Educação de Surdos Entre Narrativas Docentes
Educação de Surdos Entre Narrativas Docentes
Educação de Surdos Entre Narrativas Docentes
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EDUCAÇÃO DE SURDOS ENTRE
NARRATIVAS DOCENTES:
CONSTRUÇÕES REFLEXIVAS À LUZ
DOS ESTUDOS CULTURAIS E ESTUDOS
SURDOS
POLLIANA BARBOZA
Doutora em Ciências da Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da Educação da Christian
Business School. Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da
Universidade Federal da Paraíba, Professora da Educação Básica; Supervisora Escolar, pollianabarboza@
hotmail.com.
RESUMO
O campo dos Estudos Culturais conduz para o centro das discussões os grupos que
estão às margens da sociedade, na busca de dar visibilidade para que possam resistir
e lutar contra o que é exigido pelo cânone, além de referenciar posições de militância,
questionar e problematizar os fatos. Os Estudos Surdos embasados nas contribuições
dos Estudos Culturais lutam pelo reconhecimento da pessoa surda em sua cultura, iden-
tidade e língua. Nesta perspectiva, os Estudos Culturais e os Estudos Surdos batalham
pela compreensão da surdez numa perspectiva socioantropológica e pela valorização
desta diferença. O objetivo desta pesquisa é compreender as narrativas de professores
de uma escola estadual, localizada no interior de Pernambuco sobre a educação de sur-
dos, à luz dos Estudos Culturais e Estudos Surdos. Utilizamos como aportes teóricos
Skliar (1998); Perlin (2003); Sá (2006); Hall (2011); Souza e Souza (2012); Strobel (2016);
Dorziat (2019); Silva (2020). A metodologia utilizada foi de abordagem qualitativa,
segundo Chizzotti (2011), quanto aos objetivos, à pesquisa foi exploratória (Gonsalves,
2011), e quanto aos procedimentos de coleta trabalhamos com a pesquisa de campo
(Severino, 2018). A técnica utilizada foi à entrevista semiestruturada, baseada em
Richardson (2015), em que o instrumento foi um roteiro prévio. O campo de pesquisa
foi uma escola pública estadual, localizada em Pernambuco. Os participantes da pes-
quisa foram 6 (seis) professores que lecionam no Ensino Fundamental – anos finais
e no Ensino Médio. Os achados da pesquisa apontaram que as práticas pedagógicas
É
um grande desafio nos dias de hoje fazer pesquisa em educação no viés dos
Estudos Culturais - EC e ao mesmo tempo prazeroso. O campo dos EC possi-
bilita ao pesquisador variedades de óticas de análise, um campo metodológico
amplo, maior aproximação e identificação com o objeto de estudo, além de permitir
que todos os participantes tenham vez, voz e lugar.
Nesta direção, os EC têm suas origens nas movimentações de grupos sociais,
que referenciados num pensamento crítico e de contestação, buscam o rompi-
mento de concepções elitistas e cristalizadas de cultura. Atuando nesse contexto
das culturas, os EC expõem tentativas de descolonização de conceitos e práticas de
cultura. Assim, a cultura passa a ser entendida como “expressão das formas pelas
quais as sociedades dão sentido e organizam suas experiências comuns; cultura
como o material de nossas vidas cotidianas, como a base de nossas compreensões
mais corriqueiras”. (Costa, 2011, p.109).
Buscando movimentar os debates e evidenciando posturas contra as ideias
hegemônicas de poder, os EC “configuram espaços alternativos de atuação para
fazer frente às tradições elitistas que persistem exaltando uma distinção hierárquica
entre alta cultura e cultura de massa, entre cultura burguesa e cultura operária, entre
cultura erudita e cultura popular” (Costa; Silveira; Sommer, 2003, p.2). Portanto, os
EC propõem desfazer os binarismos originados das raízes tradicionais através de
uma posição política de oposição e movimentações que geram discussões, incerte-
zas, conflitos e ansiedades.
Neste sentido, ao compreender a importância de professores e professoras
em considerarem a cultura surda, a diferença, as identidades e a língua de sinais
como pontos chave para se pensar a educação de surdos, é que se propõe o desen-
volvimento desta pesquisa.
A escolha desta temática se deu com base nas experiências adquiridas com
a pesquisa realizada no Mestrado e também no âmbito profissional, atuando como
professora do Atendimento Educacional Especializado - AEE. As questões, no que
tange a educação de surdos geraram inquietações e reflexões, na medida em que
se observavam em algumas escolas, práticas pedagógicas que excluíam as pes-
soas surdas do processo educacional.
Alguns problemas podem ser apresentados, no que se refere à temática aqui
apresentada, que estão permeados pela hegemonia da cultura ouvinte e concepção
1 Os nomes dos sujeitos apresentados são fictícios. Os dos/as professores/as se iniciam com a letra
“O” para fazer menção a palavra ouvinte.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Professores Narrativas
Eu utilizo o ábaco, material dourado, banners com dados sobre os conteúdos, ferramen-
tas digitais disponíveis na internet. O ábaco e o material dourado é bem semelhante a
apresentação tradicional, mas trago sinais utilizados na Libras para ficar mais íntimo. Já
Odilon as ferramentas digitais, no momento da busca, procuro por características mais visuais
e intuitivas, para assim adaptá-las em alguns momentos. Os Banners já ficam na sala
expostos, estão disponíveis na escola, em todas as salas. Neles estão contidas muitas
informações sobre o básico de Libras. Alguns dependem das disciplinas.
Os recursos são para a turma. O recurso que é dedicado aos surdos é o humano, no caso
Orlando do TILS. Então, de modo geral, uso projeção de slides, computadores com acesso a inter-
net, lousa, etc. No momento atual, o google meet com um TILS dedicado ao aluno.
Olimarcia Eu utilizo livro, vídeo com legenda e práticas com tradução do intérprete.
Eu utilizo slides, projetor, recursos audiovisuais com legendas, lousa, livros, etc. Eu utilizo
esses recursos de forma direcionada e gradual para o aluno surdo e para a intérprete/
Oscar
tradutor. Não com o objetivo apenas de repassar o conteúdo, mas, de incluir o aluno nas
aulas e fazer com que ele consiga aprender, de forma dinâmica e prazerosa.
Eu utilizo nas minhas aulas as apresentações em power point, de forma criativa e dinâ-
Odisseia
mica.
Para tanto, não é possível ensinar os diferentes através dos mesmos recur-
sos, de forma integral, é preciso se pensar no direcionamento mais específico para
as particularidades dos grupos de estudantes. Focando nos estudantes surdos não
é possível incluí-los nas aulas, tendo como base a igualdade com os estudantes
ouvintes, mas sim ancorados por suas diferenças sócio-histórico-cultural.
O professor Oscar (Sociologia), por sua vez, relata que utiliza slides, projetor,
recursos audiovisuais com legendas, lousa, livros, etc. Ele relata ainda que utiliza
esses recursos de forma direcionada e gradual para o estudante surdo e para o
intérprete de Libras, com o objetivo de incluir o estudante nas aulas e fazer com que
alcance a aprendizagem de forma dinâmica e prazerosa. Essa ação do professor
Oscar aponta para o conhecimento que ele tem sobre o direcionamento dos recur-
sos didáticos para os estudantes surdos, deste modo:
Mais que conhecimentos gerais, o professor necessita ter conhecimen-
tos básicos para identificar as necessidades educacionais do aluno, para
adaptar estratégias e recursos de ensino que facilitem o seu aprendi-
zado, assim como formas alternativas de avaliação de aprendizagem que
permitam identificar o seu verdadeiro nível de desempenho. Com isso, o
professor pode favorecer o processo ensino-aprendizagem de todos os
alunos (Souza; Rodrigues, 2007, p.44).
Professores Narrativas
Eles participam, sim. Através dessa participação os alunos surdos lidam com os questio-
Odilon
namentos, se expressam, demonstram dificuldades, compreensões e receios.
Eu percebo que não é a surdez que impossibilita o estudante surdo de participar da aula.
Orlando
Tem aluno que gosta e ou quer, tem aluno que não gosta e ou não quer.
Os alunos participam das aulas, mas isso depende da personalidade do aluno e do nível de
Olimarcia
familiaridade com as línguas.
Considero que os alunos surdos participam das aulas, sim. Não identifiquei grandes difi-
Otamira culdades de aprendizagens em alunos surdos que não se igualassem, em muitos casos,
as dificuldades dos alunos ouvintes.
Sim, principalmente através da atuação do intérprete/ tradutor, que o auxilia de perto e dire-
ciona suas dúvidas para o professor. Porém, caso não exista a atuação desse profissional
(intérprete/ tradutor) a dinâmica da sala de aula e o processo ensino e aprendizagem se
Oscar torna um pouco mais difícil para esses alunos.
Os alunos surdos são bem ativos, e perguntam bastante, principalmente expondo suas
dúvidas ao profissional que os auxiliam e assim direcionam a mim, e eu consigo explicar e
esclarecer suas dúvidas com auxílio do profissional da Libras.
Os alunos surdos participam das aulas, sim. Eles participam fazendo as atividades e atra-
Odisseia
vés de sinais.
Fonte: Entrevista 2021.
REFERÊNCIAS
LIMA, N. M. F. de. Inclusão escolar de surdos: o dito e o feito. In: DORZIAT, A. (Org.).
Estudos Surdos: diferentes olhares. Porto Alegre: Mediação, 2017. p. 141-170.
SEVERINO, A. J. Metodologia do trabalho científico. 24ª ed. São Paulo: Cortez, 2018.
SILVA, L.R. O trabalho pedagógico surdo na escola regular. 2020. 240 f. Tese
(Doutorado em Educação), Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade
Federal da Paraíba, João Pessoa-PB, 2020.