Renata Cristina Do Nascimento Antão
Renata Cristina Do Nascimento Antão
Renata Cristina Do Nascimento Antão
Mestrado em Direito
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Agradecimentos
À minha mãe Luzia, pelo amor e pelo exemplo de força, ao meu pai Luiz, pelo exemplo
de perseverança.
Aos três pelo apoio emocional e material, diário e incondicional e a minha família pela
alegria da vida: Elza, Yuri, Gustavo e Jonas.
A todos aqueles que passaram pelo Escritório Modelo Dom Paulo Evaristo Arns -
PUC/SP, que entre muito trabalho e indignações da luta diária pela afirmação de
direitos, insistem, buscando um país melhor: Anna Claudia Vazzoler, Sabrina
Durigon, Karen Cruz, Rose dos Santos, Fernanda Carpanelli, Carla Paixão e tantos
outros colegas e estagiários que por lá passaram.
A todos aquelas crianças e jovens que excluídos por um perverso sistema, vendo seus
sonhos e brincadeiras se transformarem pela dura realidade, dedico este trabalho.
“Todos estavam silenciosos. Um operário que vinha
pela rua, vendo a aglomeração dos meninos na
praça, veio para o lado deles. E ficou também
parado, escutando a velha música. Então a luz da lua
se estendeu sobre todos, as estrelas brilharam ainda
mais no céu, o mar ficou de todo manso (talvez que
Iemanjá tivesse vindo também ouvir a música) e a
cidade era como que um grande carrossel onde
giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia.
Neste momento de música eles sentiram-se donos da
cidade. E amaram-se uns aos outros, se sentiram
irmãos porque eram todos eles sem carinho e sem
conforto e agora tinham o carinho e o conforto da
música.”
Jorge Amado
RESUMO
ANTÃO, Renata Cristina do Nascimento. O direito à educação do adolescente em situação
de privação de liberdade. 2012. 228 p. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Direito,
Universidade de São Paulo, 2012.
REFLEXÕES INICIAIS
II – A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
1. Direito da Criança e do Adolescente
a. Concepções que orientam o direito da criança e do adolescente
i. Escorço histórico da infância no Brasil
ii. Definição de Criança e Adolescente
b. Doutrina do respeito à peculiar condição de pessoa em desenvolvimento
c. Doutrina da prioridade absoluta
d. Doutrina da proteção integral
e. Direitos fundamentais especiais de criança e adolescente
i. Direito à educação
ii. Direito à liberdade (tutela especial da liberdade)
iii. Outros direitos individuais especiais da criança e do adolescente
autor de crime.
2. O adolescente em conflito com a lei
a. O perfil do adolescente autor de infração
b. Trajetória de vitimização do adolescente autor de infração
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
REFLEXÕES INICIAIS
1. A escolha do direito à educação juvenil em ambiente de privação de liberdade
O direito à educação é um direito fundamental, público e subjetivo, que leva
o individuo a desenvolver, com autonomia, as suas potencialidades como ser humano.
Tanto que a Constituição estabelece em seu art. 205 que o direito à educação é “direito
de todos e dever do Estado e da família”.
Ao analisá-lo a partir do enfoque do adolescente, esta fundamentabilidade se
amplia, pois sob o manto do Sistema Constitucional Especial de Proteção aos Direitos
Fundamentais da Criança e do Adolescente, instituído pela Constituição Federal de
1988, distinguem-se as crianças e adolescentes dos outros grupos de indivíduos,
considerando que os primeiros são seres em desenvolvimento que merecem tutela
diferenciada e prioridade absoluta na efetivação de direitos. LIBERATI1 entende por
“absoluta prioridade” que a criança e o adolescente estejam “em primeiro lugar na
escala de preocupação dos governantes”, e, desta forma:
1
LIBERATI, Wilson Donizeti. “Conteúdo material do direito à educação (208-260)”. In. LIBERATI,
Wilson Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 18-
19).
2
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.p. 135.
3
BRASIL, 1990, art. 4º, alínea b.
1
Muito se fala sobre os avanços da educação no Brasil: as reduções de taxas
de analfabetismo, o crescimento da escolaridade média dos brasileiros, as expectativas
sobre a ampliação do acesso e da qualidade na educação. Porém, pouco ou quase nada
se fala sobre os avanços neste campo àqueles que se encontram cumprindo medidas
socioeducativas de privação total ou parcial de liberdade sobre a tutela estatal.
A opção pelo estudo do direito à educação do adolescente que cumpre
medida privativa de liberdade em razão de ato infracional justifica-se por ser esta uma
questão não apenas de política educacional, mas de segurança pública, que exige maior
compreensão a partir da análise sistemática da legislação e jurisprudência. O problema
se amplia ao confrontarmos o direito à educação e a punição pelo ato infracional, para a
verificação de desrespeito, ou não, eventual à sua garantia e aplicação.
Segundo dados oficiais, o número de adolescentes que cumpre medida
socioeducativa em unidades de internação da Fundação Casa cresceu 18% entre agosto
de 2010 e setembro de 2011, isto é, em pouco mais de um ano, esta população saltou de
484 para 572. Tais dados nos mostram a relevância da reflexão e análise acerca da
educação fornecida nestes estabelecimentos.
Em nossa pesquisa, analisaremos, especificamente, a Fundação Centro de
Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) – instituição vinculada à
Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo 4 –, e
sua relação de parceria e gestão compartilhada do fornecimento educacional com a
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo5 – responsável prioritário pelo
fornecimento do ensino fundamental e médio no estado de São Paulo, inclusive nos
estabelecimentos de cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade.
4
http://www.justica.sp. gov.br/novo_site/ Acesso em: 10 de abril de 2012.
5
http://www.educacao.sp. gov.br/ Acesso em: 10 de abril de 2012.
6
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.p. 29.
7
Decreto nº 17.943-A de 12 de outubro de 1927.
2
legislados, como a proibição do trabalho8 para os menores de 12 anos, bem como a
adoção de medidas assistencialistas e protecionistas ao “menor” abandonado ou
delinquente. O termo delinquência e sua noção acabam por adjetivar e estigmatizar o
indivíduo. Assim, a criminologia crítica atual busca compreender a infração como um
fenômeno transitório na vida do indivíduo, tirando o estigma do “delinquente”. Porém,
como a bibliografia internacional especializada utiliza o termo “delinquência juvenil”
(juvenile delinquency) esta pode vir a ser utilizada ao longo do trabalho.
Crianças e adolescentes se tornam objeto da atenção de médicos,
psicólogos, pedagogos e juristas que institucionalizaram a figura do menor abandonado
através de casas públicas de custódia, nas quais era aplicado o modelo compaixão-
repressão dominante na doutrina da situação irregular.
O Código de Menores deu suporte à chamada “escola menorista”, que
considerava a criança pobre e desvalida e a criança autora de infração ou crime da
mesma forma. Esta clara confusão conceitual, de forte influência positivista e
determinista, acabou por permitir sérias violações aos direitos fundamentais tanto de
crianças carentes quanto de crianças delinquentes; de modo que o binômio,
historicamente construído, criança carente/delinquente, ou infância desviante, acabou
por marcar o Estado, o Direito e todas as instâncias criadas para aplicação desta
doutrina menorista, doutrina da situação irregular. Na Doutrina da situação irregular
havia clara diferenciação entre os menores regulares, ou seja, aqueles nascidos em
famílias com posses, podendo usufruir de educação, saúde e todo tipo de direito; e os
menores irregulares, provenientes de famílias pobres, órfãos, ou que haviam cometido
algum tipo de delito. Este segundo “tipo de menor” recebia tratamento jurídico
diferenciado, podendo ser retirados arbitrariamente do convívio familiar, sendo levados
a unidades de internação tanto órfãos ou crianças abandonadas, quanto as que cometiam
crimes.
Foi a doutrina da proteção integral, sedimentada pela Convenção
Internacional dos Direitos da Criança da ONU, de 1989, que rompeu com a doutrina
menorista, fazendo, então, com que os “menores” fossem vistos como crianças e
8
Art. 101. é prohibido em todo o territorio da Republica o trabalho nos menores de 12 annos.
Art. 102. Igualmente não se póde ocupar a maiores dessa idade que contem menos de 14 annos. e que não
tenham completando sua instrucção primaria. Todavia. a autoridade competente poderá autorizar o
trabalho destes, quando o considere indispensavel para a subsistencia dos mesmos ou de seus paes ou
irmãos, comtanto que recebam a instrucção escolar, que lhes seja possível.
3
adolescentes sujeitos de direitos9 amparados por um sistema de proteção. O qual acaba
por autorizar uma aparente quebra do princípio da igualdade, possibilitando uma
diferenciação positiva feita às crianças e adolescentes, visto estes serem “portadores de
uma desigualdade de fato” e permitindo-lhes atingir uma “igualdade jurídica material e
não meramente formal”10.
A Constituição Federal do Brasil e o Estatuto da Criança e do Adolescente
vêm, assim, romper com a antiga doutrina da situação irregular e sua nefasta tradição
autoritária e excludente, que tinha na confusão conceitual entre “infância carente e
infância delinquente” um instrumento jurídico extremamente poderoso à “manutenção
do status quo e das desigualdades sociais”11.
9
“(...) Crianças e adolescentes merecem, e receberam, do ordenamento brasileiro esse tratamento mais
abrangente e efetivo porque, à sua condição de seres diversos dos adultos, soma-se a maior
vulnerabilidade deles em relação aos seres humanos adultos.
É esta vulnerabilidade que é a noção distintiva fundamental, sob a ótica do estabelecimento de um sistema
especial de proteção, eis que distingue crianças e adolescentes de outros grupos de seres humanos
simplesmente diversos da noção do homo médio.” MACHADO, Martha de Toledo. A proteção
constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 119.
10
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 119.
11
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.p. 54.
12
Há quem diga que estas visam “favorecer a reintegração e reeducação do adolescente”, mas tal discurso
não é aceito na criminologia crítica, já que o prefixo “re” tem conotação de repetição e muitas destas
crianças e adolescentes em conflito com a lei, na maioria das vezes, não foram anteriormente nem
integradas, nem educadas.
13
A opção por tais expressões se dá “por apresentarem uma circunstância de vida e não uma categoria
valorativa” como ocorre com a utilização do termo ‘adolescente infrator’, que torna o “o adjetivo mais
importante que o substantivo, imprimindo um estigma irremovível” (VOLPI, 2001, p. 21)
4
socioeducativas que devem buscar esta socialização e habilitação para a vida em
sociedade.
As medidas socioeducativas, previstas no artigo 212 do Estatuto da Criança
e do Adolescente, visam punir e educar. A educação e seu fornecimento dentro dos
estabelecimentos de cumprimento destas medidas é, assim, de extrema importância,
devendo estar comprometida com valores e com a “vocação ontológica do homem” de
ser sujeito, tal qual nos ensina Paulo Freire, auxiliando estes adolescentes na construção
de novos caminhos, e contribuindo para a “construção da autonomia dos sujeitos de
modo que eles possam visualizar alternativas para a própria vida, inclusive – e de
preferência, fora do crime.”14.
4. Justificativa da escolha
O interesse por este tema de pesquisa foi motivado por anseios em
investigar durante o trabalho de conclusão de curso (tese de láurea) a questão
educacional dentro dos encarceramentos femininos. O trabalho desenvolvido voltou-se a
análise de relatórios e pesquisas realizadas por instituições da sociedade civil e órgãos
governamentais, como a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres 15, os quais a
partir de visitas aos estados obtiveram um diagnóstico a respeito da oferta escolar
existente nas prisões e de suas principais fragilidades.
Participando do Laboratório de Ciências Criminais do Instituto Brasileiro de
Ciências Criminais (IBCCRIM) e das diversas discussões relacionadas às condições dos
estabelecimentos prisionais, questões de criminologia e política criminal foi possível
analisar dados, participar de debates e mesas de estudo, verificando assim, que a
realidade dos estabelecimentos de privação de liberdade em muito se difere da disposta
no texto legal.
Outro fator que levou à investigação da educação em estabelecimentos de
privação de liberdade foi o exercício profissional enquanto professora de
desenvolvimento infantil e acompanhamento das ações socioeducativas desenvolvidas
através do Programa Escola da Família. Vivências que mostraram que muitos dos
jovens e adultos que cumprem penas privativas de liberdade tiveram itinerários de vida
14
MOREIRA, Fábio Aparecido. “A política de Educação de Jovens e Adultos em Regimes de Privação
de Liberdade no Estado de São Paulo”. Dissertação de Mestrado. São Paulo, 2007.p. 39.
15
Brasil. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Grupo de Trabalho
Interministerial – Reorganização e reformulação do Sistema Prisional Feminino – 2008. Brasília: 2008. P.
70-72
5
escolar interrompidos por problemas sociais constantes como desagregação familiar,
drogas, violência, falta de moradia entre outras causas que fogem do nosso
entendimento, não podendo a privação de liberdade espoliá-los novamente.
Em todo esse contexto, pareceu-nos bastante relevante aprofundar estudos
sobre a educação e sua efetivação nos estabelecimentos prisionais, visto haver um
grande abismo entre os direitos constitucionalmente elencados (no presente caso o
direito à educação) e a realidade do encarceramento, principalmente quando tratamos de
jovens, cuja vida está apenas começando, havendo inúmeras possibilidades de mudança
e resignificação.
16
CURY, Carlos Roberto J., “Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença”, Cadernos de
Pesquisa, São Paulo, n.116, Julho, 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/n116/14405.pdf.
Acesso em: 10 Abril. 2012.
17
RANIERI Nina Beatriz Stocco, “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de Preparo
da Pessoa para o Exercício da Cidadania pela Via da Educação”, tese apresentada à Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo, para obtenção de título de livre docente junto ao Departamento de Direito
do Estado, São Paulo, 2009. p. 29.
18
http://www.fundacaocasa.sp. gov.br/index.php/superintendencia-pedagogica - Acesso em 23.03.2012.
6
para que estas não se deem apenas no tempo, mas conforme dispositivos legais
constitucionais e internacionais de direitos humanos.
Cabe mencionar que no que toca ao tema da educação do adolescente em
conflito com a lei, privado de liberdade, há vasta produção acadêmica ligada, entre
outros, à Faculdade de Educação e ao Instituto de Psicologia da USP; entretanto, são
escassas tais pesquisas no âmbito jurídico, e quando existentes são impregnadas da
doutrina menorista. Demonstramos, assim, a importância que a presente pesquisa trará
para a garantia desse direito.
6. Objetivos
6.1. Objetivo Geral da pesquisa
(i) Explorar e desenvolver uma análise jurídica e jurisprudencial sobre o
direito à educação, com o recorte do adolescente que cumpre medida socioeducativa de
privação de liberdade;
(ii) Sistematizar e analisar a legislação e jurisprudência referente à garantia
do direito à educação nos estabelecimentos de privação de liberdade juvenis, no estado
de São Paulo, e sua efetivação;
(iii) verificar como o ensino público é ofertado nestas instituições (Estudo
de caso da Fundação CASA-SP), delimitando o tipo de ensino realizado;
(iv) verificar a observância e aplicabilidade, pelas instituições (Fundação
CASA-SP), do direito à educação, bem como dos direitos e garantias especiais da
criança e do adolescente, e princípios constitucionais a ele relacionados.
7
(iv) Analisar a jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o
tema, sistematizá-la e verificar como a legislação foi interpretada e aplicada, tendo
como instrumento súmulas e acórdãos. A análise jurisprudencial das demandas
educacionais referentes ao espaço de privação de liberdade se dará a partir da vigência
do Estatuto da Criança e do Adolescente, ano de 199119, até o ano de 2011. Tal corte
temporal, que abarca os 20 anos de vigência do ECA, se faz por o considerarmos um
importante ordenador jurídico para a garantia e defesa dos direitos da infância e
juventude. Insta salientar que tal delimitação temporal é necessária pois abrange não só
o tempo suficiente para a criação do aparato jurídico-educacional do sistema de
proteção à criança e ao adolescente, mas também à mudança ocorrida com os 06 anos de
implantação da Fundação CASA e seu novo modelo de intervenção em substituição ao
antigo modelo vigente na FEBEM. A análise buscará assim, investigar procedimentos
de realização, concretização e cumprimento das normas constitucionais e ocorrerá em
duas etapas. A primeira, formal, em que as decisões coletadas serão sistematizadas
dentro dos seguintes tópicos: 1. Número do processo; 2. Natureza do recurso; 3. Data do
julgamento; 4. Categorias; 5. Temas; 6. Origem: Comarca originária do processo; 7.
Apelante/Recorrente: os nomes dos autores que recorreram da decisão anterior; 8.
Apelados/Recorridos: os nomes dos autores que foram apelados ou recorridos para a
solução do litígio; 9. Câmara: Sessão onde ocorreu o julgamento; 10. Votação: se
unânime ou maioria dos votos; 11. Resultado: se o recurso foi provido, não provido,
parcialmente provido, recurso extinto; 12. Relator: nome do desembargador relator da
decisão; e 13. Localização da ementa e do acórdão: indicando a origem do acesso do
material. Após a sistematização, a segunda etapa, que será material, se dará através do
seguinte roteiro de pesquisa: a. Contexto – Em que consistiu o caso e quais os fatos?
Quais os problemas políticos sociais e humanos suscitados? Qual o contexto legislativo
constitucional e ordinário? b. Texto e significado da norma – Quais os sentidos
interpretativos que podem ser atribuídos ao anunciado da disposição constitucional e
ordinária em referência (origem, teleologia, história, interpretação gramatical e
interpretação sistêmica do texto)? c. Controvérsias constitucionais – quais as principais
controvérsias suscitadas pela normatização? d. Argumentação das partes e dos
envolvidos, se houver – quais os principais argumentos a favor e contra as
controvérsias? Quais as teses levantadas? e. Argumentação do Tribunal – Quais as
19
Promulgado em julho de 1990, e publicado D.O.U. 16.7.1990 e retificado no D.O.U de 27.9.1990,
entrando em vigor 90 (noventa) dias após sua publicação (art. 266 da Lei 8.069/90).
8
razões constitucionais da tese vencedora? E as do(s) voto(s) dissidentes? f. Decisão do
Tribunal – Qual a norma de decisão? Qual(is) o(s) fundamento(s) do acórdão? O
resultado final tem força racional a ponto de ser facilmente aceito pela sociedade? Quais
os seus benefícios sociais? Qual a sua repercussão jurídica?
Serão igualmente analisadas as estruturas e articulações existentes entre
órgãos envolvidos com a educação juvenil em estabelecimentos de privação de
liberdade, quais sejam: o Conselho Nacional de Educação, a Secretaria Estadual de
Educação e a Fundação CASA; analisando suas competências e atribuições. Isto porque,
sendo a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo responsável prioritário pelo
fornecimento do ensino fundamental e médio no estado de São Paulo, e sendo a
Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA) a instituição
responsável pela tutela dos adolescentes que lá cumprem medida socioeducativa de
privação de liberdade, faz-se necessário analisar dentro das competências desses órgãos
suas atribuições e limites na oferta do ensino; bem como a evolução da proteção e
promoção do direito à educação ao adolescente que se encontra privado de liberdade,
visualizando possíveis lacunas, a fim de delinear novas propostas para efetivação da
oferta educacional nos estabelecimentos de privação de liberdade destinados ao
cumprimento de medidas socioeducativas.
7. Desenvolvimento
A sistematização e análise de dados ocorreram em continuidade aos estudos
e pesquisas iniciados ainda na graduação de Direito com a temática da educação
prisional, fornecendo subsídios para a dissertação de mestrado na Faculdade de Direito
da USP. O trabalho de pesquisa teve seu foco prioritário no levantamento bibliográfico
e legislativo de maneira a agregar à bibliografia específica, voltada ao tema central da
pesquisa. Para tanto, foram usadas como fontes, as Bibliotecas da Universidade de São
Paulo (USP), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e do Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a internet (sítios eletrônicos do STJ, do
STF e do TJ-SP), resenhas críticas e artigos, através de revistas especializadas como,
por exemplo, a Revista dos Tribunais. Uma dificuldade em relação à busca por
bibliografia jurídica foi que as bibliotecas das faculdades de direito possuíam em seu
acervo livros desatualizados, alguns que ainda tratavam da doutrina menorista,
chegando a nomeação encontrada nos espaços ser “direito do menor”.
9
Diferentemente das bibliotecas dos cursos de educação, serviço social e
psicologia, nos quais a criança e o adolescente já são foco de pesquisa há algum tempo,
em que havia ampla bibliografia referente ao tema pesquisado Tal perspectiva é de
extrema importância para um trabalho que tem como área de concentração os direitos
humanos, pois rompe barreiras com relação aos outros saberes e enriquece a pesquisa
numa perspectiva dialógica.
Assim, a bibliografia trabalhada procurou abranger não apenas a área
propriamente jurídica, mas a educacional, sociológica e filosófica. Tal articulação
interdisciplinar também se deu visto não ser fácil penetrar no âmbito dos meandros do
direito (que tem muitas concepções, diversidades de ponto de vista – se aproximando
muito mais de uma ciência social, do que de uma ciência aplicada) aos meandros da
legislação e doutrina educacional.
A maior dificuldade encontrada foi com relação à pesquisa quantitativa,
quando verificamos a escassez de decisões judiciais referentes ao tema da pesquisa,
sendo encontradas decisões referentes à efetivação de outros direitos sociais que não o
educacional, ou mesmo pertinentes à execução da MSE em um enfoque muito mais
penalista do que constitucional educacional. Outra dificuldade, que levou uma
perspectiva inicial de projeto ser deixada de lado ao longo da pesquisa, foi quanto à
possibilidade de analise empírica, aplicação de questionários, ou mesmo realização de
vivências nos estabelecimentos prisionais. Tal situação foi frustrada dada a dificuldade
de realização de pesquisas no interior da Fundação CASA, as quais muitas vezes
demoram mais de um ano para obter aprovação, podendo ser subitamente canceladas
em razão de mudanças no governo.
Por fim, cumpre mencionar que apesar de vultuosa legislação referente ao
direito à educação e ao fornecimento educacional, a presente pesquisa buscou se
restringir às mais gerais e de maior incidência.
8. Metodologia da Pesquisa
O tema a ser discutido é complexo e amplo, envolvendo diversas áreas do
conhecimento. Isto porque, tratar do direito fundamental à educação do adolescente em
conflito com a lei – que se encontra em situação de privação de liberdade – acaba por
envolver as áreas da educação e da sociologia, além de temas do direito, como
criminologia e direito penal juvenil.
10
Assim, a pesquisa terá natureza aplicada para atingir seu objetivo
exploratório, que além de demonstrar familiaridade com o tema, buscará explicitá-lo a
partir da pesquisa bibliográfica e documental somadas ao estudo de caso.
Para o desenvolvimento da pesquisa, o método científico a ser utilizado será
o dialético, porque este, nas palavras de DEMO, “vê na história não somente o fluxo
das coisas, mas igualmente a principal origem explicativa”20.
Tal método se justifica por considerar que nenhum fenômeno da natureza
pode ser compreendido, quando encarado isoladamente, fora dos fenômenos que o
circundam. Sendo o crime uma construção social, visto que nós (sociedade), dentro de
um processo social de construção de valores mutáveis com o tempo, definimos o
delito21; e estando a concepção de infância e a doutrina em constante processo de
mudança e avanço. A análise da educação de crianças e adolescentes em conflito com a
lei deve ser compreendida e realizada considerando sua ligação indissolúvel com os
fenômenos que a rodeiam.
No que toca às técnicas de investigação, utilizaremos a de investigação
teórica, documental, bibliográfica e de estudo de caso.
BITTAR é claro ao afirmar que “a pesquisa não deve ficar confinada
somente a se desenvolver a partir de uma técnica bibliográfica [...], nem sobre um
modelo empírico-experimental”22 devendo se conjugar ou se adequar às técnicas de
acordo com o campo de trabalho no qual se situa o tema a ser abordado.
Assim, utilizaremos as seguintes fontes de pesquisa: (i) legislação nacional
e internacional, incluindo declarações, convenções e tratados internacionais, (ii) fontes
bibliográficas diversas a respeito do tema; (iii) jurisprudência disponível no sítio
eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (www.tjsp.gov.br); (iv)
documentos públicos e dados disponíveis em sítios de órgãos oficiais como a Fundação
CASA (www.casa.sp.gov.br), a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo
(www.educacao.sp.gov.br); Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania do
Estado de São Paulo (http://www.justica.sp.gov.br/novo_site/) o INEP
(www.inep.gov.br), MEC (www.mec.gov.br), IBGE, (www.ibge.gov.br), e ONU-
BRASIL (www.onu-brasil.org.br).
20
DEMO, Pedro, “Introdução à metodologia da ciência”. 1987, p. 21. In. BITTAR, Eduardo Carlos
Bianca. Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.
21
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
22
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9ª edição. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 201.
11
I – O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO: DIREITO SOCIAL
FUNDAMENTAL AO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
I - a soberania;
II - a cidadania;
V - o pluralismo político.
23
RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de
Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-Docência) –
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 246.
12
binômio democracia e república, como a soberania popular (participação representativa
e participação popular direta), a dignidade da pessoa humana, a cidadania e o pluralismo
jurídico, princípios estes, relativos ao regime democrático e à vida política.
Vemos, assim, que o Estado Democrático de Direito é legitimado pela
democracia, tendo seus objetivos, valores e princípios expressos constitucionalmente. O
vocábulo democracia advém etimologicamente do grego dèmokratía, que significa o
governo do povo, visto Demos = povo e kratos = força/poder, o que nos leva a concluir
que a “democracia” somente ocorre no Estado no qual o povo detém o poder24, sendo
exercida direta ou indiretamente, por meio de representantes eleitos, além de ser
possível tanto em sistemas presidencialista, parlamentararista, republicano quanto
monárquico.
Quando pensamos em democracia, logo nos vêm à mente a Grécia antiga e
suas experiências democráticas em Atenas. Ocorre que o conceito grego de democracia
apesar de guardar certa relação com o moderno, possui uma divergência fundamental no
que diz respeito à noção de povo, isto porque a condição grega de cidadania possuía
pressupostos que excluíam boa parte da população, como escravos, mulheres e
estrangeiros, que politicamente marginalizada.
Segundo DALLARI, Aristóteles é taxativo ao afirmar que a cidade-modelo
não deve jamais admitir um artesão a somar no número de seus cidadãos, já que “a
virtude política, que é a sabedoria para mandar e obedecer, só pertence àqueles que não
têm necessidade de trabalhar para viver, não sendo possível praticar-se a virtude quando
se leva a vida de artesão ou mercenário”.25 Vemos que a democracia grega era um
reflexo dos valores presentes na cultura grega.
O primeiro Estado jurídico tem origem no pensamento de fins do século
XVII e inícios do XVIII com as ideias iluministas (1650/1700)
, e nas ideias das revoluções Inglesa (1689), Americana (1776) e Francesa
(1789), quando a crise do Ancien Régime trouxe novas ideias filosóficas e econômicas
que defendiam a liberdade de pensamento e a igualdade dos homens perante as leis,
além da democracia, do liberalismo econômico e da liberdade de culto e de pensamento.
A preferência pela democracia e a afirmação dos princípios democráticos se
deu nos marcos do enfraquecimento do poder absolutista e do fortalecimento da
24
SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2001. p.
81.
25
DALLARI, Dalmo. Elementos de Teoria Geral do Estado. 23ª edição. São Paulo: Saraiva, 2002. p.
146.
13
burguesia, a qual, através da afirmação de direitos naturais da pessoa humana, buscou
ascender politicamente. Para isso, apoiaram-se em grandes pensadores jusnaturalistas,
como Locke e Rousseau.
John Locke pregava a limitação da autoridade real pela soberania do povo,
sendo suas ideias de grande valia para aqueles que queriam se ver livres dos poderes da
monarquia absolutista. Em sua obra O segundo tratado sobre o governo26, que tem
como base princípios liberais da doutrina contratualista, ele buscou universalizar suas
teorias como a de distinção entre poder Legislativo e Executivo, bem como o direito de
insurreição dos súditos, devendo sempre prevalecer a vontade soberana da comunidade
nacional, única fonte do poder27.
Interessante notar que em seu pensamento, Locke utiliza conceitos caros à
democracia moderna, como a liberdade, para validar a propriedade privada. Sendo a
propriedade para ele, um direito natural que o Estado deve reconhecer e proteger,
contraposição clara ao modelo feudal de propriedade.28.
Rousseau – outro pensador que influenciou a atual teoria de governo
democrático –, por sua vez, chegou a manifestar seu descrédito pelos governos
democráticos, dizendo que “se existisse um povo de deuses, ele se governaria
democraticamente. Tão perfeito governo não convém entre homens”.29 Mesmo assim,
podemos ver em sua obra diversos princípios inerentes ao Estado Democrático; ele
considerava, por exemplo, que todos deveriam estar em condições de igualdade para
que a democracia pudesse se efetivar.
Para Rousseau a representatividade era uma ideia incoerente com o
princípio da democracia, pois esta deveria ser exercida de maneira direta, pelo próprio
povo, de modo que a participação popular e a cidadania dependem de modo direto da
26
LOCKE, John. O segundo tratado sobre o governo. São Paulo: Ibrasa, 1963.
27
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23ª edição, revisada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1995. p.
121.
28
Tanto que Peter Laslett é enfático ao afirmar que o autor introduz “(...) um motivo para a instauração da
sociedade política que poucos consideraram no contexto das origens políticas, um motivo ao qual
ninguém atribuiu muita importância. De forma abrupta, Locke insere na discussão o conceito de
propriedade” (LASLETT, Peter. “A teoria social e política dos dois tratados sobre o governo”. In:
QUIRINO, Célia Galvão & SOUZA, Maria Tereza Sadak R. de (Orgs.). O pensamento político clássico,
cit. p. 214-5.) De igual opinião é Harold Laski para quem “Locke não teve dificuldade em considerar que
o Estado era feito para proteger os interesses de um homem que, pelo seu próprio esforço, acumulou bens
e propriedades”,de modo que para ele, “se a propriedade é a consequência do trabalho, então ele tem,
claramente, todo o direito à segurança, pois esta é a ‘grande e principal finalidade’ da união dos homens
em comunidade” (LASKI, Harold J. O liberalismo europeu. São Paulo: Mestre Jou, 1973. p. 84).
29
ROUSSEAU. Jean-Jacques, O Contrato Social, Livro III, Capítulos III e IV.
14
forma como está constituído -o Estado. Devendo sua estrutura conter mecanismos que
permitam a manifestação da vontade geral.
Como já dito anteriormente, foram três os grandes movimentos político-
sociais que transpuseram do plano teórico para o prático os princípios condutores da
democracia: a Revolução Inglesa (Revolução Gloriosa), a Revolução Americana e a
Revolução Francesa. A primeira, fortemente influenciada por Locke30, consolidou, no
limiar do século XVIII, sua estrutura monárquica, cuja tripartição do poder, sistema
representativo, preemência da opinião nacional e intangibilidade dos direitos
fundamentais do homem31 teve no Bill of Rights (1689) sua expressão mais
significativa.
Por sua vez, a Revolução Americana, sofrendo forte influência das ideias
liberais irradiadas da metrópole inglesa, estabeleceu seus princípios liberais na
Declaração de Independência Americana, datada de 4 de julho de 1776, cujo preâmbulo,
demonstra o espírito que ensejou a elaboração do documento, verbis:
30
“Esta liberdade em relação ao poder absoluto e arbitrário é tão necessária à preservação do homem e a
ela está tão intimamente conjugada, que não lhe é dado desfazer-se dela senão mediante o que lhe faz
perder juntamente a preservação e a vida.” John Locke - Segundo tratado sobre o governo, 1690.
31
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. 23ª edição, revisada e atualizada. São Paulo: Saraiva, 1995. p.
124.
15
Homem, a tríade da liberdade, igualdade e fraternidade [...]”, promulgando as
“Constituições do chamado Estado Democrático”32. Cumpre complementar o tema com
anotações acerca do tipo de Estado que se organizou para ser democrático, qual seja, o
Estado Constitucional e todas as teorias que informam as Constituições em relação às
suas formas de Estado e de governo. A importância da Constituição se faz por ser esta
uma carta de intenções do poder, que irá fundamentar e guiar as ações do Estado.
Durante o “constitucionalismo antigo”, a Constituição era a organização do
exercício do poder político que não necessariamente coincidia com o conceito de norma
jurídica. Ela não guardava um conteúdo do “dever ser” (que o Estado tem condições de
impor e o dever de garantir), sendo simplesmente uma mera fotografia do poder (o
retrato estático da forma como o Poder está estabelecido conforme o afirmado por
Lassale33).
A emergência do “constitucionalismo novo”34 – modelo que surgiu no
século XX – trouxe transformações sensíveis ao direito constitucional e ao conceito de
Estado, tais quais o reconhecimento da força normativa da Constituição, a expansão da
jurisdição constitucional, e o desenvolvimento da dogmática da interpretação
constitucional.
32
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 9ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2009.
p. 30.
33
LASSALE, Ferdinand. Que é uma Constituição? São Paulo: Edições e Publicações Brasil, 1933.
34
BARROSO, Luís Roberto. ”Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito: o triunfo tardio
do direito constitucional no Brasil”. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, n. 58, p.
129/173, jan.-mar. 2007.
35
RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de
Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-Docência) –
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 118.
16
Temos aqui a ideia de que todo o poder emana do povo, sendo a Constituição o
instrumento que reconhece esta soberania.
36
BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 9ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2009.
p. 32.
37
RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de
Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-Docência) –
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 94.
38
Mecanismo de garantia da normatividade constitucional, já que um órgão do Estado garante o controle
de outro órgão do Estado.
17
reforma.39 Nesse sentido, pode-se dizer que Constituição (em sua acepção
contemporânea) é condição de Democracia, e só tem sentido de existir em Estados
Democráticos.
Temos, assim, que Democracia são as condições que legitimam,
procedimental e materialmente, o exercício do poder do povo, pelo povo e para o povo.
Considerando “povo” como o conjunto mais amplo possível de pessoas relacionadas
com Estado.
De tal modo, faz-se obsoleta a premissa de Aristóteles de que possa haver
governos legítimos que não sejam democráticos. Tanto os procedimentos para a
investidura dos governantes para o exercício do poder político quanto o propósito com o
qual o poder político é exercido são condições da democracia. Ela é ao mesmo tempo,
um procedimento e um valor material que só se garante por meio de uma Constituição
específica.
Se tentarmos extrair um conceito material de Democracia, teremos uma
síntese de liberdade e igualdade. Isto porque, o Estado democrático não é o que garante
a liberdade absoluta, mas o que a assegura de forma igualitária para todo o seu povo,
proporcionando, assim, igualdade de possibilidade para que todos participem, na mesma
proporção, na formação e condução da própria ordem social (Estado/Direito).
Assim, em uma rápida síntese, destacamos que os princípios que passaram a
nortear os Estados são: a supremacia da vontade popular, a preservação da liberdade e a
igualdade de direitos. Cumpre, desse modo, transcrevermos o conceito de Democracia
dado pela Organização dos Estado Americanos, nos artigos 1º e 2º, da Carta
Democrática Interamericana, aprovada em 11 de setembro de 2001:
Artigo 1
Artigo 2
18
um marco de legalidade, em conformidade com a respectiva
ordem constitucional.
40
A distinção entre os termos “humanos” e “fundamentais” foi superada pela visão de que ambos os
termos tratam do mesmo instituto jurídico, recuperado por Ferreira Filho através da expressão “direitos
humanos fundamentais”. (RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido
da Exigência de Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-
Docência) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 274).
19
além de referir-se a princípios que resumem a concepção do
mundo e informam a ideologia política de cada ordenamento
jurídico, é reservada para designar, no nível do direito positivo,
aquelas prerrogativas e instituições que ele concretiza em
garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as
pessoas.41
20
para o enfoque prestacional, característico das obrigações de fazer que surgem com os
direitos sociais”45; tais direitos aparecem nos textos normativos da Constituição
Mexicana de 1917 e da Constituição de Weimar de 1934, podendo ser classificados
como “direitos-meio” de fruição de direitos de primeira geração46 e demais direitos.
Tal relação entre igualdade e efetivação de direitos sociais é feita por
diversos pensadores como o professor JAGUARIBE47 que tem na Democracia social
uma organização cuja finalidade é o interesse público:
Temos, assim, que a garantia e efetivação dos direitos sociais, são condição
necessárias ao conceito de Estado Democrático de Direito, sendo o direito fundamental
à educação o mediador da atuação participativa e crítica do indivíduo, bem como o
precursor dos demais direitos sociais.
Analisando o processo histórico de busca por direitos foi a Revolução
Industrial que trouxe à luz diversas demandas trabalhistas, afinal, foi o momento no
qual as massas operárias e o movimento sindical assumiram relevância social48 e
pautaram suas demandas por direitos. Esta, somada ao início da chamada 2ª Era dos
Direitos, Geração dos direitos econômico-sociais49, fizeram com que o Estado, agora
chamado Estado Social de Direito, constituísse uma inovação no paradigma do Estado
45
BUCCI, Maria Paula Dallari. “O conceito de política pública em direito”. In Políticas Públicas:
Reflexões sobre o conceito. p. 2-3.
46
“O professor Antonio Augusto Cançado Trindade entende, entretanto, que a classificação não tem
nenhum fundamento jurídico, nem tão pouco fundamento na realidade, tratando-se de uma teoria
fragmentária, incompatível com a complexidade do direito. Para este ilustre professor, a classificação
toma os direitos humanos de maneira dividida, teoria inaceitável uma vez que, na sua concepção, os
direitos são indivisíveis e interrelacionados. Uma interessante contribuição da crítica apresentada refere-
se aos reflexos da classificação fragmentária sobre os direitos econômicos e sociais. Para os defensores da
classificação em gerações, esses direitos são programáticos. Assim, enquanto as discriminações relativas
a direitos individuais e políticos são absolutamente condenadas, as discriminações econômicas e sociais
são toleradas, pois como entende a teoria fragmentária, são programáticos, portanto de realização
progressiva. Ainda segundo o ilustre professor, em vez de ajudar a combater as discriminações
econômicas e sociais, rejeitando-as, a teoria das gerações acaba por tolerá-las, convalidando as
disparidades.” ANGIEUSKI, Plínio Neves. Evolução dos Direitos Humanos: Crítica à Classificação em
Gerações de Direitos. Boletim Jurídico. Edição no 138. Código da publicação: 745.
47
JAGUARIBE, H. Brasil, sociedade democrática. Rio de Janeiro. José Olímpio, 1985.
48
GRINOVER, Ada Pellegrini. “O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário”. In O processo:
estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 36.
49
Cumpre mencionais que a expressão “geração de direitos” sofre críticas da doutrina, visto o uso do
termo “geração” nos dar falsa ideia de substituição de uma geração por outra, o que não ocorre, havendo
assim um processo de acumulação de direitos.
21
Liberal, transformando sua postura negativa (de abstenção) em uma postura positiva (de
prestação). Tal mudança alterou a concepção de Estado e suas finalidades, tanto que
diversas Constituições passaram a dispor sobre as garantias e proteções dos direitos
sociais como um todo, garantindo com isso que tais direitos, por figurarem na Carta
Maior, na carta de propostas de um país, não deixassem de ser previstos.
Seguindo a corrente, o Brasil também incorporou ao longo dos anos
diversos direitos sociais a sua Carta Magna, dando maior ou menor importância a estes
direitos conforme a conjuntura à época de cada modificação constituinte. Na atual
constituição Federal, datada de 1988, o Estado Brasileiro tem dentre os objetivos
fundamentais, constantes em seu artigo 3º: “I - construir uma sociedade livre, justa e
solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e IV - promover o bem de
todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.”, objetivos juridicamente vinculantes para todos os órgãos estatais,
levando-nos a concluir que o nosso Estado Democrático Social de Direito destina-se a
assegurar o exercício de direitos sociais e individuais, direitos estes fundamentais.
Temos um Estado que deve intervir sobre a realidade social para modificá-
la; que se propõe transformador, não apenas mantenedor. Conforme já mencionado, o
Estado Moderno, cujas bases foram concebidas no fim do século XVII e ao longo do
século XVIII, é tido como “organização necessariamente rígida e estática, porque o
desafio político da época consistia em abolir o absolutismo monárquico, pela
despersonalização do poder”50. Sendo necessária a norma geral e abstrata para substituir
a vontade individual do governo absolutista.
Este Estado Moderno buscava a segurança individual, valor, nas palavras de
COMPARATO, essencialmente estático e conservador; buscava a preservação da vida,
da liberdade e da propriedade. A lei aparece para Locke e Montesquieu como regra
geral e suprema de conduta, não sujeita a adaptações ou alterações (imutável), tal qual a
norma Constitucional. Tal concepção restritiva vinha por limitar o poder estatal;
limitação que Montesquieu buscou através do mecanismo da separação dos poderes,
condicionando a liberdade dos cidadãos à divisão das funções do Estado.
DALLARI observa que a “teoria foi consagrada em momento histórico no
qual se pretendia o enfraquecimento do Estado e a sua restrição na esfera de liberdade
50
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade de políticas públicas, in
Revista dos Tribunais, Ano 86, V. 35, 1997, p. 12.
22
individual”.51 Assim, a separação dos poderes serviu para refrear a interferência da
realeza nas decisões dos juízes52,53.
A transição entre o Estado Liberal e o Estado Social promove alteração
substancial quanto à concepção de Estado e sua finalidade54. A teoria de Separação dos
Poderes não pode ser um fim em si mesma devendo estar estreitamente ligada às
finalidades do Estado, de modo que com a alteração destas, a concepção da teoria
também se altera:
51
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado, 26 ed., São Paulo: Saraiva, 2007. p.
216.
52
“Os reis ingleses, por sua influência direta na composição e na atuação dos órgãos jurisdicionais, não
raras vezes tentavam intervir nas decisões exaradas nos casos concretos de maior relevância”. CANELA.
Oswaldo Jr.
53
Ele também nos lembra que Montesquieu “exerceu a magistratura. Entretanto, o seu acesso às funções
judicantes operou-se hereditariamente. Assim é que Montesquieu herdou de um tio, no ano de 1716, o
cargo de membro do Parlement de Bordeaux, órgão judiciário coletivo, cargo que acabou vendendo por
necessidade financeira e porque não nutria qualquer interesse pela atividade.” DALLARI, Dalmo de
Abreu. O poder dos juízes. São Paulo: Saraiva, 1996, p.15. apud CANELA. Oswaldo Jr. O controle
Judicial de Políticas Públicas. 1ª. Edição. São Paulo: Saraiva, 2011. p.69.
54
Concepção esta que segundo Oswaldo Canela Junior mudou de aspecto: “e assim a teoria da separação
dos poderes (art.2º da CF brasileira) muda de feição, passando a ser interpretada da seguinte maneira: o
estado é uno e uno é seu poder. Exerce ele seu poder por meio de formas de expressão (ou Poderes). Para
racionalização da atividade estatal, cada forma de expressão do poder estatal exerce atividade específica,
destacada pela Constituição. No exercício de tais funções é vedado às formas de expressão do poder
estatal interferências recíprocas: é este o sentido da independência dos poderes.” CANELA, Oswaldo. Jr.
A efetivação dos direitos fundamentais através do processo coletivo: um novo modelo de jurisdição (tese
de doutorado apresentada na USP sob orientação de Kazuo Watanabe). apud GRINOVER, Ada
Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. O processo: estudos e pareceres. 2ª
edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 39.
55
CANELA, Oswaldo. Jr. O controle Judicial de Políticas Públicas. 1ª. Edição. São Paulo: Saraiva,
2011. p.72.
56
COMPARATO, Fábio Konder. “Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade de políticas públicas”, In
Revista dos Tribunais, Ano 86, V. 35, 1997, p. 16.
23
como os instrumentos e meios para alcançá-los. Isto porque no séc. XIX as
transformações sociais decorrentes da Revolução Industrial, a expansão em massa da
população, somadas à concentração de riqueza acabaram gerando gigantescos bolsões
de misérias nas classes inferiores.
O Estado Contemporâneo, assim, passou a ter legitimidade e capacidade
para realizar objetivos predeterminados, e a reorganização da atividade estatal em
função de finalidades coletivas tornou-se indispensável, passando a ser atribuição dos
Poderes Públicos propiciar condições básicas ao alcance da igualdade social.
Tal mudança de modelo estatal de modelos estatais torna necessário um
reexame da tradicional classificação dos Poderes de estado, pois diferentemente do
modelo constitucional clássico, no qual o Legislativo é tido como um Poder Supremo, a
legitimidade estatal passa a fundar-se na realização de finalidades coletivas (a serem
concretizadas programadamente através de políticas públicas ou de programas de ação
governamental), dando ao Poder Executivo um papel hegemônico. Realidade verificada
no fornecimento de direitos sociais, como o direito à saúde e o direito à educação, que
por serem direitos prestacionais, necessitam ser organizados dentro da divisão de
competências do pacto federativo, e da atuação harmônica dos Poderes.
a. Definição e fundamento
24
humanidade. Esse caráter humanizador57 implica que a
educação tem um valor em si mesma e que não é unicamente
uma ferramenta para o crescimento econômico ou social, ainda
que também o seja, como costumava perceber-se a partir de
visões mais utilitaristas.58
25
b. Educação e Ensino
Por sua vez, ensino representa uma relação mais pontual, que se
destaca de um processo de aprendizado, direcionado e direto,
em que se podem detectar dois polos relacionais, a saber, o
educador e o educando. O ensino tem mais a ver com o
engajamento da atividade educacional em relações privadas ou
públicas de prestação de serviços educacionais, tenentes à
formação elementar do indivíduo nas ciências, nas práticas e
nos saberes constituídos pelos progressos da humanidade.
Quando se menciona a palavra ensino, está-se a vislumbrar uma
atividade de transmissão de conhecimento dentro de parâmetros
predefinidos, formais, portanto, por meio dos quais se
transporta a experiência de um para outro ser.
RANIERI nos chama atenção para o imenso número de palavras que deriva
de ambos os vocábulos, mostrando-nos que estes são empregados pela Constituição
Federal de 1988, pela LDB (Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996) ou mesmo pelo
ECA (Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990), muitas vezes como sinônimos62.
61
BITTAR, Eduardo G. B. Direito e Ensino Jurídico: Legislação Educacional. São Paulo: Editora Atlas
S.A., 2001.p. 15-16.
62
RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de
Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-Docência) –
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 277.
26
a “qualidade”, “acesso à escola pública e gratuita próxima da
residência”, “participação em entidades estudantis” etc.
63
A escola é depois da família o primeiro espaço de troca e interação social do indivíduo, sendo o seu
primeiro contato com o outro.
64
BITTAR, Eduardo G. B. Direito e Ensino Jurídico: Legislação Educacional. São Paulo: Editora Atlas
S.A., 2001.p. 15-16.
65
MONTORO, André Franco Jr. Estudos de filosofia do direito. 3.ª ed., São Paulo: Saraiva, 1999. p.
171–173.
66
BITTAR, Eduardo G. B. Direito e Ensino Jurídico: Legislação Educacional. São Paulo: Editora Atlas
S.A., 2001.p. 20-21.
27
evidente quando pensamos na educação como um todo, que não se limita ao espaço
escolar, enquanto o ensino, mais restrito, é aplicado neste.
Tais motivos por si só já seriam suficientes para a criação de medidas
efetivas que permitam a todos não só o acesso à educação, mas também sua
manutenção. Isto porque ele acaba por tornar-se o acesso aos demais direitos, à
participação efetiva do indivíduo na sociedade. No mesmo sentido, para BITTAR:
Assim, no que tange ao ensino público, este deve ser acessível a todos, de
qualidade, devendo haver forte investimento nos professores, em programas
suplementares – como a oferta de alimentação, material escolar e transporte –, no
policiamento, entre outros. Também são condições de realização do ensino público no
Brasil a igualdade de oportunidades e a garantia de vagas para todos.
Na presente pesquisa, adotaremos o termo escolarização para tratar desta
educação formalizada pelo equipamento estatal e controlada não apenas de forma
instrumental, mas também ideologicamente.
c. Acesso à educação
O acesso à educação pode ser considerado um dos mais eficazes meios para
alcançar este direito tão primordial que é a dignidade da pessoa humana. A dignidade
diz com a condição humana do ser humano, guardando íntima relação com as
complexas manifestações da personalidade humana68. SARLAT ao tratar das dimensões
da dignidade salienta como esta é vista enquanto constituinte do valor próprio que
67
BITTAR, Eduardo G. B. Direito e Ensino Jurídico: Legislação Educacional. São Paulo: Editora Atlas
S.A., 2001.p. 20-21.
68
SARLET, Ingo Wolfgang (org.). As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma
compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. 2ª. ed. e ver. e ampl. Porto Alegre: Livraria do
Advogado Editora, 2009. p. 15.
28
identifica o homem, sendo algo real, irrenunciável e inalienável. Significa que a
dignidade deve ser não apenas reconhecida e respeitada, mas protegida e promovida.
O presente trabalho se propõe a tratar do direito à educação nas situações de
privação de liberdade, situações nas quais muitas vezes encontramos indivíduos que
foram privados desta dignidade social, deste reconhecimento simbólico tão necessário
ao ser humano, acabando a buscar outras formas de reconhecimento e de afirmação
enquanto ser humano, realizando o que OLIVEIRA chama de descolamento:
69
Oliveira, Carmen Silveira de. Sobrevivendo no inferno. A violência juvenil contemporânea. Porto
Alegre: Sulina, 2001, p. 99. apud VICENTIN, Maria Cristina Gonçalves. A vida em Rebelião. Jovens em
conflito com a Lei. São Paulo: Hucitec: Fapesp, 2005. p. 210)
70
PAULA, Paulo Afonso Garrido de. “Educação, Direito e cidadania”, Revista Igualdade. Livro 0.
Curitiba, s/Ed., outubro-dezembro/1995. p. 13.
29
um novo entendimento sobre gestão pública que vise impulsionar mudanças na área
educacional:
71
SARI, Marisa Timm. “A organização da Educação Nacional. (67-120)”. In. LIBERATI, Wilson
Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 69.
30
menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da
matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente
não puderem alegar escassez de recursos, uma contribuição
módica e mensal para a caixa escolar.
72
MORAES, Alexandre de. Curso de direito constitucional. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 194.
31
Como adverte BOAVENTURA73: “Ao lado do direito à educação deve estar
a obrigação de educar”. Obrigação tão cara ao Estado Brasileiro que a Constituição de
1988 determina ser a educação um direito fundamental, ou seja, um direito público
subjetivo, nos termos dos artigos 205 e 208, §1º e reforça essa obrigação estatal ao
definir a educação como: (I) direito de todos; (II) dever do Estado e da família, devendo
ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade; (III) visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa; (IV) seu preparo para o exercício da cidadania; e sua (V)
qualificação para o trabalho, na conformidade com as disposições dos artigos 205 e
20874.
A Constituição estabelece em seu artigo 205 que o direito à educação é
“direito de todos e dever do Estado e da família”, devendo esta ser “promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
LIBERATI é claro ao definir os objetivos constitucionais da educação
como: “a) pleno desenvolvimento da pessoa; b) preparo da pessoa para o exercício da
cidadania; c) qualificação da pessoa para o trabalho”75. Objetivos interligados aos
demais princípios constitucionais, de modo que ao afirmar os norteadores do ensino, o
constituinte nada mais fez do que esmiuçar princípios de direitos e garantias já dispostos
na Constituição.
73
BOAVENTURA, M. Edivaldo. “Um ensaio de sistematização do direito educacional”. Revista de
Informação Legislativa. Brasília. Ano. 33, N. 131. Julho a setembro de 1996, p. 32
74
LINHARES, Mônica Tereza Mansur, “O Direito à Educação como Direito Humano Fundamental”. In:
Revista Jurídica da Universidade de Franca. Publicação do Curso de Direito da Universidade de Franca.
Franca. Ano 7, n. 13. 2º semestre. Franca, 2004. p. 159.
75
LIBERATI, Wilson Donizeti. “Conteúdo material do direito à educação (208-260)”. In. LIBERATI,
Wilson Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 209.
32
exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos
das redes públicas;
33
Ranieri, o “eixo jurídico da organização do ensino no País”78. Ela vem para
regulamentar as linhas traçadas pela Constituição Federal, pois disciplina a educação
escolar (da infância à superior), define incumbências (a jurisdição e a forma de
relacionamento dos Sistemas de Ensino), além de tratar da gestão democrática do ensino
público, da autonomia das escolas, dos níveis e modalidades de educação e de ensino,
dos recursos financeiros, entre outros temas de igual importância.
A LDB é considerada, por diversos autores, o marco sistematizador das
mudanças propostas à época de sua tramitação, sobretudo por sua flexibilidade,
descentralização e avaliação79.
Ao regulamentar os dispositivos constitucionais referentes à educação, ela
trata da escolarização básica de adultos (no presente caso, de jovens que cumprem MSE
de privação de liberdade) na Seção V do Capítulo II, “Educação Básica”, que obriga aos
sistemas de ensino garantir cursos e exames que proporcionem oportunidades
educacionais apropriadas aos interesses, condições de vida e trabalho dos jovens e
adultos; e determina que o acesso e a permanência destes na escola devem ser
viabilizados e estimulados por ações integradas dos poderes públicos.
Sendo a educação um direito extensivo a todos, e dever do Estado, ela deve
ser fornecida de “modo a permitir a completitude da finalidade do Estado de
proporcionar o bem-estar de todos”80, de modo que a LDB dispõe em seu art. 1º que
“educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na
convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos
movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.”
Temos, assim, que o ensino é um gênero da educação, conforme nos mostra
RANIERI81:
34
processos próprios de aprendizagem relacionados ao
oferecimento de ensino fundamental às populações indígenas
(art. 210, §2º).
[...]
[...]
82
Com relação ao inciso VII do artigo 4º, o Conselho Nacional de Educação aprovou em 2000 o Parecer
11 e a Resolução 1, que fixam Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos, de
modo a regulamentar alguns aspectos da LDB.
83
LIBERATI, Wilson Donizeti. “Conteúdo material do direito à educação” (208-260). In. LIBERATI,
Wilson Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 212.
35
Não há que se questionar a possibilidade de acesso à educação para aqueles
que não a tiveram na idade própria, bem como para aqueles que se encontram privados
de liberdade, sob a tutela do Estado.
84
SARI, Marisa Timm. “A organização da Educação Nacional”. (67-120). In. LIBERATI, Wilson
Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 73-74.
85
SARI, Marisa Timm. “A organização da Educação Nacional”. (67-120). In. LIBERATI, Wilson
Donizeti (org.). Direito à educação: Uma questão de justiça. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 73-74.
36
A Lei 10.172/2001 do Plano Nacional de Educação (PNE) definiu 26 metas
prioritárias para o decênio 2001-2010, tais quais: alfabetizar em cinco anos dois terços
da população analfabeta, visando superar o analfabetismo em uma década; assegurar,
em cinco anos, a oferta do primeiro segmento do Ensino Fundamental para 50% da
população com mais de 15 anos que não tenha atingido este nível de escolaridade;
atender no segundo segmento do Ensino Fundamental toda a população com mais de 15
anos que tenha concluído a etapa precedente; dobrar em cinco anos, e quadruplicar em
dez anos, o atendimento de jovens e adultos no Ensino Médio86.
Entre tantas metas a serem realizadas, encontramos como sendo a 17ª meta,
implantar, em todas as unidades prisionais e estabelecimentos que atendam adolescentes
e jovens em conflito com alei, programas de educação de nível fundamental e médio
(EJA), assim como de formação profissional. Tal meta contempla outras como a 5ª
(financiamento pelo MEC de material didático-pedagógico) e a 14ª (oferta de programas
de educação à distância); já que é obrigação estatal assegurar recursos do Tesouro e da
Assistência Social para programas de renda mínima associados à educação, recursos da
Saúde e Assistência Social para a educação infantil; recursos destinados à criação de
condições de acesso da escola; e recursos do Trabalho para a qualificação dos
trabalhadores.
Entretanto, apesar de o Plano Nacional de Educação ter sido elaborado em
2001, somente em março de 2005, ou seja, quatro anos depois da sua publicação, o
Ministério da Educação anunciou que em parceria com o Ministério da Justiça e a
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República participaria da definição
de projeto educativo destinado às populações carcerárias, o qual só foi efetivado em
2009, ou seja, oito anos depois.
O atual PNE87, para o decênio 2011-2020, definiu 20 metas prioritárias, tais
quais:
86
GRACIANO Mariângela. “A educação como Direito Humano: A escola na prisão”. USP Faculdade de
Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação (Mestrado). São Paulo, 2005.p. 33.
8787
Sitio eletrônico do Senado: http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2012/10/22/plano-nacional-
de-educacao-apresenta-19-metas - consulta realizada em 15.12.2012.
37
Meta 6: Oferecer educação em tempo integral em 50% das
escolas públicas de educação básica.
38
competência, assegurar a participação da sociedade no desenvolvimento,
aprimoramento e consolidação da educação nacional de qualidade”.88
O CNE é regulamentado pela lei federal 9.131/95 sancionada pelo então
presidente Fernando Henrique Cardoso, que alterou dispositivos da Lei nº 4.024, de 20
de dezembro de 1961. O atual CNE é tido como órgão colegiado integrante do
Ministério da Educação.
As atribuições do Conselho são normativas, deliberativas e de
assessoramento ao Ministro de Estado da Educação. Assim, lhe cumpre formular e
avaliar a política nacional de educação, buscando o aprimoramento da legislação
educacional e a participação da sociedade.
O Conselho e as Câmaras exercem as atribuições conferidas pela Lei
9.131/95, tal qual a emissão de pareceres e decisão de assuntos que lhe são pertinentes.
Para saber um pouco mais do histórico do Conselho Nacional de Educação,
cumpre-nos transcrever a seguinte passagem do portal do MEC:
88
Site: http://portal.mec.gov.br/ Acesso em 13.06.2011.
89
Site: http://portal.mec.gov.br/ Acesso em 13.06.2011.
39
2- Participar do esforço nacional comprometido com a
qualidade social da educação brasileira, cujo foco incide na
escola da diversidade, e para a diversidade, tendo o PNE e o
PDE como instrumentos de conquista dessa prioridade.
[...]
90
Site: http://portal.mec.gov.br/ Acesso em 13.06.2012.
40
“Um dos principais resultados desse movimento é a primeira
reforma de instrução pública, também conhecida como a
“grande reforma de 20”. A reforma realizada em São Paulo, que
propunha a modernização administrativa e a reestruturação da
rede física, serviu como exemplo para que outros Estados
também iniciassem mudanças na área.”91
41
dos jovens que se encontram em privação de liberdade, por isso a importância de sua
análise.
94
Existem remédios jurisdicionais (nacionais e internacionais), mas também outros mecanismos de
exigência, como o departamento do ombudsman (Procuradoria dos Direitos Humanos, Defensoria do
Povo etc.), as Comissões de Direitos Humanos dos sistemas universal ou regionais de direitos humanos,
os procedimentos convencionais e extraconvencionais das Nações Unidas e dos sistemas regionais de
proteção aos direitos humanos, e controles de serviço ou gestão institucional, entre outros. Os
instrumentos convencionais são os instrumentos do direito internacional que por sua natureza, sua adoção,
sua ratificação e seu grau de compromisso e composição jurídica multilateral obrigam os Estados a
respeitarem os direitos e obrigações contidas no texto de uma convenção, que normalmente zela e
promove os direitos por meio de órgãos criados por esse mesmo instrumento (como, por exemplo, o
Comitê sobre os Direitos das Crianças). Os mecanismos não convencionais não são resultado de uma
convenção ou tratado, mas sim produto do consenso ou decisão de certas instâncias dos sistemas
universal ou regionais de direitos humanos, tais como as relatorias especiais ou os grupos de trabalho de
composição aberta. A existência e a cobertura de todas essas formas protetoras é o que pode garantir a
acessibilidade, sustentabilidade e efetividade dos recursos de proteção e defesa que legalmente deveriam
ser complementados pela implementação de políticas públicas destinadas à concretização dos direitos
humanos. (HADDAD e GRACIANO, 2006. p. 52.)
42
internacional de natureza intraestatal”95, não apreciando possíveis ingerências dos
Estados.
Dentre as tentativas de pactos sociais, temos a Sociedade das Nações (1919)
que procurou “institucionalizar a comunidade internacional criando um tertius inter-
partes por meio de uma organização internacional”96, porém nesta o papel dos direito
humanos ainda era restringido.
Posteriormente, a Carta da ONU (1945) figurou como um terceiro cuja
amplitude de organização internacional auxiliou na institucionalização dos direitos
humanos e inserindo sua temática na construção da ordem mundial. Como
desdobramento da Carta da ONU, temos a Declaração Universal de 1948, o primeiro
texto internacional a tratar, de forma ampla, a importância dos direitos humanos, o que
representa internacionalmente um evento inaugural. Importante frisar que esta passagem
teve uma série de influencias como a Declaração da Independência dos EUA (1776), as
Declarações de Direito da Revolução Francesa, a Constituição Mexicana, a Constituição
Alemã de Weimar, entre outras.
Aproximadamente dois séculos antes (fins do XVIII, inícios do XIX), Kant
já sistematizara o pensamento que mais tarde apareceria na internacionalização dos
direitos humanos visto conceber o ser humano como um fim em si mesmo e não o meio.
Tanto que enfatiza em sua obra que a “história humana só pode ter unidade,
regularidade e continuidade teleológica quando considerada sob o ângulo universal”97,
sendo a proposição de um direito cosmopolita98 a grande inovação de Kant no que se
refere ao plano internacional.
Assim, percebemos que é a sensibilidade em relação à violação dos direitos
que está na raiz do evento histórico único da Declaração Universal, podendo ser
analisada a partir das fontes materiais (fenômenos sociais, econômicos ou científicos
que modificam e/ou criam normas na ordem jurídica). Tais fontes obedecem, no plano
internacional, uma lógica mais delimitada, que não foi como a das agendas internas.
95
LAFER, Celso. “Declaração universal dos Direitos Humanos (1948)”, In: MAGNOLI, Demétrio (org.).
História da paz: os tratados que desenharam o planeta. São Paulo: Contexto, 2008. Vários Autores.
96
LAFER, Celso. “Declaração universal dos Direitos Humanos (1948)”, In: MAGNOLI, Demétrio (org.).
História da paz: os tratados que desenharam o planeta. São Paulo: Contexto, 2008. Vários Autores.
97
LAFER, Celso. “Declaração universal dos Direitos Humanos (1948)”, In: MAGNOLI, Demétrio (org.).
História da paz: os tratados que desenharam o planeta. São Paulo: Contexto, 2008. Vários Autores.
98
No séc. XX, o pacto da Sociedade das Nações apreciou de forma circunscrita os direitos humanos,
tratando de diversos grupos como indígenas, mulheres, crianças, etc. Mais um regime concebido pela
Sociedade é das minorias havidas do desmembramento de impérios, o que gerou um grande número de
displaced people expelidos do conjunto Povo-Estado-Território. A negação dos direitos humanos acabou
gerando arbítrio, sendo a única maneira de efetivar o “direito a ter direitos”a tutela internacional.
43
I. Um “Direito Novo” e sua lógica
99
Foram padrinhos da Declaração, sem o quais ela não terminado adequadamente, Eleanor Roosevelt,
René Cassin, Charles Malik, Peng-chan Chung John P. Humphrey e Hernán Santa Cruz. Estes, mais do
que homogeneizadores, eram universalistas e “acreditavam na unidade do gênero humano e entendiam
que processos de experienciar, compreender e julgar eram capazes de a todos conduzir ao entendimento e
à aceitação de algumas verdades básicas” (LAFER, LAFER, Celso. “Declaração universal dos Direitos
Humanos (1948)”, In: MAGNOLI, Demétrio (org.). História da paz: os tratados que desenharam o
planeta. São Paulo: Contexto, 2008. Vários Autores.).
100
LAFER, Celso. “Declaração universal dos Direitos Humanos (1948)”, In: MAGNOLI, Demétrio
(org.). História da paz: os tratados que desenharam o planeta. São Paulo: Contexto, 2008. Vários
Autores.
44
II. A Declaração e o Direito à Educação
45
Dever-se-á fomentar e intensificar, na medida do possível, a
educação de base para aquelas pessoas que não receberam
educação primária ou não concluíram o ciclo completo de
educação primária.
c. Declaração de Hamburgo
46
docentes e fomentando iniciativas para conectar os cursos
oferecidos na prisão aos realizados fora dela102.
102
Declaração de Hamburgo, 1997, tema 8, item 47.
47
3. Outro objetivo, não menos fundamental, do desenvolvimento
da educação, é o enriquecimento dos valores culturais e morais
comuns. É nesses valores que os indivíduos e a sociedade
encontram sua identidade e sua dignidade.
48
governo, no sentido de realizar algum objetivo de ordem
pública ou, na ótica dos juristas, concretizar um direito103
103
BUCCI, Maria Paula Dallari. “O conceito de política pública em direito”. In. BUCCI, Maria Paula
Dallari (org.) Políticas Públicas: Reflexões sobre o conceito Jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 14.
104
CANELA, Oswaldo. Jr. In. GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder
Judiciário. O processo: estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009.
p. 39.
49
pode converter-se em promessa constitucional inconsequente,
sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele
depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o
cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto
irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a
própria Lei Fundamental do Estado” (RTJ 175/1212-1213, Rel.
Min. CELSO DE MELLO). [...] A meta central das
Constituições modernas, e da Carta de 1988 em particular, pode
ser resumida, como já exposto, na promoção do bem-estar do
homem, cujo ponto de partida está em assegurar as condições
de sua própria dignidade, que inclui, além da proteção dos
direitos individuais, condições materiais mínimas de existência.
Ao apurar os elementos fundamentais dessa dignidade (o
mínimo existencial), estar-se-ão estabelecendo exatamente os
alvos prioritários dos gastos públicos. Apenas depois de atingi-
los é que se poderá discutir, relativamente aos recursos
remanescentes, em que outros projetos se deverá investir. O
mínimo existencial, como se vê, associado ao estabelecimento
de prioridades orçamentárias, é capaz de conviver
produtivamente com a reserva do possível. (grifei) [...].
50
DIFUSO A SER TUTELADO POR AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
A DETERMINAÇÃO PARA IMPLEMENTAÇÃO DE
POLÍTICA PÚBLICA, JÁ PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA, NÃO CARACTERIZA INGERÊNCIA NO
PODER EXECUTIVO. RECURSOS A QUE SE NEGAM
PROVIMENTO.106
106
TJSP. AC 61.146-5/0-00. 2ª Câmara de Direito Público. Rel. Lineu Peinado. 22.06.2003
107
Apelação Cível nº 195.953-5/6-00, de 3/02/2003. Relator: Des. Prado Pereira. 7ª Câmara de Direito
Público do TJSP. Negado provimento. p. 4.
51
à sua configuração, no plano dos valores, como verdadeiro
Estado Democrático Social de Direito.108
108
RANIERI, Nina Beatriz Stocco. “O Estado Democrático de Direito e o Sentido da Exigência de
Preparo da Pessoa para o Exercício da Cidadania, pela Via da Educação”. Tese (Livre-Docência) –
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2009, p. 22-23.
109
SÃO PAULO, STF, RE. 410.715-5, Rel. Min. Celso de Melo, 2005.
52
II – A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
110
Decreto nº 17.943-A de 12 de outubro de 1927.
111
Art. 101. é prohibido em todo o territorio da Republica o trabalho nos menores de 12 annos.
Art. 102. Igualmente não se póde ocupar a maiores dessa idade que contem menos de 14 annos. e que não
tenham completando sua instrucção primaria. Todavia, a autoridade competente poderá autorizar o
trabalho destes, quando o considere indispensavel para a subsistencia dos mesmos ou de seus paes ou
irmãos, comtanto que recebam a instrucção escolar, que lhes seja possível.
112
A utilização dos termos “menor infrator” e “menor delinquente” acaba por adjetivar e estigmatizar o
indivíduo em conflito com a lei, autor de infração ou crime. Assim, a criminologia crítica atual busca
compreender a infração como um fenômeno transitório na vida do indivíduo, tirando o estigma do
“delinquente”. Como a bibliografia internacional especializada utiliza o termo “delinquência juvenil”
(juvenile delinquency) esta pode vir a ser utilizada ao longo do trabalho em transcrições de textos
internacionais. Porém, considero importante marcar minha posição de que a fala nunca é neutra, e por me
53
Depois da Primeira Guerra, vários tratados internacionais
estabeleceram novas regras de convivência entre os países
membros da Sociedade das Nações, e um dos resultados desses
tratados foi a aprovação de uma Declaração dos Direitos da
Criança, na Conferência de Genebra, em 1921. No Brasil, o que
se decretou foi um Código de Menores, em 1927, do qual
constava a proibição do trabalho de crianças de até 12 anos e
sua impunidade até os 14 anos. Dos 14 aos 18, as crianças
poderiam ser internadas em “estabelecimentos especiais”e dos
18 anos em diante seriam puníveis pelos crimes cometidos. As
crianças da categoria dos 14 aos 18 anos, desde então numa
espécie de limbo legal, serão transformadas em menores, e os
estabelecimentos especiais destinados a elas, bem como os
agentes sociais que delas deveriam se encarregar, passam a ser
objeto da atenção de médicos e juristas, de psicólogos e
pedagogos. E, ainda que houvesse algumas divergências a
respeito do modo como deveriam se distribuir o peso desse
cuidado, ora com ênfase no Estado, ora na sociedade, ora na
Igreja, conforme a inserção dos vários agentes envolvidos no
debate, em dois pontos cruciais parece ter havido concordância
entre eles: primeiro, a questão do menor abandonado era
também uma questão de sua institucionalização, e, em segundo
lugar, os agentes preferenciais nesse cuidado institucional
seriam mulheres.113
54
assim historicamente se construiu a categoria criança não
escola, não família, criança desviante, criança em situação
irregular, enfim, carente/delinquente, que passa a receber um
mesmo tratamento – e a se distinguir de nossos filhos, que
sempre foram vistos simplesmente como crianças e jovens –,
compondo um nova categoria, os menores.115
115
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 33.
55
Este segundo “tipo de menor” recebia tratamento jurídico diferenciado, podendo ser
retirados arbitrariamente do convívio familiar, sendo levados a unidades de internação
tanto órfãos ou crianças abandonadas quanto as que cometiam crimes.
A jurista e procuradora de justiça Martha de Toledo Machado afirma que tal
confusão conceitual entre carência/delinquência acabou por criar um direito triplamente
iníquo:
116
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 47.
117
“Lombroso parte da ideia da completa desigualdade fundamental dos homens honestos e criminosos.
Preocupado em encontrar no organismo humano traços diferenciais que separassem e singularizassem o
criminoso, Lombroso vai extrair da autópsia de delinquentes uma “grande série de anomalias atávicas,
sobretudo uma enorme fosseta occipital média e uma hipertrofia do lóbulo cerebeloso mediano (vermis)
análoga a que se encontra nos seres inferiores”.” MOTA, Mauricio Jorge Pereira da. O crime segundo
Lombroso. 20 de agosto de 2007. Disponível em: http://criminologiafla.files.wordpress.com/2007/08/o-
crime-segundo-lombroso-texto-complementar.doc Acesso em 06.02.2012.
56
menorista, passando os então “menores” a serem vistos como crianças e adolescentes
sujeitos de direitos.
Este sistema especial de proteção acaba por autorizar uma aparente quebra
do princípio da igualdade, possibilitando uma diferenciação positiva feita às crianças e
adolescentes vendo estes enquanto “portadores de uma desigualdade de fato” e
permitindo-lhes atingir uma “igualdade jurídica material e não meramente formal”119.
A Organização das Nações Unidas – através de diversos tratados e
convenções entre os quais pode-se mencionar as Regras Mínimas das Nações Unidas
para a Administração da Justiça da infância e da Juventude (Regras de Beijing), as
Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Juvenil (Diretrizes de
Riad), as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção de jovens Privados de
Liberdade, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças – acabou por
formar e fortificar a Doutrina da Proteção Integral recepcionada pela Constituição
Federal do Brasil em seu art. 227, e regulada pela Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e
do Adolescente).
118
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 119.
119
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 119.
57
nº 99.710, de 21.11.90, que aprovaram e promulgaram a
Convenção da Assembleia Geral da ONU sobre o Direito da
Criança e do Adolescente, e na Lei nº 8.069, de 13.7.90.120
120
BULHÕES, Antônio Nabor Areias. “Depoimento na audiência pública sobre redução da maioridade
penal de 18 para 16 anos, realizada em 10/11/1999”. In: A razão da idade: mitos e verdades. 1ª Edição.
Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA, 2001.p. 21.
121
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.p. 54.
122122
O parâmetro adotado para conceituar juventude no Brasil é originário da Organização das Nações
Unidas (ONU) estabelecido em 1985, Ano Internacional da Juventude, que circunscreve a faixa etária
entre 15 e os 24 anos.
123
O conceito de vulnerabilidade remete à ideia de dependência e fragilidade, sendo que o índice de
“vulnerabilidade juvenil” é utilizado pelo SEADE, para o direcionamento de políticas
públicas/intervenções.
124
Negação que esteve presente durante todo o período que vigorou a Doutrina Menorista, a ainda se
encontra presente àqueles infantes pertencentes a grupos vulneráveis, pobres, periféricos, e de etnia negra.
58
Não se estranha, portanto, que esse silêncio que se infiltra na
noção de infância continue marcando-a quando ela se
transforma em matéria de estudo ou de legislação.125
A noção de infância, tal como compreendida por Lajolo, acaba por marcar a
doutrina, a legislação e a jurisprudência que a circunda, muitas vezes omissa em relação
aos seus direitos e à proteção especial que lhes deve ser dispensada. Estas crianças eram
duplamente mudas, pois além de não serem um foco de atenção especial, também não
eram percebidas, ouvidas, não tinham direito à fala, nem delas se falava126.
Interessante observar na literatura – em relatos, testemunhos históricos e
produção normativa – as diferentes concepções, percepções e distinções da infância;
como ela aparece em função não apenas da idade, mas também do desempenho
econômico. LEITE, ao buscar, ao buscar as referências feitas a crianças e adolescentes
em memórias e livros de viagem do Brasil do séc. XIX, nos mostra que “uma
caracterização nítida é a do período de 0 a 3 anos, em que, como ainda não andam, os
pequenos são carregados pelas mães, pelos irmãos ou pelas escravas”127 sendo
designados em alguns escritos, pela expressão “desvalidos de pé”.
No mesmo texto, a autora nos mostra o quanto a definição da infância é uma
construção cultural e histórica, de modo que as variações e abstrações numéricas
referentes à idade da maioridade eram divergentes conforme o órgão que a determinava,
pois enquanto para o Código Filipino128 a maioridade “se verificava aos 12 anos para as
meninas e aos 14 para os meninos”129, para a Igreja Católica esta ocorria a partir dos 7
anos.
A necessidade de classificação e afinação nos conceitos de infância leva
teóricos a buscarem na psicologia a definição mais adequada e científica, como fez
HOLLANDA ao definir o verbete infância:
125
LAJOLO, Marisa. “Infância de papel e tinta”. In: FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social
da Infância no Brasil. 5ª.ed. - São Paulo: Cortez, 2003. p. 229-230.
126
MATTOSO, Katia de Queirós Mattoso apud LEITE, Miriam L. Moreira. “A infância no século XIX
segundo memórias e livros de viagem”. In: FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social da
Infância no Brasil. 5ª.ed. - São Paulo: Cortez, 2003. p. 21.
127
LEITE, Miriam L. Moreira. “A infância no século XIX segundo memórias e livros de viagem”. In:
FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social da Infância no Brasil. 5ª.ed. - São Paulo: Cortez,
2003. p. 21.
128
As Ordenações Filipinas, ou Código Filipino, é a compilação jurídica resultante da reforma do código
manuelino, por Filipe II de Espanha, durante o domínio castelhano.
129
LEITE, Miriam L. Moreira. “A infância no século XIX segundo memórias e livros de viagem”. In:
FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social da Infância no Brasil. 5ª.ed. - São Paulo: Cortez,
2003. p. 21.
59
Período de vida que vai do nascimento à adolescência,
extremamente dinâmico e rico, no qual o crescimento se faz,
concomitantemente, em todos os domínios, e que, segundo os
caracteres anatômicos, fisiológicos e psíquicos, se divide em
três estágios: a primeira infância, de zero a três anos; segunda
infância, de três a sete anos; e terceira infância, de sete anos até
a puberdade.130
[...] que, por isso mesmo, percebe-se, não é a mesma coisa, aqui
e lá, ontem e hoje, sendo tantas infâncias quantas forem ideias,
práticas e discursos que em torno dela e sobre ela se
organizem.131
130
HOLLANDA, Aurélio Buarque. Novo Dicionário. 1. ed. (5.reimpressão). Rio de janeiro, Nova
Fronteira, s/d. p. 763.
131
LAJOLO, Marisa. “Infância de papel e tinta”. In: FREITAS, Marcos Cezar de (org.). História social
da Infância no Brasil. 5ª.ed. São Paulo: Cortez, 2003. p. 231.
132
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e
adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre 18
e 21 anos de idade.
133
A EC nº 65/2010 resgatou o conceito de “jovem”, que diferentemente da criança e do adolescente, é
aquele indivíduo entre os 18 anos completos e os 21 anos incompletos.
60
crianças e adolescentes enquanto seres humanos que merecem proteção integral, por se
encontrarem em uma fase especial de desenvolvimento. Daí o corte etário que irá
priorizar políticas públicas, isentá-los de determinadas subsunções penais, e protegê-los
integralmente para que se desenvolvam e se preparem para a vida adulta.
Artigo 1
134
TERRA, Eugênio Couto. “A idade penal mínima como cláusula pétrea”. In: A razão da idade: mitos e
verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA,
2001. p. 53.
135
DALLARI, Dalmo de Abreu. “A razão para manter a maioridade penal aos 18 anos”. In: A razão da
idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 26-27.
61
Nessa Convenção reiterou-se o disposto no princípio 4º da Declaração dos
Direitos da Criança, de 1959, que prevê proteção e cuidados especiais à criança desde o
seu nascimento.
136
DALLARI, Dalmo de Abreu. “A razão para manter a maioridade penal aos 18 anos”. In: A razão da
idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 26-27.
137
SOUSA Jr., José Geraldo de. “A construção social e teórica da criança no imaginário jurídico”. In: A
razão da idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII.
Brasília: MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 107-108.
62
Para ele que confronta seus estudos analíticos com percepções
que incluem análises históricas como as de Philippe Ariès, a
partir do exame de pinturas (retratos de famílias que captam o
universo de sistemas sociais e os lugares dos indivíduos nesses
sistemas, uma tese plenamente reconhecida é a de que na
sociedade tradicional, e até já bem entrado o século XVI, a
infância tal como ela é entendida hoje, não existia: refutando
las tesis de la psicología positivista que vinculan la categoría
niñez a determinadas características de la evolución biológica,
El enfoque histórico la presenta como El resultado de una
compleja construcción social que responde, tanto a
condicionamientos de carácter estructural cuanto a sucesivas
revoluciones en El plano de los sentimientos.138 (grifamos)
138
SOUSA Jr., José Geraldo de. “A construção social e teórica da criança no imaginário jurídico”. In: A
razão da idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII.
Brasília: MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 107-108.
139
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão.
63
fundante para o estabelecimento de um sistema especial de
proteção, porque: a) distingue crianças e adolescentes de outros
grupos de seres humanos simplesmente diversos da noção do
homo médio; b) autoriza e opera a aparente quebra do princípio
da igualdade – porque são portadores de uma desigualdade
inerente, intrínseca, o ordenamento confere-lhes tratamento
mais abrangente como forma de equilibrar a desigualdade de
fato e atingir a igualdade jurídica material e não meramente
formal –, mediante ‘processo de especialização do genérico, no
qual se realiza o respeito à máxima suum cuique tribuere’,
como referiu Bobbio140.
140
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.
141
NETO, Gercino Gerson Gomes. “A inimputabilidade penal como cláusula pétrea”. In: A razão da
idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 88-89.
142
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 132.
64
A Fundação Sistema Estadual de Análises de Dados (SEADE) utiliza o
termo “vulnerabilidade juvenil” em vez de “adolescentes em situação de risco” ou
“adolescentes em situação de exclusão social” por entender que a problemática na qual
os adolescentes estão envolvidos é grave e complexa, não se limitando aos adolescentes
pobres e desassistidos. Neste sentido, ela se utiliza de um índice de vulnerabilidade
juvenil (IVJ) para “auxiliar na escolha de áreas de intervenção”143 e desenvolvimento de
políticas públicas especificas aos jovens.
A rede para a manutenção e promoção do sistema especial de proteção aos
direitos fundamentais das crianças é imensa, sendo a Política Nacional dos Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes e o Plano Decenal dos Direitos Humanos de
Crianças e Adolescentes construídos conjuntamente pelo Conselho Nacional dos
Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), e a Secretaria de Direitos Humanos
(SDH), da Presidência da República.
143
http://www.seade.gov.br/produtos/ivj – Acesso em 04.02.2012.
144
GRACIANI, Maria Stela Santos. “Os desafios da implantação das medidas socioeducativas no Brasil”.
In: A razão da idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo
VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 160.
65
A peculiar condição de pessoa em desenvolvimento é tida como central no
sistema especial de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes que
permeia toda a legislação constitucional brasileira.
145
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 105.
146
MACHADO, Martha de Toledo. “Direito da Infância e Juventude”. In: NUNES Jr., Vidal Serrano
(Coord). Manual de Direitos Difusos. São Paulo: Editora Verbatim, 2009. p. 152.
147
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 135.
148
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003.p. 109.
66
Como seres humanos em situação fática peculiar de desenvolvimento, os
direitos fundamentais de crianças e adolescentes são compreendidos de maneira
especial, sendo necessários, essenciais, especiais e de estruturação diversa. Esse direito
peculiar de se formar, de se desenvolver está diretamente ligado a personalidade,
conforme ensinamento de CUPIS.
67
na implementação de políticas públicas, por exemplo, e desta
forma, inclusive por questão de coerência jurídico-
constitucional, não iria deixar ao desabrigo do artigo 60, §4º,
IV, os direitos e garantias individuais de crianças e
adolescentes, quando, foi justamente o contrário que desejou e o
fez.150
68
A criança e o adolescente passam, assim, a ter mais direitos fundamentais
que os adultos, já que por se encontrarem neste período especial necessitam de um
“plus” de direitos, tal qual o direito ao não trabalho até os 14 anos, o direito ao trabalho
protegido dos 14 aos 16 anos, o direito de brincar, o direito a imputabilidade penal, à
excepcionalidade e brevidade da privação de liberdade.
Artigo 3
152
TERRA, Eugênio Couto. “A idade penal mínima como cláusula pétrea”. In: A razão da idade: mitos e
verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA,
2001. p. 39.
153
DALLARI, Dalmo de Abreu. “A razão para manter a maioridade penal aos 18 anos”. In: A razão da
idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 25.
69
Vemos assim, a importância que a Constituição brasileira de 1988 dá aos
direitos fundamentais de crianças e adolescentes, concepção de direitos humanos, que
nas palavras de MACHADO é unitária.
70
que a positivação de qualquer direito fundamental teoricamente
comporta – situar todos os direitos fundamentais de crianças e
adolescentes nesse segundo extremo, como forma de assegurar
maior efetividade a seus direitos fundamentais.155
155
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 385.
156
CURY, Munir (Org). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. Malheiros Editores, 2008. p.
63-71.
157
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 208.
71
para a criança porque apenas sob liberdade ela pode crescer de
sua maneira natural – a boa maneira.158
II - opinião e de expressão;
158
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 9ª edição. São Paulo: Malheiros, 1992,
p. 71
159
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos
reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III - em razão de sua conduta.
160
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá
determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;
IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e
toxicômanos;
VII - abrigo em entidade;
VIII - colocação em família substituta.
72
Quando falamos de liberdade dentro do Direito positivo, tratamos da sua
espécie objetiva; por sua se utilizarmos o termo liberdades este melhor representa as
diversas formas, expressões externas da liberdade, divididas por SILVA em cinco
grandes grupos:
Parágrafo único. O abrigo é medida provisória e excepcional, utilizável como forma de transição para a
colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.
161
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30ª edição, revista e atualizada. São
Paulo: Malheiros, 2008. p. 235.
162
“Em lugar de uma pessoa competente, que é contraditada com a pena, portanto, coloca-se o indivíduo
perigoso [3], contra quem – aqui: com uma medida preventiva, não com uma pena – é procedido de modo
fisicamente efetivo: combate ao perigo, em lugar de comunicação, Direito penal do inimigo (...), em vez
de Direito Penal do cidadão...”. JAKOBS, Bürgerstrafrecht und Feindstrafrecht, 2004, Caderno 3, p. 89 s.
73
prisão junto a adultos para aqueles acusados de cometer infrações e/ou crimes. Tal
discurso misturado ao senso comum e às reduções da fala do crime 164 acaba por afirmar
posturas discriminatórias através de um discurso ambíguo que distorce o disposto no
Sistema Constitucional especial de proteção aos direitos fundamentais da criança e do
adolescente, confundindo imputabilidade penal com impunidade.
Proteção e imputabilidade não é impunidade, de modo que o adolescente
que comete ato considerado crime responde por ele, sendo previstas, no Estatuto da
Criança e do Adolescente, diversas medidas socioeducativas, havendo até a previsão de
internação em estabelecimentos prisionais.
Tanto que MACHADO é clara ao afirmar a continuidade das limitações
gerais impostas ao Estado quando sua atuação concerne a preservação da paz social:
163
Utilizaremos os termos adolescência e juventude enquanto sinônimos, acreditando na ideia de
sobreposição etária de tais conceitos e procurando rechaçar a tendência de reservar o termo adolescente
para os autores de atos infracionais e o termo juventude para aqueles que não cometeram atos
infracionais, em um claro resgate a dicotomia criança/menor paradigma da Doutrina da Situação
Irregular. Tendência apontada por SILVA em seu livro Pedagogia Social (Roberto da Silva, João C. de
Souza Neto, Rogério A. de Moura (org.). São Paulo: Expressão e Arte Editora, v.1. 2ª edição, 2011.).
164
A pesquisadora Teresa Pires do Rio Caldeira, em seu livro “Cidade de muros” nos mostra o quanto a
“fala do crime” lida com categorias simplistas, imagens essencializadas e repetição de estereótipos, de
modo a elaborar preconceitos.
165
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 238.
166
Art. 228. “[...] são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da
legislação especial”.
167
NETO, Gercino Gerson Gomes. “A inimputabilidade penal como cláusula pétrea”. In: A razão da
idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 86.
168
Conceito de crime dentro da teoria tripartida,
74
O fato que está na base da intervenção do Estado quando
segrega o adolescente é o mesmo que leva à segregação do
adulto: O CRIME.
169
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 235.
170
COSTA, José Haroldo Teixeira da. “Reduzir a idade penal não é a solução”. In: A razão da idade:
mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/
SEDH/DCA, 2001. p. 114.
75
Ato infracional171 Desvio de Conduta
Adolescente que comete conduta prevista Criança que pratica conduta prevista como
como crime ou contravenção crime e contravenção, ou, ainda, conduta
atentatória à sua formação.
Este último tipo de conduta não é tida, porém,
como crime ou contravenção pela legislação.
Medida socioeducativa – portanto (entre eles, Medida específica de proteção – portanto,
até medidas específicas de proteção, desde que MEP é tanto para criança quanto para
as previstas no art.101, incisos I a IV, ou seja, adolescente nas hipóteses alhures
não se aplicam as MEPs de acolhimento mencionadas.
institucional, familiar ou família substituta) –
art. 112, VII, do ECA).
MSE é somente para adolescentes.
76
Criança e do Adolescente176, considerar criança ‘toda pessoa com idade inferior a 18
anos’, no Brasil a classificação ocorre de maneira diversa. Aqui ainda há uma
diferenciação entre criança e adolescente; todos aqueles com 12 anos completos passam
a ser considerados adolescente e se tornam passíveis de aplicação de medida
socioeducativa. Focaremos o restante da pesquisa em dados referentes a esta faixa
etária, sua situação atual, trajetórias e perspectivas.
População total 167 716 538 179 556 501 190 977 109 210 727 174
Homens
176
Aprovada pela Organização das Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada pelo Brasil
em 24 de setembro de 1990.
177
Tal recorte etário é utilizado pela Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e pelo Conselho Nacional de
Juventude (Conjuve), e é adotado na proposta de Estatuto da Juventude.
77
População total 82 384 860 87 995 438 93 393 810 102 636 115
População total 85 331 678 91 561 063 97 583 299 108 091 059
Fonte: Projeto IBGE/Fundo de População das Nações Unidas - UNFPA/BRASIL (BRA/98/P08), Sistema
Integrado de Projeções e Estimativas Populacionais e Indicadores Sociodemográficos.
78
oriundos de famílias com renda domiciliar per capita superior a
dois SMs e aproximadamente 53,7% pertencem ao extrato
intermediário, com renda domiciliar per capita entre meio e
dois SMs. Embora haja equilíbrio na distribuição dos jovens
brasileiros por sexo – sendo 50% homens e 50% mulheres –, a
pobreza é ligeiramente superior entre as mulheres jovens (53%),
tal como se dá para a população como um todo.
178
CASTRO, Jorge Abrahão de; AQUINO, Luseni Maria C. de; e ANDRADE, Carla Coelho de (Org).
Juventude e políticas sociais no Brasil. Brasília: Ipea, 2009. p. 31-32.
179
CASTRO, Jorge Abrahão de; AQUINO, Luseni Maria C. de; e ANDRADE, Carla Coelho de (Org).
Juventude e políticas sociais no Brasil. Brasília: Ipea, 2009. p. 33.
180
O Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de
Medidas Socioeducativas (DMF) foi criado pela Lei n. 12.106, de 2 de dezembro de 2009.
79
lei, mapeou181 o funcionamento dos estabelecimentos de internação e das varas da
infância e juventude com atribuição de fiscalização destas unidades em todos os estados
e no Distrito Federal.
Neste diagnóstico buscou-se analisar o perfil dos adolescentes em
cumprimento de medida socioeducativa de internação; examinar a tramitação dos
processos de execução das medidas socioeducativas; avaliar o ordenamento territorial
dos estabelecimentos; e conhecer as instituições de internação a fim de analisar se aos
adolescentes sob custódia do Estado são garantidos os direitos abrigados no Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) e no Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo (SINASE)
Ao traçar um perfil do adolescente em conflito com a lei vemos que esta
possui idade média de 16,7 anos, de modo que se considerado o período máximo de
internação, boa parte dos jovens internados alcança a maioridade civil e penal durante o
cumprimento da medida.
181
O mapeamento foi realizado por equipe composta por juízes, servidores de cartórios judiciais e
técnicos do Judiciário da área de assistência social, psicologia e pedagogia, que percorreu 320
estabelecimentos de internação no Brasil, durante o período de 19/7/2010 a 28/10/2011, a fim de analisar
as condições de internação de 17.502 adolescentes que cumpriam medida socioeducativa de restrição de
liberdade.
80
Fonte: DMF/CNJ - Elaboração: DPJ/CNJ
81
O tráfico de drogas se destacou nas regiões Sudeste e Sul (segundo ato
infracional mais praticado) representando 32% e 24%, respectivamente. Por sua vez,
estupro, furto, lesão corporal e roubo seguido de morte obtiveram menores proporções.
82
Fonte: DMF/CNJ - Elaboração: DPJ/CNJ
182
CONSELHO NACIONAL DE JUVENTUDE, Panorama Nacional. A Execução das Medidas
Socioeducativas de Internação Programa Justiça ao Jovem. CNJ, 2012.
83
A maioria dos adolescentes internados apresenta um baixo grau de
escolaridade, não chegando ao ensino médio. Assim, a maioria declarou ter parado de
estudar entre 08 e 16 anos (média de 14 anos).
84
Fonte: DMF/CNJ - Elaboração: DPJ/CNJ
183
Panorama Nacional. A Execução das Medidas Socioeducativas de Internação Programa Justiça ao
Jovem. CNJ, 2012.
85
pessoa que, individual ou coletivamente, tenha sofrido danos,
inclusive lesões físicas ou mentais, sofrimento emocional, perda
financeira ou diminuição substancial de seus direitos
fundamentais, como consequências de ações ou omissões que
violem a legislação penal vigente, nos Estados- Membros,
incluída a que prescreve o abuso de poder
184
SILVA. Enid Rocha Andrade da. “O perfil da criança e do adolescente nos abrigos pesquisados”. In.
SILVA. Enid Rocha Andrade da (Coord.). O Direito à Convivência Familiar e Comunitária: os abrigos
para crianças e adolescentes no Brasil. Brasília : IPEA/CONANDA, 2004.
185
GUERRA e AZEVEDO. Infância e violência doméstica: fronteiras do conhecimento. 2 ed. São Paulo:
Cortez, 1997. apud AMARO, Sarita. Crianças vítimas da violência: das sombras do sofrimento à
genealogia da resistência. Uma nova teoria científica. Porto Alegre: AGE/EDIPURS, 2003.
186
VIOLANTE, Maria Lúcia Vieira. O dilema do decente malandro. São Paulo, Cortez-Autores
Associados, 1982, p. 22.
86
Através de dados extraídos do banco de dados da Fundação CASA,
DT/NUPRIE, em 20 de abril de 2010, podemos observar o perfil dos adolescentes
atendidos pela Fundação: idade predominante entre 16 e 18 anos, com escolaridade
aquém de sua idade cronológica, envolvidos diretamente ou indiretamente com
drogas187.
Esta intensa relação com a violência continua com a internação, visto que há
ampla utilização da tortura psicológica nas unidades, conforme revela o Diagnóstico do
CNJ:
Por mais que se fale que a medida socioeducativa de internação não possua
caráter eminentemente punitivo, mas que busca responsabilizar o adolescente pelas
consequências lesivas do ato infracional – tendo como objetivo sua ressocialização e a
reparação do ato –, é perceptível a semelhança que a sanção imposta ao adolescente,
pela prática de fato definido como crime, guarda com a pena criminal. Tal perspectiva é
corroborada por MACHADO:
187
Dados retirados do sítio eletrônico: http://www.fundacaocasa.sp. gov.br/ Acesso em 12.07.2011.
188
Panorama Nacional. A Execução das Medidas Socioeducativas de Internação Programa Justiça ao
Jovem. CNJ, 2012.p. 127-128.
87
seja, comportam, na essência e em sentido genérico, reação
aflitiva à ofensa, nas palavras de Ferrajoli. E medida aflitiva
que se impõe ao autor do crime, de um lado, como forma de
lograr prevenção dos delitos; por outro, objetivando lograr a paz
social pelo mecanismo de resposta estatal ao crime, que busca
inibir a resposta individual do ofendido ou seus ‘apoiadores’ –
resposta não jurídica e não pública, portanto, violenta, ilimitada
e selvagem – contra o autor do fato penal típico, ou inibir a
‘resposta pública’ não limitada por um sistema constitucional
de garantias do cidadão.189
189
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 239.
190
ZAFFARONI, Raul, in CURY, Munir (Org). Estatuto da Criança e do Adolescente comentado.
Malheiros Editores, 2008. p. 803.
191
TERRA, Eugênio Couto. “A idade penal mínima como cláusula pétrea”. In: A razão da idade: mitos e
verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA,
2001.p. 53.
192
ESPINOZA, Olga. A mulher encarcerada em face do poder punitivo. São Paulo: IBCCrim, 2004. p.
148.
88
Não se pode tolerar que o espaço simbolicamente reservado para a
reabilitação do indivíduo, e cujo tutor é o Estado, permita que os internados sofram
lesões físicas, mentais, Além da diminuição substancial de seus direitos fundamentais,
fato que se configura como flagrante violação da legislação penal juvenil vigente,
muitas vezes tornando estes adolescentes vítimas do cumprimento de medidas
socioeducativas.
89
III – A LEI, A INFRAÇÃO E A PUNIÇÃO
1. A medida socioeducativa
193
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente
as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e
a gravidade da infração.
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e
especializado, em local adequado às suas condições.
194
CERQUEIRA, Thales tácito Pontes Luz de Pádua. Manual do estatuto da criança e do adolescente
(teoria e prática). 2ª Ed. Niterói, RJ: Impetus, 2010. p. 369.
90
proteção da criança e do adolescente, conforme crítica feita por PIOVESAN sobre o
tema:
195
PIOVESAN, Flávia. “A inconstitucionalidade da redução da maioridade penal”. In: A razão da idade:
mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 74-75.
196
CAPÍTULO III - DOS DIREITOS INDIVIDUAIS
Art. 49. São direitos do adolescente submetido ao cumprimento de medida socioeducativa, sem prejuízo
de outros previstos em lei:
I - ser acompanhado por seus pais ou responsável e por seu defensor, em qualquer fase do procedimento
administrativo ou judicial;
II - ser incluído em programa de meio aberto quando inexistir vaga para o cumprimento de medida de
privação da liberdade, exceto nos casos de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à
pessoa, quando o adolescente deverá ser internado em Unidade mais próxima de seu local de residência;
III - ser respeitado em sua personalidade, intimidade, liberdade de pensamento e religião e em todos os
direitos não expressamente limitados na sentença;
IV - peticionar, por escrito ou verbalmente, diretamente a qualquer autoridade ou órgão público, devendo,
obrigatoriamente, ser respondido em até 15 (quinze) dias;
V - ser informado, inclusive por escrito, das normas de organização e funcionamento do programa de
atendimento e também das previsões de natureza disciplinar;
VI - receber, sempre que solicitar, informações sobre a evolução de seu plano individual, participando,
obrigatoriamente, de sua elaboração e, se for o caso, reavaliação;
VII - receber assistência integral à sua saúde, conforme o disposto no art. 60 desta Lei; e
VIII - ter atendimento garantido em creche e pré-escola aos filhos de 0 (zero) a 5 (cinco) anos.
§ 1o As garantias processuais destinadas a adolescente autor de ato infracional previstas na Lei no 8.069,
de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), aplicam-se integralmente na execução das
medidas socioeducativas, inclusive no âmbito administrativo.
§ 2o A oferta irregular de programas de atendimento socioeducativo em meio aberto não poderá ser
invocada como motivo para aplicação ou manutenção de medida de privação da liberdade.
91
[...] porque o Estatuto não pormenorizou suficientemente o
conteúdo, e, portanto, o contorno jurídico, da medida
socioeducativa. Na pormenorização que fez, a lei ocupou-se
muito mais em ditar as limitações do poder restritivo do Estado
da liberdade do adolescente, consubstanciada na faceta
denominada ‘sócio’ da medida (v.g., art. 124, VI, VII, VIII, IX,
X, XI, XII, XIII, XIV E XV), do que em definir com precisão o
que seria a faceta educativa.
[...]
a. Definição
197
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 248-249.
198
TELLES Jr., Goffredo da Silva; GRAU, Eros Roberto. “A desnecessária e inconstitucional redução da
maioridade penal”. In: A razão da idade: mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos.
Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 97-98.
92
O significado material da MSE está relacionado à sua essência, o “ser” de
seu objeto, sendo seus elementos informadores a unilateralidade e a obrigatoriedade199.
Isto porque o jovem em conflito com a lei que receberá a MSE está em posição de
subordinação perante o juiz que aplicará a medida, pois esta prescinde sua vontade, e o
exercício deste poder sancionatório e coercitivo é consequente do ato infracional. Nas
palavras de KONZEN:
199
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 51-52.
200
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 53.
201
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
202
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2008. p. 307.
93
“a compreensão das consequências do descumprimento de dever normatizado”203.
Ainda sobre esta discussão semântica, KONZEN afirma:
203
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 63.
204
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 63.
205
FRAGOSO, Heleno Cláudio. In: Lições de direito penal – a nova parte especial. Rio de Janeiro,
Forense, 11ª Ed., 1987, p. 1-2.
94
não está permitido ou está proibido punir [...] A função
específica das garantias do direito penal [...] na realidade não é
tanto permitir ou legitimar, senão muito mais condicionar ou
vincular e, portanto, deslegitimar o exercício absoluto da
potestade punitiva. Precisamente porque ‘delito’, ‘lei’,
‘necessidade’, ofensa’, ‘ação’ e ‘culpabilidade’ designam
requisitos ou condições penais, enquanto ‘juízo’, ‘acusação’,
‘prova’ e ‘defesa’ designam condições processuais, os
princípios que se exigem aos primeiros chamar-se-ão garantias
penais, e os exigidos para os segundos, garantias processuais.206
206
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 74.
207
TERRA, Eugênio Couto. “A idade penal mínima como cláusula pétrea”. In: A razão da idade: mitos e
verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília: MJ/SEDH/DCA,
2001. p. 60-61.
95
com a incidência do instrumental garantista em defesa de uma
determinação potencialmente subjetiva e discricionária.208
[...]
208
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 64.
209
O estudo da finalidade da pena apresenta-se por meio de diversas teorias que buscam discutir o seu
caráter, punitivo, retributivo, ou reparador; e teorias de justificação que concebem efeitos e finalidades da
pena.
210
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 241.
211
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 77 e 89.
96
bem como de interferir no desenvolvimento do jovem em conflito com a lei, o
integrando, e o resignificando.
Assim, “a autoridade judiciária deve levar em conta obrigatoriamente as
necessidades pedagógicas, preferindo aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos
familiares e comunitários”.212 A MSE visa dar conta das necessidades pedagógicas do
adolescente, tanto que a autoridade judiciária deve “conformar o autor do ato infracional
com aquela consequência capaz de responder adequadamente às necessidades
pedagógicas reveladas pela infração e pelo estudo das condições pessoais do infrator.”
Devem ser criados e desenvolvidos programas de atendimento que em sua
metodologia educacional visem a inserção social e familiar do jovem em conflito com a
lei.
212
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 79.
213
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 136.
214
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 81.
215
“Pedagógico é o respeitante à pedagogia. E a pedagogia pode ser entendida como um conjunto de
doutrinas, princípios e métodos de educação e instrução que tendem a um objetivo prático. Pedagogia é a
arte de educar, um conjunto de métodos e técnicas em busca do desenvolvimento pessoal e social. Cabe
ao pedagogo a tarefa de combinar a ação educativa em favor do desenvolvimento do conhecimento,
habilidades, valores e atitudes do educando.” (KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa.
Reflexões sobre a natureza jurídica das medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 80.)
97
A busca de uma pedagogia especificamente destinada ao
adolescente autor de ato infracional constitui-se em desafio
permanente dos operadores do sistema de atendimento proposto
pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, operadores
responsáveis pela execução das medidas. Boas contribuições
podem ser encontradas em clássicos da pedagogia, cujos
princípios incidem integralmente na pedagogia socioeducativa,
como os métodos defendidos por Paulo Freire [...]216.
216
KONZEN, Afonso Armando. Pertinência Socioeducativa. Reflexões sobre a natureza jurídica das
medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 81.
217
Com relação a isto existe um forte crítica da doutrina, de que ao inserir nas medidas socioeducativas as
medidas protetivas, volta-se à antiga doutrina da situação irregular, que não separa punição de proteção.
Sendo tal inciso considerado por muitos como inconstitucional. Tal é o posicionamento de MACHADO,
para quem “[...] o inciso VII do artigo 112 do ECA é inconstitucional, por permitir que medidas vagas
sejam impostas pelo Estado como sanção pela prática de fato definido na lei penal como crime. Ou, ao
menos, seria inconstitucional essa interpretação do dispositivo.” MACHADO, Martha de Toledo. A
proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003.p.
227.
98
possibilitada a realização de atividades externas,
independentemente de autorização judicial.
99
socioeducativa não deixa de contemplar, em boa medida, esse
caráter de pena como já abordado.219
219
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 353.
220
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 352.
100
A internação deve ocorrer em local específico, exclusivo para adolescentes,
devendo ser uma preocupação do estabelecimento a separação por critérios de idade, a
gravidade da infração, entre outras peculiaridades dos adolescentes.
Os artigos 123 e 124 dispõem sobre as condições de internação e os direitos
do adolescente em conflito com a lei em privação de liberdade:
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui
motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio
poder poder familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010,
de 2009) Vigência
221
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 242-243.
101
c. A eficácia das medidas socioeducativas
Estudos mostram que o ato infracional deriva de uma busca por inclusão e
reconhecimento, ou seja, dentro do dilema do decente malandro, no qual o “ser decente”
significa ser aceito socialmente, mas marcado uma vez que acomodado dentro de suas
222
VICENTIN, Maria Cristina G.onçalves. A vida em Rebelião. Jovens em conflito com a Lei. São Paulo:
Hucitec: Fapesp, 2005. p. 210.
223
Em seu estudo, VICENTIN recorre a Carmen de Oliveira, que enfatiza no ato infracional “sua
dimensão de resposta à omissão social em um país de ‘direitos virtuais’. Ele configura-se como recusa
recíproca de integração: a marginalização que a sociedade dirige à juventude de periferia se faz
acompanhar de recusa destes jovens aos parâmetros socialmente aceitos. O delito expressaria, então, essa
‘zona de vazio para a participação na vida pública’, onde os adolescentes são ‘fortemente convocados ao
palco principal do cenário contemporâneo’, mas ‘sem usufruir as prerrogativas da cidadania’(OLIVEIRA,
Carmen de. Sobrevivendo no inferno. A violência juvenil contemporânea. Porto Alegre: Sulina, 2001, p.
99; apud VICENTIN, Maria Cristina Gonçalves. A vida em Rebelião. Jovens em conflito com a Lei. São
Paulo: Hucitec: Fapesp, 2005. p. 200.)
224
VIOLANTE, Maria Lucia. O dilema do decente malandro. São Paulo: Cortez - Autores Associados,
1982, p. 186. apud VICENTIN, Maria Cristina Gonçalves. A vida em Rebelião. Jovens em conflito com a
Lei. São Paulo: Hucitec: Fapesp, 2005. p. 200.)
102
condições marginais de sobrevivência; “ser malandro” significa ser respeitado pelo
grupo, em razão de sua insubmissão às suas condições de existência.
Pesquisa de doutorado em serviço social realizada por GUARÁ nos mostra
que a situação de exclusão social de grande parcela dos jovens em conflito com a lei,
são conformadas por elementos históricos, culturais e sociais, sendo responsáveis pelas
contradições e instabilidades (pessoal, social e moral) destes indivíduos. Isto é, estes
adolescentes não vivenciam situações que promovam seu desenvolvimento, o qual já é
prejudicado em virtude das condições sociais que estes se encontram225.
Assim, se a MSE institucionaliza o adolescente, privando-o de desenvolver
interseções com o mundo exterior, este pode acabar criando mecanismos de resistência
para cumprir a MSE sem vivenciá-la em seu caráter pedagógico; estabelecendo laços
que o mantêm em “relação de subordinação e de dependência pelo resto da Vida”.226
Nas palavras de RASSIAL, um dos desafios da MSE é pensar como
mobilizar os jovens em conflito com a lei à uma “rebeldia ativa e como gerenciar novas
formas de lidar com a liberdade que não seja o modelo ‘fora-da-lei’.”227 Desafio que
pode ser viabilizado através da ação pedagógica, a qual também pode auxiliar a
minimizar para o jovem, o “grau de angústia e de sofrimento decorrente da perda ou da
restrição da liberdade.”228
103
Conforme já mencionado, apesar de o ECA possuir um sistema de execução
de MSEs, ele preocupou-se apenas elencar as medidas e as garantias com relação aos
adolescentes em conflito com a lei, mas não em esmiuçar a correspondência entre o
crime/delito praticado e a medida a ser imposta. No sistema do ECA o sistema trifásico
e a dosimetria da pena não são aplicados, não havendo delimitação legal quanto à
sanção imposta, à sua duração, e ao cumprimento.
229
MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 353.
104
personalidade (cuja maior vulnerabilidade deve ser observada) e afastá-lo das
consequências negativas da privação da liberdade, devendo a resposta estatal ao crime
praticado por adolescente, ainda que contemple a privação de liberdade, ser excepcional
e breve (direito à excepcionalidade e à brevidade da privação de liberdade).
A prisão, cadeia ou cárcere é o espaço institucional que simboliza o direito
de punição do Estado. Esta teve diferentes utilizações desde que foi implantada no
Brasil, servindo como alojamento de escravos e ex-escravos, abrigo para crianças e
adolescentes abandonados e/ou infratores, abrigo para doentes mentais, local de
encarceramento de inimigos políticos, infratores da lei penal, criminosos,
contraventores.
Segundo PEDROSO:
230
PEDROSO, Regina Célia. Os signos da Opressão. História e Violência nas prisões brasileiras.
Coleção Teses e Monografias vol. 05. Arquivo do Estado Imprensa Oficial do Estado – São Paulo, 2003.
231
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. História da violência nas prisões. 35ª.
edição, tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. p. 2.
105
vemos na aplicação da MSE a forte relação entre o tempo de encarceramento do jovem
e a gravidade da infração por ele cometida. Para SÁ:
232
SÁ, Geraldo Ribeiro de. A prisão dos Excluídos. Origens e Reflexões sobre a Pena Privativa de
Liberdade. Rio de Janeiro: Diadorim Editora Ltda.,1996. p. 111.
106
A institucionalização de mecanismos repressivos sobre as
camadas excluídas também é de longa data no Brasil. Prisões
arbitrárias, torturas, raptos, maus tratos, descasos, perseguições,
ou simplesmente a opressão detectada na prisão, representavam
nitidamente o poder do Estado sobre a população
marginalizada.233
233
PEDROSO, Regina Célia. Os signos da Opressão. História e Violência nas prisões brasileiras.
Coleção Teses e Monografias vol. 05. Arquivo do Estado Imprensa Oficial do Estado – São Paulo, 2003.
p. 43.
234
PEDROSO, Regina Célia. Os signos da Opressão. História e Violência nas prisões brasileiras.
Coleção Teses e Monografias vol. 05. Arquivo do Estado Imprensa Oficial do Estado – São Paulo, 2003.
p. 61
107
ambas conforme a penalidade aplicada, desde a prisão perpétua até a reclusão de alguns
dias. Isto porque, a prisão, sob uma visão utópica, tinha como suas principais metas:
235
PEDROSO, Regina Célia. Os signos da Opressão. História e Violência nas prisões brasileiras.
Coleção Teses e Monografias vol. 05. Arquivo do Estado Imprensa Oficial do Estado – São Paulo, 2003.
p. 74.
236
PEDROSO, Regina Célia. Os signos da Opressão. História e Violência nas prisões brasileiras. Coleção
Teses e Monografias vol. 05. Arquivo do Estado Imprensa Oficial do Estado – São Paulo, 2003. p. 74.
237
“É que o sistema jurídico anterior, pré-constituição de 1988, além de figurar crianças e adolescentes
como objeto das relações jurídicas do cidadão pai-patrão, na expressão de Ferrajoli, e não como sujeito de
direitos especiais em face do mundo adulto, orientava-se, simultaneamente, pela cisão entre duas
categorias distintas de crianças e adolescentes: a infância normal (infância família, infância escola,
infância protegida e fruindo os bens materiais e culturais socialmente produzidos) e a infância desviante
(infância não família, não escola, infância desassistida, não fruindo desses bens, e fundida num conceito
jurídico de carência-delinquência); ao primeiro grupo aplicava-se um conjunto de regras, o até chamado
direito de família, e ao segundo outro conjunto de regras, o chamado direito do menor, que se apropriava
de algumas noções daquele, mas que configurava um corpo próprio de normas e se aplicava
exclusivamente ao segundo grupo.” (MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de
crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003. p. 146)
108
Analisando o sistema de atendimento a crianças e adolescentes, nos
deparamos com um histórico de omissões estatais no que diz respeito à implantação de
políticas públicas relacionadas aos internos e suas peculiaridades. As omissões foram
tantas que relatório da ONU para a Tortura, feito por Nigel Rodley, em sua missão
oficial ao Brasil no ano de 2000, revelou diversos casos de tortura e omissões relativas a
direitos fundamentais principalmente no que se refere a estabelecimentos prisionais:
O sistema penal juvenil representa uma instituição que não cumpre suas
funções manifestas e se caracteriza totalizante e despersonalizadora, tornando a
violência um instrumento de troca.
Apesar de a Constituição Federal impor ao Estado, responsável pela
manutenção da unidade prisional, o dever de conferir aos internos condições mínimas
de existência digna, e do ECA prever, expressamente, em seu artigo 125239 que é dever
do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, este ainda se mostra
omisso em muitas de suas necessidades fundamentais, sendo a dignidade apenas uma
expectativa distante para a maioria deles.
Os jovens em conflito com a lei no Brasil são submetidos a uma condição
de invisibilidade, que, ao mesmo tempo em que é sintomática, legitima e intensifica as
marcas de desigualdades econômicas, raciais e de gênero aos quais diversas pessoas são
submetidas na sociedade brasileira.
Para que se compreenda as razões desse permanente descumprimento das
disposições legais, em especial, por parte das instituições responsáveis justamente por
sua aplicação, deve-se ter em conta a cultura predominante no país de desrespeito à
estrutura legal vigente, sobretudo quando ela se refere à atribuição de direitos a
segmentos populacionais menos favorecidos. Fato que não deixa de representar uma
contundente negativa do Estado brasileiro em reconhecer os direitos civis dessas
238
PIOVESAN, Flávia. “A inconstitucionalidade da redução da maioridade penal”. In: A razão da idade:
mitos e verdades. 1ª Edição. Coleção Garantias de Direitos. Série Subsídios Tomo VII. Brasília:
MJ/SEDH/DCA, 2001. p. 73-74.
239
Art. 125. É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as
medidas adequadas de contenção e segurança.
109
populações num fenômeno característico da organização social e política brasileira
denominada, por CALDEIRA,240 democracia disjuntiva241.
A invisibilidade permanece mesmo com o crescente número de indivíduos
que se encontram no sistema prisional. Conforme dados da Comissão Interamericana de
Direitos Humanos, em 5 de setembro de 2000, o Centro pela Justiça e o Direito
Internacional – CEJIL, apresentou à CIDH petição242 contra a República Federativa do
Brasil na qual denunciou violação dos artigos 4, 5, 19, 8 e 25 da Convenção Americana
no que toca ao direito à vida, à integridade física, à proteção especial à infância, às
garantias judiciais e à recurso judicial, bem como a violação do artigo 13 do Protocolo
de San Salvador, que versa sobre o direito à educação, em prejuízo dos
adolescentes acusados de cometerem infrações penais, custodiados nas unidades da
Fundação do Bem Estar do Menor (FEBEM), no Estado de São Paulo.
Dados que revelam o quão necessário se faz voltarmos nossa atenção à
população jovem, principalmente com relação aqueles que se encontram em privação de
liberdade, uma vez que o Estado brasileiro ainda não tem garantido condições
adequadas para o cumprimento de pena de privação de liberdade nas instituições
fechadas no país.
Concluímos que a questão prisional, problema político que é, exige que toda
a sociedade civil se posicione, principalmente partidos políticos, imprensa, entidades
religiosas, sindicatos e movimentos sociais.
240
CALDEIRA, Teresa P. do Rio. Cidade de Muros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo. São
Paulo: Editora 34/Edusp, 2000.
241
Para Caldeira a expansão da cidadania política, através do processo de transição democrática, se
desenvolveu junto com a deslegitimação da cidadania civil e a emergência de um espaço público
fragmentado e segregado, por isso o caráter disjuntivo desse processo de democratização.
242
http://www.cidh.oas.org/annualrep/2002port/brasil12328.htm - Acesso em 10.10.2012.
243
Garantismo Penal – [...] Modelo normativo de direito que obedece a estrita legalidade, típico do Estado
Democrático de Direito, voltado a minimizar a violência e maximizar a liberdade, impondo limites à
função punitiva do Estado.[...] (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2008).
110
distrital e municipais, bem como todos os planos, políticas e programas específicos de
atendimento a adolescente em conflito com a lei.
Fonte: SINASE/ Secretaria Especial dos Direitos Humanos – Brasília-DF: CONANDA, 2006.
Fonte: SINASE/ Secretaria Especial dos Direitos Humanos – Brasília-DF: CONANDA, 2006.
111
destinado ao abrigo244, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição
física e gravidade da infração. Sendo obrigatórias as atividades pedagógicas.
O sistema reafirma a diretriz do Estatuto sobre a natureza pedagógica da
medida socioeducativa, assim, a execução das MSEs é regida por princípios como
legalidade, excepcionalidade da intervenção judicial (preferência pela autocomposição
de conflitos); prioridade a práticas restaurativas; proporcionalidade; brevidade da
medida; individualização (conforme idade, capacidades e circunstâncias pessoais do
jovem); fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo
socioeducativo, entre outros.
244
Tão nítida essa clivagem básica que a lei buscou introduzir, e que está intimamente presa à estrita
observância da reserva legal, que o sistema preocupou-se em dispor expressamente no parágrafo único do
artigo 101 que o abrigo não pode consubstanciar privação de liberdade, expressão utilizada na sua
acepção estrita de cárcere, de prisão, eis que senão restaria o dispositivo desprovido de qualquer conteúdo
e a lei, como é basilar, não contém expressões ou disposições inúteis.” (MACHADO, Martha de Toledo.
A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003. p.
212-213)
245
Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE/ Secretaria Especial dos Direitos
Humanos – Brasília-DF: CONANDA, 2006.p. 16.
112
criação de um projeto pedagógico e de uma rotina da unidade e/ou programa de
atendimento246.
Assim, a ação socioeducativa deverá respeitar as fases de desenvolvimento
do adolescente – considerando suas potencialidades, sua subjetividade, suas capacidades
e suas limitações – buscando garantir a particularização de seu acompanhamento. Para
isto será criado o Plano Individual de Atendimento (PIA) previsto no SINASE como um
instrumento pedagógico que garante a imparcialidade e a equidade no processo
socioeducativo, uma vez que o desenvolvimento institucional do adolescente internado
está diretamente ligado às conquistas das metas por ele estabelecidas.
A elaboração do PIA – importante ferramenta no acompanhamento da
evolução pessoal e social do adolescente – se inicia na acolhida do adolescente no
programa de atendimento com a realização de um diagnóstico polidimensional nas áreas
jurídica, de saúde, psicológica, social e pedagógica. Então é realizado pelos técnicos o
plano individual de atendimento, estabelecendo metas e compromissos247, os quais
devem ser constantemente pactuados com o adolescente e sua família durante o
cumprimento da MSE.
Os parâmetros da ação socioeducativa estão organizados em 8 eixos
estratégicos: (1) suporte institucional e pedagógico; (2) diversidade étnico-racial, de
gênero e de orientação sexual; (3) cultura, esporte e lazer; (4) saúde; (5) escola; (6)
profissionalização/trabalho/previdência; (7) família e (8) comunidade e segurança.
Com relação ao eixo educacional do PIA, o SINASE estabelece como
obrigação comum, a todas às entidades e programas que executam a internação
provisória e as MSEs, a garantia do fornecimento educacional (acesso à educação)
através de parcerias com órgãos do Executivo, da criação de estrutura e organização
escolar. Vejamos:
113
ações pedagógicas, o convívio em equipes de discussões e
reflexões e que estimulem o aprendizado e as trocas de
informações, rompendo, assim, com a repetição, rotina e
burocracia;
248
Sistema Nacional De Atendimento Socioeducativo -SINASE/ Secretaria Especial dos Direitos
Humanos – Brasília-DF: CONANDA, 2006.p. 59.
249
O Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de
Medidas Socioeducativas (DMF) foi criado pela Lei n. 12.106, de 2 de dezembro de 2009.
114
Fonte: DMF/CNJ - Elaboração: DPJ/CNJ
115
de São Paulo inseridos em medidas socioeducativas de privação de liberdade
(internação) e semiliberdade aplicadas de acordo com o tipo de ato infracional e a idade
dos adolescentes.
O Estado de São Paulo possui 141 unidades da Fundação CASA com uma
população de mais de 8.333 internos. Destes 59 estão em atendimento inicial, 2.337 em
internação provisória, 5.3579 em internação e 560 em semiliberdade250. Os internos se
encontram distribuídos nos seguintes tipos de estabelecimentos:
CASA – Centros de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente:
unidades construídas para abrigar os jovens que cumprem medidas
socioeducativas de privação de liberdade (internação) e
semiliberdade.
250
Dados retirados do sítio eletrônico: http://www.fundacaocasa.sp. gov.br/ Acesso em 12.11.2012.
116
estão no CAIP, é prestada assistência ao jovem, como, por exemplo,
o acompanhamento de psicólogos e assistentes sociais.
251
Esta descentralização político-administrativa mediante a criação e a manutenção de programas
específicos é prevista nos artigos 204, inc. I, da Constituição Federal e 88, inc. II, do ECA.
252
(1) CASA Atibaia; (2) CASA Bragança Paulista; (3) CASA Dom Gabriel Paulino Bueno Couto –
Jundiaí; (4) CASA Sorocaba I; (5) CASA Sorocaba II; (6) CASA Sorocaba III; (7) CASA Sorocaba IV;
(8) CASA Franco da Rocha, (9) CASA Novo Tempo; (10) CASA Franco da Rocha; (11) CASA
Jacarandá, (12) CASA Rio Negro, (13) CASA Tapajós, (14) CASA Semiliberdade Jundiaí, (15) CASA
Semiliberdade Sorocaba.
253
(1) CASA Ferraz de Vasconcelos I; (2) CASA Ferraz de Vasconcelos II; (3) CASA Novo Horizonte –
Guaianazes I; (4) CASA Guaianazes II; (5) CASA Encosta Norte; (6) CASA Fazenda do Carmo; (7)
CASA Vila Conceição; (8) CASA Chiquinha Gonzaga; (9) CASA Itaquera; (10) CASA Semiliberdade
Azaléia – Zona Leste; (11) CASA Semiliberdade Fênix – Zona Leste; (12) CASA Semiliberdade Prof.
Paulo Freire – Zona Leste; (13) CASA Semiliberdade Sabará – Zona Leste; (14) CASA Semiliberdade
Umbó – Zona Leste; (15) CASA Semiliberdade Uraí – Zona Leste; (16) CASA Semiliberdade São
Mateus–Zona Leste
254
(1) CAI Gaivota; (2) CASA Itaparica; (3) CASA Rio Paraná; (4) CASA Rio Turiassú; (5) CASA Rio
Nilo; (6) CASA Rio Tocantins; (7) CASA Topázio; (8) CASA Juquiá; (9) CASA Rio Tâmisa.
255
(1) CASA Osasco I; (2) CASA Osasco II; (3) CASA Pirituba; (4) CASA Nova Aroeira; (5) CASA
Cedro; (6) CASA Ipê; (7) CASA Jatobá; (8) CASA Nogueira; (9) CASA Vila Leopoldina; (10) CASA
Jardim São Luiz I; (11) CASA Jardim São Luiz II; (12) CASA Feminina Parada de Taipas; (13) CASA
Semiliberdade Guararema; (14) CASA Semiliberdade Jacirendi; (15) CASA Semiliberdade Araré; (16)
CASA Semiliberdade Nundiaú; (17) CASA Semiliberdade Ibituruna.
117
DRM V – DIV. REGIONAL METROP. V NORTE (Vila Maria)256
– Com 14 unidades;
DRMC – DIV. REGIONAL METROPOLITANA CAMPINAS
(Campinas)257 – Com 10 unidades;
DRVP – DIV. REGIONAL VALE DO PARAIBA (Jacarei) 258 –
Com 9 unidades;
DRN – DIVISÃO REGIONAL NORTE (Ribeirão Preto)259 – Com
16 unidades;
DRL – DIVISÃO REGIONAL LITORAL (Praia Grande)260 – Com
13 unidades;
DRO – DIVISÃO REGIONAL OESTE (Marilia)261 – Com 13
unidades;
DRS – DIVISÃO REGIONAL SUDOESTE –262 Com 11 unidades.
Cabe a cada Centro de Atendimento apresentar, anualmente, o Plano
Político Pedagógico que englobará todos os aspectos do trabalho a ser desenvolvido na
execução da medida socioeducativa, de âmbito técnico e administrativo, a partir do
levantamento das necessidades do adolescente e de sua família, das especificidades
256
(1) CASA Itaqua I; (2) CASA Itaqua II; (3) CASA Vila Guilherme; (4) CASA Bela Vista; (5) CASA
Bom Retiro; (6) CASA Nova Vida; (7) CASA Paulista; (8) CASA Ouro Preto; (9) CASA João do Pulo;
(10) CASA São Paulo; (11) CASA Belém; (12) CASA Semiliberdade Alvorada; (13) CASA
Semiliberdade Caetanos; (14) CASA Semiliberdade Ícaro – Zona Norte.
257
(1) CASA Maestro Carlos Gomes; (2) CASA Campinas; (3) CASA Mogi Mirim; (4) CASA
Laranjeiras; (5) CASA Rio Piracicaba; (6) CASA Escola Rio Claro; (7) CASA Jequitibá; (8) CASA Rio
Amazonas; (9) NAI Americana; (10) CASA Semiliberdade Mogi Mirim.
258
(1) CASA Arujá; (2) CASA Jacarei; (3) CASA Taubaté; (4) CASA Tamoios; (5) CASA
Caraguatatuba; (6) CASA Guarulhos I; (7) CASA Guarulhos II; (8) CASA Guarulhos Feminino; (9)
CASA Lorena
259
(1) CASA Arcebispo D.Hélder Câmara – CASA Franca; (2) CASA Taquaritinga; (3) CASA São
Carlos; (4) CASA Batatais; (5) CASA Araraquara; (6) CASA Ouro Verde; (7) CASA Ribeirão Preto; (8)
CASA Rio Pardo; (9) CASA Sertãozinho; (10) NAI Ribeirão Preto; (11) NAI São Carlos; (12) CASA
Semiliberdade Araraquara; (13) CASA Semiliberdade Barretos; (14) CASA Semiliberdade Batatais; (15)
CASA Semiliberdade Ribeirão Preto; (16) CAIP Arcebispo D. Hélder Câmara – CAIP Franca
260
(1) CASA Peruibe; (2) CASA Mauá; (3) CASA Itanhaém; (4) CASA Mongaguá; (5) CASA Praia
Grande I; (6) CASA Praia Grande II; (7) CASA São Bernardo I; (8) CASA São Bernardo II; (9) CASA
Guarujá; (10) CASA V São Vicente; (11) NAI Santos; (12) CASA Semiliberdade Diadema; (13) CAIP
Guarujá.
261
(1) CASA Araçatuba; (2) CASA Irapuru I; (3) CASA Irapuru II; (4) CASA Mirassol; (5) CASA São
José Rio Preto; (6) CASA Araçá; (7) CASA Marília; (8) CASA Tanabi; (9) CASA Rio Dourado – Lins;
(10) CASA Vitória Régia – Lins; (11) CASA Semiliberdade Fernandópolis; (12) CASA Semiliberdade
São Jose Rio Preto; (13) CASA Semiliberdade Marília
262
(1) CASA Botucatu; (2) CASA Feminino Cerqueira Cesar I; (3) CASA Feminino Cerqueira Cesar II;
(4) CASA Cerq Cesar III; (5) CASA Esperança; (6) CASA Madre Teresa de Calcutá I – Iáras; (7) CASA
Madre Teresa de Calcutá II – Iáras; (8) CASA Bauru; (9) CASA Rio Novo – Iáras; (10) CASA Três Rios
– Iáras; (11) CASA Semiliberdade Bauru
118
regionais e das características definidas para atendimento (Artigo 10 do Regimento
Interno da Fundação CASA).
263
Dados retirados do sítio eletrônico: http://www.fundacaocasa.sp. gov.br/ Acesso em 12.07.2011.
119
do ensino, em que o aluno é incentivado a analisar, comparar, confrontar e sintetizar o
conhecimento”264.
264
Dados retirados do sítio eletrônico: http://www.fundacaocasa.sp. gov.br/ Acesso em 15.10.2012.
120
IV – DIREITO À EDUCAÇÃO DO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO
DE PRIVAÇÃO DE LIBERDADE
265
Programa Nacional de Direitos Humanos III. Decreto nº 7.037, de 21 de Dezembro de 2009.
Disponível em http://portal.mj.gov.br/sedh/pndh3/pndh3.pdf Acesso em 23.11.2012.
121
ambiente, entre outros temas de direitos humanos). Concebendo a proteção aos direitos
humanos como uma ação integrada de governo, uma política de Estado.
Durante a elaboração do plano, na 8ª Conferência Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente, foi discutida a elaboração de um plano decenal para esse
segmento e avaliada a implantação do SINASE.
O PNDH-I colocava a Educação dentre as “Propostas de Ações
Governamentais” de três diferentes maneiras. A primeira trata da educação como meio
de capacitação dos profissionais da área da segurança e lideranças populares, no item
“Conscientização e mobilização pelos direitos humanos. Educação e Cidadania. Bases
para uma cultura de Direitos Humanos”, entre as ações de “Curto prazo”:
266
Programa Nacional de Direitos Humanos I. Decreto nº 1.904, de 13 de maio de 1996. Disponível em
<http://www.dhnet.org.br/dados/pp/pndh/textointegral.html> Acesso em 23.11.2012.
122
interdependente, assegurando a cidadania plena; e em seu Eixo Orientador V (Educação
e Cultura em Direitos Humanos) buscando alcançar as diretrizes 18 (Efetivação das
diretrizes e dos princípios da política nacional de educação em Direitos Humanos para
fortalecer cultura de direitos), 19 (Fortalecimento dos princípios da democracia e dos
Direitos Humanos nos sistemas de educação básica, nas instituições de ensino superior e
nas instituições formadoras, 20 (Reconhecimento da educação não formal como espaço
de defesa e promoção dos Direitos Humanos) e 21 (Promoção da Educação em Direitos
Humanos no serviço público).
Dentre as ações programáticas da diretriz 20, a ação “g” trata da educação
dos jovens em privação de liberdade:
123
O PNDH-III tem diversas propostas de ações governamentais – desde
assegurar a implantação e o funcionamento adequado dos órgãos que compõem o
Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes (proposta 129) e promover
a discussão do papel do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública
e do Poder Legislativo na implementação do ECA (proposta 130) – que visam a
proteção e garantia em rede dos direitos das crianças e adolescentes, até propostas
específicas aos adolescentes em conflito com a lei, e/ou que se encontram privados de
liberdade que são as propostas 155 a 159 que dispõem:
124
ii. Programa Estadual de Direitos Humanos do Estado de São
Paulo - PEDH-SP
O Programa Estadual de Direitos Humanos, instituído pelo decreto nº
42.209 de 15 de setembro de 1997, cria a Comissão Especial de acompanhamento da
execução desse programa além de instituir propostas de ações governamentais para a
garantia e proteção dos direitos humanos no estado de São Paulo. Elaborado e discutido
com a participação da sociedade civil o PEDH-SP tem como proposta a (1) construção
da Democracia e promoção dos Direitos Humanos, em que os principais objetivos são a
educação para a Democracia e os Direitos Humanos e a participação política; (2) a
proteção de direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais, que envolve desde o
direito ao desenvolvimento humano e o emprego e geração de renda até a garantia do
direito à educação; e (3) a proteção de direitos civis e políticos, como o acesso à justiça
e luta contra a impunidade, segurança e medidas contra a violência e sistema prisional e
ressocialização, medidas contra a discriminação, e a proteção de grupos como crianças e
adolescentes, mulheres, população negra, povos indígenas, refugiados e migrantes,
terceira idade, pessoas portadoras de deficiência e homossexuais e transexuais.
A proteção de crianças e adolescentes no PEDH-SP vai desde a
implementação de campanhas para proteção e promoção dos seus direitos; como a
melhora da infraestrutura para o adequado funcionamento do Conselho Estadual dos
Direitos da Criança e do Adolescente, incentivo a criação e funcionamento de
Conselhos Municipais de Direitos, Conselhos Tutelares e Fundos dos Direitos da
Criança e do Adolescente.
A orientação e assistência jurídica nos processos envolvendo crianças ou
adolescentes e o apoio à criação e funcionamento de varas, promotorias e delegacias
especializadas em infrações penais envolvendo crianças e adolescentes também são
objetivos do plano, como:
125
5.18. Priorizar programas que privilegiem a aplicação de
medidas socioeducativas não privativas da liberdade para
adolescentes autores de ato infracional.
126
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação,
visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para
o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho,
assegurando-lhes:
Por sua vez, o artigo 54 acaba por reproduzir o disposto no art. 208 da
Constituição Federal, referente aos deveres do Estado no que concerne à educação. O
Estatuto busca, assim, assegurar à criança e ao adolescente igualdade de condições para
o acesso e permanência na escola, obrigação do estado, da família e da sociedade, nos
moldes do art. 205 da Constituição Federal.
É notório o posto ocupado pela educação no Estatuto da Criança e do
Adolescente, de modo que mesmo quando a criança e o adolescente se encontrarem
cumprindo medida socioeducativa pela prática de ato infracional267, o direito à educação
não pode lhes ser negado.
Isto porque, a medida socioeducativa é tida como a “manifestação do
estado, em resposta ao ato infracional (crime ou contravenção penal), praticado por
menores de 18 anos, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva, cuja
aplicação objetiva inibir a reincidência”268 esta não pode ultrapassar outros direitos além
da liberdade.
Previsto no ECA, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente (CONANDA) foi criado em 1991, pela Lei nº 8.242, e é tido como o
principal órgão do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente. Ele se
267
O Estatuto diferencia criança (menores de 12 anos) de adolescente (de 12 a 18 anos), prevendo que
enquanto para as primeiras se aplicam medidas de proteção (art. 101), aos adolescentes se aplicam as
medidas sócio-educativas constantes no art. 112.
268
LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao estatuto da Criança e do Adolescente. 11ª ed. São
Paulo: Malheiros Editores, 2010. p. 122.
127
desenvolve através da gestão compartilhada entre governo e sociedade civil, as ações
executadas pelo poder público e gere o Fundo Nacional da Criança e do Adolescente
(FNCA) e fiscalizar as ações de promoção dos direitos da infância e adolescência
executadas por organismos governamentais e não governamentais.
128
utilizam dentre as suas considerações iniciais, questões que foram aprovadas pelas
Conferências Internacionais de Educação de Adultos (V e VI CONFINTEA) a Diretriz
menciona sua “preocupação de estimular oportunidades de aprendizagem a todos, em
particular, os marginalizados e excluídos”, buscando garantir o reconhecimento do
direito à aprendizagem de todas as pessoas encarceradas269, proporcionando-lhes
informações e acesso aos diferentes níveis de ensino e formação.
As Diretrizes estabelecem em seu artigo 2º que a legislação educacional
deve se estender aos estabelecimentos prisionais, enquanto seu artigo 3º a coloca como
responsabilidade das Secretarias de Educação Estaduais (no caso dos estabelecimentos
estaduais e do Distrito Federal) e do Ministério da Educação e Ministério da Justiça
(nos estabelecimentos federais).
Estabelece também que as verbas do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
(FUNDEB), destinadas à modalidade de Educação de Jovens e Adultos, devem
abranger a educação nas prisões. As orientações para a oferta educacional dispõe desde
os órgãos responsáveis pelo fornecimento educacional, as fontes de financiamento, à
sua forma de funcionamento e articulações a serem realizadas.
129
manutenção de bibliotecas destinadas ao atendimento à
população privada de liberdade, inclusive as ações de
valorização dos profissionais que trabalham nesses espaços;
130
atividades educacionais, esportivas, culturais, de formação profissional e de lazer,
integrando-as às rotinas dos estabelecimentos penais.
As Diretrizes também preveem o atendimento diferenciado de acordo com
as especificidades de cada medida e/ou regime prisional, como as necessidades de
inclusão e acessibilidade, as peculiaridades de gênero, raça e etnia, credo, idade, e as
peculiaridades de tempo, espaço e rotatividade da população carcerária levando em
consideração a flexibilidade prevista no art. 23 da Lei nº. 9.394/96 (LDB).
Soma-se o fato de que em diversas passagens do documento, a necessidade
de articulações, convênios, e parcerias com diferentes esferas e áreas de governo,
universidades, instituições de Educação Profissional e organizações da sociedade civil, é
ressaltada, o que nos mostra a necessidade de lidar com a educação nos
estabelecimentos de privação de liberdade como um problema só sanado com o desenho
de políticas públicas bem estruturadas.
131
pedagógicas culturais. Porém, como o artigo 12 dispõe que o planejamento das ações de
educação poderá contemplar, além das atividades de educação formal, propostas de
educação não-formal, queremos crer que a educação formal é obrigatória.
Os educadores nos estabelecimentos penais deverão levar em consideração
as especificidades da política de execução penal (Art. 11). Porém, uma importante
diretriz está no parágrafo primeiro do mesmo artigo, ao prever que docentes que atuam
nestes espaços deverão ser profissionais do magistério devidamente habilitados e com
remuneração condizente com as especificidades da função. Acabando com a tradição até
então existente de precarização do fornecimento educacional inframuros ou mesmo com
a utilização de profissionais sem titulação270 adequada para educar.
A implementação e fiscalização destas Diretrizes será obrigação dos
Conselhos de Educação dos Estados e do Distrito Federal, que para isso, deverão
articular-se com os Conselhos Penitenciários Estaduais e do Distrito Federal ou seus
congêneres (Art. 14).
As Diretrizes vêm, assim, atender as demandas educacionais de material,
equipe especializada e verbas, tão reclamadas pelos grupos e organizações que
atualmente defendem os direitos dos presos.
b. Legislação Internacional
i. A Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e
a Cultura e seus desafios e estratégias para a educação
270
Apesar do § 2º do mesmo artigo 11 prever que a pessoa privada de liberdade ou internada que possua
perfil adequado e receba preparação especial, pode atuar em apoio ao profissional da educação, esta
atuação será um auxilio ao educador, não sua substituição.
132
problemas dos jovens nas agendas da vida política dos Estados-membros, no que tange
à educação, às ciências, à cultura e à comunicação.”271
271
Sitio eletrônico da UNESCO Brasil - http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/special-
themes/preventing-youth-violence/ - consultado em 12.10.2012.
133
alfabetização de jovens e adultos, para a qual tem o apoio da UNESCO no compromisso
com os objetivos da Educação para Todos (EPT). Assim, ela tem entre seus objetivos
estratégicos referentes à política educacional o Objetivo 03, que estipulou o prazo de 03
anos para que houvesse equidade nas condições de acesso à educação e nos resultados
no sistema educacional brasileiro.
Para o Biênio 2008-2009, buscou-se a qualificação de políticas e programas
de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos, para a qual foram realizados diversos
seminários como o Seminário Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos na
América Latina: Direito e Desafio realizado; oficinas de qualificação para gestores dos
países que compõem a Estratégia Life; a audiência pública na Câmara dos Deputados
para apresentação e debate do relatório da RNDHE sobre educação em prisões, dentre
outros significativos eventos. Por sua vez o biênio 2010-2011 no que se refere à
educação teve como prioridade contribuir ao exito do programa Educação para Todos
(EPT) e exercer uma lideraça mundial e regional em matéria de educação,
principalmente mediante a aplicação das recomendações das grandes convenções
internacionais sobre educação.
O atual biênio 2012-2013 tem como meta a promoção de uma educação
mais equitativa e de melhor qualidade ao serviço da aprendizagem ao longo de toda a
vida e o desenvolvimento sustentável, bem como mantêm a prioridade de fortalecer sua
liderança mundial no âmbito da educação.
272
Como na Declaração de Genebra de 1924 sobre os Direitos da Criança e na Declaração dos Direitos da
Criança, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional de Direitos Civis e
Políticos, no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
134
Na parte I da Convenção, o artigo 28.1 da Convenção dispõe sobre o direito
da criança à educação como meio de se exercer progressivamente e em igualdade de
condições esse direito, devendo os Estados Partes signatários da Convenção tornar o
ensino primário obrigatório e disponível para todos; estimular o desenvolvimento do
ensino secundário, ambos gratuitos. Os Estados devem também promover e estimular a
cooperação internacional em questões educacionais, facilitando o acesso aos
conhecimentos científicos e técnicos; devendo a educação ser orientada no sentido de
desenvolver a personalidade, as aptidões e a capacidade mental e física da criança,
desenvolver o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, preparar a
criança para assumir uma vida responsável.
Mais especificamente no que se refere à privação de liberdade, o artigo 37
traz o obrigação dos Estados Partes em zelar para que nenhuma criança seja privada de
sua liberdade de forma ilegal ou arbitrária. Devendo a detenção, a reclusão ou a prisão
apenas ocorrer como último recurso, e durante o mais breve período de tempo, sendo
direito de toda criança, a quem se alegue ter infringido as leis penais ou a quem se acuse
ou declare culpada de ter infringido as leis penais, ser tratada de modo a promover e
estimular seu sentido de dignidade e de valor.
A convenção considera direito e garantia de toda criança de quem se alegue
ter infringido as leis penais ou a quem se acuse de ter infringido essas leis, de ter
plenamente respeitada sua vida privada, bem como serem tratadas de modo apropriado
ao seu bem-estar e de forma proporcional às circunstâncias e ao tipo de delito.
A parte II da Convenção trata do compromisso dos Estados Partes em dar
aos adultos e às crianças amplo conhecimento dos princípios e disposições da
Convenção; do estabelecimento de comissões compostas por especialistas para que
realizem estudos especiais sobre assuntos relacionados aos direitos das crianças; de
formas de fomento da implantação efetiva da Convenção; e de formas encorajar a
cooperação internacional. Por sua vez a parte III trata da ratificação da Convenção pelos
Estados (aberta à assinatura e adesão de qualquer Estado).
A convenção busca, assim, elencar direitos e garantias mínimas da criança,
devendo ser a educação um direito fundamental a ser garantido, enquanto a punição,
além de breve e excepcional, deve respeitar a dignidade e o processo de
desenvolvimento da criança. Deste modo, compreende-se que a primeira não pode ser
negada ou inviabilizada pela segunda.
135
iii. Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no
Campo do Ensino
Soma-se à extensa produção legislativa referente à educação nas prisões, a
Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, aprovada em
14 de dezembro de 1960, pela Conferência Geral da UNESCO, em sua 11ª sessão,
reunida em Paris de 14 de novembro à 15 de dezembro de 1960, ratificada pelo Brasil,
e aprovada pelo Congresso Nacional pelo decreto legislativo n. 40, de 1967 que resultou
no Decreto nº 63.223 - de 6 de setembro de 1968. A Convenção dispõe em seu artigo I:
136
de ensino; a não admitir nenhuma preferência ou restrição baseadas unicamente no fato
de que os alunos pertençam a determinado grupo (Artigo III).
Para isso, os Estados parte se comprometem a formular, desenvolver e
aplicar política nacional que vise a promover a igualdade de oportunidades e tratamento
em matéria de ensino (Artigo IV), de modo a tornar o ensino primário obrigatório e
gratuito, ampliar o acesso ao ensino secundário, e assegurar a qualidade do ensino
fornecido.
A Convenção também dispõe sobre a necessidade da educação visar ao
pleno desenvolvimento da personalidade humana e ao fortalecimento do respeito aos
direitos humanos e das liberdades fundamentais, favorecendo a compreensão, a
tolerância e a amizade entre todas as nações.
Em que pese a Convenção da UNESCO contra a discriminação na educação
ser uma das mais antigas normas de direito internacional referentes ao direito à
educação, ela ainda está muito longe de ser plenamente efetivada. Quando tratamos do
fornecimento de educação de qualidade a todos de maneira equânime e não
discriminatória, vemos que ainda há um longo caminho a ser percorrido, principalmente
quando tratamos do direito à educação daqueles que se encontram sob a tutela do
Estado, isto é, de jovens que se encontram cumprindo medidas socioeducativas de
privação de liberdade.
137
todos os recursos (família, voluntários e outros grupos comunitários, escolas e outras
instituições comunitárias) a fim de promover o bem-estar do menor e reduzir a
necessidade de intervenção da lei, bem como tratar de forma eficaz, equitativa e
humanitária o jovem em conflito com a lei. Para isso, a Justiça de menores deve ser
concebida como parte integrante do processo de desenvolvimento nacional de cada país
(regra 1.4), de modo a garantir a proteção dos jovens e a manutenção da paz e da ordem
na sociedade. As medidas de proteção social dos jovens, também deve ser priorizada, de
modo a prevenir o crime e a delinquência juvenil.
As Regras Mínimas foram formuladas de forma a serem aplicadas em
sistemas jurídicos diferentes, fixando normas mínimas para o tratamento dos
delinquentes juvenis, para tanto define os termos “menor” e “delito” em sua regra 2.2.
Mesmo com esta flexibilidade, as regras reconhecem que a responsabilidade penal não
deve ser fixada a um nível demasiadamente baixo, tendo em conta problemas de
maturidade afetiva, psicológica e intelectual (regra 4).
O “princípio da proporcionalidade” é objetivo a ser buscado pela Justiça de
menores, de modo que a imposição de sansões deve ser proporcional tanto às
circunstâncias especiais dos jovens em conflito com a lei, quanto do delito. Tanto que o
poder discricionário deve ser exercido de um modo responsável, em todas as fases do
processo e a todos os níveis, afinal os jovens devem ter preservadas suas garantias
fundamentais processuais, como a presunção de inocência, o direito de ser notificado
das acusações, o direito de não responder, o direito à assistência judiciária, o direito à
presença dos pais ou tutor, o direito de interrogar e confrontar as testemunhas e o direito
ao recurso.
As regras têm na prisão preventiva uma medida de último recurso, devendo
sua duração ser o mais breve possível e quando possível, esta deve ser substituída por
outras medidas, tais como uma vigilância apertada, uma assistência muito atenta ou
colocação em família, em estabelecimentos ou em lar educativo. Para as regras, a
colocação de um menor em instituição, é sempre uma medida de último recurso (regra
19).
As regras também prezam pela necessidade de profissionalização e de
formação, de modo que a formação profissional, a formação permanente, os cursos de
reciclagem e outros tipos de formação devem ser oferecidos.
A quarta parte das regras trata do tratamento em meio aberto enquanto a
quinta do tratamento em instituição, nosso foco de pesquisa, tem objetivo assegurar aos
138
jovens em conflito com a lei, que se encontram em privação de liberdade, assistência,
proteção, educação e formação profissional. Eles devem ser colocados em instituições
ou locais diferentes (separados) dos adultos, devendo ser beneficiados por uma atenção
especial no que diz respeito às suas necessidades e problemas próprios.
Por fim, a sexta parte ao tratar da investigação, planificação e formulação de
políticas e avaliação mostra a necessidade de formulação de planos e de políticas
eficazes, bem como de avaliações periódicas das tendências, problemas e as causas da
delinquência e da criminalidade juvenis.
139
material, devendo ser tomadas disposições para reforçar os seus laços com a
comunidade e facilitar a sua reinserção na sociedade (regra 10.4).
Para isso, as condições das medidas não privativas de liberdade devem ser
práticas e precisas e as pessoas que irão aplicar as medidas devem ser qualificadas e ter
uma formação especializada apropriada e experiência prática (regra 16.1). A
participação da coletividade também deve ser encorajada, pois constitui um importante
meio de reforçar laços entre os delinquentes submetidos a medidas não privativas de
liberdade e as suas famílias e a comunidade (regra 17.1).
Por fim, a investigação e planificação são necessárias, devendo ser
integrados no sistema de justiça penal para recolher e analisar os dados estatísticos
pertinentes sobre a aplicação do tratamento de delinquentes em meio aberto.
140
língua, religião, opinião política ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social,
fortuna, nascimento ou em qualquer outra situação. Outra necessidade que as regras
impõe está na separação de categorias (Regra 8) já que as diferentes categorias de
presos deverão ser mantidas em estabelecimentos prisionais separados ou em diferentes
zonas de um mesmo estabelecimento prisional, levando-se em consideração seu sexo e
idade, seus antecedentes, as razões da detenção e o tratamento que lhes deve ser
aplicado. Tal regra nos remete a prevista no ECA e no SINASE no que concerne a
fixação e aplicação da pena de privação de liberdade.
As regras tratam especificamente de diversas questões sensíveis a privação
de liberdade, como o local destinado aos presos (Regra 9-14), a higiene pessoal (Regra
15-16), as roupas de vestir, camas e roupas de cama (Regra 17-19), a alimentação
(Regra 20), a prática de exercícios físicos (Regra 21), o fornecimento de serviços
médicos (Regra 22-26), as disciplina e sanções (Regra 27-32), os instrumentos de
coação (Regra 33-34), a informação e direito de queixa dos presos (Regra 35 -36), a
possibilidade de contato com o mundo exterior (Regra 37-39), a existência de biblioteca
(Regra 40), a prática de religião (Regra 41-42), o depósito de objetos pertencentes aos
presos (Regra 43), a notificação de morte, doenças e transferências (Regra 44), a
transferência de presos (Regra 45), o pessoal penitenciário (Regra 46-54), e a inspeção
(Regra 55).
A parte II, ao tratar das regras aplicáveis a categorias especiais, dispõe em
seu item 77, denominado “Educação e recreio”, que:
141
Conforme já mencionamos, apesar das Constituições Liberais procurarem a
“inação” estatal, a Revolução Industrial e o “movimento das coisas”273 passou a exigir
mais ação estatal, sendo necessário um planejamento estratégico, no qual devem ser
escolhidos fins e objetivos comuns, além dos instrumentos e meios para alcançá-los.
O Estado Contemporâneo, assim, passou a ter legitimidade e capacidade
para realizar objetivos predeterminados, de modo que a reorganização da atividade
estatal em função de finalidades coletivas torna-se indispensável, sendo atribuição dos
Poderes Públicos propiciar condições básicas ao alcance da igualdade social. Esta
passagem de modelos estatais, e necessidade de reorganização da atuação estatal em
vista de da realização de finalidades coletivas, as quais devem ser concretizadas
programadamente através de políticas públicas ou programas de ação governamental, de
maneira coletiva, que englobe todos os Poderes/Funções estatais.
Assim, seguindo este novo modelo de Estado as Constituições do Estado
Dirigente impõem objetivos ao corpo político, os quais devem orientar todo o
funcionamento do Estado e organização da sociedade, tais quais os objetivos do art. 3º
da Carta Magna de 1988; Objetivos, estes, juridicamente vinculantes para todos os
órgãos estatais, o que vem por quebrar o dogma do Estado Liberal da atividade
legislativa preponderante sobre os demais poderes e o dogma da atividade jurisdicional
“prestada por um juiz que representava apenas la bouche de la loi”274.
A professora GRINOVER relembra que “no Brasil, durante muito tempo os
tribunais auto-limitaram-se, entendendo não poder adentrar o mérito do ato
administrativo”275. Tendo a Lei da Ação Popular aberto ao Judiciário a possibilidade de
apreciação do mérito do ato administrativo nos casos dos artigos 4º, II, b, e V, b, da Lei
n.4.717/65. A Constituição de 1988 acabou por ampliar o instituto, quando em seu
artigo 5º, inciso LXXIII previu que
273
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade de políticas públicas, in
Revista dos Tribunais, Ano 86, V. 35, 1997, p. 16.
274
GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. O processo:
estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 38.
275
GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. O processo:
estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 37.
142
Por sua vez, Cândido Dinamarco entende que foi a ação popular que abriu
caminho ao Judiciário para o controle de mérito do ato discricionário do poder publico a
partir do momento em que ela desmistificou o dogma da “substancial incensurabilidade
do ato administrativo”276.
Como já mencionado anteriormente, a Constituição de 1988 fez mais ao
fixar os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil em seu artigo 3º, pois
para atingir tais objetivos (acrescendo-se a eles o princípio da prevalência dos direitos
humanos, previsto no artigo 4º, II da CF) o Estado deve se organizar no facere e
praestare, modificando a realidade social. Tanto que para Oswaldo Canela Jr. “cabe ao
Poder Judiciário investigar o fundamentos de todos os atos estatais a partir dos objetivos
fundamentais inseridos na Constituição (art. 3º da CF brasileira)”277 havendo, portanto,
a necessidade de uma postura do Judiciário mais ativa e comprometida socialmente.
Tanto que atualmente com os julgamentos do STF de casos complexos
como o Raposa Serra do Sol e mesmo o Mensalão, vemos o Poder Judiciário cada vez
mais na mídia, e a importância da considerável influência que este exerce sobre as
políticas governamentais. Nessa direção confluem as conclusões de RAMOS:
276
GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. O processo:
estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 38.
277
CANELA, Oswaldo. Jr. In. GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder
Judiciário. O processo: estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009.
p. 39.
278
RAMOS, Elival da Silva. Controle de constitucionalidade no Brasil: perspectivas de evolução. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 438-439.
143
infringência frontal à Constituição pelos atos do Poder Público, mas também por
intermédio do cotejo desses atos com os fins do Estado”279.
A inconstitucionalidade de uma política pública pode ocorrer em razão de
sua finalidade ou em razão dos instrumentos escolhidos para a sua concretização. Ela
pode ser tanto comissiva quanto omissiva, sendo os efeitos jurídicos de uma decisão que
fulmina de inconstitucionalidade uma política pública atingiria todas as leis e atos
normativos executórios (efeito ex nunc), sendo desejável que esta tivesse além deste
efeito desconstitutivo, a natureza injuntiva ou mandamental.
Em relação ao controle de políticas públicas pelo Judiciário não podemos
esquecer a advertência de DWORKIN de que o princípio democrático é igualmente,
limitador das decisões políticas dos magistrados, de forma que ao passo em que
contribuem para a realização da democracia, os juízes estão igualmente limitados por
ela280.
279
GRINOVER, Ada Pellegrini. O controle de políticas públicas pelo Poder Judiciário. O processo:
estudos e pareceres. 2ª edição revisada e ampliada. São Paulo: DPJ Editora, 2009. p. 37.
280
CANELA. Oswaldo Jr. O controle Judicial de Políticas Públicas. 1ª. Edição. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 91.
281
RAMOS, Elival da Silva. Controle de constitucionalidade no Brasil: perspectivas de evolução. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 464.
282
RAMOS, Elival da Silva. Controle de constitucionalidade no Brasil: perspectivas de evolução. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 440-441.
144
responder às necessidades sociais, acompanhando os ágeis e raramente uniformes
movimentos pelos quais se expressam.”283.
283
RAMOS, Elival da Silva. Controle de constitucionalidade no Brasil: perspectivas de evolução. São
Paulo: Saraiva, 2010. p. 440-441.
284
CANELA. Oswaldo Jr. O controle Judicial de Políticas Públicas. 1ª. Edição. São Paulo: Saraiva,
2011. p. 92.
145
minorias que na maioria das vezes não tem espaço nos processos políticos
convencionais285.
Já, com relação à alegação da falta de legitimidade político-democrática do
Supremo Tribunal Federal, alegação estendida a órgãos menores do Judiciário, tal
alegação mostra-se um tanto equivocada, não só devido à existência daquilo que
chamamos legitimidade reflexa, visto a indicação dos Ministros ser realizada pelo
Presidente da República e passar por aprovação no Senado. Cumpre transcrever o
entendimento de Willian L. Reynolds que ao refutar o argumento majoritário para
criticar a posição ativista do judiciário, diz:
285
SABINO. Marco Antonio da Costa. Quando o Judiciário Ultrapassa seus Limites Constitucionais e
Institucionais – O Caso da Saúde. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo. O controle
jurisdicional das políticas públicas. São Paulo: Forense, 2011, p. 353-386.
286
REYNOLDS. Willian L. Judicial Process in a Nutshell. 2nd edition. Maryland: West Group, 1991, pp.
143-154.
287
Promulgado em julho de 1990, e publicado D.O.U. 16.7.1990 e retificado no D.O.U de 27.9.1990,
entrando em vigor 90 (noventa) dias após sua publicação (art. 266 da Lei 8.069/90).
146
A primeira etapa de pesquisa jurisprudencial, etapa formal, buscou coletar e
sistematizar as decisões dentro dos seguintes tópicos: 1. Número do processo; 2.
Natureza do recurso; 3. Data do julgamento; 4. Categorias; 5. Temas; 6. Origem:
Comarca originária do processo; 7. Apelante/Recorrente: os nomes dos autores que
recorreram da decisão anterior; 8. Apelados/Recorridos: os nomes dos autores que
foram apelados ou recorridos para a solução do litígio; 9. Câmara: Sessão onde ocorreu
o julgamento; 10. Votação: se unânime ou maioria dos votos; 11. Resultado: se o
recurso foi provido, não provido, parcialmente provido, recurso extinto; 12. Relator:
nome do desembargador relator da decisão; e 13. Localização da ementa e do acórdão:
indicando a origem do acesso do material.
A análise se deu a partir da coleta de decisões nos sítios eletrônicos do STJ e
STF, através do banco de dados “Pesquisa – Jurisprudência do STJ” e “Pesquisa de
Jurisprudência” do STF, utilizando como descritores: “direito à educação”, “educação”,
“privação de liberdade”, “jovem”, “socioeducativa”, e “internação”. No sítio eletrônico
do STJ foram selecionados registros referentes à “educação, privação de liberdade, e
socioeducativa”, totalizando 04 decisões monocráticas, sendo três habeas corpus
referentes a mudança de medida socioeducativa de internação para aberta e/ou
semiliberdade, e um recurso especial para o mesmo fim, sendo os primeiros concedidos
e o recurso negado.
Já no sítio eletrônico do STF não foram selecionados registros com base nos
descritivos mencionados, de modo que inexistem decisões referentes ao fornecimento
educacional nas prisões, apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal.
O Tribunal de Justiça do estado de São Paulo, através do banco de dados
“Magistrado”, “Consulta Jurisprudência”, utilizando como descritores: “direito à
educação”, “educação”, “privação de liberdade”, “jovem”, “socioeducativa”, e
“internação”. No sítio eletrônico do TJ-SP foram selecionados registros referentes à
“educação”, “privação de liberdade” e “jovem”, totalizando 02 decisões monocráticas,
aparecendo a mensagem de que haviam mais decisões, porem, estas se encontravam em
segredo de justiça. Por sua vez utilizando os descritores “educação”, “privação de
liberdade” e “socioeducativa” não foi localizada nenhuma decisão.
Os registros encontrados não se referem direitamente a garantia do direito à
educação na prisão, nem ao fornecimento educacional, mas sim a processos de execução
da MSE, pedidos de modificação de MSE ou contra a inserção do adolescente em MSE
de internação, como no caso dos pedidos de habeas corpus encontrados.
147
Após a sistematização da jurisprudência (presente na parte anexos), a
segunda etapa de análise (análise material), se dará através do roteiro de pesquisa
apresentado nos objetivos da pesquisa. Sendo escolhida a decisão monocrática do
habeas corpus nº 224.583 – origem SP (2011/0269500-4) proferida em 30 de
novembro de 2011, pelo relator do caso, o Ministro Sebastião Reis Júnior, cuja decisão
concedeu a ordem de habeas corpus a fim de inserir adolescente em medida
socioeducativa de liberdade assistida associada ao acompanhamento ambulatorial
psiquiátrico, psicopedagógico e familiar.
a. Contexto
A decisão analisada é referente habeas corpus impetrado em benefício de
adolescente (S. D. A.), e aponta como autoridade coatora a Câmara Especial do
Tribunal de Justiça de São Paulo, que denegou o pedido de Habeas Corpus, indeferindo
a modificação da medida socioeducativa aplicada à adolescente, e mantendo-a na MSE
de internação, não levando em conta relatório técnico que sugeria a progressão da
medida e afirmando que tal relatório não o vinculava. A decisão do Magistrado de
primeiro grau acaba por fundamentar-se, apenas, na existência de faltas disciplinares
cometidas pela adolescente.
A adolescente já se encontrava internada há mais de 02 anos “em
decorrência de sentença judicial que determinou sua internação, em razão da prática de
ato infracional equiparado ao crime de tráfico de drogas”, e apresentava distúrbio de
conduta, com sintomas de autoflagelação, agressividade, alucinações visuais e auditivas,
irritabilidade excessiva, dentre outros, que estavam se agravado em razão das condições
ambientais (encarceramento), nas quais a adolescente estava inserida.
O HC pleiteou, ainda, que a adolescente fosse encaminhada “a um
atendimento individual e especializado, compatível com sua limitação mental”,
suscitado o § 3º, do art. 112 do ECA e a colocação da jovem em liberdade, em medida
proteção, sendo necessário o tratamento ambulatorial, psiquiátrico, psicopedagógico e
familiar.
Os principais problemas suscitados são a finalidade da MSE de privação de
liberdade, sua ineficácia, no caso da jovem, já que a privação de liberdade e falta de
contato com a família estavam visivelmente definhando a jovem e lhe causando sérios
148
problemas de ordem psicológica e afetiva. Tanto que o relator é claro ao dizer que o
“intuito da medida socioeducativa, em qualquer de suas modalidades, é o de educação e
ressocialização do menor infrator. Sua aplicação é realizada de acordo com o caso que
se apresenta, sendo consideradas as circunstâncias da prática do ato infracional
(objetivas) e as condições pessoais do menor infrator (subjetivas)”. Ele ainda aventa que
as reavaliações periódicas servem para que a efetividade da MSE imposta seja
verificada.
A presença da família da jovem no acompanhamento da medida também é
um problema (no caso solução) do qual a decisão trata. Isto porque no caso analisado, a
mãe da jovem (Sra. A) participa de forma ativa nas ações propostas pela equipe de
técnicos para reorganização pessoal de sua filha288. Tal participação só é possível dada a
descentralização do sistema de atendimento e de cumprimento de medida
socioeducativa, que é estadual, mas busca estabelecer convênios municipais para
aproximar o adolescente da comunidade e auxiliá-lo no cumprimento da pena. Ocorre
que o SINASE ainda é muito recente e ainda não é aplicado de forma integral, sendo um
sério problema político-social.
Outro sério problema que podemos notar na decisão em questão é o fato da
MSE não ter prazo definido, apenas a previsão de ser breve e não ultrapassar 03 anos.
Tal falta de correspondência entre o ato infracional considerado crime e a quantidade de
meses/anos para o cumprimento da medida (tal qual ocorre na execução penal do
adulto), acaba por ampliar o poder discricionário do juiz que determina a MSE, que
acaba infringindo aos adolescentes medidas muito mais duras do que aos adultos
(resguardados pela legislação penal garantista). No presente caso a jovem está
submetida a medida de internação há mais de 2 anos.
A utilização de terapia medicamentosa na MSE aparece no laudo que o
magistrado transcreve, sendo uma preocupação a utilização de medicamentos no curso
da internação, como forma de conter e/ou acalmar o jovem. Tanto que o tratamento
médico não pode ser ministrado por funcionários que não possuam titulação e aptidão
técnica para tal.
Por fim, o principal problema que visualizamos está no fato da própria
medida socioeducativa proposta à adolescente, ser a de internação, esta, que deveria ser
288
“Nesse sentido, participa das consultas psiquiátricas de S. realizadas na rede de saúde de Tatuí/SP para
aumentar sua percepção e responsabilidade sobre as vivências de sua e filha e sobre as perspectivas que
visualizam para quando for encerrado o período de privação de liberdade” (habeas corpus nº 224.583 - SP
(2011/0269500-4).
149
a ultima ratio, e que no presente caso, está claramente acentuando uma espécie de
desgaste psíquico no contexto familiar e distanciando a jovem de pessoas afetivas e
próximas de sua convivência, gerando sérios prejuízos a resignificação da adolescente e
a organização da vida familiar.
A decisão ocorreu em novembro de 2011, ou seja, dentro de um contexto de
ampliação dos direitos sociais, no qual além da Constituição de 88 (conhecida por
Constituição Cidadã) prever e garantir direitos à todas as crianças e adolescentes, a
legislação infraconstitucional como o ECA de 1990, as resoluções do CONAMA e os
tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, são fonte extensa e robusta de
legislação constitucional e ordinária, na defesa da proteção de crianças e adolescente.
Porém da data da sentença, ainda não existia o SINASE, que esmiúça de modo mais
claro o cumprimento da medida socioeducativa.
c. Controvérsias constitucionais
As principais controvérsias suscitadas pela normatização estão no binômio
punir educar da pena no direito penal juvenil, já que apesar da extensa legislação
protetiva dos direitos da criança e do adolescente, o ato infracional ou conduta
considerada crime, deve ser punido pelo Estado.
e. Argumentação do Tribunal
150
A principal razão exposta na tese aplicada, já que por tratar-se de decisão
monocrática, não temos votos dissidentes e outros posicionamentos além do relator,
Ministro Sebastião Reis Júnior; é a de que nos termos do § 1º do art. 112 do ECA, a
imposição de medida socioeducativa deve considerar a capacidade de seu cumprimento
pelo adolescente, no caso concreto e no caso em questão, a adolescente não possui
capacidade mental para assimilar a medida socioeducativa, que, acaba revestindo-se de
caráter retributivo e não ressocializador, sendo incompatível com os objetivos do ECA.
f. Decisão do Tribunal
A norma da decisão vai no sentido de conceder a ordem (HC) para
“confirmar a liminar já deferida, inserindo a paciente na medida socioeducativa de
liberdade assistida associada ao acompanhamento ambulatorial psiquiátrico,
psicopedagógico e familiar”.
Sendo esta motivada pelo fato de que os fundamentos contidos nas decisões
impugnadas não afastam a conclusão do laudo técnico, no sentido de que a medida de
internação, que já perdura por mais de 2 anos, não trazendo progresso à jovem, que não
mais assimila os benefícios da medida aplicada, necessitando de tratamento
ambulatorial, bem como o estreitamento dos seus vínculos familiares. Para isso, o
relator se utiliza do ECA e a da Constituição Federal brasileira, no que concerne ao
direito da criança e do adolescente e a aplicação de medida socioeducativa.
O resultado da decisão não é facilmente aceito na sociedade, devido o
movimento que se faz para a mitigação de direitos humanos, principalmente quando
tratamos dos jovens em conflito com a lei (que são na maioria das vezes pobres e
periféricos). O atual estado de democracia disjuntiva, já mencionado em capítulos
anteriores nos mostra o quanto o senso comum e o cidadão médio é refratário a garantia
de direitos da juventude infracional.
O principal resultado final tem como benefícios sociais, não apenas a
consolidação da legislação referente à proteção da criança e do adolescente, mas
também a consolidação do estado Democrático de Direito.
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
152
precursor dos demais direitos, uma vez que leva o individuo a desenvolver, com
autonomia, as suas potencialidades como ser humano, além de ser um dos meios mais
eficazes para se alcançar a dignidade da pessoa humana. De modo sintético, pode-se
dizer que a Democracia e educação sempre andam juntas. O direito à educação também
pode ser compreendido enquanto direito social, dimensão dos direitos fundamentais do
homem, consistentes em prestações positivas proporcionadas pelo Estado.
6. O direito à educação comporta os vocábulos educação e ensino, porém
apesar destes serem utilizados como equivalentes, possuem significados distintos, sendo
a educação mais ampla que ensino. Educação envolve processos culturais, sociais,
éticos, familiares, religiosos, ideológicos e políticos presentes ao longo da formação do
indivíduo; ao passo que o ensino é mais pontual, se relacionando a um processo de
aprendizado, direcionado e direto (formação elementar do indivíduo nas ciências,
práticas e saberes constituídos pela humanidade).
Em que pese a Constituição Federal de 1988, a LDB (Lei 9.394, de 20 de
dezembro de 1996) ou mesmo o ECA (Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990),
empregarem os vocábulos muitas vezes enquanto sinônimos, concluímos que o ensino é
“um capítulo da educação de uma pessoa”, mais ampla e por isso relacionada aos
diferentes processos socioculturais que formam o indivíduo.
7. A educação fortalece os liames éticos, dignifica o cidadão, amplia seus
horizontes e suas opções intelectuais, morais, sociais, cívicas e laborais. Ela alavanca o
cidadão para o desenvolvimento; motivos por si só suficientes para a criação de medidas
efetivas que permitam a todos o acesso e a manutenção à/da educação. No concernente
ao ensino público, este deve ser acessível a todos, de qualidade, e investir nos
professores, em programas suplementares (alimentação, material escolar e transporte).
Sendo a igualdade de oportunidades e a garantia de vagas para todos, condições de
realização do ensino público no Brasil.
8. A garantia de implementação e acesso à educação, mais do que um direito
fundamental, é uma obrigação estatal e questão de política pública, principalmente
quando tratamos da oferta educacional para aqueles que estão em fase de
desenvolvimento como as crianças e os adolescentes. Ela abrange tanto o atendimento a
crianças em idade escolar (2-18 anos) em creches, pré-escolas e ensino fundamental,
quanto àqueles que não tiveram acesso à educação na idade própria.
9. Dentre as fontes do Direito Educacional temos a Constituição da
República Federativa do Brasil (artigos 6º e 205 e seguintes da Constituição Federal),
153
que tem como objetivos o pleno desenvolvimento da pessoa; seu preparo para o
exercício da cidadania; e sua qualificação para o trabalho; a lei n. 9.394, de 20.12.96,
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que regulamenta as linhas traçadas
pela Constituição Federal, disciplina a educação escolar, define incumbências como
jurisdição e forma de relacionamento dos Sistemas de Ensino; o Plano Nacional de
Educação, que deve ser fruto de debate dos representantes dos diversos partidos
políticos, entidades e órgãos educacionais; bem como Conselho Nacional de Educação e
outros órgãos relacionados ao tema.
Por sua vez, no âmbito internacional, inúmeros tratados e declarações tratam
do direito à educação, sua promoção e garantia; sendo as principais a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais (PIDESC), a Declaração de Hamburgo, a Declaração Mundial sobre
Educação para todos.
10. A garantia e efetivação de direitos sociais, ditos prestacionais, necessita
de programas de ação, planejamento e investimento, consolidados através de políticas
públicas, no presente estudo, políticas públicas educacionais. Política pública enquanto
programa de ação, quadro de ação governamental, que permite a adoção de medidas
articuladas no sentido de concretizar um direito. Tais medidas perpassam por todas as
funções do Estado: Legislativa, Executiva e Judiciária; uma vez que todas estão ligadas
aos fins do Estado (art. 3º da CF).
Destarte, a atuação do Poder Judiciário na efetivação de direitos
fundamentais, a partir do seu juízo de constitucionalidade de políticas públicas, é
cabível e em alguns casos necessária. Tanto que a jurisprudência ampla e na maioria das
vezes progressista, quando se trata do direito à educação; elevando-o ao patamar de
direito fundamental e entendendo ser de aplicabilidade imediata, principalmente por
envolver a garantia de um direito primordial, prestado especialmente às crianças e
adolescentes.
11. O direito da criança e do adolescente é recente, visto que a infância
apenas passou a ser identificada no tecido social brasileiro no final do século XVII e
início do século XVIII, tendo seu período de maior destaque no século XX com o
avanço do positivismo e da doutrina menorista.
Durante este período crianças e adolescentes pobres e desvalidos ou autores
de infração (binômio criança carente/delinquente) recebiam o mesmo tratamento do
Estado, passando a ser objeto da atenção de médicos, psicólogos e juristas,
154
institucionalizados em casas públicas de custódia, nas quais o modelo compaixão-
repressão era aplicado.
12. Esta realidade somente foi superada com a proteção especial trazida pela
Constituição Federal de 1988 e legislação infraconstitucional que alicerçaram os direitos
da criança e do adolescente, configurando o Sistema Constitucional Especial de
Proteção. Sistema que deriva do disposto nos artigos 226, 227, 228 e 229 da
Constituição Federal, tendo nos princípios da prioridade absoluta, da tutela diferenciada
e da igualdade seu alicerce principiológico.
Conforme vimos ao longo do trabalho, a proteção especial e o tratamento
diferenciado se dão a partir do pressuposto de que crianças e adolescentes são seres
vulneráveis e em formação, necessitando de tratamento especial por parte do legislador.
A Constituição não distingue, assim, os direitos fundamentais da criança e adolescente
em classes, estando todos no rol de direitos do seu artigo 227, devendo o Estado adotar
uma postura ativa em relação a esses direitos.
13. O tratamento diferenciado dispensado às crianças e adolescentes
engloba, assim, a Doutrina do Respeito à Peculiar Condição de Pessoa em
Desenvolvimento (uma vez que eles se encontram em processo formação física,
psíquica, moral, etc., demandando proteção jurídica especial e o reconhecimento de
direitos especiais, permitindo-lhes construir suas potencialidades e desenvolver sua
personalidade para a vida adulta); a Doutrina da Prioridade Absoluta (na qual Estado,
sociedade e família devem assegurar o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e
à convivência familiar e comunitária das crianças e adolescentes, com prioridade
absoluta); e a Doutrina da Proteção Integral (devendo os direitos fundamentais das
crianças e dos adolescentes receber proteção integral).
14. Concluímos que a Constituição Federal, ao priorizar a efetivação dos
direitos fundamentais das crianças e adolescentes, fez mais do que fixar os direitos
individuais e sociais, pois para serem efetivados o Estado e os órgãos públicos, privados
e entidades da sociedade civil devem ter uma postura ativa e comprometida
socialmente. De tal modo que a rede para a manutenção e promoção do sistema especial
de proteção aos direitos fundamentais das crianças é imensa, sendo a Política Nacional
dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes e o Plano Decenal dos Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes construídos conjuntamente pelo Conselho
155
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), e a Secretaria de Direitos
Humanos (SDH), da Presidência da República.
15. Quando tratamos da criança e do adolescente em conflito com a lei, a
legislação protetiva permanece, mas a justificação social de tal proteção torna-se
conflituosa, sendo muitas vezes proteção e imputabilidade confundidas por impunidade,
havendo grande clamor público por medidas punitivas mais duras, e a crença de que o
adolescente que comete ato considerado crime não responde por seus atos.
Tal discurso distorce o disposto no Sistema Constitucional especial de
proteção aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, confundindo
imputabilidade penal com impunidade. Afinal, o adolescente que comete ato
considerado crime responde por ele, sendo previstas diversas medidas socioeducativas
(artigos 103, 104 e 212 do Estatuto da Criança e do Adolescente.), havendo até a
previsão de internação em estabelecimentos prisionais (privação da liberdade).
16. Enfatizamos que adolescente em conflito com a lei é punido através das
diversas medidas socioeducativas previstas no ECA, sendo a de internação em
estabelecimentos prisionais uma das mais duras. Aos adolescentes sob custódia do
Estado são garantidos os direitos abrigados no ECA e no SINASE, além de toda a
legislação protetiva prevista nacional e internacionalmente.
Quando analisamos o perfil do adolescente em conflito com a lei, este
possui idade média de 16,7 anos, cumprindo medida de internação por atos infracionais
correspondentes a crimes contra o patrimônio (roubo, furto, entre outros), possuem
elevada taxa de reincidência e baixa escolaridade.
Analisando dados do relatório apresentado pelo CNJ, em 2012, sobre a
internação na Fundação CASA de São Paulo, chegamos a um perfil de jovens cujas
famílias desestruturadas, a defasagem escolar e/ou a utilização de substâncias
psicoativas, somadas a uma latente exclusão social, cultural e econômica potencializam
a delinquência, sendo na maioria das vezes apontadas como causadoras do ato
infracional e/ou envolvimento criminal.
17. Concluímos pela responsabilidade estrutural da sociedade, que exclui
social, cultural e economicamente estes adolescentes em situação de conflito. O grande
número de crimes contra o patrimônio nos leva a inferir o desejo de inclusão em uma
sociedade capitalista, que exclui pelo consumo.
18. As medidas socioeducativas tem seu significado material relacionado à
sua essência, o “ser” de seu objeto, elementos informadores a unilateralidade e a
156
obrigatoriedade. Este, caráter sancionatório das MSEs faz com que elas sejam aplicadas
excepcionalmente (excepcionalidade), dentro da lei e da normativa do sistema de
proteção da criança e do adolescente (legalidade), bem como em curtos espaços de
tempo (brevidade).
A importância do potencial instrumentalizador de mudanças da MSE está na
sua finalidade pedagógica. Tanto executor quanto o aplicador estão vinculados aos seus
critérios, princípios e garantias e finalidades, devendo a autoridade judiciária levar em
conta obrigatoriamente as necessidades pedagógicas.
19. A busca de uma pedagogia especificamente destinada ao adolescente
autor de ato infracional constitui-se em desafio permanente dos operadores do sistema
de atendimento e operadores responsáveis pela execução das medidas. O projeto
político-pedagógico da MSEs deve visar fazê-los experimentar respostas e construir
novas alternativas, devendo estimular a flexibilidade, valorizar o vivencial, respeitar o
diferente.
Estudos nos mostram que muitas vezes o ato infracional deriva da busca por
inclusão e reconhecimento, já que estes jovens não vivenciam situações que promovam
seu desenvolvimento enquanto ser humano.
20. O sistema de cumprimento de medida socioeducativa de internação foi
recentemente regulamentado pela lei nº. 12.594, de 18 de janeiro de 2012, que busca
concretizar a comunidade socioeducativa através da gestão participativa, realização de
diagnóstico situacional dinâmico e permanente do programa de atendimento, realização
de assembleias, criação de comissões temáticas ou grupos de trabalho, de rede externa,
de um projeto pedagógico e de uma rotina da unidade e/ou programa de atendimento.
A ação socioeducativa deve respeitar as fases de desenvolvimento do
adolescente através do Plano Individual de Atendimento (PIA) que é elaborado a partir
da acolhida do adolescente com a realização de um diagnóstico polidimensional nas
áreas jurídica, de saúde, psicológica, social e pedagógica, o qual irá embasar as metas e
compromissos do plano individual.
21. O plano socioedutavivo contará com a educação formal, escolarização
que se dá através de diversos projetos conforme o tipo de MSE de privação de liberdade
que o jovem cumpre; sendo multiseriada (ou disseriada) e com currículo diferenciado,
visto o caráter transitório de permanência de alguns alunos na unidade de internação.
Ainda assim, são adotadas as Propostas Curriculares dos Cursos de Ensino Fundamental
e Médio regulares da Rede de Ensino Estadual.
157
Contará igualmente com a educação socioeducativa que consiste em práticas
educativas orientadas para a cidadania, direitos humanos, valores, participação política e
protagonismo, que instrumentalize o indivíduo para mudar as estruturas sociais que o
vulnerabiliza. Para isto a educação deve ser vinculada à família, à comunidade, à
cultura, ou seja, a seu contexto social entendido de maneira ampla.
A educação deve ser, assim, global, social e se dar até o resto da vida,
capacitando o indivíduo a viver em sociedade e comunicar-se, necessitando para isso,
uma relação de abertura, reciprocidade e compromisso.
22. A educação dentro de estabelecimentos de privação de liberdade deve se
dar de maneira ampla e irrestrita, buscando resignificar o adolescente em conflito com a
lei. Em que pese a legislação infraconstitucional de proteção a criança e ao adolescente
ter mais de 22 anos, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ter 16 anos, o
SINASE, que regulamenta a o atendimento socioeducativo tem pouco mais de 1 ano.
Assim, a dado o fato das políticas governamentais serem judiciáveis, a partir
do juízo de constitucionalidade, a pesquisa jurisprudencial realizada buscou verificar
demandas educacionais referentes ao espaço de privação de liberdade. Para isso foram
consultados os sítios eletrônicos do STF – no qual não foram selecionados registros
jurisprudenciais, e do STJ, onde os registros encontrados não se referiam direitamente a
garantia do direito à educação em estabelecimentos de privação de liberdade.
Dentre as decisões encontradas pudemos perceber o quanto os tribunais de
primeira instância ainda não aplicam adequadamente os preceitos do ECA e da
legislação protetiva da criança e do adolescente, negando ordens de habeas corpus,
dificultando a inserção do adolescente em medida socioeducativa de liberdade assistida
associada a acompanhamento (ambulatorial psiquiátrico, psicopedagógico e familiar),
distanciam o jovem da família, além de não se utilizarem do laudo técnico e aplicarem
medidas muito mais penosas do que as regulamentadas no direito penal.
23. Tendo a Constituição como conjunto sistêmico de conteúdo integrado, e
acreditando que todas as funções/poderes do Estado encontram-se vinculados aos
objetivos fundamentais do Estado Brasileiro, constantes no artigo 3º, sendo o Judiciário
legitimado constitucionalmente na conformação ou aplicação de políticas públicas
educacionais. Como a pesquisa jurisprudencial realizada não obteve êxito em encontrar
decisões referentes ao tema, sendo poucas as decisões que tratavam da execução da
MSE, fomos levados a questionar se a demanda educacional nos ambientes de privação
de liberdade não aparece na jurisprudência nacional por não haver demanda, pelo fato
158
do fornecimento educacional estar se dando conforme os parâmetros legais; pela falta de
acesso desta população ao Judiciário ou porque as formas de controle judicial inicial
acabam impedindo que tais demandas cheguem aos Tribunais Superiores,
questionamentos estes, não abordados no presente trabalho, necessitando de pesquisas
posteriores que elucidem essas questões.
24. Diante dessas constatações, é forçoso concluir que, ante as finalidades
da MSE de resignificar o jovem em conflito com a lei e romper com a lógica de
violência e deslocamento social que este vivenciou e vivencia extramuros, e a realizada
dos jovens internados, ainda existe um grande abismo.
Mais do que escolarização, a educação dentro destes espaços deve ser
emancipadora, resignificadora e inclusiva, procurando fornecer a este jovem excluído
socialmente, instrumentos de luta, como capacidade de autodeterminação e de
argumentação, e senso crítico, que o permitam novamente realizar um deslocamento do
infracional, da violência, para o diálogo e a inclusão social. A educação deve também,
ser organizada de modo a atender às peculiaridades de tempo, espaço e rotatividade
deste grupo de indivíduos, buscando contemplar o atendimento em todos os turnos,
propiciando espaços físicos adequados às atividades educacionais, esportivas, culturais,
de formação profissional e de lazer.
25. A medida socioeducativa de internação só demonstrará esta eficácia,
quando deixar de se limitar ao seu caráter eminentemente punitivo, que busca
responsabilizar o adolescente pelas consequências lesivas do ato infracional (de
perceptível a semelhança com a pena criminal), e passar a ser verdadeiramente
educativa, visando processos internos e externos de aprendizagem e de resignificação,
mais do que resocialização.
Em conclusão, a lógica da educação não se coaduna à lógica da punição dos
estabelecimentos de privação de liberdade, de modo que se deve buscar fomentar a
discussão sobre o direito à educação e seu fornecimento nos espaços de privação de
liberdade, não apenas no meio acadêmico, mas principalmente entre aqueles que
aplicam a lei e acompanham a execução da medida socioeducativa.
26. A discussão sobre o fornecimento educacional dos estabelecimentos
prisionais ainda é muito incipiente, havendo inúmeros outros aspectos ainda a serem
abordados tais quais: como articular educação com ausência de liberdade; quais os
pontos de intersecção entre a educação formal e a não-formal, dentre as garantias
processuais asseguradas ao adolescente privado de liberdade, como implantá-las e
159
garanti-las efetivamente; quais os caminhos e práticas adequados para que a MSE de
internação se constitua exclusivamente como medida punitiva; qual o perfil e a
formação dos trabalhadores da área, qual o perfil do juiz executor de MSE na vara da
infância e juventude.
Espera-se que este estudo estimule futuras investigações no campo do
direito e demais áreas relacionadas ao tema.
160
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170
ANEXOS
171
TABELAS SOBRE A INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO BRASIL
Centro-
Brasil (1) Norte (2) Nordeste Sudeste Sul
Oeste
Total
15 a 17 anos 20,2 20,5 39,2 10,6 8,3 14,4
18 anos 18,1 15,5 34,4 11,5 7,9 12,7
19 anos 17,6 16,0 34,6 9,9 8,3 13,0
20 a 24 anos 18,9 17,0 34,1 12,2 10,4 15,2
Homens
15 a 17 anos 24,2 24,8 47,2 12,5 9,3 17,1
18 anos 22,0 18,2 43,8 11,7 6,4 14,9
19 anos 20,3 17,3 43,0 10,5 8,8 14,0
20 a 24 anos 21,9 14,4 41,5 13,0 11,3 19,5
Mulheres
15 a 17 anos 16,2 16,3 31,0 8,6 7,3 11,6
18 anos 14,1 13,0 25,1 8,1 9,5 10,8
19 anos 14,9 14,7 26,3 9,7 7,7 12,1
20 a 24 anos 16,0 14,8 27,0 11,5 9,6 11,1
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro:
IBGE, 1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2) Exclusive a
população rural.
172
Tabela 3 - Média de anos de estudo das pessoas de 10 a 24 anos de idade,
por Grandes Regiões e situação do domicílio, segundo os grupos de idade
Brasil e Grandes Regiões – 1997
Centro-
Brasil (1) Norte (2) Nordeste Sudeste Sul
Oeste
Total
Urbana
Rural
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro:
IBGE, 1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2) Exclusive a
população rural
173
Tabela 4 - Média de anos de estudo das pessoas de 10 a 24 anos de idade,
por grupos de idade e renda mensal familiar per capita, segundo as Grande Regiões
Brasil e Grandes Regiões – 1997
Até 1/4 Mais Até 1/4 Mais Até 1/4 Mais Até 1/4 Mais
do de 2 do de 2 do de 2 do de 2
salário salários salário salários salário salários salário salários
mínimo mínimos mínimo mínimos mínimo mínimos mínimo mínimos
Brasil (1) 2,3 4,2 3,4 6,4 4,5 8,6 4,6 10,6
Norte (2) 2,3 4,0 3,5 5,9 5,1 8,1 5,7 10,3
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro: IBGE,
1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2) Exclusive a
popu -lação rural.
174
Tabela 5 -Taxas de escolarização das pessoas de 4 a 24 anos de idade,
por grupos de idade e situação do domicílio, segundo as Grandes Regiões
Brasil e Grandes Regiões – 1997
5e6 7a 15 a 17 18 e 19 20 a 24
4 anos
anos 14 anos anos anos anos
Total
Urbana
Rural
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro:
IBGE, 1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2) Exclusive a
população rural.
175
Tabela 7 - População residente total e de 0 a 24 anos de idade,
absoluta e relativa, por Grandes Regiões, segundo os grupos de idade
Brasil – 1997
(continua)
Centro-
Brasil (1) Norte (2) Nordeste Sudeste Sul
Oeste
Números absolutos
156 128
População total 003 ###### ###### ###### ###### ######
6 916
0 a 6 anos 21 231 045 ###### 618 ###### ###### ######
1 123
Menos de 1 ano 2 931 013 188 407 929 311 247 466 983 213 206
1 169
1 ano 2 931 514 169 480 941 453 735 425 941 217 148
1 007 1 223
2 anos 3 092 860 165 833 981 639 466 560 219 860
1 167
3 anos 2 990 574 179 965 961 863 410 473 130 202 338
1 039 1 249
4 anos 3 172 197 178 686 222 791 478 332 214 867
1 037 1 167
5 anos 3 083 345 173 816 413 372 481 242 217 341
1 173
6 anos 3 029 542 169 266 999 375 841 468 846 209 790
1 460
7 a 14 anos 26 863 331 186 ###### ###### ###### ######
1 009 1 284
7 anos 3 190 255 166 217 152 083 485 858 237 281
1 081 1 275
8 anos 3 242 917 177 455 598 013 454 065 244 422
1 144 1 325
9 anos 3 381 862 173 320 756 560 486 304 243 556
1 148 1 337
10 anos 3 380 308 184 950 044 778 463 266 237 894
1 136 1 256
11 anos 3 332 069 190 689 266 545 498 464 244 798
1 141 1 380
12 anos 3 430 693 178 667 363 944 493 026 227 388
1 111 1 346
13 anos 3 352 675 190 993 622 938 462 527 234 254
1 177 1 424
14 anos 3 552 552 197 895 452 303 508 563 237 502
1 483
15 a 17 anos 10 399 484 566 329 ###### ###### 371 732 209
1 151 1 486
15 anos 3 617 469 203 219 237 564 510 759 259 783
1 122 1 412
16 anos 3 443 485 179 685 358 975 487 117 236 408
1 044 1 384
17 anos 3 338 530 183 425 150 181 485 495 236 018
1 022 1 333
18 anos 3 205 499 181 931 578 719 427 116 235 458
1 303
19 anos 2 975 400 165 102 878 516 702 407 893 216 353
3 924 5 800 1 960
20 a 24 anos 13 454 058 714 267 961 848 999 1 029 430
176
Tabela 7 - População residente total e de 0 a 24 anos de idade,
absoluta e relativa, por Grandes Regiões, segundo os grupos de idade
Brasil e Grandes Regiões – 1997
(conclusão)
Centro-
Brasil (1) Norte (2) Nordeste Sudeste Sul
Oeste
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro:
IBGE, 1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2) Exclusive a
população rural.
177
Tabela 8 - Proporção de pessoas com rendimento de até 1/2 salário mínimo, per capita,
por Grandes Regiões, segundo os grupos de idade
Brasil e Grandes Regiões – 1997
Fonte: Pesquisa nacional por amostra de domicílios 1997 [CD-ROM]. Microdados. Rio de Janeiro: IBGE, 1998.
(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. (2)
Exclusive a população rural.
178
ORGANOGRAMA FUNDAÇÃO CASA
179
FUNDAÇÃO CASA-SP: NÚMERO DE INTERNOS POR REGIONAL
DRM I - DIV. REGIONAL METROPOLITANA I (Franco da Rocha)
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- 16 40 -
1 CASA Atibaia
adolescentes
CASA Bragança 56
2 - 16 40 -
Paulista adolescentes
CASA Dom
Gabriel Paulino 56
3 - 16 40 -
Bueno Couto – adolescentes
Jundiaí
CASA Sorocaba 56
4 - 16 40 -
I adolescentes
CASA Sorocaba 56
5 - 56 - -
II adolescentes
CASA Sorocaba 96
6 - - 96 -
III adolescentes
CASA Sorocaba 24
7 8 16 - -
IV adolescentes
CASA Franco da 40
8 - 40 - -
Rocha adolescentes
CASA Novo 56
9 - 56 - -
Tempo adolescentes
CASA 80
10 - 80 - -
Jacarandá, adolescentes
CASA Rio 80
11 - 80 - -
Negro adolescentes
80
12 CASA Tapajós - 80 - -
adolescentes
CASA 20
13 - - - 20
Semiliberdade adolescentes
180
Jundiaí
CASA
20
14 Semiliberdade - - - 20
adolescentes
Sorocaba.
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
CASA Ferraz de
- 16 40 -
1 Vasconcelos I
adolescentes
56
2 CASA Ferraz de - 16 40 -
Vasconcelos II adolescentes
44
3 CASA Novo Horizonte - - - 44 -
Guaianazes I adolescentes
44
4 - - 44 -
CASA Guaianazes II
adolescentes
40
5 CASA Encosta Norte - - 40 -
adolescentes
CASA Fazenda do 60
6 - - 60 -
Carmo adolescentes
60
7 CASA Vila Conceição - - 60 -
adolescentes
122
CASA Chiquinha
8 10 40 72 -
Gonzaga
adolescentes
152
9 CASA Itaquera - - 152 -
adolescentes
CASA Semiliberdade 20
10 - - - 20
Azaléia – Zona Leste adolescentes
CASA Semiliberdade 30
11 - - - 30
Fênix – Zona Leste adolescentes
CASA Semiliberdade 30
12 - - - 30
Prof.Paulo Freire- adolescentes
181
Z.Leste
CASA Semiliberdade 20
13 - - - 20
Sabará – Zona Leste adolescentes
CASA Semiliberdade 20
14 - - - 20
Umbó – Zona Leste adolescentes
CASA Semiliberdade 20
15 - - - 20
Uraí – Zona Leste; adolescentes
CASA Semiliberdade 20
16 - - - 20
São Mateus–Zona Leste adolescentes
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
64
- 64 - -
1 CAI Gaivota
adolescentes
170
2 CASA Itaparica - 170 - -
adolescentes
170
5 CASA Rio Nilo - 170 - -
adolescentes
CASA Rio 80
6 - 80 - -
Tocantins adolescentes
170
7 CASA Topázio - 170 - -
adolescentes
130
8 CASA Juquiá - - 130 -
adolescentes
CASA Rio 90
9 - - 90 -
Tâmisa. adolescentes
182
DRM IV - DIV. REGIONAL METROP. IV OESTE (Raposo Tavares)
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- 16 40 -
1 CASA Osasco I
adolescente
56
2 CASA Osasco II - - 56 -
adolescentes
72
3 CASA Pirituba - - 72 -
adolescentes
64
4 CASA Nova Aroeira - - 64 -
adolescentes
72
5 CASA Cedro - - 72 -
adolescentes
90
6 CASA Ipê - - 90 -
adolescentes
60
7 CASA Jatobá - -- 60 -
adolescentes
66
8 CASA Nogueira - - 66 -
adolescentes
CASA Feminina 60
12 - - 60 -
Parada de Taipas adolescentes
CASA Semiliberdade 20
13 - - - 20
Guararema adolescentes
CASA Semiliberdade 20
14 - - - 20
Jacirendi adolescentes
15 CASA Semiliberdade 20 - - - 20
183
Araré adolescentes
CASA Semiliberdade 20
16 - - - 20
Nundiaú adolescentes
CASA Semiliberdade 20
17 - - - 20
Ibituruna adolescentes
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- 16 40 -
1 CASA Itaqua I
adolescentes
30
2 CASA Itaqua II - - 30 -
adolescentes
100
3 CASA Vila Guilherme - - 100 -
adolescentes
80
4 CASA Bela Vista - - 80 -
adolescentes
50
5 CASA Bom Retiro - - 50 -
adolescentes
45
6 CASA Nova Vida - - 45 -
adolescentes
45
7 CASA Paulista - - 45 -
adolescentes
45
8 CASA Ouro Preto - - 45 -
adolescentes
48
9 CASA João do Pulo - - 48 -
adolescentes
56
10 CASA São Paulo - - 56 -
adolescentes
56
11 CASA Belém - - 56 -
adolescentes
184
CASA Semiliberdade 20
12 - - - 20
Alvorada adolescentes
CASA Semiliberdade 20
13 - - - 20
Caetanos adolescentes
CASA Semiliberdade 20
14 - - - 20
Ícaro – Zona Norte adolescentes
Inicial Provisória
1 CASA Maestro 56 - 16 40 -
Carlos Gomes
adolescentes
2 CASA Campinas 56 - - 56 -
adolescentes
adolescentes
4 CASA Laranjeiras 56 - - 56 -
adolescentes
5 CASA Rio 56 - 12 40 -
Claro adolescentes
7 CASA Jequitibá 72 - - 72 -
adolescentes
adolescentes
9 NAI Americana 12 4 8 - -
adolescentes
10 CASA Semiliberdade 20 - - - 20
185
DRVP - DIV. REGIONALV. REGIONAL VALE DO PARAIBA (Jacarei)
Inicial Provisória
1 CASA Arujá 56 - 16 40 -
adolescentes
2 CASA Jacare 56 - 16 40 -
adolescentes
3 CASA Taubaté 56 - 16 40 -
adolescentes
4 CASA Tamoios 96 - 32 64 -
adolescentes
5 CASA Caraguatatuba 56 - 16 40 --
adolescentes
6 CASA Guarulhos I 56 - - 56 -
adolescentes
7 CASA Guarulhos II 56 - 40 16 -
adolescentes
8 CASA Guarulhos 56 - 16 40 -
Feminino adolescentes
9 CASA Lorena 56 - 16 40 -
adolescentes
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
82
CASA Arcebispo
10 16 40 -
1 D.Hélder Câmara
adolescentes
– CASA Franca
CASA 56
2 - 16 40 -
Taquaritinga adolescentes
56
3 CASA São Carlos - 16 40 -
adolescentes
186
56
4 CASA Batatais - 16 40 -
adolescentes
88
5 CASA Araraquara - 16 72 -
adolescentes
CASA Ouro 83
6 - 83 - -
Verde adolescentes
96 em internação e
112
8 CASA Rio Pardo - - 16 em -
adolescentes
internação/sanção
CASA 88
9 - - 88 -
Sertãozinho adolescentes
NAI Ribeirão 5
10 5 - - -
Preto adolescentes
2
11 NAI São Carlos 2 - - -
adolescentes
CASA
20
12 Semiliberdade 20
adolescentes
Araraquara
CASA
20
13 Semiliberdade 20
adolescentes
Barretos
CASA
56
14 Semiliberdade - 16 40 -
adolescentes
Batatais
CASA
20
15 Semiliberdade - - - 20
adolescentes
Ribeirão Preto
CAIP Arcebispo
20
16 D. Hélder Câmara 20 (república)
adolescentes
– CAIP Franca
187
DRL - DIVISÃO REGIONAL LITORAL (Praia Grande)
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- 16 40 -
1 CASA Peruibe
adolescentes
56
2 CASA Mauá - 16 40 -
adolescentes
56
3 CASA Itanhaém - 16 40 -
adolescentes
56
4 CASA Mongaguá - - 56 -
adolescentes
56
5 CASA Praia Grande I - 16 40 -
adolescentes
72
9 CASA Guarujá - 24 48 -
adolescentes
96
10 CASA V São Vicente - 24 72 -
adolescentes
12
11 NAI Santos 12 - - -
adolescentes
CASA Semiliberdade 20
12 - - - 20
Diadema adolescentes
13 CAIP Guarujá. - - - - -
188
DRO - DIVISÃO REGIONAL OESTE (Marilia)
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- - 56 -
1 CASA Araçatuba
adolescentes
56
2 CASA Irapuru I - 40 16 -
adolescentes
56
3 CASA Irapuru II - - 56 -
adolescentes
56
4 CASA Mirassol - - 56 -
adolescentes
84
6 CASA Araçá - 24 60 -
adolescentes
88
7 CASA Marilia - 24 64 -
adolescentes
56
8 CASA Tanabi - 40 16 -
adolescentes
CASA Semiliberdade 20
11 - - - 20
Fernandópolis adolescentes
CASA Semiliberdade 20
12 - - - 20
São Jose Rio Preto adolescentes
CASA Semiliberdade 20
13 - - - 20
Marília adolescentes
189
DRS - DIVISÃO REGIONAL SUDOESTE
Atendimento Internação
Internos Internação Semiliberdade
UNIDADE
Inicial Provisória
56
- 16 40 -
1 CASA Botucatu
adolescentes
CASA Feminino 56
2 - 16 40 -
Cerqueira Cesar I adolescentes
CASA Feminino 56
3 - - 56 -
Cerqueira Cesar II adolescentes
56
4 CASA Cerq Cesar III - 16 40 -
adolescentes
56
5 CASA Esperança - 16 40 -
adolescentes
88
8 CASA Bauru - 16 72 -
adolescentes
CASA Semiliberdade 20
11 - - - 20
Bauru adolescentes
Obs.: Pelos dados do site da Fundação CASA nas regionais DRMC Campinas (unidade CASA Rio
Piracicaba) faltam 04 internos e na unidade DRN Ribeirão (CASA Arcebispo D. Hélder Câmara – CASA
Franca) faltam 16 internos - apresentados no número geral de internos, mas não indicados quanto a
medida que cumprem. (faltando um total de 20 adolescentes).
JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
190
191
192
193
194
195
196
197
198
199
200
201
202
203
204
205
206
207
208
209
210
QUADRO SISTEMATIZADO DE JURISPRUDÊNCIA
1
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação – Reclusão número 1398871/2, da Comarca de Americana - 2- V.C. (PROC. H4/98), EM QUE É: APELANTE
ALESSANDRO FERREIRA DA SILVA APELADO MINISTÉRIO PUBLICO ACORDAM, EM SÉTIMA CÂMARA DO TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL,
PROFERIR A SEGUINTE DECISÃO: NEGARAM PROVIMENTO. V.U. NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, EM ANEXO. PRESIDIU E PARTICIPOU DO
JULGAMENTO O SR.JUIZ SOUZA NERY (REVISOR), PARTICIPANDO AINDA, O SR. JUIZ SALVADOR D'ANDRÉA (3. JUIZ).
2
Ação civil pública. Reexame necessário. Instalação e manutenção de programa de acolhimento institucional destinado a crianças e adolescentes em situação de risco. Medida
de proteção que se insere na política de atendimento instituída pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e constitui prioridade social, de sorte a dar efetividade ao comando
da Constituição Federal (art. 227).
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Número Data do
Autor/Apelante/ Réu/Apelados/ Votação/
do Natureza julgament Origem Relator Ementa
Recorrente Recorridos Resultado
processo o
RS MINISTÉRIO PÚBLICO Ministro
Nº 09 de
1 1.319.70
RECURSO
outubro de
(2012/007266 W DE O DOS S (MENOR) DO ESTADO DO RIO Recurso especial SEBASTIÃ 3
ESPECIAL 0-6) REPR: A M DA C O GRANDE DO SUL improvido. O REIS
4 2012
JÚNIOR
CRISTINA SON - TRIBUNAL DE JUSTIÇA MINISTRO 4
30 de SP
Nº HABEAS DEFENSORA PÚBLICA E DO ESTADO DE SÃO SEBASTIÃ
2 novembro (2011/026950 HC concedido
224.583 CORPUS OUTRO - S. D. A. PAULO O REIS
de 2011 0-4)
(INTERNADO) JÚNIOR
DEFENSORIA PÚBLICA
DO DISTRITO FEDERAL
TRIBUNAL DE JUSTIÇA MINISTRO
23 de DF ADVOGADO: LUIS
Nº HABEAS DO DISTRITO OG
3 outubro de (2008/019549 CLÁUDIO VAREJÃO DE HC concedido
212 114.859 CORPUS FEDERAL E DOS FERNAND
2008 8-6) FREITAS - DEFENSOR
TERRITÓRIOS ES
PÚBLICO
PACIENTE: L B DE L
DEFENSORIA PÚBLICA
DO ESTADO DE MATO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA MINISTRO
GROSSO DO
MS DO ESTADO DE MATO ARNALDO
Nº HABEAS 10 de maio SUL E ADV: CACILDA
4 (2007/010514 GROSSO DO HC concedido ESTEVES
82.606 CORPUS de 2007 KIMIKO NAKASHIMA -
0-1) SUL LIMA
DEFENSORA PÚBLICA
PACIENTE: J C R DA S
PACIENTE: R R DE L
3
RECURSO ESPECIAL. DIREITO PENAL. LEI N. 8.069/1990. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MEDIDA SÓCIOEDUCATIVA DE
INTERNAÇÃO. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ESTUPRO. VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA À PESSOA. DECISÃO JUDICIAL
FUNDAMENTADA. ACÓRDÃO A QUO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. SÚMULA 83/STJ.
4
HABEAS CORPUS. ECA. MEDIDA DE INTERNAÇÃO.
NECESSIDADE DE TRATAMENTO AMBULATORIAL. MEDIDA DE CARÁTER MERAMENTE RETRIBUTIVO. ILEGALIDADE. Ordem concedida para que a
paciente seja inserida na medida socioeducativa de liberdade assistida, associada ao acompanhamento ambulatorial psiquiátrico, psicopedagógico e familiar.