Dissertação VictorLinoBernades Corpo Sentido - Corporeidade e A Emergência de Recursos Subjetivos Associados À Criatividade
Dissertação VictorLinoBernades Corpo Sentido - Corporeidade e A Emergência de Recursos Subjetivos Associados À Criatividade
Dissertação VictorLinoBernades Corpo Sentido - Corporeidade e A Emergência de Recursos Subjetivos Associados À Criatividade
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
BRASÍLIA-DF
2016
1
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
Orientadora:
2
UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________
Orientadora: Profª. Drª. Albertina Mitjáns Martínez
Universidade de Brasília - Faculdade de Educação
______________________________________________________
Examinador: Prof. Dr. Alexandre Luiz Gonçalves de Rezende
Universidade de Brasília - Faculdade de Educação Física
______________________________________________________
Examinadora: Profª. Drª. Vera Margarida Lessa Catalão
Universidade de Brasília – Faculdade de Educação
______________________________________________________
Suplente: Profª. Drª. Maristela Rossato
Universidade de Brasília – Instituto de Psicologia
3
AGRADECIMENTOS
4
RESUMO
ABSTRACT
The present work tries to understand the impact of the Corporeity and Corporeal
Expression course and the Universitary Extension Project Movi-mente in the
subjectivity of the participants, focusing in the emergence of subjective resources
associated with creativity. The theoretical aproach used in the research was the
Subjectivity Theory developed by González Rey, the conception of creativity as a
complex subjectivity process developed by Albertina Mitjáns Martínez and the
humanist psychology developed by Abraham Maslow and Carl Rogers. The research
characterized as Case Study, was realized using the principles of Qualitative
Epistemology where the production of the aknowledge happens through the
constructive-interpretative analyses. In the course/project the body has a multicultural
5
and spiritual approach, the body becomes a laboratory with the purpose to develope
body awareness and achieve the meditative expirience. It was realized an intense
fieldwork wich included our participation in the classes and practices. The case study
was made with two subjects using the instruments: conversasional dynamics, frase
accomplishment, documental analyses, facebook analyses and composition. Through
the case analyses we were able to articulate a relation between Corporeity, Subjectivity
and Creativity. We observed how an expirience where corporeal practices are used with
the purpose of self-aknowledge, had na impact in the subjectivity of the participants
contributing for the emergence of subjective resources associated with creativity.
6
Sumário
INTRODUÇÃO.......................................................................................................9
I – APORTES TEÓRICOS..........................................................................................18
3. CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA...................................................................60
3.1 Objetivos.......................................................................................................60
3.2 Epistemologia Qualitativa............................................................................60
3.3 Estudo de caso..............................................................................................62
3.4 Contexto de Pesquisa: O curso Corporeidade e o projeto de extensão
Movi-mente..................................................................................................62
3.5 Construção do cenário social de pesquisa....................................................69
3.6 Instrumentos.................................................................................................69
3.7 Participantes.................................................................................................74
3.8 Procedimentos..............................................................................................74
3.9 Formas de análise/ construção da informação.............................................77
4. ANÁLISE E CONSTRUÇÃO DA INFORMAÇÃO................................................78
4.1 Caso Valkyria................................................................................................79
4.2 Caso Raíza.....................................................................................................99
7
4.3 Análise integrativa dos casos.......................................................................107
5. IMPERMANENTES CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................112
REFERÊNCIAS...........................................................................................................119
ANEXOS.......................................................................................................................124
APÊNDICE..................................................................................................................141
8
INTRODUÇÃO
Alguns autores categoricamente afirmam que o ser humano moderno vive uma
crise multidimensional, uma crise de percepção (CAPRA; EICHEMBERG, 2006); uma
crise epistemológica (MORIN, 2007). A crise enfrentada pelo seres humanos se
expressa na ausência de uma existência humana capaz de perceber a interdependência
inerente a tudo o que existe, o fio sutil que liga todas as coisas (MORIN, 2000). Nos
tornamos insensíveis às nossas emergências individuais e coletivas.
9
Não há dúvidas de que tal visão teve significativa contribuição na produção de
conhecimentos e tecnologias que tem sua utilidade para a humanidade, porém acabamos
por perder a perspectiva que percebe aquilo que está integrado e as relações existentes
entre o observador e observado. Na perda da percepção das relações, também perdemos
a habilidade de nos relacionarmos com os acontecimentos de maneira complexa.
O momento limite ou de crise se torna crucial, pois nele teremos que usar nossa
criatividade e imaginação para construirmos a ponte que nos conduzirá à transcendência
do vivido ou como diria o físico Amit Goswami (2008), nos possibilitará o salto
quântico rumo a um novo nível de complexidade e organização. Seja lá qual forem as
limitações que uma pesquisa possa vir a elencar ou a crise que ela possa vir a expressar,
saberemos que, sempre, ao final, o que possibilitará sua transcendência será justamente
a fantástica faculdade humana de criar alternativas para a superação de seus limites.
10
bem-estar das próximas gerações, hemos de convir que se torna inalienável aos seres
humanos uma educação que lhes permita o desenvolvimento e expressão de sua
sensibilidade e criatividade.
11
O paradigma newtoniano-cartesiano, para conhecer corpo e mente os separou,
atribuindo o corpo à biologia e à nossa dimensão psicológica reservamos os campos da
filosofia ou da psicologia que, justamente em função da ausência do que julgavam ser
científico, caminha arduamente para constituir-se enquanto ciência e para isso se
centrou-se majoritariamente numa perspectiva comportamental (GONZÁLEZ REY,
2003).
O que nos desperta interesse no tema se inicia em nossa passagem pela área de
Educação Ambiental durante o curso de Pedagogia na Universidade de Brasília (UnB) e
projetos de extensão. Entre 2009 e 2012 estivemos em contato com o projeto de
extensão Clube de Yoga Mover Juntos, com Movimento Expressivo Vital do Sistema
Rio Aberto e o projeto da Faculdade de Educação Física (FEF) o Movi-mente sendo que
neste projeto, antes do professor Marcelo de Brito se afastasse para Portugal para a
12
realização de seu doutorado, participamos juntos de um grupo de estudos sobre os
fundamentos teóricos do Movi-mente.
O ponto de contato entre tais práticas é sua busca por propiciar ao praticante um
conhecimento maior sobre a condição humana, para que a partir desta compreensão o
13
indivíduo possa se relacionar consigo e com o outro de modo a abandonar aquilo que
sinta não ser benéfico e aderir aquilo que sinta proporcionar benesses a ele e à vida
como um todo. Esses movimentos transferem toda a responsabilidade ao indivíduo
pelas alegrias ou tristezas que sente. Em todas elas, o corpo será utilizado como um
veículo para se chegar até este conhecimento que liberta o ser de percepções que lhe
geram sofrimento. Este conhecimento não pode ser compreendido apenas
intelectualmente, e nem pode ser ensinado por alguém, ele precisa emergir de uma
experiência que acontece na moldura do próprio corpo.
14
elementos subjetivos emergem naqueles que participam de tais práticas e em que
contribuem para o desenvolvimento da criatividade.
Este trabalho não tem a pretensão de esgotar-se e muito menos de colocar pontos
finais. Entendemos a necessidade de nos articularmos com outras áreas do
conhecimento, de criarmos elos de comunicação entre elas e principalmente, de
reconhecer seu caráter inacabado, aberto para futuras contribuições daqueles que por
esta reflexão e prática se interessarem. Esperamos que esta seja uma contribuição para
aqueles que buscam a integração de conhecimentos aparentemente díspares, e que
também possa nos servir de auxílio no caminho onde buscamos integrar o sentir, o
pensar e o agir, manifestando coerência.
15
corpo e mente ao longo da história, permeiam o fazer de um determinado povo,
permeiam não só seu ato criativo, mas toda sua existência e relação com o mundo.
O trabalho que vamos apresentar está dividido em duas partes, na primeira estão
os aportes teóricos que expressam o caminho que trilhamos e que foi constituindo as
lentes necessárias para realizarmos a leitura e interpretação da realidade que iremos
penetrar e que nos permitirão o processo de elaboração das informações que se dará na
sequência. Na segunda parte, encontraremos os fundamentos epistemológicos e
metodológicos que delinearão nossas atividades durante a pesquisa.
16
oriente e como pensamos a articulação entre as práticas que tem como premissa a
unidade corpo-mente e seu impacto na subjetividade e desenvolvimento da criatividade.
17
I – APORTES TEÓRICOS
Quando chegamos a este planeta, entramos em contato com outros que por aqui
estavam antes de nossa chegada, seres que desenvolveram sua humanidade dentro de
um sistema cultural. Nós, em contato com este sistema cultural, temo-lo como base para
emergirmos enquanto seres pensantes, sensíveis e intencionais. E somos capazes de
criar o que ainda não existe dentro deste sistema, de transformá-lo e de sermos
transformados por nossas criações.
Reconhecemos o esforço que tem sido feito por González Rey (1997, 2002, 2003,
2004, 2011) em produzir um modelo de representação da psique que devolva a nós uma
compreensão de que o funcionamento dos seres humanos é complexo e não corresponde
a uma lógica de causalidade linear.
18
Não vemos como colocar esses saberes em prática senão conseguirmos conhecer
nossos educandos com um mínimo de profundidade e a teoria da subjetividade, parece
permitir ao pesquisador, buscar formas de entender os indivíduos com profundidade.
19
criação deste sistema pode gerar diferentes formas de inteligir o fenômeno e gerar
alternativas para nos relacionarmos com o mesmo.
O que permitirá a singularidade dos indivíduos, é que eles não são simplesmente
receptores passivos. A singularidade se produz a partir da maneira como a pessoa
vivencia sua experiência, como ela a subjetiva através da produção de sentidos
subjetivos. Segundo González Rey (2003):
20
nossas mentes enquanto refletimos. Esses sentidos subjetivos produzidos em diferentes
tempo/espaço agem recursivamente contribuindo para a emergência de novos sentidos
subjetivos (GONZÁLEZ REY, 2012).
21
O conceito de configurações é usado por González Rey para definir a
personalidade de modo a concebermos sua processualidade, seu caráter dinâmico que
está em contínuo processo de transformação e representa uma forma de organização da
subjetividade individual (GONZÁLEZ REY, 2003).
22
A personalidade não é soberana em relação a regulação do comportamento da
pessoa, a personalidade é como os bonecos de um mamulengueiro, são seus recursos
para realizar sua encenação. O mamulengueiro é representado pela categoria sujeito
(GONZÁLEZ REY, 1997, 2002, 2003, 2004, 2005b, 2011) que representa esta
individualidade, portadora de uma personalidade (MITJÁNS MARTÍNEZ, 1997). Essa
personalidade é capaz de operar intencionalmente, de fazer escolhas de forma ativa e
criativa, capaz de utilizar os recursos subjetivos para projetar e realizar suas ações no
mundo.
As pessoas não são sujeitos a todo momento, e a atuação como sujeito está
relacionada à constituição das configurações subjetivas (GONZÁLEZ REY 2003), por
este motivo algumas pessoas comportam-se como sujeito em mais momentos do que
outras. Uma pessoa pode se manter refém de uma situação, por não conseguir atuar
como sujeito, não assumindo sua responsabilidade dentro de um determinado contexto
que lhe causa insatisfação, a pessoa é assujeitada ao invés de sujeito (GONZÁLEZ
REY, 2012).
23
construir uma prática que nos possibilite nos constituirmos como sujeitos, exercitando
nossa faculdade de questionar, de refletir, não nos restringindo a práticas que dão ênfase
na memorização e reprodução de conteúdos.
1.3 Criatividade
Eureka!
Educar para a criatividade é uma responsabilidade que dever ser assumida por
todos aqueles que mantêm o compromisso com uma educação que permita a aprender a
Ser (DELORS, 1998). Veremos adiante que a perspectiva assumida por nós neste
trabalho mantém relações íntimas com o desenvolvimento de elementos que auxiliariam
as pessoas, não apenas em seu fazer criativo, mas principalmente, a tornarem-se seres
dotados de recursos subjetivos que em muito contribuirão para seu bem-estar integral.
25
de um determinado contexto e incentivar a criatividade, pode ser considerado uma
transgressão.
26
Talvez seja pelo mesmo motivo que os humanistas, Abraham Maslow (1968) e
Carl Rogers (1986) tenham entendido a criatividade como uma marcante característica
em pessoas que consideraram felizes. Os humanistas observaram que a criatividade,
enquanto uma característica da expressão do indivíduo não chega sozinha, ela chega
estruturada por elementos como coragem, reflexividade, ausência de convencionalismos
e aceitação de si mesmo, elementos que se constituíram na pessoa ao longo seu
desenvolvimento.
27
Há perspectivas onde o valor não depende do aval de uma comunidade, o
produto pode ter relevância apenas para aquele que cria e impacta seu contexto, tanto
subjetivo, como o espaço social onde se relaciona (MITJÁNS MARTINEZ, 2009).
Por uma outra via seguem as pesquisas qualitativas, que apesar de serem estudos
de uma outra ordem, podem também exercer uma leitura dos dados buscando uma
neutralidade sem buscar ir além do dado e sem admitir que a interpretação do dado
possui também um caráter subjetivo, configurando seu fazer científico muito
semelhante às pesquisas quantitativas de caráter positivista (GONZÁLEZ REY, 2005).
Podemos ―perceber‖ ―traços característicos‖ da personalidade de indivíduos criativos,
mas ainda assim não conseguindo elaborar compreensões sobre como, processualmente,
se desenvolve a criatividade.
As palavras novo e valioso aparecem entre aspas porque não se está mais se
referindo apenas a um produto externo que é considerado novo e valioso por alguém ou
por algum grupo de pessoas externas ao indivíduo. Considera-se também ‗ação humana‘
28
o próprio ato de reflexão, a produção de novas ideias, proposições para a resolução de
dilemas filosóficos e psicológicos, de novos entendimentos acerca de um determinado
assunto ou situação que terão valor para o próprio indivíduo1.
1
Esta ideia que se inicia, integrada a outras, tem sido desenvolvida posteriormente pela autora no que
denomina ―dimensão funcional da criatividade― (2009), categoria em processo de desenvolvimento e
investigação.
29
e um alto nível de motivação intrínseca, de uma forma ou de outra,
refletem-se em diferentes trabalhos com bastante força. (p.26)
30
emergência de nova compreensão relacionada à percepção que os estudantes têm de si,
do outro e do mundo.
Nossa hipótese é de que, neste processo, a expressão criativa pode ser desenvolvida,
pode constituir-se. Se entendermos este complexo processo em um nível mais profundo,
teremos a possibilidade de orientar práticas pedagógicas com objetivos específicos tais
como o desenvolvimento da sensibilidade, da reflexividade, da intuitividade, da
coragem, da confiança em si e da aceitação de si. Tais práticas também abrem a
possibilidade de conseguirmos desencadear momentos pedagógicos capazes de nos
proporcionar um verdadeiro giro paradigmático acerca das percepções de quem somos,
de tornar palpável a possibilidade de nos experienciarmos como interdependentes,
participantes da teia da vida.
Esta hipótese pode gerar uma zona de sentido, (GONÁLEZ REY, 2003) capaz de
contribuir significativamente, no processo de construção de uma didática catalizadora
dos processos educativos que intencionam o desenvolvimento da criatividade, não em
um sentido produtivista, mas principalmente engajada com a saúde individual e social.
31
construção de indicadores sobre a constituição de elementos que participem de
configurações criativas, que se desenvolvem ao longo do semestre, durante a
participação dos alunos no curso Corporeidade e ao projeto Movi-mente.
A abordagem humanista irrompe como terceira força opondo-se a essas duas forças
dominantes e centra suas investigações em aspectos positivos dos seres humanos, em
suas virtudes e potencialidades (SCHULTZ & SCHULTZ 2008). No humanismo a
criatividade tem sido considerada um aspecto que expressa a saúde do indivíduo, não
entendida apenas na perspectiva do produto, seu valor está centrado em um senso de
satisfação advindo da interação com a vida de maneira criativa.
32
É notável que a compreensão de Carl Rogers associe-se muito às compreensões do
oriente, chegando até a usar, para se expressar, palavras semelhantes às usadas pelas
tradições de sabedoria antiga. Rogers (2009) diz que existe a possibilidade da pessoa
conscientizar-se do mundo tal como ele é. Na sabedoria antiga oriental, de origem
budista, irão utilizar esta expressão, chegando a usá-la para nomear uma de suas
principais meditações, a Vipassana, que significa ver as coisas como são (HART,
2012). Ver as coisas como são, ou ver o mundo como ele é, significa ver sem que o que
Rogers (2009) chamou de categorias predeterminadas. Segundo Rogers, tais categorias
distorcem nossa percepção e experiência do fenômeno, consequentemente, interferem
na maneira como nos relacionamos com o mesmo e muitas vezes não nos
proporcionando a realização que estamos buscando.
33
A abertura à experiência é o que permitirá a pessoa tomar consciência do
momento e escolher aquilo que seja mais apropriado, utilizando a criatividade de
maneira construtiva.
Abraham Maslow (1968) também expressa alguns aspectos que ele começou
observar nos pacientes que considerava criativos:
34
A liberdade humana implica a capacidade de fazer uma pausa entre o
estímulo e a reação, para escolher a resposta que mais nos convém. O
poder de criarmos o nosso eu com base nessa liberdade é inseparável
do conhecimento de nós mesmos. (p.102)
Esta liberdade a que se refere Rollo May, tem uma profunda conexão com o
coração da meditação budista. É a capacidade de fazer essa pausa, propiciada pelo que
chamam de faculdade de equanimidade (upekkha), considerada uma das dez perfeições
(paramis) que germinam na mente do praticante caso a meditação seja cultivada
(HART, 2012). É apenas com este recurso que Rollo May chamou de pausa, manter-se
nesta vacuidade consciente, que se tem liberdade para criar.
Desde o fervor cultural, vivido pelo movimento hippie anos sessenta, o ocidente
tem demonstrado cada vez mais abertura para examinar a espiritualidade oriental
(CAPRA; FYFIELD, 1988). Constitui-se uma forte representação na subjetividade
social que as práticas meditativas do oriente, que em determinado momento dedicam-se
ao cultivo do corpo e desenvolvem aspectos físicos do ser humano, contribuem também
para o desenvolvimento de qualidades psicológicas. Esta representação e a busca por
sua comprovação movimenta estudos tanto no campo da neurociência como também
começam a ganhar espaço em estudos de metodologia qualitativa (MENEZES;
DELLAGLIO, 2010) produzindo informações sobre o impacto de tais práticas.
36
2. CORPO SENTIDO
Sugiro uma nova forma de coragem corporal: o uso do corpo, não para
o desenvolvimento exagerado de músculos, mas para o cultivo da
sensibilidade. Isso significaria desenvolver a capacidade de ouvir o
corpo. Seria como diz Nietzsche, um aprendizado para pensar com o
corpo. Seria a valorização do corpo como um meio de criar empatia
com outras pessoas, a expressão do eu como um objeto de arte e uma
fonte de prazer.
37
Assim como a representação, amplamente difundida, de seres humanos
apartados da natureza desemboca em ações que danificam o meio ambiente e
comprometem seriamente as condições da Vida do planeta. Também as representações
de mente separada do corpo implicam em uma ação limitada em relação aos mesmos.
38
já se encontra a definição de skhandas (idioma sânscrito) ou khandas (idioma páli) que
significa: agregados. O ser/existência é constituído por cinco agregados: rupa (forma
material), vedana (sensação), sanya (percepção), sankhara (formações volitivas) e
vinyana (consciência) (RAHULA, 2005). Este sistema em movimento, que não pode ser
compreendido separadamente, representa a concepção de ser/existência para a tradição
budista.
A quietude mental é uma das vias para a realização do estado de samadhi, que
em alguns contextos é traduzido por profunda meditação. De acordo com Eliade (1996)
e Feuerstein (1998) significa estar dentro do Si mesmo, dentro da Essência
transcendente da personalidade. Nesta concepção o samadhi é pré-requisito para que
posteriormente o praticante atinja uma condição onde sua mente conscientiza-se e
transcende as estruturas de concepções geradoras de sofrimento. Dessa forma atinge-se
o Kaivalyam: ―a vivência de integração com tudo e destruição de todo o apego a
diferenciação.‖ (BARBOSA, 2006).
39
determinadas posturas físicas por determinado tempo, o praticante é capaz de
desencadear estados de quietude mental com potencial transformador de sua apreensão
e relação com o mundo, capaz de atingir um tipo de transcendência do mesmo.
40
A partir de Zigmund Freud e Breuer (1895), em seus estudos sobre a histeria,
percebemos um marco no pensamento ocidental. Quando Freud conclui que
comportamentos típicos da histeria, como o tique nervoso, teriam relações com aspectos
psicológicos, sendo talvez um dos primeiros autores da modernidade a expressar e intuir
sobre tal interação.
Segundo Reich (1978), o orgone é uma força vital existente em todo o universo,
no organismo humano é responsável por trazer vitalidade ao corpo e teria também
efeitos psicológicos. O conceito elaborado por Reich não é algo novo, porém encontrou
resistência no meio científico por seu caráter místico e de difícil comprovação empírica.
41
percepções sobre o corpo e mente, de cada compreensão resultam diferentes formas de
se relacionar com os mesmos.
Outro autor que nos chamou atenção, sobre o que também consideramos serem
indicadores de uma relação entre corpo e mente, foi Vygotsky (2009). Vygotsky fala
sobre a dupla expressão do sentimento, onde afirma que para todo sentimento ou
emoção que se manifesta surgem imagens mentais correspondentes. O mesmo acontece
quando ao imaginarmos algo, emergem sentimentos relacionados a imagem que temos
em mente.
Então poderíamos nos perguntar, qual perspectiva é a real? Podemos dizer que
todas são realidades, e para cada realidade concebida existe uma forma de ser no mundo
42
que se desdobra em ação política. Mas, seja qual for a perspectiva, as ações
desencadeadas por ela reverberarão indefinidamente pela teia da vida afetando-a.
Serge Moscovici (1975) nos diz sobre as inúmeras representações que os seres
humanos utilizaram para distanciar-se de sua condição de natureza, isso através da ideia
de que possuem cultura, linguagem e autoconsciência. Foram construídos uma série de
argumentos para garantir uma diferenciação e soberania do seres humanos em relação à
natureza, o que teria nos levado a construção de uma sociedade que está contra a
natureza.
Para a medicina ocidental, por exemplo, este tipo de concepção pode orientar um
tratamento que incide apenas sob aspectos fisiológicos, jamais permitindo ao médico
atingir uma compreensão integral do problema. Não permitindo que o mesmo
investigue a pessoa com mais profundidade baseado em suas crenças, motivações,
história de vida e emoções que permeiam seus hábitos (GONZÁLEZ REY, 2011).
43
A corporeidade em Merleau-Ponty não apenas rompe com a perspectiva que
cinde corpo e mente, rompe também com a distinção entre observador e observado,
sujeito e objeto e consciência e mundo. Dando novamente à existência um caráter
orgânico, relacional e finalmente abrindo a possibilidade de remoção do véu que torna
estanque nosso olhar.
44
constituem o ato de dirigir e sem que haja um movimento consciente, nós dirigimos, é
como se estivéssemos em um piloto automático. Isso não é problemático quando se trata
de dirigir, mas é possível que outras coisas que tenhamos aprendido nos impeçam,
automaticamente, de ver e ser algo a partir de outra perspectiva.
Merleau-Ponty tem sido considerado como um marco porque nos traz um novo
olhar sobre o corpo e sobre o mundo constituído de forma relacional. Um novo olhar
sobre como o que é aprendido se enraíza corporalmente e como o corpo interage com
realidades a partir do aprendido e mais uma vez aprende com ela num infinito ciclo.
Educar não se restringe mais a um ato reflexivo ou de operações puramente
intelectuais. Aprender é encarnar uma realidade em si, realidade que, dependendo da
forma como se configura, contribui tanto para limitar o indivíduo como também para
auxiliá-lo a ampliar as possibilidades de atuação como sujeito.
45
temos novos desafios para desenvolvermos processos educativos que favoreçam o
processo rumarmos em direção a nossa inteireza (SANTOS NETO, 2006).
Uma característica geral encontrada por nós nos trabalhos que tem contribuído
para a construção do campo de estudos da relação corpo-mente, principalmente nas
correntes neo-reichianas (LOWEN, 1970; PIERRAKOS, 1987) e na obra de Ken
Dychtwald (1984) é a relação personalidade e corpo-mente. Os trabalhos são permeados
pela compreensão de que a pessoa, ao longo de sua vida, no enfrentamento de situações
cotidianas, na maneira como reage, vai imprimindo informações em seu corpo e mente e
vai constituindo sua personalidade.
46
Na introdução do livro ‗O Corpomente’ de John Dychtwald (1984), há um
momento em que relata estar nu diante de Jonh Pierrakos em um workshop na
California. Em instantes, Pierrakos ao observar o corpo de Dychtwald traz a tona uma
série de informações sobre sua história. Fala sobre a maneira como Dychtwald
relacionou-se com figuras como seu pai, sua mãe, como se relaciona com as pessoas em
geral e citou também aspectos íntimos de sua personalidade. Pierrakos diz fazer toda
esta leitura apenas a partir do corpo de Dytchwald e lhe garantiu que para realizá-la
apenas leu o que estava impresso em seu corpo físico, em momento algum havia usado
percepção extra-sensorial.
47
gerar modelos de teóricos, para compreendermos o processo de movimentação da
subjetividade dos indivíduos que participam de tais processos terapêuticos ou práticas
meditativas.
48
(CAPRA; EICHEMBERG, 1987; GOSWAMI, 2007; KEN WILBER, 1989; MORIN,
2002; SANTOS, 2010; STANISLAV GROF, 1994, 1987). Nossa hipótese é de que a
visão holística apresentada por essas tradições mantenha algum tipo de relação com os
Estados de Ser vivenciados pelas mesmas e pela consequente subjetividade produzida
por esses povos, tanto durante como após estas experiências.
O mistério que ainda paira e que começa a ser discutido por Grof (1994, 2000)
não é sobre a consistência material desta experiência. E sim como o praticante de tais
psicoterapias ou meditações subjetiva esses estados de ser. Podemos até dizer que a
experiência é inarrável, mas é vivenciada, subjetivada e impacta o praticante. Mas de
que forma impacta?
49
emocionar-se em relação a um conteúdo ou experiência que lhe ocorreu em estado de
meditação. Pode produzir subjetivamente acerca do experienciado tanto consciente
como inconscientemente.
Estes estados são pouco conhecidos por nossa ciência, mas tradições do oriente
possuem tratados onde classificam, até mesmo hiearquizam, diferentes estados de ser. O
guru Osho exemplifica isto em seu livro Orange (2013). Osho discorre sobre o estado
de consciência que as pessoas que praticam corrida acessam, chamado de turiya: ―…um
momento vem em que o corredor desaparece e só há o correr. O corpo, a mente e a alma
começam a funcionar juntos: de repente, um orgasmo interior acontece.‖ (RAJNEESH,
2013).
Os estados referem-se a uma série de estados que estão disponíveis para serem
acessados pela pessoa em meditação. A entrada e permanência dentro de um estado, tem
implicações na constituição de um estágio de consciência. As produções subjetivas
acerca do que é experienciado em determinado estado de consciência ganham certa
50
estabilidade configurando um estágio de consciência. A constituição dos estágios de
consciência a partir das experiências de outros estados de consciência são integrados
pelo indivíduo de diferentes formas, dependendo de sua história de vida, de sua
configuração subjetiva.
Estes estados estão longe de ser algo surreal ou distantes de nossa realidade. Nós
os realizamos durante toda vida, por exemplo quando nos concentramos para ler um
texto de difícil acesso ou através de exercícios físicos. A questão é, a ciência ocidental
não possui um corpo de conhecimento que nos possibilite perceber isso de tal forma,
pela simples razão e limitação que a ciência moderna não concebe como científico a
investigação da interioridade pela interioridade, um Eu que investiga a Si Mesmo, e que
neste processo produz conhecimento ou ciência (WILBER, 2001). A ausência de um
conhecimento em nossa ciência moderna, que discorra sobre isto e a sua potência, não
51
nos permite tomarmos consciência do que fazemos e nem tanto como fazê-lo
intencionalmente de forma autônoma e apropriada, intensificando seus efeitos.
52
compreender se na relação dos alunos com este espaço social, onde a proposta é a
experimentação de sua corporeidade, ocorre a emergência de processos subjetivos que
possam ser associados à criatividade.
Não é nada fácil falar de Dhyan Kapish, mas tivemos a oportunidade de passar
dois anos ao lado deste ser que inspira aqueles que com ele convivem. Este senhor tem
disposição de um jovem e com humildade e brincadeira expressa uma sabedoria anciã.
Imaginamos que, por seu trabalho, no mínimo deve gerar em seu colegas de faculdade
algum tipo de estranhamento, mas dificilmente indiferença. Sua alegria é contagiante e
sua paciência para lidar com problemas do cotidiano nos faz perceber o quanto a
impermanência é para ele um fato. Bastava perceber sua reação a alguma coisa inusitada
que lhe acontecesse durante a semana ou nas imersões, com alegria no olhar ele se
referia a isto como uma provação divina, como se as vicissitudes que nos abarcam
cotidianamente fossem sagrados presentes para nos tornar melhores.
Partilhamos com Kapish o mesmo fascínio pela meditação, durante esse período
tivemos o sentimento de estarmos trabalhando juntos naquilo que acreditamos. Auxiliar
a emergência no espaço acadêmico de investigações e experiências que ampliem nossa
2
Para maiores informações sobre a trajetória de Marcelo de Brito e sobre o Movi-mente, sugerimos a
leitura de sua tese de doutorado disponível na internet: A construção do sentimento de unidade:
desdobramentos de uma abordagem corporal atípica. Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila
Real, 2013. O projeto oficial do Movi-mente se encontra no ANEXO II deste trabalho.
3
O professor Marcelo de Brito autorizou a utilização de seu nome oficial neste trabalho.
53
compreensão sobre o que seja ser/existir. Contribuir para o desenvolvimento integral
dos seres humanos e para bem estar planetário. Estar em sua presença é estar
constantemente observando a si mesmo, investigando a vida e seus mistérios. Nossas
palavras chave eram: meditação, presença, consciência, transcendência, corporeidade,
alegria e sincronicidade.
54
De acordo com Kapish as motrivivências, quando conduzidas por ele, apesar de
possuírem princípios e fundamentação teórica, nunca são previamente elaboradas. Pois
precisam ser a emergência da criatividade que acontece no momento em que nos
tornamos presentes no aqui e agora, na criativa vacuidade de onde tudo surge. As
práticas emergem no momento presente, pois elas necessariamente precisam ser uma
expressão criativa e intuitiva. Percebemos que são uma síntese entre aquilo que já é
conhecido por ele com aquilo que sente que deve ser trabalhado no momento presente.
Seu fundamento é a busca por atender aquilo que percebe como sendo a necessidade dos
participantes naquele instante.
55
Sentimos, de maneira profunda, estar em conexão com o supremo e
fundamental princípio de todo Ser. (p.201/202)
O ser inteiro deveria, pois, ser digno de sincera busca. Neste sentido,
construímos uma abordagem de trabalho corporal que busca o
desenvolvimento integrado das dimensões humanas e cujo objetivo é
ampliar a consciência da unidade. Não é, entretanto, o desígnio de
forjar budas ou seres iluminados que nos move. O que se pretende é
simplesmente encontrar maneiras de nos integrarmos, nos
conhecermos e vivermos melhor, em harmonia com a natureza pessoal
e global. (p.103)
Outro aspecto importante sobre este espaço é a concepção de Corpo em que nele
podemos encontrar. O corpo-mente neste curso é destituído de uma verdade absoluta,
ele é transformado em um incógnita, sua obviedade é removida.
5
Professor Dhyan Kapish idealizador do Movi-mente, quando for citado a partir de seu trabalho de
doutorado será usado o nome que utiliza no contexto acadêmico.
56
Durante o curso o próprio professor insiste em não fechar completamente um
conceito de corporeidade. Ao longo do semestre várias percepções criadas por
diferentes perspectivas, de origem acadêmicas e não-acadêmicas, vão sendo
disponibilizadas, confrontadas e discutidas abertamente.
Não sabemos qual desdobramento essa experiência pode ter para cada um.
Hipotetizamos que, esse aumento da consciência da unidade e a gama de experiências
que se pode viver com o próprio corpo dentro deste espaço, pode ser um marco para o
indivíduo em seu desenvolvimento, chegando a causar impacto significativo na própria
personalidade.
A busca pelo desenvolvimento da pesquisa neste espaço está para além de nosso
desejo por compreender o impacto de estados meditativos na subjetividade. Se dá
também pelo envolvimento prévio que tivemos com o mesmo e pelos questionamentos
que foram levantados a partir dos inúmeros relatos de pessoas, que acreditavam ter
vivido uma verdadeira transformação durante a permanência no projeto.
57
As transformações expressadas pelas pessoas participantes do Movi-mente,
apesar de acontecerem numa relação com práticas corporais para alçar experiências, são
de ordem subjetiva. O que não é surpreendente na medida em que um dos focos do
curso é: perceber a existência desta unidade corpo-mente, o que se expressa quase que
em conceber que a mente também é corpo. No caso das diversas percepções
apresentadas no curso a mente também pode estar além do corpo humano e habitar
outros corpos que estão além do corpo físico, que o transcendem e o incluem ao mesmo
tempo.
Mas como investigar isto? De que forma concluiremos que ao longo deste
processo as pessoas desenvolveram ou não tais processos em alguma medida? Que
instrumento utilizaremos para tentar compreender este processo? Para isso utilizaremos
58
a Epistmologia Qualitativa de Fernando González Rey e a metodologia da pesquisa
derivada dela que apresentaremos no próximo capítulo.
59
II – FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS E METODOLÓGICOS
3. Caracterização da Pesquisa
3.1. Objetivos
Objetivo geral
Compreender o impacto do curso Corporeirade e Expressão Corporal e do
Projeto de Extensão Universitária Movi-mente na subjetividade com foco na
emergência de recursos subjetivos associados à criatividade.
Objetivos específicos
60
A Epistemologia Qualitativa emerge como alternativa a uma ciência empirista,
que atribuiu excessivo valor aos dados colhidos em campo e os caracterizou como
sendo o real e não como uma realidade. Entendia-se que esses dados não passavam por
uma interpretação, que era subjetiva, ou seja, que tinha sua dimensão entrelaçada ao
processo histórico-cultural participante da constituição dos cientistas.
61
Apesar de compreendermos que existem várias linhas para a pesquisa-ação e não
tentarmos compará-la à Epistemologia Qualitativa entendemos que o pesquisador dentro
da Epistemologia Qualitativa, enquanto está em campo, sempre se encontra na condição
de pesquisador-ator. Pois no momento em que pergunta, em que conversa, abre
possibilidades de reflexão para o entrevistado. Isso oportuniza compreensões às quais,
tanto pesquisador como pesquisado, ainda não haviam se deparado e chegando a
produzir outras compreensões sobre um determinado assunto.
62
Nosso espaço de pesquisa se dividiu em dois momentos, o curso de
Corporeidade e o Projeto de Extensão da Faculdade de Educação Física da Universidade
de Brasília (FEF/UnB), o Movi-mente.
O professor Kapish mantém uma postura muito dinâmica dentro de sala de aula.
É um professor que está sempre muito alegre e bem humorado, aparenta ser apaixonado
por seu trabalho e seu entusiasmo é uma caraterística marcante. Suas aulas não possuem
um caráter estritamente expositivo.
Kapish disponibiliza vídeos e textos base na internet para que os alunos reflitam
e discutam durante as aulas. No momento teórico das aulas ele busca deixar os alunos à
vontade, faz perguntas que estão sempre direcionadas a descobrir alguma experiência
que o estudante possa ter vivido em seu cotidiano para utilizá-la como fio condutor da
aula.
63
Enquanto Kapish falava da pele, começou a falar do que chamou de manias de
pele e logo em seguida as pessoas começam a comentar suas experiências. Existem
pessoas que só dormem com um lenço encostado no rosto, outros tem o hábito de ficar
coçando uma determinada parte do rosto sempre que estão reflexivas. E desse ponto
Kapish vai para o assunto condicionamentos, pergunta o quanto desses movimentos são
realizados conscientemente em oposição a uma ação mecânica e automática.
O professor atalha de um assunto para outro. Quem não o conhece, não sabe de
suas intenções e estudo por trás de tudo o que ele está fazendo, pode ficar um pouco
perplexo com a descontinuidade que a aula parece ter. Em um momento estamos
falando sobre a pele, na sequência estamos falando sobre consciência e
condicionamentos. Aparentemente isso traz um certo desconforto para aqueles que
exigem uma linearidade no desenvolvimento dos assuntos.
64
os monitores enviam artigos científicos sobre corporeidade, vídeos sobre corporeidade
ou sobre algum sentido específico como tato, visão e outros, que serão trabalhados na
aula da semana.
Ao longo do semestre os alunos vão fazer uma viagem pelo corpo e o curso
assume diferentes configurações de acordo com o semestre. O professor parece
esforçar-se para que ela não se torne repetitiva. Basicamente durante o semestre os
alunos percorrerão seus corpos, investigando e vivendo experiências com os cinco
sentidos. Kapish introduz o sistema de chakras (centros de energia) na concepção hindu
e temas como sentido, percepção, comportamento autômato, inconsciente e consciência.
Os cinco sentidos são sempre explorados numa relação com a mente. Por
exemplo, para as instruções sobre um exercício sobre o tato, o professor pede aos alunos
que dividam-se em duplas. Uma pessoa da dupla fica vendada e a outra guiará o colega
pelo Centro Olímpico (CO), proporcionando a seu colega diversas experiências com o
tato.
65
Às 19h30 os estudantes se encaminham para a Sala de Dança. O projeto Movi-
mente é aberto a comunidade e quando os estudantes do curso corporeidade chegam na
Sala de Dança algumas pessoas já se encontram reunidas na sala esperando o início da
prática. Aguardam conversando, jogando malabares, alongando e fazendo posturas de
yoga ao som de alguma música cuidadosamente selecionada pelos monitores.
As músicas vão do rock‘n‘roll dos anos 60 e 70, passam pelos hits dos anos 80
pelo new age, pagode e axé dos anos 90. Sons de estilo étnico tribal também fazem
parte desta jornada e chegam até as músicas eletrônicas que marcam a primeira década
do século 21. As músicas variam de acordo com o propósito da motrivivência.
66
Comandos muito utilizados em meditações como atenção a respiração, atenção
às sensações e simplesmente observe, são utilizados para lembrarem o momento no qual
os estudantes devem permanecer, o momento presente. Mesmo pensando os
participantes devem estar atentos ao fluxo de pensamentos e sentimentos.
67
Este fator é considerado por nós, também várias vezes explicitado pelo professor
Kapish, como um dos motivos responsáveis por afastar as pessoas do projeto. Seria uma
espécie de dificuldade para lidar com os indesejáveis aspectos de nós mesmos. Esta
dificuldade parece ser transcendida na medida em que se persiste na prática, abrindo a
possibilidade de nos tornamos mais tolerantes e acolhedores em relação a nós mesmos.
68
forma, ampliando a compreensão sobre a diversidade de recursos que possam emergir
favorecendo a criatividade.
Acreditamos que este contato amigável com o professor Kapish facilitou nosso
trabalho, pois sempre se colocou em uma postura muito aberta à propostas e está
interessado na realização de estudos dentro deste projeto. O projeto Movi-mente foi
investigado em seu trabalho de doutorado em Portugal concluído em 2013.
3.5 Instrumentos
69
presente, formas de perceber o mundo, formas de relacionar-se com o mundo, planos
para o futuro e principalmente sua vivência dentro do curso/projeto.
70
Esta é uma forma que encontramos para nos aproximarmos dos sujeitos de
pesquisa e de estar em contato com possíveis movimentações que aconteciam ao longo
do semestre na subjetividade. As instruções enviadas aos sujeitos de pesquisa sobre o
diário se encontram no Apendice II.
Para além da orientação, citada acima, os estudantes podiam fazer qualquer tipo
de anotação neste de diário. A premissa é que suas anotações estivessem atreladas às
vivencias dentro do curso de Corporeidade e do projeto Movi-mente.
O professor pede aos alunos reflexões escritas sobre suas experiências dentro do
curso. Também pede para que realizem exercícios de observação e produção de texto
sobre determinadas características do corpo, como a investigação de um habito
mecânico. Alguns trabalhos, com o aval dos sujeitos de pesquisa e do professor, foram
recolhidos para análise.
71
reflexivos dos alunos, não são necessariamente uma síntese ou resumo dos textos, nós
os utilizamos com o objetivo de investigar as formas de subjetivação do curso por parte
dos alunos. Nos privilegiamos de exercícios que dirigem os alunos a uma zona de
sentido que está estritamente envolvida com o curso, percebendo em que concentram-se
suas reflexões, quais são seus focos e sentimentos em relação ao que estão
experienciando. Os pedidos de reflexão, feito pelo professor Kapish, encontram-se no
Anexo III.
5. Análise de Facebook
72
onde ela pudesse expressar seus sentimentos sobre um determinado assunto, de modo
que pudéssemos acompanhar a forma como ela se expressava.
73
Os momentos informais não são considerados um instrumento. São instantes em
que o pesquisador, sem que tivesse preparado algo formal, percebesse que o sujeito de
pesquisa está expressando algo importante para o desenvolvimento de sua produção
teórica.
3.6 Participantes
O curso é composto por estudantes de idade que varia dos 17 aos 28 anos de
idade. A turma geralmente é mista, havendo equilíbrio entre o número de mulheres e
homens. Apesar do curso ser ofertada pela FEF-UnB os alunos que optam por fazê-la
são de diversas graduações. Entre eles encontramos estudantes das artes cênicas,
pedagogia, serviço social, engenharias, medicina, psicologia entre outros, sendo poucos
os alunos que são da Educação Física.
Outro motivo que nos levou a escolher os estudantes do curso foi em função
deste ser o espaço de reflexão e estudo sobre a dimensão teórica do que acontece
durante o projeto de extensão.
3.7 Procedimentos
74
pesquisa. Com isso foi possível a seleção dos sujeitos para a realização do estudo de
caso.
Dos oito sujeitos iniciais três não frequentaram o curso com regularidade,
estiveram ausentes em boa parte do curso por motivos diferentes. Dos que faltavam, um
encontrava-se no período de conclusão de curso e estava ocupado com o trabalho final.
O outro, um aluno da Educação Física, não parecia ter grande afinidade pelos
temas discutidos no curso. Aparentemente as discussões também lhe geravam certo
desconforto por colocaram em questão suas crenças religiosas. Apesar do aluno não ter
dito isto, essa inferência foi feita com base em nós o observamos nas raras vezes em que
esteve presente. Várias de suas expressões faciais enquanto assistia à aula,
principalmente em momentos quando se discutiam temas considerados tabus,
representavam desdenho, como se o professor estivesse dizendo algo sem lógica e sem
fundamentação.
75
Até tentamos incentivá-lo a participar da pesquisa, pois pensávamos que seria
interessante pesquisar um sujeito que não tivesse afinidade com o curso, mas ele se
demonstrou cada vez menos interessado em contribuir. Sentimos também um tipo de
desconforto por parte dele por ter se disposto a participar e ter desistido.
Outro sujeito ausente, uma garota, não tornou possível estabelecer uma
aproximação que nos permitisse descobrir os motivos pelos quais não comparecia ao
curso. Sua justificativa por não participar foi que naquele momento tinha outras
prioridades.
Dos oito sujeitos iniciais, consideramos ter conseguido nos aproximar de cinco,
um homem e quatro garotas. O homem era este que se encontrava realizando seu
trabalho de conclusão de curso e de repente desapareceu das aulas.
Das quatro que chegam até este momento, apenas duas escreveram em seu diário
durante todo o percurso. A justificativa por não terem escrito mais em seus diários
também estava relacionada ao fato de estarem cursando o último semestre e estarem
envolvidas com o trabalho de conclusão de curso (TCC).
Entre as quatro, as duas envolvidas com o TCC também tinham mais faltas. E
uma delas, além de ser mãe, frequentemente saía mais cedo da parte prática, pois
chegava à aula já cansada do trabalho, o que a restringiu em sua participação do
curso/projeto.
76
3.8 Formas de análise/construção da informação
77
4. ANÁLISE E CONSTRUÇÃO DA INFORMAÇÃO
Conhece-te a ti mesmo.
Oráculo de Delfos
Não há mistério em descobrir o que você gosta, o que você tem e o que você faz.
Ao final da primeira e início da segunda etapa, que consideramos ter sido o final
do mês de abril de 2015, estávamos trabalhando com três sujeitos de pesquisa. Nosso
critério final para seguir a diante na seleção dos dois sujeitos, que participariam do
estudo de caso, foram: assiduidade nos momentos teóricos e práticos, participação em
imersões, produção contínua no diário e o estabelecimento da comunicação entre
pesquisador e pesquisado.
Valkyria, a nosso convite, aceitou participar de uma das imersões. Para nossa
surpresa, se sentiu envolvida e nos acompanhou nas demais imersões junto ao professor
Marcelo durante todo o ano de 2015. Valkyria foi a única aluna do curso corporeidade
a aceitar participar das imersões, apesar do convite ter sido feito a todos da turma.
Este contínuo convívio com Valkyria ao longo do ano de 2015 foi essencial para
que a escolhêssemos para realizar o estudo de caso. Conseguimos estabelecer o que
achamos mais difícil ao longo desta pesquisa, um contínuo espaço dialógico entre
pesquisador e pesquisado, e de observação do sujeito de pesquisa.
6
Os nomes dos sujeitos de pesquisa são fictícios. Os nomes fictícios foram utilizados para preservar a
identidade das pessoas pesquisadas.
78
Então para além do curso, estivemos em contato com Valkyria durante todo ano.
Acabamos, para além de nos relacionarmos como pesquisador/pesquisado,
estabelecendo um forte vínculo fraterno.
Raíza foi escolhida por ter sido dentre os sujeitos uma das pessoas que, durante
todo o curso, fez relatos constantes em seu diário. A aluna frequentou as aulas em seus
dois momentos. Foi encontrado em seu diário um espaço de expressão de seus conflitos,
desde os mais íntimos aos mais corriqueiros de forma muito espontânea. Isso nos
permitiu articular uma comunicação fundamental para o desenvolvimento da pesquisa.
Por final, um outro fator decisivo na escolha deste sujeito foi a ausência de
conhecimento e vivência prévia de contextos semelhantes ao do curso Corporeidade.
Valkyria
79
tecnológico. Os alunos permanecem durante um ano em outro país, cursando disciplinas
relacionadas a seu curso.
80
Para além das questões de inserção na rotina, V. também explicita o quanto
também é difícil relacionar-se com as antigas amizades, pois sente que sua percepção de
mundo e das coisas, transformou-se de forma significativa. Segundo V. sua busca por
espaços como o Movi-mente constituem sua busca pelo autoconhecimento, fator que ela
sente ser essencial para realizar este processo de reintegração com seu cotidiano.
Valkyria foi uma pessoa que esteve presente em quase todas as aulas. Somente
esteve ausente nos momentos em que em outras disciplinas encontrava-se no período de
provas, no meio e no final do semestre. Havia nesta estudante um interesse muito
grande pelo curso. Podemos dizer que sua motivação mantinha significativa ligação
com a proposta do curso, conhecer-se. A jovem, tanto nos instrumentos como
momentos informais, constantemente declarava que vivia um momento conflituoso e
que acreditava que poderia ser superado através do autoconhecimento.
Isso expressava-se tanto nos livros que garota estava lendo sobre interpretações da
física quântica por Stephen Hawking. Também, no início do ano, estava frequentando
aulas de Kundalini Yoga.
Quando perguntei a ela, logo na segunda aula, sobre sua percepção sobre questões
religiosas, investigando se a aluna tinha alguma crença e se era adepta de alguma
religião, ela nos disse que não. Porém que naquele momento, mais do que outros em sua
vida, estava abrindo-se para investigar aspectos relacionados a sua espiritualidade.
81
eu acho que é uma coisa sobre mim.. sobre os meus gostos.. sobre o
que eu quero fazer... sobre o que eu gosto de fazer o que eu não
gosto.. o que eu quero pra minha vida.. sabe? o que eu quero pra
minha vida e tipo assim.. entender isso.. porque assim, se a gente não
entender e buscar nossas vontades a gente vai estar a mercê das coisas
e não vai chegar a lugar nenhum... (Dinâmica Conversasional)
Perguntamos a V. se ela recomendaria o projeto a alguém, ela nos afirma que sim.
Explica que naquele semestre em vários momentos se percebeu tentando explicar o
projeto enquanto fala do mesmo para as pessoas que lhe eram queridas. Perguntamos a
V. o que ela fala para as pessoas sobre o curso/projeto e V. responde:
O conflito surgia pois V. sentia que foram poucos os momentos em sua vida em
que se dedicou àquilo que gostava. Sentia que sua prioridade não estava em dedicar-se
àquilo que gostava, mas dedicar-se a escola. Vejamos o trecho em que V. se expressa
em relação a sua vida escolar:
82
Percebemos que os sentidos subjetivos que permeiam sua vida escolar são
paralelos àquilo que lhe dá prazer, aos seus anseios mais profundos. A escola era uma
espécie de demanda externa a ser comprida de forma obrigatória, para conseguir uma
vaga no vestibular e consequentemente ingressar no mercado de trabalho.
Ela nos relatou uma série de atividades que apesar de gostar, não conseguiu dar
continuidade, pois expressou que sua dedicação estava na maior parte do tempo,
centrada em atender da melhor forma possível as demandas escolares. Tal foco nas
demandas escolares fora expressado com um ar de preocupação, em determinado
momento, antes de nossa última dinâmica conversasional, como se tivesse feito algo de
errado.
Para V. este local foi encontrado no circo, na prática de tecido acrobático. No mês
de novembro encontramos em seu perfil de facebook dois convites para aulas de tecido
acrobático, que agora eram ministradas por ela junto a uma amiga. A jovem parecia ter
83
alcançado uma de suas metas: encontrar algo que se sentisse bem e pudesse servir o
mundo.
Perguntamos a ela quais eram suas preocupações com sua mãe. V. nos relatou que
acreditava que sua mãe estava muito distante de espaços que fossem conducentes a este
autoconhecimento. Expressava alívio e gratidão por sua participação nesses espaços e
desejava também que a mãe tivesse a oportunidade de desfrutar do que ela havia
encontrado ali.
No diário, pedimos aos sujeitos de pesquisa que fizessem anotações, não apenas
sobre as aulas e sobre as motrivivências, mas que também fizessem anotações durante a
semana, sempre que algo que acontecesse os levasse a lembrar do curso. No mês de
junho encontramos a seguinte anotação na primeira semana:
Ontem fui andar de bicicleta e senti um bem estar tão grande, depois
de passar dias fazendo um trabalho que me deixou bem tensa, o
prazer e a liberdade de poder fazer algo que eu gosto por simples
lazer. Essa sensação de paz e liberdade me lembraram o
movimente, sensações e sentimentos que tenho nas práticas.
(Diário)
E na semana seguinte, após uma aula que falava a busca por investigar hábitos
automáticos e romper com eles:
84
12. No Movi-mente... Aprendi
Certa vez encontramos V. na UnB e lembramos a ela sobre a imersão que haveria
naquele final de semana. Ela havia esquecido e com um ar de alívio nos disse: ―Ai que
bom, estou precisando mesmo, minha energia está baixa‖. A jovem referia-se a seu
sentimento de vitalidade.
A partir dos trechos exibidos por nós, concluímos parcialmente, que os sentidos
subjetivos gerados por V. em relação ao Movi-mente estão relacionados ao ato de
conhecer, experimentar e refletir sobre si mesma. Inquirir a si mesma acerca daquilo
que realmente gosta, o que V. denomina como estabelecer contato com sua essência,
com sua espiritualidade através do corpo propiciando autoconhecimento.
85
É importante lembrar que entre as motrivivências do Movi-mente um dos temas
frequentemente trabalhados é o ridículo. Existe a máxima dita pelo professor Kapish:
―Ame e dê vexame!‖. Como expressado pelo professor, algumas experiências são
desencadeadas com a finalidade de romper com estruturas constituídas na pessoa que
lhe impedem de se expressar com autenticidade. O receio de ser ridículo e julgado são
partes dessas estruturas que impedem a expressão autêntica e criativa.
Este receio de ser ridículo mantém, em certos casos, uma relação com os
sentidos subjetivos que a pessoa produziu em relação ao outro, do que é que pode ser
expresso diante desse outro. São sentidos subjetivos relacionados às convenções sociais
e como relacionar-se com elas. No diário de bordo, ao longo do semestre, V. vai
explicando como se sente em relação as práticas e aos outros que estão próximos a ela.
A jovem expressa sobre a liberdade que sente em relação a um espaço onde não
sente que está sendo julgada, em contraposição a outros espaços onde frequentemente
sente-se julgada. Isso sinaliza uma produção de sentidos subjetivos de acolhimento de si
na condição de expressão de sua autenticidade.
7
Durante o semestre o professor guia os alunos numa jornada pelos 5 sentidos e incluí entre eles um sexto
sentido, que é entendido como o sentido da mente. Em tradições como o hinduísmo e o budismo a mente
é entendida como um sentido. Durante as aulas o professor diz que segundo essas tradições, a mente é
único sentido que é capaz de criar aquilo que sente, o pensamento é o objeto sentido pela mente e
simultaneamente uma produção dela mesma.
86
constituir elementos subjetivos constitutivos de configurações criativas expressas, neste
caso expresso na desinibição, aceitação de si e autoconfiança.
Ao final do mês de março V. exprime em seu diário como acredita que o Movi-
mente está alterando sua forma de se relacionar com outros espaços:
Outra coisa que pude perceber durante essas oficinas (de circo) é
como eu me sinto mais à vontade na presença de grupos de
pessoas desconhecidas.‖ E eu acho que devo isso ao movi-ment
pois já tinha feito coisas “muito piores” nos encontros (do movi-
mente). Haha!
E mais uma vez sobre a imersão em junho na Chapada dos Veadeiros V. expressa:
Me senti muito a vontade com o grupo, senti uma energia muito forte
entre as pessoas, de cuidado, carinho, preocupação, muito amor. Com
certeza as práticas no movimente me ajudaram com relação disso,
me soltar, perder timidez, nesse sentido. (Diário – julho)
87
estudantes a fazerem tais constatações sobre suas mudanças. Falaremos sobre a reflexão
sobre si em separado mais a adiante.
Sobre o dia de avaliação do curso V. expressa em seu diário:
Foi muito interessante ouvir o relato tão profundo de pessoas que eu
nunca tinha conhecido e conversado. Pessoas que eu tinha um pré-
julgamento mas que não fazia a menor ideia do tanto de pensamentos
e emoções que passava na cabeça da pessoa e carinho pelas pessoas.
uma espécie de identificação e compartilhamento de sentirmos
respeito. Incrível como uma turma inteira consegue se
desvencilhar de amarras e padrões, e abre mão de vaidades para
expor seus sentimentos de forma tão sincera.
88
que a outra.. e é uma coisa que eu não estou também preocupada..
porque você está ali pra fazer a aula sabe.. e eu não estou
preocupada com o julgamento das pessoas e eu me senti a vontade
mesmo estando com pessoas desconhecidas e tendo que fazer
coisas que eram completamente diferentes para mim.. uma dança
de pole dance, uma coisa sensual. A sensualidade por exemplo, é uma
coisa que eu nunca trabalhei... não flui muito enfim... e é uma coisa
que foi completamente diferente mas eu me senti super à
vontade... tava nenhum pouco preocupada com as pessoas sabe...
E aula de dança também... eu tive dança do ventre aí tinha gente
ficava muito fechado, você via que as pessoas estavam com
vergonha... não conseguiam se soltar... e é uma coisa que eu comecei
a ficar muito mais tranquila depois do Movi-mente.
Mais uma vez, agora nas dinâmicas conversacionais, V. apresenta sua produção
subjetiva nos momentos experienciados por ela ao longo do curso. É observado a
presença de sentidos subjetivos relacionados a uma satisfação que vem da liberdade de
ser ela mesma. Inclusive de reconhecer próprios defeitos e aceita-los, o que também é
89
explicitado por Maslow (1968) como algo por ele percebido em pessoas criativas, uma
aceitação de sua discrepâncias.
Vejamos como a produção subjetiva de V., dentro deste espaço, acerca
do curso e prática está sempre associada a liberdade de expressar-se autenticamente:
Tipo.. sei lá.. você vê que tem pessoas no início.. na primeira da vez
da pessoa.. que ela fica preocupada com certas coisas que... velho.. eu
não to preocupada e ninguém ta preocupado.. por exemplo... teve um
menino que.. numa aula.. que a gente tinha que fazer acho que fazer
um alongamento na pessoa.. e era eu e mais duas meninas mexendo
em um menino e aí tinha que fazer uma massagem alongar e ele tava
todo preocupado.. ele falava: gente é porque eu suo muito.. na minha
mão e no meu pé. Eu falei: "gente.. que que tem?" Tipo assim.. eu
pensei.. pô to aqui e nem depilei minha perna tipo várias coisas que
ninguém tem que se preocupar.. e acho que quando você se entrega
mesmo às práticas do movi-mente você não vai estar preocupado
com isso.. porque cara isso não é nada.. sabe? Se a pessoa ta com
cecê ou tá com qualquer coisa que sinceramente EU NÃO ESTOU
PREOCUPADA... Eu não to preocupada se eu depilei a perna.. tipo
assim é uma coisa que eu deixei de me preocupar em questão disso..
você desapega total dessas coisas porque o objetivo ali é uma coisa
muito maior.. a interação é uma coisa muito maior.. o que você
sente é uma coisa muito maior que isso que num vai fazer
diferença se sua mão ta suada.. é isso que eu acho fantástico.
8
Na maioria das motrivivências, exceto as que se relacionam com o tema da visão, as luzes mantém-se
apagadas. Pois um dos objetivos seria sentir corporalmente aquilo que os olhos não conseguem ver.
90
quando utilizava a palavra autoconhecimento. Então nos contou sobre o que consiste
para ela o desdobramento de se trabalhar com foco no autoconhecimento:
... e cara é muito diferente quando você começa a trabalhar isso que eu
falei... você fica menos preocupado com o julgamento das pessoas,
você deixa de querer ser uma pessoa que você não é.. quando você
começa a buscar o autoconhecimento.. porque eu sempre tive esse
problema... sempre tive a autoestima muito baixa... muito mesmo...
então.. acaba que você tenta sempre ser uma pessoa que você não é
porque você sempre acha que o que você é não é o suficiente não é
tão bom quanto uma outra pessoa... mas quando você busca o
autoconhecimento você vê que é uma coisa que você não vai
mudar... você aprender a gostar de você assim... dos seus gostos e
cara você vai criando uma paz interior... a sua mente... o ego... se
aquieta um pouco de querer a ser aquilo que você não é e querer
estar em destaque alguma coisa em que você não precisa estar...
Percebemos que dentro deste contexto a jovem produz sentidos subjetivos que
lhe conduzem a um processo de aceitação de si mesma, na medida em reconhece que
conhecer-se não é necessariamente mudar, mas inclusive aceitar o que está lá. Veremos
um pouco adiante como esse processo de aceitação de si a leva a compreender que
existem prazeres que ela se negou para construir uma carreira profissional. A forma
como se percebeu negar envolver-se com as coisas que lhe davam prazer e que
aparentemente não mantinham um elo com o que ela acredita ser sua carreira
profissional.
Observemos expressões que corroboram com nossa hipótese sobre a constituição
de elementos relacionados a configurações criativas no instrumento Completamento de
Frases:
27.Quero ser... eu mesma
Estas duas frases nos chamaram atenção por expressarem congruência com
indicadores anteriores. Ambas relacionadas ao reconhecimento de suas próprias
contradições e o desejo de ser ela mesma.
Então quando V. diz desejar ser ela mesma, intuímos que tal afirmação
mantenha uma conexão com essa concepção de Ser apresentada dentro do Movi-mente
e do curso de Corporeidade. Neste espaço, Ser você mesmo significa estar livre de
padrões psicológicos que lhe oprimem e causam sofrimento. É estar em contato com o
que Rogers (2009) chamou de tendência para caminhar rumo à maturidade. A
91
nomenclatura que estamos utilizando neste texto ao explicarmos a concepção de Ser
usada pelo Movi-mente é a mesma que é utilizada dentro deste contexto.
Enfim apresentamos um momento expressivo do último instrumento a
Composição:
Porém, venho percebendo e aceitando, que sou um movimento só, que
sou a própria mudança do ser, inconstante por si. Existem ainda
infinitas descobertas a serem feitas, assentadas em milhões de
possibilidades. A cada nova descoberta me vejo em um processo
diferente, que envolvem e acarretam em mudanças. Sei que estou em
uma fase de transição, entre o ser que era antes o que virei a ser, mas
isso não implica em minha não existência atual.
Outro fator que utilizamos como indicador para a construção teórica acerca da
constituição subjetiva de V. foram nossas observações dentro de sala de aula, práticas e
durante as imersões. Notamos uma mudança em sua participação nas aulas e nas
práticas ao longo do semestre. No início das práticas, como expressa nos instrumentos
escritos, V. estava mais recolhida, expressando introversão, sentimento que ao longo
das práticas foi mudando.
Percebemos que V. vai se sentindo cada vez entregue, seus olhos já estão
fechados nas práticas onde a proposta é manter os olhos fechados. E nas práticas mais
aleatórias, o segundo tipo que citamos no parágrafo acima, sua participação torna-se
mais fluída. Chega a um momento do semestre em que V. aparenta ser uma veterana do
projeto, pois está realmente entregue.
92
haviam sentido. Várias fantasias estavam dispostas na mesa. Após isso os estudantes
deveriam fazer uma dança para a turma toda e de frente para o espelho, ao mesmo
tempo. V. nos surpreendeu, junto a uma garota que simplesmente tomaram a frente do
grupo e fazendo uma dança sensual, cômica e ridícula ao mesmo tempo. V. estava
muito a vontade, alegre e havia trazido a tona seu ser brincante.
Sua participação ao longo das aulas também aumenta. Faz mais perguntas, vai a
frente junto ao professor para servir de modelo para a turma, auxiliando algo que o
professor deseja explicar.
Reflexão sobre si
Outro elemento que percebemos com muita intensidade durante o processo foi a
Reflexão sobre si. Esse parece ter sido elemento fundamental para que Valkyria
encontrasse vias de avaliação dos próprios conflitos e qualidades. Também lhe auxiliou
num processo de construção da via de superação de seus conflitos. Vejamos alguns
trechos utilizados para a construção de indicadores acerca da reflexão sobre si:
93
No instrumento completamento de frases a garota também expressa reflexão sobre
o vivido:
Me sinto dividida entre duas paixões, uma delas, nem coloco mais
como a engenharia florestal em si e suas múltiplas atividades possíveis
entre seguimentos produtivos ou conservacionistas, mas coloco a
natureza como minha paixão. Faço assim, uma escolha, a
conservação, o estudo da natureza viva.
Voltando a história da arte, a que venho me entregando é a arte do
corpo, a consciência do corpo, as infinitas possibilidades de
exploração desse templo, o respeito e a união entre o corpo e a mente.
Neste sentido, venho passando por mudanças profundas, desde a
alimentação, ao estudo do corpo espiritual. A partir disso surgem
tantas descobertas espirituais que, acredito eu, tem influenciado e
adubado as infinitas descobertas de mim.
94
partilhemos aquilo que está acontecendo conosco. Acreditamos que nos tornamos esse
ponto de apoio para V.
O conceito ego, por exemplo, é muito usado pelo professor durante as aulas.
Esse surge em vários momentos de diálogos e diários de V. como que um ponto de
referência desindentificada em relação a si mesmo. Funciona como uma possibilidade
95
de falar de si mesma e refletir sobre si mesma, sem sentir agredida ou desconfortável.
Torna-se um ponto de referência para que V. desenvolva franqueza ao olhar para si.
96
Perguntamos a ela o que significava aquilo para ela durante a dinâmica conversasional e
ela nos responde:
Perguntamos se ela acreditava no que aquilo queria dizer. E ela nos perguntou no
que consistia aquele conceito. Nós explicamos a ela o conceito de dharma 9 provindo de
tradições orientais e que no contexto em que estávamos significava: essência, função,
uma espécie de qualidade inerente a pessoa e que devesse ser desenvolvida por ela nesta
existência. E encontrá-lo representa, de alguma forma, ter encontrado o sentido da
própria existência. Algo como a qualidade de uma semente, que retrata a natureza e seu
potencial de produzir um determinado tipo de fruto. Ela nos responde: ―Eu queria que
isso fosse verdade‖.
Kapish falou: ―de volta a casa‖... e foi exatamente nesse momento que
eu senti isso.. era exatamente isso como se eu tivesse voltando para a
consciência universal do mundo e entendendo tudo.. (lágrimas, V. se
emociona ao relembrar do vivido) naquele momento eu entendi tudo
do que eu sou, do que o universo é.. tudo foi muito claro... (Dinâmica
9
Dhamma (páli), Dharma (sânskrito). Literalmente, ―suporte‖, ―esteio‖, ―mantenedor‖. É traduzido
variavelmente por religião, verdade, doutrina, lei, norma, justiça, retidão, qualidade, virtude, essência,
constituinte ulterior, fenômeno, natureza, constituintes da natureza, coisa, objeto da mente, qualidade
moral, entidade, etc. No plural, a palavra tem outro significados adicionais: fenômenos (morais, naturais);
hábitos, costumes ou comportamentos (bons ou maus); constituições ou elementos do caráter ; eventos,
coisas (mentais-emotivas); faculdades (mentais-emotivas). Alguns destes significados são comuns
também a algumas filosofias indianas; outros são peculiares ao Budismo. (COHEN, 2004, p. 246).
10
Rodas de energia do corpo sutil representado nas escolas vedânticas. (FEUERSTEIN,1998)
97
Conversasional) Procurar uma relação entre esse mundo e o mundo
transcendente, a consciência universal . Por que então a existência
desse mundo inferior?
Vejamos mais dois trechos onde V. expressa suas percepções a cerca do corpo-
mente em um exercício entregue na última semana de aula, onde o professor pediu aos
estudantes que simplesmente escrevessem o que era Corporeidade para eles:
Os outros corpos emergem como algo próximo, caloroso e próximo, algo a ser
contatado, respeitado, cuidado e a ser conhecido. Por várias vezes em momentos
informais, após o término do curso conversávamos sobre relacionar-se. Esse tema
surgiu quando, de alguma forma, V. tinha superado seu dilema entre vida profissional e
outras atividades. V. expressava certa preocupação em relacionar-se, continuava
questionando e refletindo sobre o que seriam relações sustentáveis, aparentemente em
uma busca por enxergar o que seriam relacionamentos positivos. Anseio que,
possivelmente, mantenha relação com a experiência do relacionamento e separação de
seus pais.
99
brincalhona, seus assuntos e preocupações, apesar de existentes, não transitavam mais
por esses assuntos.
Raíza
R. é uma garota alegre está constantemente fazendo piadas e graça com as coisas. A
garota julga como necessário ser sempre forte, firme e guerreira. É apaixonada por
esportes e ao final de seu curso na Educação Física nos aparece uma pessoa confiante
em relação a sua escolha e futuro profissional.
100
Observando suas postagens no facebook, cerca três vezes ou mais por semana, a
jovem posta fotos de treinos, de competições e de vitorias relacionadas a sua
participação em campeonatos de handebol.
As tensões que surgem em seu cotidiano, expressas em seu diário, nos mostram
como as produções subjetivas de outros espaços participam do processo de subjetivação
de R. dentro do espaço do curso. Seus conflitos expressos no diário referem-se a
preocupação que ela tem com a saúde de sua avó e tia, ao intenso esforço que faz para
manter-se na graduação de fisioterapia e seu dia-a-dia na faculdade particular, seu
conflituoso namoro com uma garota que vive em outro estado e sua insatisfação em ter
de esconder sua orientação sexual da mãe, irmão e amigos.
101
Sobre o curso em seu diário, no mês de março, R. escreve sobre uma aula:
Quando perguntamos se ela indicaria o Movi-mente nos diz que indica para todas as
pessoas que conhece, que ainda estão na UnB. Ela fala para todas as pessoas fazerem,
quando perguntamos por quais motivos de forma engraçada nos diz que acordou para
uma luz. Quando a questionamos o que seria essa luz a estudante traz um tom mais sério
em sua voz e comprimindo o rosto assume um tom reflexivo e nos responde:
muda a vida sacou.. muda.. primeiro que muda a vida pra você muda a
sua percepção do mundo e de você mesmo. coisas que antes pra você
passava despercebido.. sempre valorizei pequenas coisas.. tipo ah ver
um beija flor tal.. mas ver o tanto de.... conexão.. o tanto de coisa que
tá envolvida naquele ato do beija flor cheirar a beija flor.. tão
complexo que é.. e tão necessário fundamental.. dês do beija flor até
uma nave espacial.. que a gente manda pra lua... mas de sair do
cotidiano repetitivo.. do ―caramba eu tenho que estudar.. tenho que
fazer as provas.. tenho que fazer os trabalhos.. tenho que casar e ter
filho.. tenho que ter uma vida boa‖ sacou?! sair disso.. pra explorar o
sentimento do agora.. o que está acontecendo aqui e agora.. por
exemplo, até a parede que ta aqui e até essas cadeiras são incríveis..
sacou? Elas tem um valor energético incrível, não tanto quando uma
pessoa que te passa essa energia.. mas é muito complexo.. eu não sei
explicar.. deu uma acordada para sentimentos e sensibilidades que
estavam totalmente adormecidos.. por exemplo aquele dia do
paladar.. de comer.. cara.. as vezes você come a comida lá numa
velocidade na sagacidade que você tá e o negócio (a comida) é tão
bem elaborado sabe.. um alimento que tem tanta coisa inserido e você
deixa passar.. o que pegou pra mim é.. não dá pra deixar passar
essas coisas sacou?... é injusto você deixar passar tanta coisa
102
complexa e bonita.. assim tipo ah foda-se é meu dia a dia
entendeu.. então o corpo acordou... E o que eu falei é que me corpo
acordou.. e não só meu corpo mas a consciência de que.. as pessoas
tem que acordar o corpo delas.. eu tenho que ensinar isso pras
crianças.. eu tenho que ensinar que tipo.. velho.. não desvaloriza o
tato.. não desvaloriza a visão.. apesar da visão ser super enganadora..
mas não desvaloriza! a audição.. sacou o olfato..
103
percebemos a emergência de sentidos subjetivos relacionados ao corpo e à orientação
profissional. Tais sentidos produzidos por Raíza, no futuro, podem participar de um
processo facilitador da emergência de recursos que integrem suas configurações
criativas.
Consciência Corporal
Perguntamos a ela então como ela percebe que o corpo é tratado de maneira
geral na Faculdade Educação Física:
104
Os professores não exploram essa questão mais.. eu ia falar profunda..
mas não é mais profunda.. não exploram o corpo!.. a galera explora..
as valências físicas tipo: coordenação, agilidade, habilidade fina, e tal..
isso a galera explora..
E em seguida perguntamos a ela, mas o que é o corpo agora? E ela nos responde:
Vejamos no diário trechos que corroboram com nossa produção teórica acerca do
processo de R. e a produção de sentidos subjetivos relacionados a percepção e
sensibilidade:
105
R. Fala sobre um momento de partilha entre os estudantes após uma prática, ela
se impressiona por conhecer outros estudantes logo na segunda semana de aula:
Cara, olha que louco, olha como é imediato essa influência! Quando
as pessoas se entregam e acessam os seus sentidos, o seu interior elas
se abrem e abrem a cabeça! Muito massa! (março)
106
mais ampla. Passou a se ver para além de alguém educando um corpo num sentido da
performance, mas efetivamente cuidado de seres de forma integral e educando para a
integralidade. Vejamos um trecho da dinâmica conversasional onde ela fala sobre o que
aprende em seu curso:
70.O estudo... é algo que deve te fazer evoluir, crescer, que deve
mudar sentimentos ou sensações dentro de você. O estudo não é
isso que se aprende na faculdade (na sua grande maioria). O estudo é a
reflexão e a prática das questões que te perturbam ou que te instigam
ou que sejam fundamentais pra sua existência. E a corporeidade faz
isso no nível mais profundo do ser. (Completamento de frases)
E na composição:
107
incrível, basta mexer seu corpo e usá-lo da melhor forma pra isso.
(Composição)
No caso Valkyria assim como no caso Raíza, nós encontramos esta perplexidade e
descoberta referente a sensibilidade do corpo. Porém em V. seu olhar está
predominantemente centrado em aspectos subjetivos. V. expressa estar realizando uma
108
investigação sobre sua subjetividade, o que ela sente; como e por que ela se sente de
determinada forma em relação às coisas da vida.
Como ela diz, ela percebe que o corpo é mais do que carne, gordura e ossos. R.
não está, por exemplo, como em V. predomina, questionando seu caráter de sujeito em
relação às coisas que lhe acontecem.
R. está concebendo este corpo complexo, que sente e que emociona-se, que age
tanto conscientemente como inconscientemente, e em nossa hipótese, sua produção de
sentidos subjetivos relacionados ao corpo cria condições favoráveis para um processo
de abertura a si mesma, pois está concebendo que o que ela pensava e gostaria de ser
está longe do que efetivamente é. O corpo-mente, espaço que antes era tido como algo
dado, agora está se torna um mistério destituído de obviedade.
Ao final do processo de R., nos parecia que a jovem estava conseguindo conceber
a proposta do curso: conhecer o mistério para além do corpo óbvio, que alimenta em
R. uma vontade de se autoconhecer. Em seus relatos, ao final do curso, começamos a
ver em R. pela primeira vez uma expressão autocrítica. Também se expressa um
reconhecimento das próprias qualidades indicando um aumento da auto-estima, coisas
109
que inexistiam durante a maior parte do processo. Portanto possivelmente teríamos a
oportunidade, caso o curso se estendesse, de perceber e fundamentar em R. a
emergência de processos subjetivos que percebemos emergir em V.
110
Em V. por exemplo, as mudanças que percebemos estão ligadas aos processos
subjetivos relacionados à criatividade que focamos e desenvolvem-se principalmente a
nível de reflexão sobre si, que potencializa-se por estar atrelado a sua vontade de se
autoconhecer, em sintonia com o objetivo do curso. No entanto apareceram também
outros recursos subjetivos associados à criatividade como novas configurações da
motivação profissional como vimos no caso R.
Tudo isto corrobora inferir, nos sujeitos estudados, uma relação entre corpo,
mudanças na subjetividade e criatividade. Os sujeitos implicaram-se numa experiência
da corporeidade, que constituiu um espaço de produção de novos sentidos subjetivos.
Esses expressaram-se em mudanças nas configurações subjetivas que, entre outros
aspectos, implicaram o desenvolvimento, ao menos incipiente, de recursos subjetivos
associados à criatividade.
111
5. IMPERMANENTES CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos neste trabalho, foi possível articular uma relação, que não é linear e
nem causal, entre Corporeidade, Subjetividade e Criatividade. Observamos como que
uma experiência em um espaço, onde organizam-se várias experiências com o corpo
com o objetivo de autoconhecimento, tem desdobramentos na subjetividade de seus
participantes, favorecendo a emergência de recursos subjetivos associados à
criatividade.
A presente pesquisa torna-se relevante ao passo que nos permite ampliar nossas
compreensões sobre de que forma o trabalho com o corpo, em uma perspectiva
complexa, multicultural e espiritual, propulsionada pelo campo da Corporeidade, pode
ter impactos no desenvolvimento da subjetividade favorecendo potencialmente uma
futura expressão criativa.
A Teoria da Subjetividade nos alerta para ao fato de que nas nossas relações com
o mundo e com nós mesmos participam de nossas configurações subjetivas. Desta
forma, quando pensamos em saúde, bem-estar e educação dentro da teoria pensamos em
recursos subjetivos capazes de auxiliar o indivíduo em sua trajetória pela vida. Auxiliam
em uma vida que, longe de ser perfeita, pode ser vivida com dignidade e com um senso
de satisfação maior do que o de insatisfação. Quais configurações singulares
participariam da constituição de uma pessoa que se sente realizada neste mundo?
112
sejam favoráveis ao desenvolvimento de processos subjetivos como a autoconfiança,
paciência, desinibição, coragem, resiliência ente outros, muitos deles favorecedores da
criatividade?
Neste espaço o corpo não surge como uma máquina que pode atingir alta
performance. Não surge como algo que precisa estar em uma forma pré-determinada
para atender uma estética hegemônica e nem mesmo algo a ser usado para atingir uma
saúde estritamente fisiológica. Mas torna-se um complexo organismo capaz de
revolucionar a subjetividade daqueles que se tornam presentes em Si mesmos (SOUSA,
2009-2010).
Como pesquisadores o que mais nos toca ao longo do trabalho é o poder das
unidades simbólico-emocionais, o que nos fez pensar em uma microfísica da ação. O
impacto da emergência de novos sentidos subjetivos pode ser capaz de atribuir ao olhar
e existência da pessoa um brilho inarrável, em um instante pode tornar-se leve aquilo
que outrora lhes pesava.
113
corpo/casa ao perceberem-se separados e superiores aos diversos outros e à natureza.
Tal crença pode torná-los passíveis de serem inescrupulosamente explorados e
desrespeitados. Como também pode portar uma subjetividade que favorece a
regeneração de nossas relações com nós mesmos e com o Todo, conforme
estabelecemos vínculos sensíveis e afetivos com os mesmos.
Tentar compreender a subjetividade, seja ela individual, seja ela social, é tentar
compreender quais crenças, emoções, pensamentos, sentimentos, percepções,
individuais e compartilhadas são constituídas dentro de um contexto histórico-cultural.
Como podem estar participando de nossos movimentos corpóreos individuais e
coletivos, sem que inclusive tenhamos a consciência de que ou por que estamos
agindo. E pior, inconscientes do quê ou a quem servimos através de nossas ações.
Outro fator que nos chama a atenção é perceber que a pesquisa é um momento
subjetivo do pesquisador. Nosso olhar provavelmente viciado pelo primeiro caso,
custou a se tornar receptivo ao o inesperado quando fomos trabalhar no segundo caso.
Agora, no instante que concluímos o texto, continuamos a revisitar as informações
produzidas em campo, e continuamos a fazer associações, análises-interpretativas e
novas hipóteses continuam a surgir. Agora já somos orientados por outros interesses,
que não são mais os pautavam o início desta pesquisa.
114
um dinamismo que, por si, favorece um processo de produção cientifica complexo e
transdisciplinar.
Ainda há muito o que ser pesquisado, nesta pesquisa demos pequenos passos em
busca de compreender a relação corpo e subjetividade. Alertamos para uma certa
urgência que temos em implantar projetos como o curso/disciplina em diferentes
espaços formais e não formais, não apenas no ensino superior e não apenas no curso
de Educação Física. Favorecer um processo onde, a partir do corpo, somos capazes de
conceber a nós mesmos de uma forma nova e principalmente mais humana.
É preciso destituir o corpo de sua moderna obviedade, é preciso que espaços como
o curso e o projeto, apresentados nesta pesquisa, sejam cuidadosamente pensados. Por
exemplo, a partir de uma perspectiva da criação de políticas públicas que nos garanta
acesso a uma forma transformadora de concebermos a nós mesmos e o mundo. Não
apenas no sentido de inserção de um componente curricular, mas como um princípio
que deve orientar processos educativos comprometidos com o bem-estar planetário.
115
Nos parece que este seja um delicado trabalho de criar espaços de alto nível,
como o Movi-mente, e neste exato momento é um desafio. Da mesma forma que
surgem atividades aparentemente interessantes e de positivo valor para aqueles que o
praticam, também surgem algumas iniciativas um tanto quanto estranhas, charlatãs. A
epistemologia qualitativa pode nos servir como um instrumento de observação
qualitativa em relação a essa iniciativas.
116
As práticas, destituídas de uma visão poderiam se tornar mais um tipo de
escravidão, mais uma simples forma de fuga do cotidiano, o que em hipótese alguma
pode ser considerado, como sendo o objetivo de tais práticas. Tendo em vista a
crescente a ânsia pelas tecnologias do Ser, através do reconhecimento de seus
impactos neurofisiológicos, este tema é de extrema relevância. Populariza-se o acesso
a essas tecnologias, mas ao mesmo tempo teme-se o retorno ao trevoso período
medieval, ao aproximar-se de uma perspectiva filosófica radicalmente diferente da que
concebemos no cotidiano ocidental e que por vezes preconceituosamente enquadramos
em nossa restrita concepção científica do religioso. Com isso distorcendo suas bases
filosóficas e epistemológicas.
Pensar a educação do corpo é permitir que o corpo de cada um, sem medo,
produza respostas às perguntas que sintomaticamente lhe inquietam. Perguntas e
respostas que nos surgem quando paramos e nos observamos. É o início do processo
de conhecer e produzir o conhecimento, inquietar-se ou espantar-se ao ser encontrado
por uma ideia ou lembrança. Encontrar nosso próprio corpo é um encontro criativo
com nós mesmos, conscientizarmo-nos de que nos emocionamos e temos sentimentos,
de que operamos para além de nossa consciência local é caminho para um viver
sensível e criativamente consciente.
117
em direção ao respeito e compassividade diante da complexa expressão humana e,
portanto, da Vida; é tornar lícita a qualidade criativa da natureza e se tornar receptivo à
sua expressão; é deixar o mistério nos sussurrar aos ouvidos a poesia que da vida ao
mundo.
118
REFERÊNCIAS
BARROS, Laura P. de. O corpo em conexão: sistema Rio Aberto. Niterói: Ed. UFF,
2008.
DELORS, Jacques et al. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 1998.
119
FELDENKRAIS, Moshe. Consciência pelo movimento. Grupo Editorial Summus,
1977.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1981.
120
GOLEMAN, Daniel. A mente meditativa: as diferentes experiências meditativas no
oriente e no ocidente. Atica, 1997.
JECUPÉ, Kaka Werá. A terra dos mil povos: história indígena brasileira contada
por um índio. Editora Peirópolis, 1998.
121
_________________________; TACCA, M. C. V. R. Criatividade no trabalho
pedagógico e criatividade na aprendizagem: uma relação necessária. Aprendizagem e
trabalho pedagógico, p. 69-94. Alínea, 2008.
MORIN, Edgar. O método vol. 1-a natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, 2002.
_____________. A cabeça bem feita. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, p. 99, 2000.
OSHO, Bhagwan Shree Rajneesh. Criatividade: liberando sua força interior. São
Paulo, 1999.
____________. Uma breve história do universo. Rio de Janeiro: Nova Era, 2001.
123
ANEXOS
ANEXO I
Plano de Curso
Ementa
EMENTA: Corpo, corporeidade, sensoriedade-sensibilidade, perceção, indivíduo
e individuação, cultura do corpo, movimento, expressividade, impressividade.
OBJETIVOS GERAIS
Aprofundar a discussão acerca do fenômeno da corporeidade na contemporaneidade
à luz da história;
Estimular a sensibilidade e a perceção integrativa através de motrivivências;
Ampliar a consciência de si
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Estudar o fenômeno da corporeidade na sociedade contemporânea
Aguçar o aparato sensorial e a perceção.
Ampliar a expressividade e a impressividade corporal
124
O processo do autoconhecimento (individuação)
- Uma praxis para integrar as dimensões fisica, emocional, intelectual,
espiritual e social do ser humano
METODOLOGIA
A praxis da disciplina segue uma abordagem construtivista onde, de acordo com
as aspirações e possibilidades do grupo enveredamos por uma leitura crítica do tema
CORPOREIDADE revendo aspetos individuais e sociais, históricos e da atualidade para
construir meios de ampliação da consciência do próprio indivíduo. As aulas se baseiam
em motrivivências que intencionam levar o indivíduo a uma ―leitura de si‖. Serão
adotadas técnicas de ensino diversas (diretivas e não diretivas) que envolverão
trabalhos individuais e em grupo.
Menções
As menções serão dadas em relação ao total de pontos obtidos nas avaliações.
SS Igual ou acima de 9,0 MS De 7,0 a menos de 9,0 MM De 5,0 a menos de 7,0
Estará aprovado o Aluno que obtiver menção final igual ou superior a MM.
Ficará reprovado, com a menção SR, o discente que ultrapassar a 25% de faltas da carga horária da dis-
ciplina.
1,0
Realização de práticas e estudos contextualizados
5,0
Participação efetiva, assiduidade, contribuições às
aulas......................................................................................................
TOTAL
............................................................................................................................... 10,
...................... 0
125
Observações Pertinentes
Cada discente deve ocupar-se em manter o seu aparelho de telefone celular
desligado durante todas as aulas. É uma questão de educação!
Bibliografia Recomendada
Amoroso R, Dienes I, Varga Cs (eds). Unified Theories. Oakland: The Noetic Press;
2008.
_______. Reencantar a educação: rumo à sociedade aprendente. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
Bateson G.. Natureza e espírito – uma unidade necessária. Lisboa: Dom Quixote; 1987.
126
Boff L. Ethos mundial. Brasília: Letraviva; 2000.
Brito M, João R. Percepção corporal no esporte. In: Jogo, corpo e escola: Esporte
escolar – Módulo de ensino a distância ( Programa Segundo Tempo. Capacitação
Continuada especialização). Brasília: UnB/CEAD/Ministério do Esporte. (3); 2004.
CAGIGAL, José Maria. Cultura intelectual e cultura física. Buenos Aires: Editorial
Kapelusz,1979.
Carvalho Y M. O ―mito‖ da atividade física. São Paulo: Editora Hucitec, 1998. 133 p.
Castellani L. Educação Física no Brasil : a história que não se conta. Campinas: Papirus,
1994. 93 p.
_______. Uma reflexão sobre o corpo. In: Rodrigues D.(Edit.) O corpo que
(dês)conhecemos. Lisboa: Faculdade de Motricidade Humana; 2005
127
_______. A prática e a Educação Física. 2ed. Lisboa: Portugal. Compendium, S/D.
Damásio AR. O Erro de Descartes: Emoção, Razão e o Cérebro Humano. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
_______. O mistério da consciência. São Paulo, SP: Ed. Companhia das Letras, 2000.
Goldenberg M. Nu & vestido: dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio
de Janeiro: Record, 2002.
128
Jia YC, Davids K, Hristovski R, Araújo D, Passos P. Nonlinear pedagogy: learning design
for self organization neurobiological systems. New Ideas in Psycology. 2011, aug;
(29)2: 189-200, Disponível em:
http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0732118X10000607. Acessado em
17 jul 2011
Maturana H, Varela FJ. A Árvore do Conhecimento. São Paulo: Palas Athenas; 2001
Motoyama H. A teoria dos chakras: ponte para a consciência superior. 5ed. São Paulo:
Pensamento; 2001.
129
Rodrigues D (Edit.). O corpo que (dês)conhecemos. Lisboa: Faculdade de Motricidade
Humana; 2005
Werneck CLG. Educação Física: Novos olhares sobre o corpo. In: SOUZA, Eustáquia
Salvadora & VAGO, Tarcício Mauro (orgs.). Trilhas e partilhas: Educação Física na
cultura escolar e nas práticas sociais. Belo Horizonte: Gráfica e Editora Cultura Ltda,
1997. 387 p.
http://www.motricidade.com/index.php?option=com_content&view=article&id=124:a-
accao-pedagogica-do-professor-de-educacao-fisica-pos-
graduado&catid=48:docencia&Itemid=90
Wilber K. Uma Teoria de Tudo: uma visão integral para os negócios, a política e a
espiritualidade. São Paulo: Cultrix, 2003.
_______. A união da alma e dos sentidos: integrando ciência e religião. SP: Cultrix,
2006.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
Cuche D. A noção de cultura nas ciências sociais. Bauru: EDUSC, 2002. 255p.
130
Goleman D, Gurin J. Equilbrio mente-corpo. Rio de Janeiro: Campos;1997.
Naranjo C. Mudar a educação para mudar o mundo. São Paulo: Esfera, 2005.
Rohden H (Lao Tsé). Tao Te King – o livro que revela Deus. São Paulo: Martins Claret;
2003.
Segalen M. Ritos e rituais contemporâneos. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002. 161 p.
Sousa JA. Vergílio Ferreira e a filosofia da sua obra literária. Lisboa: Instituto Piaget,
2008.
OBS: Material advindo de periódicos serão utilizados ao longo da disciplina, mas que
não estão aqui relacionados. As fontes serão apresentadas ao longo do semestre.
131
ANEXO II
Ano:
Semestre: ( X ) 1º ( ) 2º
1. IDENTIFICAÇÃO
MOVI-MENTE
1.3. Coordenador:
Unidade de lotação:FEF
Cargo/Titulação:PROFESSOR/DOUTOR
132
Local da execução:CENTRO OLÍMPICO/FEF
OBS: O projeto Movi-mente não segue uma lógica de terminalidade. Pausas são realizadas no período de férias
acadêmicas porém as atividades retornam com o inicio do semestre letivo.
2. VÍNCULO ACADÊMICO
Departamento(s):
Disciplina(s):
3. CARACTERIZAÇÃO DO PROJETO
3.2. Origem:
3.3. Multidisciplinariedade:
Áreas envolvidas: O projeto Movi-mente é multifacetado podendo ser relacionado a varias outras áreas como
educação, artes, saúde, serviço social, psicologia.
133
3.4. Instituições envolvidas/Tipo de participação:
No segundo semestre de 2013 pretendemos interagir com as seguintes instituições: Escola de ensino médio-CEAN
e Núcleo de reclusão feminina da Colméia. Manteremos também uma interface com o Projeto Atividade física e
Parkinson
4. JUSTIFICATIVA
Numa sociedade em estado de crise, a preservação dos valores humanos, da ética, da ecologia merecem detida
atenção pois são orientam possibilidades de ampliação de uma vivência e de uma convivência dignas. Neste
sentido, a busca do autoconhecimento (consciência de si) é uma emergência na atualidade O desenvolvimento da
consciência de si (metanóia), assim entendemos, representa o caminho para preservar e melhorar as condições de
nossa existência. Este intento está evidenciado em diversos contextos e mecanismos da sociedade. O corpo, neste
contexto, representa, em nossa compreensão, a base para realização dessa busca.
Há quase duas décadas desenvolvendo estratégias direcionadas para esse objetivo, vimos constatando que a
atividade corporal constitui um eixo fundamental no processo de autodescoberta.
O Movi-mente amparado em experiências abertas de educação motora é um projeto que constutuiu-se numa
oportunidade ímpar de auto-conhecimento.
5. OBJETIVOS
Estabelecer um espaço/tempo para a comunidade em geral experienciar rupturas nos padrôes cotidianos
através do trabalho corporal e da meditação dinâmica
6. METODOLOGIA
134
Baseado em uma proposta aberta de ensino, experiêncas corporais (motrivivências) são desenvolvidas almejando
a ampliação da percepção visando a consciência corporal e a meditação. O trabalho é desenvolvido em sessões de
2 a 3 horas de atividade.
Baseada numa abordagem de trabalho singular desenvolvida no próprio Movi-mente (Brito, 2013), as práticas
buscam numa perspectiva não linear a ruptura com os padrões comportamentais do cotidiano.
As atividades emergem como fruto da capacidade criativa do mediador e do grupo em função da situação do
Agora que se contextualiza. Assim sendo, os indivíduos são convidados, a cada encontro, a uma experiência
inusitada. A praxis segue um fluxo que envolve ação-observação- reflexão-inação e fundamentam-se no Kaos
criativo, no jogo, na formação de um campo harmônico de interações que visam ativar a bio-energia da
corporeidade em todas as dimensões (física, emocional, mental, espiritual e social)
7. CLIENTELA
O público que freqüenta as práticas é eclético e vai desde jovens acima de 15 anos até a terceira idade. Em geral, o
grupo frequentador compõe-se de jovens entre 20 e 30 anos. O número de participantes é aberto, mas
normalmente gira em torno de 30 a 40 pessoas.
A partir de 2013 ampliaremos a oferta do projeto para jovens que estão cursando o ensino médio, para mulheres
em estado de reclusão e para portadores da doença de Parkinson.
8. AVALIAÇÃO
A avaliação segue uma perspectiva eminentemente qualitativa. Relatos espontâneos e induzidos, rodas de troca
de experiência, entrevistas abertas, trocas via internet e entrevistas com os particiipantes são os mecanismos
utilizados para assegurar o curso da proposta. Circunstancialmente, relatos por escrito das experiências e da
trajetória pessoal são requisitados para documentar os processos de desenvolvimento.
Testes específicos para aferição de competencias corporais, aspectos psicológicos e sociais devem passar a fazer
parte da coleta de dados como fundamento para pesquisas e produção acadêmica introduzindo no contexto
avaliações quali-quantitativas.
9. SOCIALIZAÇÃO DO CONHECIMENTO
(Produtos a serem gerados: a) de natureza cientifica: monografias, teses, publicações, etc; b) de natureza artística:
135
oficinas, produtos artísticos, etc.)
Alguns produtos já foram constituídos em forma de artigos e apresentações em congresso. A experiência do Movi-
mente orientou a tese de doutorado Brito M. A construção do sentimento de unidade: desdobramentos de uma
abordagem corporal atípica no desenvolvimento humano. [Tese de doutorado] UTAD-Portugal, 2013.
Encontra-se à disposição da Revista Pensar a Prática (UFGO), o artigo entitulado: Educar para a consciência da
unidade.
Outros 3 artigos encontram-se em fase de conclusão e devem ser submetidos no segundo semestre de 2013.
Subcoordenaç
ão,organizaçã
o e orientação
3)
4)
5)
Meses jan Fev Mar Abr mai jun jul ago set out Nov dez
Etapas
1) Elaboração do projeto x
2) Encaminhamento do projeto x
3)início do projeto X
136
4)conclusão do ciclo semestral x
5)recomeço X X
Os ítens 12 e 13 são referentes a despesas. Como não há previsão orçamentária excluí estes
itens.
13. ANEXOS
( ) Ficha cadastral: palestrantes, instrutores e professores externos (ou curriculum vitae resumido).
137
Nome do Projeto: MOVI-MENTE
PARECER DO COORDENADOR DE EXTENSÃO (No parecer deve constar: adequação do projeto às normas do DEX;
compatibilidade entre a área do coordenador do projeto e a atividade proposta; compatibilidade da receita e despesa (quando
houver); encaminhamento de informação adicionais previstas no quadro de ANEXOS, mérito da proposta.)
138
acadêmicos e a relevância do projeto; a disponibilidade do coordenador da proposta para desenvolver o
projeto.)
Cargo: Matrícula:
139
Anexo III
Temas das reflexões escrita pedidas pelo professor Marcelo de Brito ao longo do
semestre no curso Corporeidade.
1. Carta ao corpo: O estudante deve escrever uma carta a seu próprio corpo.
2. O que é Corporeidade?
3. Quais são seus padrões inconscientes? O que fazer para superá-los?
4. Auto-avaliação: O que você aprendeu em Corporeidade?
140
APÊNDICES
Apêndice I
Roteiro de observação
1. Momento teórico
- Interatividade alunos-alunos
- Interesse e participação dos alunos em relação ao que está acontecendo dentro de sala
- Reação e expressão dos estudantes durante as aulas teóricas em relação aos assuntos
polêmicos como: espiritualidade oriental, consciência, real e realidade, reencarnação e
outros.
2. Momento prático
- Participação e resposta aos comandos dados pelo professor dentro do projeto Movi-
mente
3. Imersões
141
- Expressões e reações diante daquilo que é requerido nas motriviências
142
Apêndice II
Instruções enviadas por correio eletrônico aos sujeitos de pesquisa sobre o que escrever
no diário.
Sobre os diários, existem duas ocasiões em que eu gostaria que vocês escrevessem nele.
Mas vocês para além delas vocês podem escrever o que tiverem vontade.
Trata-se de explicar minuciosamente aquilo que você vivenciou na sua aula e prática.
Fiquem a vontade para abrir as profundezas do coração. Pensem nisso como um
processo terapêutico, com possibilidades de tomarem consciência de si mesmo,
ampliando suas potencialidades e superando suas limitações.
2. Caso durante a semana ocorrer alguma situação que lhe lembre o Movi-mente.
Se no seu cotidiano, você perceber que por algum motivo você se lembrou de algo que
ocorreu no Movi-mente ou na aula, escreva no caderno esta situação que o fez lembrar
do Movi-mente e descreva com detalhes o porque que você acreditar ter lembrado.
Enfim, narre o que ocorreu e narre sua reflexão sobre o acontecido. Fique a vontade
par a compartilhar
Agradeço a participação.
Abraço,
Victor.
143
Apêndice III
Escolha da graduação e processo de graduação: Este eixo busca investigar como foi
o processo de tomada de decisão em relação ao curso de graduação. Buscamos
compreender como a pessoa se sentia previamente antes de entrar o curso, como ela está
vivenciando sua graduação, como se sente em relação ao futuro de seu curso, quais
perspectivas o curso lhe abriu,
Quem sou? De onde vim? Para onde vou? Busca por compreender como a pessoa
percebe a si mesmo em sua trajetória, como vê o mundo e como se organiza para se
relacionar com ele. Este tópico também busca compreender como a pessoa está vivendo
seu momento atual, o que tem feito, quais tem sido seus conflitos, como a pessoa se
situa diante de seus conflitos, como se sente em relação a vida e aos próprios objetivos.
144
Apendice IV
COMPLETAMENTO DE FRASES
Complete as frases abaixo com a primeira ideia que surgir na sua mente:
1.Eu gosto...
2. O tempo mais feliz...
3. Gostaria de saber...
4. Lamento...
5. Meu maior medo...
6. Meu corpo...
7. Não posso...
8. Sofro...
9. Fracassei...
10. A coisa mais importante...
11. Meu futuro...
12. No Movi-mente...
13. Meu caminho...
14. Algumas vezes...
15. Este lugar...
16. A preocupação principal...
17. Desejo...
18. Corporeidade...
19. Secretamente eu...
20. Eu...
21.Meu maior problema é...
22.O trabalho...
23.Amo...
24. Estou melhor...
25.Eu prefiro...
26.Meu problema principal...
27.Quero ser...
28.Creio que minhas melhores atitudes são...
29.Nesse ano...
30.A felicidade
31. Quando acontece algum imprevisto...
32.Esforço-me diariamente por...
33.Sinto dificuldade...
34.Meu maior desejo...
35.Sempre quis...
36.Gosto muito...
37.Minhas aspirações são...
38. Nos últimos meses tenho me sentido...
39.Minha vida futura...
40.Farei o possível para alcançar...
41.Frequentemente, reflito sobre...
42.Proponho-me a...
145
43.Meu maior tempo dedico a...
44.Sempre que posso...
45.Luto...
46.Frequentemente, sinto...
47.Diante de situações novas...
48.No início o ano...
49.Esforço-me...
50.As contradições...
51.Minha opinião...
52.Penso que as pessoas...
53.Espero...
54.Incomoda-me...
55.Ao deitar-me...
56.A gente...
57.Decidi que...
58. Meus estudos...
59. Percebo mudanças...
60. Considero que posso...
61.Quando tenho dúvidas...
62.No futuro...
63.Necessito...
64.Minha principal ambição...
65.Odeio...
66.Quando estou só...
67.Meu maior temor...
68.Se trabalho...
69.Deprimo-me...
70.O estudo...
71.Meus amigos...
72.Meu grupo...
73.O ser humano...
74.Não me sinto preparada...
146
Apêndice V
COMPOSIÇÃO
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