilizou para expulsar os poetas trágicos
de seu Estado – mas com a condição de que ela, como os poetas
trágicos, pudesse falar e defender-se. Ela poderia dizer então:
Povo miserável! É culpa minha se em vosso meio vaguei
como uma cigana pelos campos e tenho de me esconder
e disfarçar, como se fosse eu a pecadora e vós meus juí-
zes? Vede minha irmã, a Arte! Ela está como eu: caímos
entre bárbaros e não sabemos mais nos salvar. Aqui nos
falta, é verdade, justa causa: mas os juízes diante dos quais
encontraremos justiça têm também jurisdição sobre vós e
vos dirão: – Tende antes uma civilização, e então ficareis
sabendo vós também o que a Filosofia quer e pode.101
SUMÁRIO 104
cerrados), pois tem contra si o espírito gregário organizado, o qual
teme ver abalado tudo o que o mantém vivo.
SUMÁRIO 105
com que, por todo o país, se honra a memória de seus gênios.
Mas, ao deduzir daí que não é preciso fazer nada pelo gênio, con-
dena-se à morte tudo o que vive e estabelece-se o raciocínio de
que tudo já está feito.
102 Heinrich von Kleist (1777-1811), poeta e dramaturgo alemão. Ingressou no exército prussiano
em 1792. Depois de sete anos, abandonou a carreira militar, entregando-se ao estudo da física,
matemática, direito, latim e filosofia. A leitura de Kant provocou a primeira grande crise de sua
vida, destruindo-lhe a confiança no valor do conhecimento e mostrando-lhe a impossibilidade
de atingir a verdade absoluta. Em 1801, partiu precipitadamente para Paris e daí para a Suíça, com
propósito de se fazer lavrador e pôr em prática o ideal de Rousseau. A partir de então, levou uma
vida de errante. Profundamente desiludido consigo mesmo e com a evolução dos acontecimentos
políticos, amargurado pela incompreensão dos contemporâneos e dos próprios familiares, decidiu
suicidar-se, juntamente com Henriette Vogel, sua amiga íntima, atacada de doença incurável. Suas
principais obras: Penthesilea (1807) e Prinz Fr. V. Hamburg (1810).
SUMÁRIO 106
Será, pergunta ainda Nietzsche, que os alemães podem pro-
nunciar o nome de Schiller103 sem corar? Será que a cor de sua face
tingida pela morte não diz nada aos que o elogiam?
103 Johann Friedrich von Schiller (1759-1805), poeta e dramaturgo alemão. Influenciado pelas espe-
culações estéticas de Kant, escreveu “Sobre o encanto e a dignidade”, “Sobre a poesia ingênua
e poesia sentimental”. A maior peça da dramaturgia alemã é sua obra-prima, a trilogia histórica
Wallenstein (1800). Dentre suas obras de dramaturgia, até hoje encenadas com sucesso, des-
tacam-se também Maria Stuart (1801) e Wilhelm Tell (1804; Guilherme Tell). Foi muito amigo de
Goethe. Sua obra é muito popular na Alemanha.
SUMÁRIO 107
CONCLUSÃO
“Educar os educadores”
Mas os primeiros devem começar
por se educar a si próprios.
e é para esses que eu escrevo.”
Nietzsche, Fragmentos póstumos: primavera-verão de 1875
SUMÁRIO 108
valores da educação e, com isso, destruiu as convicções que susten-
tavam o sistema educacional de sua época.
SUMÁRIO 109
pensamento, pode-se tomar Nietzsche como exemplo, assim como
ele tomou os gregos? E mais: o que significa tomá-lo como exemplo?
SUMÁRIO 110
REFERÊNCIAS
Obras de Nietzsche
Assim falou Zaratustra. Trad. Mário da Silva. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977.
Considérations inactuelles I et II. In: Fragments posthumes: été 1872 - hiver 1873-1874.
Trad. Pierre Rusch. Paris: Gallimard, 1990.
Considérations inactuelles III et IV. In: Fragments posthumes: début 1874 - printemps
1876. Trad. Henry-Alexis Baatsch, Pascal David, Cornélius Heim, Philippe Lacoue-Labarthe
et Jean-Luc Nancy Paris: Gallimard, 1988.
Correspondance I: juin 1850 - avril 1869. Trad. Henry-Alexis Baatsch, Jean Bréjoux,
Maurice Gandillac. Paris: Gallimard, 1986.
Correspondance II: avril 1869 - décembre 1874. Trad. Jean Bréjoux, Maurice Gandillac.
Paris: Gallimard, 1986.
Ecce homo. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo, Max Limonad, 1985.
Fragments posthumes: Automne: 1887 - Mars 1888. Trad. Pierre Klossowski. Paris:
Gallimard, 1976.
Fragments posthumes: Début 1888 - Janvier 1889. Trad. Jean-Claude Hémery. Paris:
Gallimard, 1976.
SUMÁRIO 111
La philosophie à l’époque tragique des grecs. In: Écrits posthumes: 1870-1873. Trad.
Jean-Louis Backes, Michel Haar et Marc B. de Launay, Paris: Gallimard, 1975.
Biografias de Nietzsche
(2) JANZ, Curt Paul. Nietzsche biographie. Trad. De Launay. Paris: Gallimard, 1984, 3
volumes.
Sobre Nietzsche
(4) ANDLER, Charles. Nietzsche, sa vie et sa pensée. Paris: Gallimard, 1958, 3 volumes.
SUMÁRIO 112
(10) KOFMAN, Sarah. Nietzsche et la métaphore. Paris: Payot, 1972.
(13) LACOUE-LABARTHE, Philippe. L’imitation des modernes. Paris: Éd. Galilée, 1986.
(14) LEBRUN, Gérard. “Por que ler Nietzsche hoje?”. In: Passeios ao léu. São Paulo:
Brasiliense,1983.
SUMÁRIO 113
ÍNDICE REMISSIVO
A E
adestramento 14, 78, 79, 86, 87, 88, 91, 92, 96, 97 economistas 69
Alemanha 13, 22, 24, 25, 27, 30, 32, 37, 43, 48, 53, 55, 88, 93, 107 educação 12, 13, 14, 16, 18, 24, 26, 33, 38, 48, 51, 52, 53, 55, 59,
alma 52, 57, 63, 66, 72, 73, 76 60, 61, 68, 69, 72, 77, 78, 79, 81, 82, 83, 85, 87, 92,
95, 96, 97, 103, 108, 109, 110
arte 14, 17, 20, 24, 27, 31, 32, 33, 35, 36, 37, 43, 52, 80, 86, 89,
96, 97, 98, 109 educadores 25, 34, 38, 52, 61, 62, 65, 76, 95, 108
artista 23, 50, 51, 66, 70, 71, 78, 104, 110 egoísmo 73, 74, 77
autonomia 90, 93, 95 ensino 10, 12, 13, 14, 16, 28, 33, 41, 43, 48, 68, 69, 72, 73, 74, 78,
82, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 92, 93, 94, 95, 96,
B 98, 103, 105, 108
Beethoven 80, 106 escolaridade 15, 16, 18
C escolas técnicas 93
capacidade crítica 19, 110 especialização 19, 23, 82, 83
cátedra 20, 25, 26, 27, 39 espírito 10, 14, 17, 21, 27, 32, 38, 54, 55, 72, 77, 85, 90, 93, 104,
ciência 11, 14, 19, 20, 21, 32, 52, 73, 74, 75, 76, 77, 79, 80, 82, 86, 105, 107
96, 97, 103 Estado 24, 52, 64, 69, 70, 73, 74, 77, 79, 82, 83, 94, 95, 99, 100, 101,
cientista 74, 75, 76, 77 102, 103, 104, 105, 108
civilização 31, 50, 62, 80, 88, 104, 105 F
classes 10, 20, 73, 84 filologia 10, 18, 19, 20, 21, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 38, 39, 49, 98
comerciantes 73, 77, 82 filosofia 10, 14, 24, 25, 27, 31, 33, 35, 41, 52, 54, 58, 64, 96, 98, 99,
composição alemã 85, 89 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 109
conhecimento 10, 16, 23, 34, 40, 50, 52, 54, 62, 71, 72, 74, 75, 77, formação humanista 12, 108
83, 96, 97, 106, 109, 110 G
consciência 34, 39, 57, 91 gênio 26, 45, 52, 56, 64, 65, 69, 71, 72, 73, 78, 79, 83, 84, 85, 101,
conspiração do silêncio 64, 100, 105 105, 106, 107
convento laico 25 Germânia 17, 24
corpo e espírito 55 Goethe 22, 32, 48, 62, 63, 64, 89, 106, 107
cultivo de si 59, 67, 68, 78 grego 10, 16, 38, 41, 42, 46
cultura artificial 49, 55, 58 Gymnasium 14, 26, 85, 86, 87, 88, 89, 92, 93
cultura histórica 48, 49, 50, 51, 54, 66, 87, 89, 98, 99, 102 H
cultura jornalística 14, 83, 88 hebraico 16
D história 10, 17, 22, 32, 34, 48, 49, 50, 51, 52, 54, 55, 56, 62, 66, 67,
domesticação 78, 79, 95 76, 80, 96, 98, 99, 102, 103, 109
SUMÁRIO 114
Hölderlin 16, 17, 32, 89, 106 P
Homero 22, 41, 89 Pädagogium 10, 12, 20, 22, 27, 38, 39, 40, 41
humanidade 17, 20, 61, 68, 69, 74, 78 poetas 16, 17, 89, 104
I profanação 14, 88
imitação 54, 65, 66, 67 professores 14, 17, 20, 23, 25, 29, 33, 40, 84, 88, 89, 90, 96, 97,
98, 99, 101
individualidade 57, 59
profissionalização 92, 93, 95, 108
L
pseudocultura 13, 53
latim 16, 92, 106
R
Lessing 32, 89, 106
realidade 66, 75, 97, 109
liberdade acadêmica 94, 95
rebanho 21, 42, 56, 60
língua alemã 14, 32, 43, 86, 88, 91, 92
renovação cultural 13, 22, 24, 25, 27, 84
linguagem 45, 84, 88, 93
Ritschl 19, 20, 28
língua materna 86, 88, 108
Romantismo 58
literatura 16, 17, 18, 34, 41, 52
literatura alemã 17 S
Schiller 16, 17, 32, 89, 107
M
Schopenhauer 10, 19, 21, 22, 32, 33, 34, 37, 54, 56, 58, 59, 60, 61,
máscaras 57, 58
62, 63, 64, 65, 67, 68, 70, 71, 72, 73, 98, 99, 100, 101,
massa 18, 39, 45, 50, 58, 84, 89, 103 102, 103, 104, 106
mercado de trabalho 69, 108 simplicidade 61, 76
mestre 19, 22, 30, 41, 83, 87 singularidade 41, 56, 58
mimesis 66 sistema educacional 12, 13, 23, 29, 53, 55, 82, 92, 95, 107, 109
música 10, 16, 17, 18, 27, 36, 43, 45, 80, 85, 97, 106 sociedade 17, 24, 31, 32, 34, 36, 39, 58, 64, 68, 71, 79, 104, 105
N T
nacionalismo 32, 54 Teógnis 10, 19
natureza 17, 50, 55, 56, 57, 70, 71, 72, 76, 78, 79, 83, 87, 99, 105, 106 teologia 10, 19, 51
Naumburg 10, 16 Tribschen 10, 22, 23, 27, 36, 37
Nietzsche 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25,
U
26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39,
40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, Universidade da Basiléia 11, 18, 25, 28, 30, 37, 39, 45
55, 56, 57, 58, 59, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, V
70, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 82, 83, 84,
virtude 55, 56, 60
85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98,
99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, vulgarização 12, 69
110, 111, 112, 113 W
O Wagner 10, 11, 22, 23, 27, 28, 29, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38,
originalidade 54, 79, 90, 92 43, 67, 106
SUMÁRIO 115