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Introdução

O Estado elabora leis por intermédio do Poder Legislativo, regulando a vida de


todos aqueles que nele se encontram. Quando o cidadão infringe uma norma penal,
nasce para o Estado o direito de punir, demandando, assim, a ingerência do Direito
Processual Penal.
Porém, para o cidadão que cometeu a infração penal também nasce um direito,
qual seja, o direito a um processo justo, em que lhe são garantidos o contraditório e a
ampla defesa.
A lei que na mesma forma dá força para o Estado punir, também o controla,
normatizando-o, dando limites a essa punição, fazendo com que o Estado obedeça a
direitos indispensáveis ao ser humano.
Vamos agora dar início ao estudo do Processo Penal para vencermos mais uma
etapa e, assim, conquistarmos o nosso objetivo maior: a aprovação no concurso de
carreiras policiais.
Bons estudos!

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2 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

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Capítulo
1

Sistemas Processuais Penais


e Fontes do Processo Penal

1.1. Sistema Acusatório

É o sistema adotado no Brasil. Trata-se de um sistema público, em que se verifica


a imparcialidade do julgador e se assegura o contraditório e a ampla defesa (Processo
Triangular).
• Juiz à julga (inerte).
• MP à acusa.
• Advogado ou Defensor Público à defende.
Há uma distribuição das funções de defender, de acusar e de julgar a órgãos
distintos.Verifica-se uma liberdade probatória, sendo que o juiz julga de acordo com
o seu convencimento, porém com a exigência da fundamentação. Deve o magistrado,
pois, motivar as decisões proferidas, ou seja, existe um livre convencimento motivado.
Outra característica importante do sistema acusatório é a publicidade e a oralidade dos
atos processuais1.
Segundo Ferrajoli, são características do sistema acusatório a separação rígida entre
o juiz e a acusação, a paridade entre acusação e defesa, e a publicidade e a oralidade do
julgamento. Lado outro, são tipicamente próprios do sistema inquisitório a iniciativa
do juiz em campo probatório, a disparidade de poderes entre acusação e defesa e o
caráter escrito e secreto da instrução.
Vale lembrar que, no Brasil, o Inquérito Policial é um procedimento administrativo
e dispensável,não integrando a fase processual.

1
Nesse sentido: PRADO, Geraldo. Sistema acusatório: a conformidade constitucional das leis processuais penais. 3a ed. Rio de
Janeiro: Editora Lumen Juris, 2005. p. 114. Com entendimento semelhante: FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do
garantismo penal. 2a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p. 518. No mesmo entendimento: LIMA, Renato
Brasileiro. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 45.

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4 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

CUIDADO!
• Se a questão estiver indagando apenas essas duas opções: o Sistema Processual
Penal Brasileiro é Acusatório ou Misto?
A resposta é: Acusatório.
• Agora, se as duas opções forem: o Sistema Processual Penal Brasileiro é
Acusatório Puro ou Acusatório Misto?

A resposta é: Acusatório Misto. Isso porque temos resquícios do Sistema Inquisitivo.


Vejamos alguns exemplos.
Segundo o art. 158 do Código de Processo Penal, para os crimes que deixam
vestígios, é indispensável a exigência de corpo de delito como prova da materialidade
de um crime.Isso é um resquício de prova legal, prova predefinida por lei. Outro bom
exemplo de resquícios do Sistema Inquisitivo se dá no art. 156, também do CPP, em
que o magistrado deixa sua inércia, determina diligências e busca provas, assim como
o magistrado fazia no Sistema Inquisitivo, visando a alcançar a verdade real.
No Sistema Acusatório Puro, o juiz é completamente inerte, para garantir a sua
imparcialidade. O nosso sistema não é assim, porquanto possui resquícios inquisitivos
e, dentre os muitos traços inquisitivos, se destaca o princípio da verdade real.

1.2. Sistema Inquisitivo

A concentração do poder dá-se nas mãos do juiz inquisidor, o qual é, em regra,


escolhido (Processo Linear). Tal autoridade, por meio de um processo escrito e
sigiloso, de forma unilateral, atua no aspecto probatório da causa, limitando a atuação
da defesa, acusando e, ao final, julgando o conflito.
Em virtude dessa concentração de poderes nas mãos do juiz, não há falar em
contraditório, o qual nem sequer seria concebível em virtude da falta de contraposição
entre acusação e defesa.
A prova legal é uma característica desse sistema, assim como a busca da verdade
real pelo magistrado. Nele, enxerga-se um juiz ativo, o qual colhe provas, ficando
evidente a falta de inércia do magistrado.
Em suma, nesse sistema não existe direito à ampla defesa e nem ao contraditório.

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Capítulo 1 — Sistemas Processuais Penais e Fontes do Processo Penal ■ 5

1.3. Diferenças entre Sistema Inquisitivo (S.I) e Sistema


Acusatório (S.A)

Sistema Inquisitivo Sistema Acusatório


Não há separação das funções de acusar, Há separação das funções de acusar,
defender e julgar, pois estão concentradas defender e julgar. Por consequência, é
em uma única pessoa, que assume as vestes caracterizado pela presença de partes
de um juiz inquisidor. distintas, contrapondo-se acusação e
defesa em igualdade de condições e
sobrepondo-se a ambas um juiz, de
maneira equidistante e imparcial.
Como se admite o princípio da verdade real, O princípio da verdade real é
o acusado não é sujeito de direitos, sendo substituído pelo princípio da busca da
tratado como mero objeto do processo, daí verdade, devendo a prova ser produzida
por que se admite, inclusive, a tortura como com fiel observância ao contraditório e
meio de se obter a verdade absoluta. à ampla defesa.
Gestão da prova: o juiz inquisidor é dotado Gestão da prova: recai precipuamente
de ampla iniciativa acusatória e probatória, sobre as partes. Na fase investigatória, o
tendo liberdade para determinar de ofício juiz só deve intervir quando provocado,
a colheita de elementos informativos e de e desde que haja necessidade de
provas, seja no curso das investigações, seja intervenção judicial. Durante a
no curso da instrução processual. instrução processual, prevalece o
entendimento de que o juiz tem
certa iniciativa probatória, podendo
determinar a produção de provas de
ofício, desde que o faça de maneira
subsidiária.
A concentração de poderes nas mãos do A separação das funções e a iniciativa
juiz e a iniciativa acusatória dela decorrente probatória residual restrita à fase
são incompatíveis com a garantia da judicial preservam a equidistância que
imparcialidade (CADH, art. 8o, item 12) e o magistrado deve tomar quanto ao
com o princípio do devido processo legal. interesse das partes, sendo compatível
com a garantia da imparcialidade e com
o princípio do devido processo legal3.
23

2
Art. 8o. Garantias judiciais
1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal
competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada
contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra
natureza.
3
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 47.

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1.4. Sistema Misto ou Francês

Esse sistema é composto por duas fases processuais. A primeira fase é a inquisitória,
onde são colhidos os elementos de prova e não cabe o contraditório e nem a ampla
defesa. Geralmente, essa fase é chamada de juizado de instrução. Ao final dela, inicia-se
a segunda fase, que é a acusatória. Nessa fase, já cabem o contraditório e a ampla defesa.
A França e a Argentina são dois exemplos de países que adotam esse sistema.
Cumpre lembrar que o sistema misto não é adotado no Brasil.

1.5. Garantismo Penal

Em linhas gerais, o garantismo penal tem por característica principal a salvaguarda


de direitos e liberdades do acusado, bem como a imposição de sanções para aqueles
que não atendem às normas legais.
Tal doutrina se escora no art. 5o, inciso XXXIX, da Carta Magna, que trata do
devido processo penal, bem como no art. 1o do Código Penal, que dispõe não haver
crime sem lei anterior que o defina e nem pena sem prévia cominação legal.
Cuida-se, assim, do conjunto de teorias penais e processuais penais entabuladas
pelo jusfilósofo italiano Luigi Ferrajoli, que prega uma liberdade comedida, amparando
o bem jurídico que deve ser protegido.
Um autor garantista busca preservar totalmente a imparcialidade do magistrado,
ele busca um sistema acusatório puro.
Esses autores são facilmente identificados, pois eles condenam ou consideram
inconstitucionais, por exemplo, os arts. 284, 1565 e 3856, todos do CPP, pois esses
dispositivos retiram a inércia do magistrado. Vale ressaltar que essa visão garantista é
minoritária, porém, alguns Estados, como o Rio de Janeiro, consideram essa corrente
como a correta nas provas para Delegado de Polícia.

1.6. Fontes do Processo Penal

Por fontes entende-se tudo aquilo que contribui para o surgimento das normas
jurídicas e podemos classificar em:

4
Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de
quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças
de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou
insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender.
5
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando
a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto
relevante.
6
Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado
pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.

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Capítulo 1 — Sistemas Processuais Penais e Fontes do Processo Penal ■ 7

1.6.1. Fontes Materiais

Trata de quem tem competência para produzir a norma jurídica. No Processo


Penal compete principalmente à União, mas essa competência não é exclusiva, pois há
casos em que os Estados e o Distrito Federal também poderão elaborar essas normas.
Art. 22, I, parágrafo único; art. 24, XI, CF.

1.6.2. Fontes Formais

Aquelas que revelam a norma criada:


I) Fontes Formais Imediatas, Diretas ou Primárias:
São as leis, por exemplo: leis ordinárias, CF, tratados e convenções.
II) Fontes Formais Mediatas, Indiretas, Secundárias ou Supletivas:
Princípios gerais do direito, a doutrina, o direito comparado, os costumes, a
jurisprudência e a analogia.

1.7. Interpretação da Lei Processual


1.7.1. Quanto ao sujeito que realiza a interpretação
1.7.1.1. Autêntica ou legislativa

Interpretação feita pelo próprio legislador e pode ser:


I) Contextual:
No próprio dispositivo ele descreve o que significa: “Peculato. Art. 312, CP.
Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro
bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo,
ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio.” No próprio dispositivo legal
agora no art. 327, CP ele descreve o que é ou quem é o funcionário público.
A própria lei, ou seja, o próprio Código Penal descreve o sentido/significado
não dando margem para interpretações diversas.

II) Posterior à vigência da lei:


Quando uma lei posterior àquela vem trazer o significado de algo que passou
em branco ou que causou dúvida e/ou estranheza. Melhor seria chamar de:
“posterior à publicação”, pois a lei anterior não perdeu sua vigência.

III) Doutrinária ou científica:


A exposição de motivos de um Código, como as interpretações dos disposi-
tivos legais efetuadas pelos estudiosos.

IV) Jurisprudencial ou judicial


Trata-se da interpretação que os tribunais e juízes dão à norma, como por
exemplo, as súmulas vinculantes.

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Capítulo
2

Princípios Processuais Penais


e Lei Processual no Tempo

2.1. Princípio da Inércia (Ne procedat iudex ex officio ):


art . 129, inciso I, CF/88

Como vemos na Constituição Federal, o juiz é inerte, nada devendo promover,


via de regra. Cabe às partes promover o início e o andamento dos feitos, sejam elas o
Ministério Público ou um particular.

2.2. Devido Processo Legal (due processo flaw )

Processo previsto em lei = devido processo legal.


De acordo com o art. 5o, inciso LIV, da Constituição Federal, ninguém será privado
da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
Nos termos do art. 5o, inciso LV, da Constituição Federal, aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

• Contraditório: é a relação dialética no processo. O juiz deve mensurar


quem está mentindo ou falando a verdade.

Assim como Renato Brasileiro cita a lição clássica de Joaquim Mendes de Almeida,
seguimos pelo mesmo posicionamento, em que sempre se compreendeu o princípio do
contraditório como ciência bilateral dos atos ou termos do processo e a possibilidade
de contrariá-los1. De acordo com esse conceito, o núcleo fundamental do contraditório
estaria ligado à discussão dialética dos fatos da causa, devendo se assegurar a ambas

1
Princípios fundamentais do processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1973. p. 82.

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as partes, e não somente à defesa, a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos


praticados no curso do processo. Eis o motivo pelo qual se vale a doutrina da expressão
“audiência bilateral”, consubstanciada pela expressão em latim audiatur et altera pars (seja
ouvida também a parte adversa). Seriam dois, portanto, os elementos do contraditório:
1) direito à informação; 2) direito de participação. O contraditório seria, assim, a
necessária informação às partes e a possível reação a atos desfavoráveis.
De acordo com a Súmula no 707 do Supremo Tribunal Federal, constitui nulidade
a falta de intimação do denunciado para oferecer contrarrazões ao recurso interposto da
rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação de defensor dativo.
Nesse sentido, foi bastante incisiva a Lei no 11.690/2008, dando nova redação
ao art. 15, caput, do CPP: “O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da
prova induzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão
exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as
provas cautelares, não repetíveis e antecipadas”. Impõe-se, pois, a observância do
contraditório ao longo de toda a persecutio criminis in iudicio, como verdadeira pedra
fundamental do processo penal, contribuindo para o acertamento do fato delituoso.
Afinal, quanto maior a participação dialética das partes, maior é a probabilidade de
aproximação dos fatos e do direito aplicável, contribuindo de maneira mais eficaz para
a formação do convencimento do magistrado2.

• Ampla defesa: consiste na demonstração de tudo que puder ser usado para
se defender.

O direito de defesa está ligado diretamente ao princípio do contraditório. A defesa


garante o contraditório e por ele se manifesta. Afinal, o exercício da ampla defesa só é
possível em virtude de um dos elementos que compõem o contraditório, qual seja, o
direito à informação.
Apesar da influência recíproca entre o direito de defesa e o contraditório, os dois
não se confundem. Com efeito, por força do princípio do devido processo legal, o
processo penal exige partes em posições antagônicas, uma delas obrigatoriamente
em posição de defesa, havendo a necessidade de que cada uma tenha o direito de se
contrapor aos atos e termos da parte contrária. Como se vê, a defesa e o contraditório
são manifestações simultâneas, intimamente ligadas pelo processo, sem que daí se
possa concluir que uma derive da outra3.

2
Nessa linha: LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 56. Com
entendimento semelhante: OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 11a ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris,
2009. p. 34. Com entendimento semelhante: BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivany. Ônus da prova no processo penal.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 116.
3
Com esse entendimento: Fernandes, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 6a ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2010, p. 253. Com entendimento semelhante: LIMA, Renato Brasileiro, Manual de processo penal. 2a ed. Salvador:
Editora JusPodivm, 2014. p. 57.

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Capítulo 2 — Princípios Processuais Penais e Lei Processual no Tempo ■ 11

Não se admitirá prova ilícita no processo à REGRA.


O ônus da prova no Processo Penal é de quem alega.

• Igualdade entre as partes: “Devemos tratar igualmente os iguais e


desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade” – Aristóteles.

• Direito ao silêncio: não se obriga o acusado, o réu ou o querelado a se


autoincriminar, sendo direito constitucional permanecer calado, não se
traduzindo tal fato em confissão ficta.

CUIDADO!
A transação penal é o devido processo legal das infrações de menor potencial
ofensivo, segundo corrente majoritária. É um procedimento previsto em lei para as
infrações de menor potencial ofensivo.
Há correntes minoritárias em sentido oposto, afirmando que a transação penal
violaria o devido processo penal. Recomenda-se que o candidato preste atenção na banca
examinadora. No concurso para Delegado do Estado do RJ, por exemplo, o examinador
adota orientação do sentido de que a transação penal fere o devido processo penal.

2.3. Juiz Natural

Ninguém será julgado por tribunal de exceção. Significa dizer que ninguém
será processado e julgado sem a determinação de autoridade judiciária previamente
competentepara tanto (art. 5o, XXXVII e LIII, da CF).
O princípio do juiz natural deve ser compreendido como o direito que cada cidadão
tem de saber, previamente, a autoridade que irá processá-lo e julgá-lo caso venha a
praticar uma conduta definida como infração penal pelo ordenamento jurídico.
A relevância do princípio do juiz natural é destacada por Ada Pellegrini Grinover:
“a imparcialidade do juiz, mais do que simples atributo da função jurisdicional, é vista
hodiernamente como seu caráter essencial, sendo o princípio do juiz natural erigido
em núcleo essencial do exercício da função. Mais do que direito subjetivo da parte e
para além do conteúdo individualista dos direitos processuais, o princípio do juiz é
garantia da própria jurisdição, seu elemento essencial, sua qualificação substancial.
Sem o juiz natural, não há função jurisdicional possível4”.
Na dicção do Min. Celso de Mello, reveste-se de dupla função instrumental, pois,
enquanto garantia indisponível, tem por titular qualquer pessoa exposta, em juízo
criminal, à ação persecutória do Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa

4
GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no
processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000. p. 44.

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12 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

fator de restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal incumbidos de promover,
judicialmente, a repressão criminal5.
Como anota Antônio Scarance Fernandes, embora dúplice a garantia do juiz
natural, manifestada com a proibição de tribunais extraordinários e com o impedimento
à subtração da causa ao tribunal competente, a expressão ampla dessas garantias
desdobra-se em três regras de proteção: 1) só podem exercer jurisdição os órgãos
instituídos pela Constituição; 2) ninguém pode ser julgado por órgão instituído após
o fato; 3) entre os juízes pré-constituídos vigora uma ordem taxativa de competências
que exclui qualquer alternativa deferida à discricionariedade de quem quer que seja6.

2.4. Publicidade dos Atos Processuais

Os atos são públicos, exceto aqueles acobertados pelo segredo de justiça.


Traduz-se, portanto, numa exigência política de se afastar a desconfiança
da população na administração da Justiça. Com ela “são evitados excessos ou
arbitrariedades no desenrolar da causa, surgindo, por isso, a garantia como reação
aos processos secretos, proporcionando aos cidadãos a oportunidade de fiscalizar a
distribuição da justiça7”.

2.5. Verdade Real

O Processo Penal está interessado somente na verdade, e não em documentos.


É por essa razão, por exemplo, que o juiz pode pedir a reconstituição quantas vezes
quiser.
O juiz fica vinculado ao fato narrado pelo acusado, e não à capitulação legal. Logo,
se surgir novo crime, terá que haver outra lide.
Como bem coloca Cândido Rangel Dinamarco, “a verdade e a certeza são dois
conceitos absolutos, e, por isso jamais se tem a segurança de atingir a primeira e jamais
se consegue a segunda, em qualquer processo (a segurança jurídica, como resultado
do processo, não se confunde com a suposta certeza, ou segurança, com base na qual

5
STF – HC 81.963/RS – 2a Turma – DJ 28/10/2004.
6
Processo penal constitucional. 3a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 127. Com entendimento semelhante:
CUNHA, Leonardo José Carneiro. Jurisdição e competência. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 65. Não por
outro motivo, concluiu o STJ que a designação de magistrado para julgar determinada ação penal viola o princípio do juiz
natural, in verbis: “É ilícita a designação ad personam de magistrado para atuar especificamente em determinado processo. No
caso, falta razoabilidade à justificativa apresentada pelo Tribunal de origem – grande acúmulo de serviços daquele que seria
o substituto legal na ação – para proceder à designação casuística, especial, de magistrados para julgar o feito. As portarias no
1.623/2009 e 744/2010, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, são incompatíveis com os regramentos constitucionalmente
estabelecidos. Ordem concedida a fim de anular todos os atos praticados pelos magistrados designados pelo Tribunal de
Justiça do Estado do Piauí para atuarem, especificamente, na ação penal em questão” (STJ, 6a Turma, HC 161.877/PI, Rel.
Min. Celso Limongi – Desembargador convocado do TJ/SP –, j. 10/05/2011, DJe 15/06/2011).
7
FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 68. LIMA,
Renato Brasileiro. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 67.

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Capítulo 2 — Princípios Processuais Penais e Lei Processual no Tempo ■ 13

o juiz proferiria os seus julgamentos). O máximo que se pode obter é um grau muito
elevado de probabilidade, seja quanto ao conteúdo das normas, seja quanto aos fatos,
seja quanto à subsunção desses nas categorias adequadas8”.
Renato Brasileiro explica:
Por esse motivo, tem prevalecido na doutrina mais moderna que o princípio
que vigora no processo penal não é o da verdade material ou real, mas sim o
da busca da verdade. Esse princípio também é conhecido como princípio da
livre investigação da prova no interior do pedido e princípio da imparcialida-
de do juiz na direção e apreciação da prova, bem como do princípio da inves-
tigação, princípio inquisitivo ou princípio da investigação judicial da prova.
Seu fundamento legal consta do art. 156 do Código de Processo Penal. Por
força dele, admite-se que o magistrado produza provas de ofício, porém ape-
nas na fase processual, devendo sua atuação ser sempre complementar, sub-
sidiária. Na fase preliminar de investigações, não é dado ao magistrado pro-
duzir provas de ofício, sob pena de evidente violação ao princípio do devido
processo legal e à garantia da imparcialidade do magistrado9.

2.6. Correlação

Deve haver correlação entre o pedido e o que a sentença decretar, sendo vedadas
as sentenças ultra, citra e extra petitas.
• Ultra petita: além do que foi pedido.
• Citra petita: sentença é omissa quanto ao pedido.
• Extra petita: fora do que foi pedido.

2.7. Presunção de inocência

Também conhecido como presunção do estado de inocência ou presunção de não


culpabilidade, consiste em afirmar que ninguém será considerado culpado por um
ato ilícito antes que exista uma sentença condenatória definitiva, ou seja, transitada
em julgado, da qual não caiba mais qualquer recurso. Significa dizer que os efeitos da
sentença condenatória só terão vez quando ela se tornar definitiva.
Em consequência, deverá sempre prevalecer a disposição mais favorável.

Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

8
A instrumentalidade do processo. Fundamentos do processo civil moderno. 2a ed., 1987. p. 449, no 44.
9
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 72.

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14 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

(...)
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória;

Na lição de Renato Brasileiro de Lima:


A Constituição Federal, todavia, é claríssima ao estabelecer que somente o
trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória poderá afastar o
estado inicial de inocência de que todos gozam. Seu caráter mais amplo deve
prevalecer, portanto, sobre o teor da Convenção Americana de Direitos Hu-
manos. De fato, a própria Convenção Americana prevê que os direitos nela
estabelecidos não poderão ser interpretados no sentido de restringir ou limi-
tar a aplicação das normas mais amplas que existam no direito interno dos
países signatários (art. 29, b). Em consequência, deverá sempre prevalecer a
disposição mais favorável.
Do princípio da presunção de inocência (ou presunção de não culpabilidade)
derivam duas regras fundamentais: a regra probatória (também conhecida
como regra de juízo) e a regra de tratamento10.

2.8. Favor Rei ou Favor libertatis

O favor rei é um princípio gênero, do qual o in dubio pro reo é a sua melhor espécie.
Diante de situações em que existir o conflito “punição x liberdade”, o que prevalece
é a liberdade.
Toda interpretação durante a investigação criminal deve ser em favor do réu,
presumindo-se a sua inocência.
Segundo o doutrinador Fernando Capez, o princípio favor rei consiste em que
qualquer dúvida ou interpretação na seara do processo penal, deve sempre ser levada
pela direção mais benéfica ao réu11.

2.9. In Dubio Pro Reo

Na dúvida, adota-se a interpretação que mais favoreça ao réu, no momento da


sentença.
Por força da regra probatória, a parte acusadora tem o ônus de demonstrar a
culpabilidade do acusado além de qualquer dúvida razoável, e não este de provar sua
inocência. Em outras palavras, recai exclusivamente sobre a acusação o ônus da prova,
incumbindo-lhe demonstrar que o acusado praticou o fato delituoso que foi imputado
na peça acusatória12.

10
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 50.
11
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 10a ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 39.
12
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 50.

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Capítulo 2 — Princípios Processuais Penais e Lei Processual no Tempo ■ 15

Direito de punir do Estado x Direito à liberdade (dever): para solucionarmos esse


conflito, vamos buscar o devido processo legal (art. 386, VII, do CPP – é a sentença
absolutória por insuficiência de provas).
Essa regra probatória deve ser utilizada sempre que houver dúvida sobre fato
relevante para a decisão do processo. Na dicção de Badaró, cuida-se de uma disciplina
do acertamento penal, uma exigência segundo a qual, para a imposição de uma
sentença condenatória, é necessário provar, eliminando qualquer dúvida razoável, o
contrário do que é garantido pela presunção de inocência, impondo a necessidade
de certeza.
Nessa acepção, como conclui Renato Brasileiro, presunção de inocência confunde-
-se com o in dubio pro reo. Não havendo certeza, mas dúvida sobre os fatos em discussão
em juízo, inegavelmente é preferível a absolvição de um culpado à condenação de um
inocente, pois, em um juízo de ponderação, o primeiro erro acaba sendo menos grave
que o segundo.

2.9.1. In dubio pro societatis

Havendo dúvida, adota-se a interpretação mais favorável à sociedade. Tal princípio


vige no momento da denúncia e da pronúncia do Júri. Significa dizer que, se não
houver certeza, o MP denunciará o acusado.
Nessa hipótese, não há que se falar em presunção de inocência.

1a fase 2a fase
Sumário de Culpa Plenário
P ronúncia
I mpronúncia
D esclassificação
A bsolvição sumária

2.10. Princípio do Nemo tenetur se detegere

Como nos ensina Renato Brasileiro, de acordo com o art. 5o, LXIII, da Constituição
Federal, “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado,
sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”. O direito ao silêncio,
previsto na Carta Magna como direito de permanecer calado, apresenta-se apenas
como uma das várias decorrências do nemo tenetur se detegere, segundo o qual ninguém
é obrigado a produzir prova contra si mesmo13.

13
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. 2a ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2014. p. 76.

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16 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

Trata-se de uma modalidade de autodefesa passiva, que é exercida por meio da


inatividade do indivíduo sobre o qual recai ou pode recair uma imputação. Consiste,
grosso modo, na proibição de uso de qualquer medida de coerção ou intimidação ao
investigado em processo de caráter sancionatório para obtenção de uma confissão ou
para que colabore em atos que possam ocasionar sua condenação. Como anota Maria
Elizabeth Queijo, como direito fundamental, o princípio do nemo tenetur se detegere
“objetiva proteger o indivíduo contra excessos cometidos pelo Estado, na persecução
penal, incluindo-se nele o resguardo contra violências físicas e morais, empregadas
para compelir o indivíduo a cooperar na investigação e apuração de delitos14”.
Além da Constituição Federal, o princípio do nemo tenetur se detegere também
se encontra previsto no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 14.3,
“g”15), e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 8o, § 2o, “g”16).

2.11. Princípio da proporcionalidade

Com efeito, o exame da cláusula referente ao due process of law permite nela
identificar alguns elementos essenciais à sua configuração como expressiva garantia de
ordem constitucional, destacando-se, dentre eles, por sua inquestionável importância,
as seguintes prerrogativas: a) direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário);
b) direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação; c) direito a um
julgamento público e célere, sem dilações indevidas; d) direito ao contraditório e à
plenitude de defesa; e) direito de não ser processado e julgado com base em leis ex
post facto; f ) direito à igualdade entre as partes; g) direito de não ser processado com
fundamento em provas revestidas de ilicitude; h) direito ao benefício da gratuidade;
i) direito à observância do princípio do juiz natural; j) direito ao silêncio; l) direito
à prova; m) direito de presença e de “participação ativa” nos atos de interrogatório
judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando existentes17.
Como observa o Min. Gilmar Mendes:
A cláusula do devido processo legal – objeto de expressão proclamação pelo
art. 5o, LIV, da Constituição, e que traduz um dos fundamentos dogmáticos
do princípio da proporcionalidade – deve ser entendida, na abrangência de
sua noção conceitual, não só sob o aspecto meramente formal, que impõe
restrições de caráter ritual à atuação do poder público (procedural due process
of law), mas, sobretudo, em sua dimensão material (substantive due process of

14
QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir prova contra si mesmo: (o princípio Nemo tenetur se detegere e suas
decorrências no processo penal). São Paulo: Saraiva, 2003. p. 55.
15
Artigo 14 (...) 3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as seguintes garantias: (...)
g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada.
16
Art. 8o – Garantias judiciais (...) 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for
legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
(...) g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada;
17
Nesse sentido: STF, 2a Turma, HC 94.016/SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 038 26/02/2009.

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Capítulo 2 — Princípios Processuais Penais e Lei Processual no Tempo ■ 17

law), que atua como decisivo obstáculo à edição de atos normativos revistos
de conteúdo arbitrário ou irrazoável. A essência do substantive due process of
law reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdades das pessoas
contra qualquer modalidade de legislação ou de regulamentação que se revele
opressiva ou destituída do necessário coeficiente de razoabilidade18.
Em sede processual penal, o Poder Público não pode agir imoderadamente, pois a
atividade estatal acha-se essencialmente condicionada pelo princípio da razoabilidade.
Daí a importância do princípio da proporcionalidade, que se qualifica, enquanto
coeficiente de aferição da razoabilidade dos atos estatais, como postulado básico de
contenção dos excessos do Poder Público19.

2.12. Lei Processual no Tempo

Para as normas puramente processuais penais impugna-se o princípio da aplicação


imediata (tempus regit actum – art. 2o, CPP) preservando-se, no entanto, os atos
processuais praticados sob a vigência da lei anterior.
Para as leis processuais penais materiais, mistas ou híbridas (leis que trazem em seu
conteúdo matérias de cunho penal e processual) prevalece o que nos ensina o art. 5o,
XL, da CF, sobre o princípio da aplicação imediata. Dessa forma se tiver aspecto
penal benigno, retroagirá, se for maligno para o réu não retroagirá, quanto ao aspecto
processual será aplicado normalmente de forma imediata, independente de benigno
ou maligno.

18
Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: Estudos de direito constitucional. 3a ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 65.
19
Segundo Luís Roberto Barroso, há uma relação de fungibilidade entre o princípio da proporcionalidade e o da razoabilidade,
cuja origem remonta à garantia do devido processo legal, principalmente na fase em que se atribui a essa garantia feição
substancial. Ao discorrer sobre o princípio da razoabilidade, o referido autor aponta os mesmos requisitos da adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, trabalhados pela doutrina e pela jurisprudência como requisitos do
princípio da proporcionalidade em sentido amplo (Interpretação e aplicação da Constituição. 4a ed., rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2001. p. 219).

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18 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

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Capítulo
3

Inquérito Policial

3.1. Conceito

Procedimento administrativo inquisitório e preparatório, consistente em um


conjunto de diligências realizadas pela polícia investigativa para apuração da infração
penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo.
Em suma, visa a apurar indícios de autoria e prova da materialidade.
O inquérito policial, após encerrado, possui destinatários imediatos e mediato:
A. Imediatos
• Ação Penal Pública à MP.
• Ação Penal Privada à vítima ou seu representante legal.

B. Mediato: Juiz
É importante considerarmos, ainda, que o legislador atribuiu menor ofensividade
a certas condutas típicas. Para esses casos, será lavrado um Termo Circunstanciado, isto
é, um procedimento mais célere que o utilizado na confecção do Inquérito Policial.
Termo Circunstanciado: procedimento reservado às infrações de menor potencial
ofensivo.
Infração de menor potencial ofensivo: todas as contravenções penais e os
crimes cuja pena máxima não seja superior a dois anos, cumulada ou não com multa,
submetidos ou não a procedimento especial (ex.: crime praticado por deputado
federal). Veja-se o art. 61 da Lei no 9.099/95.

Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo,


para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei
comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não
com multa.

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20 ■ Manual de Processo Penal para Carreiras Policiais — José Carlos Cardoso, Rafael Póvoas e Sérgio Bautzer

3.2. Natureza jurídica

Procedimento administrativo.
Se o delegado cometer uma irregularidade, esse vício é capaz de contaminar
todo o processo? Não, pois IP é apenas um procedimento.
Logo, como o inquérito policial é mera peça informativa, eventuais vícios dele
constantes não têm o condão de contaminar o processo penal a que der origem.
Havendo, assim, eventual irregularidade em ato praticado no curso do inquérito,
mostra-se inviável a anulação do processo penal subsequente. Afinal, as nulidades
processuais concernem, tão somente, aos defeitos de ordem jurídica que afetam os
atos praticados ao longo da ação penal condenatória1.
Eventuais vícios constantes do IP não afetam a ação penal a que der origem.

3.3. Finalidade

De acordo com Fernando Capez, “a finalidade do inquérito policial é a apuração


de fato que configure infração penal e a respectiva autoria, para servir de base à ação
penal ou às providências cautelares”2.
Guilherme de Souza Nucci, a seu turno, aponta que a finalidade do inquérito
policial é “evitar acusações levianas, garantindo a dignidade da pessoa humana, bem
como agilizar o trabalho do Estado na busca das provas da existência do crime”.
Da lição dos eminentes doutrinadores, podemos resumir a finalidade do IP
da seguinte forma: colheita de elementos de informação relativos à autoria e à
materialidade do delito.
Elementos de informação ≠ prova

Art. 155, CPP: o juiz formará sua convicção pela livre apreciação
da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos colhidos
na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e
antecipadas.

1
Nesse sentido: STF, 1a Turma, HC 94.034/SP, Rel.a Min.a Cármen Lúcia, j. 10/06/2008, DJe 167 09/04/2008. E ainda: STF,
2a Turma, HC 85.286/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 29/11/2005, DJ 24/03/2006. Também é entendimento dominante
no STJ que eventual nulidade do inquérito policial não contamina a ação penal superveniente, vez que aquele é mera peça
informativa, produzida sem o crivo do contraditório: STJ, 6a Turma, RHC 21.170/RS, Rel. Min. Carlos Fernando Mathias
(Juiz convocado do TRF 1a Região), j. 04/09/2007, DJ 08/10/2007 p. 368.
2
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 15a ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

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