Artigo Sobre Boderline

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Revista Psicologia e Educação On-Line

2019, Vol. 2, Nº 1, 36 - 46
Submetido: 25/06/2019
Aceite: 10/07/2019

Avaliação Neuropsicológica – Transtorno de Personalidade Borderline


com Comportamento de Automutilação
Evaluación neuropsicológica - Trastorno límite de la personalidad con
comportamiento auto-compulsive
Neuropsychological Assessment - Borderline Personality Disorder with Self-
Compulsive Behavior

Juliana Corrêa da Silva


Universidade da Beira Interior, Portugal
E-mail: [email protected]

Luís Maia
Universidade da Beira Interior, Portugal
E-mail: [email protected]

36
Silva, Maia 38
Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação RP&E online V2N1 2019

Avaliação Neuropsicológica – Transtorno de Personalidade Borderline


com Comportamento de Automutilação
Evaluación neuropsicológica - Trastorno límite de la personalidad con
comportamiento auto-compulsive
Neuropsychological Assessment - Borderline Personality Disorder with Self-
Compulsive Behavior

Silva, Maia
Universidade da Beira Interior, Portugal
Resumo
A perturbação do Transtorno da Personalidade Borderline (TPB) é uma perturbação que se caracteriza pela delimitação do estado-limite, onde o
paciente navega constantemente entre os campos da neurose e da psicose, apresentando manifestação repetitivas de ansiedades crônicas,
fobias, obsessões, compulsões, sintomas de conversão bizarra, dissociações, hipocondria, tendência sexuais perversas, tendências constantes a
impulsividade, uso abusivo de drogas, álcool e medicação, labilidade emocional, grandes necessidades de exibicionismo, sentimentos crônicos de
vazio, dificuldades de desvinculações, dificuldades de sustentação de vínculos, comportamentos auto lesivos, dentro outros (Pereira, 1999). É
importante recolher dados da história de vida do paciente e dos comportamentos atuais repetitivos que são apresentados. Os primeiros sintomas
potenciais emergem normalmente na adolescência e no início da fase vida adulta, repercutindo assim por toda a vida, os diagnósticos são mais
comuns após os 17 anos de idade (APA, 2014). Os sintomas tendem a diminuir quando ocorre tratamento adequado, com acompanhamento
contínuo médico, psicológico e medicamentoso. A importância por parte da avaliação neuropsicológica está associada ao estudo aprofundado
das funções cognitivas, das funções emocionais e comportamentais que são apresentadas por esses sujeitos, permitindo assim tratamentos e
acompanhamentos adequados. A neuropsicologia pode fazer a utilização de vários testes, o profissional é quem decide quais os mais pertinentes
e adequados para cada caso, no entanto, a avaliação não se baseia apenas em testes, cabendo ao profissional buscar outras técnicas de
intervenção pertinentes ao diagnóstico (Pastore, Lisboa, 2014). Ao longo do processo, é importante que a família se faça presente, junto o
desenvolvimento do trabalho para observação das melhorias e dos comportamentos persistentes que acompanham o paciente.

Palavras-chave: Adolescentes, Adultos, Transtorno, Personalidade Borderline, Impulsividade, Comportamento Auto Lesivo
Abstract
The disturbance of Borderline Personality Disorder (BPD) is a disorder characterized by the delimitation of the state limit where the patient
navigate constantly between the fields of neurosis and psychosis, with repetitive manifestation of chronic anxieties, phobias, obsessions,
compulsions, symptoms of bizarre conversion, dissociation, hypochondriasis, perverse sexual tendency, constant tendency to impulsivity, drug
abuse, alcohol and medication, emotional lability, great needs of exhibitionism, chronic feelings of emptiness, difficulties layoff, links support
difficulties, self-injurious behaviors, in others (Pereira, 1999). It is important to collect data from the patient's life history and the current
repetitive behaviors that are presented. The first potential symptoms usually emerge in adolescence and early adulthood phase, thus impacting
for life, diagnoses are more common after the age of 20 (APA, 2014). Symptoms tend to decrease when appropriate treatment occurs, with
continuous medical, psychological and drug monitoring. The importance of neuropsychological assessment is associated with the in-depth study
of the cognitive functions, emotional and behavioral functions that are presented by these subjects, thus allowing appropriate treatments and
follow-up. Neuropsychology can make use of several tests, the professional is the one who decides what the most relevant and appropriate for
each case, however, the assessment is not based solely on testing, health professionals should seek other relevant intervention techniques to the
diagnosis (Pastore, Lisbon, 2014). Throughout the process, it is important for the family to be present, along with the development of the work
to observe the improvements and the persistent behaviors that accompany the patient.

Keywords: Adolescents, Adults, Disorder, Borderline Personality, Impulsiveness, Auto Lesivo Behavior. .
Resumen
El trastorno de trastorno de personalidad limítrofe (DBP) es un trastorno caracterizado por la delimitación del estado límite, donde el paciente
navega constantemente entre los campos de neurosis y psicosis, presentando manifestaciones repetitivas de ansiedades crónicas, fobias,
obsesiones, compulsiones. síntomas de conversión extraña, disociaciones, hipocondrias, tendencia sexual perversa, tendencias constantes a la
impulsividad, uso abusivo de drogas, alcohol y medicación, labilidad emocional, grandes necesidades de exhibicionismo, sentimientos crónicos
de vacío, dificultades de desapego, Conductas autolesivas, en otros (Pereira, 1999). Es importante recopilar datos de la historia de vida del
paciente y los comportamientos repetitivos actuales que se presentan. Los primeros síntomas potenciales usualmente surgen en la adolescencia
y en la vida adulta temprana, lo que afecta a lo largo de la vida; los diagnósticos son más comunes después de los 17 años (APA, 2014). Los
síntomas tienden a disminuir cuando se produce el tratamiento adecuado, con un control médico, psicológico y farmacológico continuo. La
importancia de la evaluación neuropsicológica está asociada con el estudio en profundidad de las funciones cognitivas, las funciones
emocionales y de comportamiento que presentan estos sujetos, lo que permite tratamientos y seguimientos adecuados. La neuropsicología
puede hacer uso de varias pruebas, el profesional es el que decide cuáles son las más pertinentes y adecuadas para cada caso. Sin embargo, la
evaluación no solo se basa en las pruebas, sino que también depende del profesional buscar otras técnicas de intervención pertinentes para el
diagnóstico (Pastore , Lisboa, 2014). A lo largo del proceso, es importante que la familia esté presente, junto con el desarrollo del trabajo para
observar las mejoras y los comportamientos persistentes que acompañan al paciente.

Palabras clave: adolescentes, adultos, trastorno, personalidad limítrofe, impulsividad, comportamiento autolesivo.
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RP&E online V2N1 2019 Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação

O Diagnóstico de Saúde Mental (DSM) - 5 reporta que o transtorno


borderline é caracterizado essencialmente por padrões relacionados a
A denominação inglesa da palavra “borderline” significa fronteiriço
instabilidade interpessoal, instabilidade na representação da
ou linha que compõe a margem, traçando a delimitação característica
autoimagem, nos afetos, e uma marcada impulsividade associada aos
de um estado considerado como sendo de caráter limite (estado-
comportamentos autodestrutivos. Segundo as descrições do manual
limite). A designação de fronteiriço está associada ao fato de o
diagnóstico de saúde mental, os transtornos de personalidade estão
Transtorno de Personalidade Borderline está em um constante
inclusão na denominação do grupo B, juntamente com a
cruzamento entre os campos de estrutura neurótica e da estrutura
categorização dos transtornos da personalidade antissocial,
psicótica (Scherer, 2016). Alguns traços subjetivos do indivíduo
transtornos da personalidade histriônica e também o transtorno
navegam sobre os mares fragmentados da alucinação e do delírio
narcisista (Scherer, 2016).
constituintes do campo da psicose, outras vezes, navegam sobre a
lucidez e o contato com a realidade concreta no campo das neuroses, Nos critérios diagnósticos do DSM - 5 é possível retratar nove critérios
sendo assim, fica evidente que o perfil borderline oscila em ambas as básicos para o diagnóstico de transtorno de Personalidade Borderline,
estruturas psíquicas. cinco sintomas mínimos devem estar presentes para que seja
realizado o diagnóstico médico de transtorno, visto que, possuem
A patologia de Transtorno de Personalidade Borderline ou mesmo a
pacientes que apresentam todas as sintomatologias associadas ao
caracterização do conhecido estado-limite, atravessa nas pesquisas
transtorno (Silva, 2014), sendo elas:
uma temática de conceito bastante controverso e difuso, onde,
localiza-se basicamente num terreno intermediário entre dois Esforços desesperados para evitar abandono real ou abandono
imaginado (p. ex., fins de relacionamentos, perdas de emprego,
discursos teóricos. O termo borderline refere-se à inserção do sujeito
desvinculações afetivas, perda de um lugar social que se acredita
entre o funcionamento neurótico e também do funcionamento obter).
psicótico, com uma perspectiva de alternação contínua, sendo assim, Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos
esses pacientes não podem ser classificados em um único campo, caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e
desvalorização (p. ex., eu amo muito determinada pessoa e/ou
flutuando subjetivamente em ambos durante toda a constituição odeio muito determinada pessoa, perspectiva forte do amor/
psíquica da vida, é importante ressaltar que uma das maiores marcas ódio).
da personalidade borderline é a ausência ou a impossibilidade de Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e persistente da
autoimagem ou da percepção de si mesmo (p. ex., identidade
construir um processo empático para com o outro (Silva, 2014). sexual, transtornos alimentares associados).
A representação do Transtorno de Personalidade Borderline versa Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente
autodestrutivas (p. ex., gastos excessivos, sexo sem proteção,
sobre a dinâmica limiar entre a esfera da razão e a esfera do completo abuso de substância, direção irresponsável, compulsão
desespero, onde ocorre a constante oscilação entre a difusão do alimentar).
processo da razão e da loucura. Sendo assim, esses indivíduos em Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de
comportamento de automutilação. (p. ex., tentativas de suicídio,
parte são capazes de controlar seus limites e impulsos de ódio e em ideações suicidas, auto perfurações).
outros momentos se debruçarem sobre a não contenção das pulsões
Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor
da fragmentação da loucura, em alguns casos se apresentam com (p. ex., disforia episódica, irritabilidade ou ansiedade muito
frequência, por exemplo, o comportamento auto lesivo (Silva, 2014). intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas
raramente de mais de alguns dias).
Os transtornos de personalidade são conceitualizados como um Sentimentos crônicos de vazio. (p. ex., sentimento de desesperança,
padrão persistente de vivencias, de experiências, de atitudes e de solidão, isolamento, esquivas sociais).
comportamentos que não são bem aceitos pelo contexto social, visto Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controlá-la, por
questões relacionadas ao impulso (p. ex., mostras frequentes de
que, é caracterizada como um padrão de ordem difusa e de caráter irritabilidade, sentimentos de raivas constantes, brigas físicas
inflexível para com o seu mundo exterior. O transtorno possui recorrentes).
comumente sua manifestação inicial de desenvolvimento na fase da Ideação paranoide transitória associada ao estresse ou sintomas
dissociativos intensos. (p. ex., desconfianças sem motivos
adolescência ou na passagem para a vida adulta, perpetuando- se aparentes, suspeitas para com os outros, dificuldades em estreitar
assim ao longo da vida, acarretando ao sujeito, grandes sobrecargas os vínculos).
de sofrimentos e dificuldades de construção de vínculos afetivos, Dentre essas características existem três delas que são mais
comportamentos de automutilação, fortalecimento de inserções predominantes e comuns para o transtorno Borderline,
sociais e sustentação das relações pessoais (APA, 2014). nomeadamente a impulsividade em pelo menos duas áreas
potencialmente autodestrutivas (suicídio e autolesão), um padrão de
Segundo as conceptualizações do CID – 10, o transtorno borderline
relacionamentos interpessoal instável e intenso caracterizado pela
constitui características relacionadas as sucessivas instabilidades
alternância entre extremos de idealização e desvalorização e também
emocionais e fragmentadas, sentimentos crônicos constantes de vazio
a instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade e
e solidão, grandes tendências a se envolver em relacionamentos com
mudança constante de humor.
traços de intensidade e instabilidade afetiva, esforços constantes para
não se deparar com o abandono do outro, repetidas ideações suicidas, Verifica-se aqui que existe um consenso parcial da conceitualização do
tentativas suicidas e comportamentos auto lesivos (OMS,1993). Transtorno de Personalidade Borderline, visto que, ainda existem
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Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação RP&E online V2N1 2019

vivencias relacionadas ao processo da perda ainda na infância são


algumas divergências das caracterizações básicas do desenvolvimento,
acontecimentos potencializadores para o surgimento e/ou construção
sintomas e/ou etiologia do transtorno. Ao longo do artigo
subjetiva do transtorno. Isso não quer dizer que todas as crianças que
discutiremos sobre o comportamento auto lesivo em sujeitos que
apresentem processos de perdas vão desenvolver a condição, mas os
possuem o Transtorno de Personalidade Borderline e quais as
autores enfatizam que os estudos demarcam que 20% a 40% dos
repercussões associadas aos comportamentos de automutilação.
diagnósticos experimentaram situações traumáticas de perda da mãe
ou perda do pai e/ou figura de cuidador (Pastore, Lisboa, 2014).

Metodologia Outro fator marcadamente potencializador é a experiencia


traumática de abuso sexual infantil, alguns estudos apontam que 80%
Para a realização da meta-análise sobre a avaliação neuropsicológica
dos indivíduos que obtiveram diagnóstico do transtorno, retratam em
em pacientes com Transtorno de Personalidade Borderline, foram
suas experiencias de vida o abuso sexual, comumente vinculado ao
necessárias pesquisas bibliográficas em artigos periódicos,
ambiente familiar (Pastore, Lisboa, 2014). No entanto, foram
dissertações e teses. Para a busca do material de estudo foram
possivelmente crianças que sofrem de abuso, mas que não recebem
utilizadas as bases de dados de Scielo e Google Acadêmico, onde
nenhum suporte social e familiar para elaborar a situação traumática
foram realizadas as pesquisas dos conceitos chaves sobre “Avaliação
precoce.
Neuropsicológica do Transtorno Borderline”, “Sintomas do Transtorno
de Personalidade Borderline”, “Comportamento Auto lesivo”, Em outros estudos, pacientes com diagnóstico médico borderline,
“Borderline Personality Disorder” e “Manual Diagnóstico e Estatístico retratam uma história contínua que desgastes emocionais desde a
de Transtornos Mentais”. As periodicidades das referências primeira infância, nomeadamente reportam, a ausência de afeto,
bibliográficas foram limitadas entre o intervalo de 1993 e 2017, e as amor e carinho maternal, conflitos agressivos com a figura paterna,
línguas foram o Português-PT, Português-BRA e Inglesa. Após as explosões de raiva dirigidas à criança por parte do pai, separação ou
revisões bibliográficos foram selecionados os artigos considerados abandono ainda muito precoces, crueldade, hostilidade, agressividade
pertinentes para a elaboração da pesquisa. e maus tratos, negligência, constantes ausências da figura materna,
brutalidade prolongadas por parte as figuras parentais (Soure, 2011).
Para a análise dos dados será realizado uma seletividade de todos os
É importante observar que a etiologia e a origem do transtorno
materiais que foram localizados ao longo da pesquisa sobre a
borderline, tendencialmente estão muito relacionadas as vivencias de
avaliação neuropsicológica da personalidade borderline. Em seguida
um trauma por maus-tratos na primeira infância, onde, os traumas
será realizada uma análise qualitativa dos dados que tem como ponto
são apresentados pelas figuras parentais e/ou figuras de segurança e
de partida o objetivo secundário da avaliação neuropsicológica em
apoio.
sujeitos que são portadores do transtorno de Personalidade
Borderline com comportamentos de automutilação. A etiologia dos comportamentos auto lesivos é muito complexa e
ainda sem uma definição concreta, visto que, o comportamento de
automutilação é caracterizado como sendo uma estratégia que o
Etiologia sujeito encontra para lidar com as sensações de vazio e de não
realidade exterior. Os comportamentos de automutilação podem
Os estudos apontam que existem muitos fatores etiológicos estar relacionados com um mecanismo de defesa utilizado pelo
associados a constituição de um Transtorno de Personalidade sujeito, ou mesmo uma estratégia de caráter muito primitiva, que não
Borderline em um sujeito, fatores esses que podem ser de ordem tem uma elaboração saudável e/ou positiva (Garreto, 2015).
biológicas e experienciais. Como por exemplo, existem marcadores
associados a genética, a hereditariedade, a experiencias de rupturas e
separações na infância, experiencias de perda, abuso infantil, Prevalência
ambiente familiar agressivo e conturbado, vivencias em ambientes
caóticos e negligentes (Pastore, Lisboa, 2014). Sendo assim, é comum Segundo o Diagnóstico Saúde Mental (DSM) - 5 a prevalência média
observar em pacientes que receberam diagnósticos do transtorno de social do Transtorno da Personalidade Borderline na população
personalidade obtiveram problemáticas muito persistentes e mundial é estimada entre 1,6%, esta média, no entanto, pode chegar
traumáticos no campo infantil, situações essas que comumente são até os 5,9%, nos casos em que não ocorre devido diagnóstico prévio.
bem precoces e marcadamente sem processo de construção de Esta acentuada prevalência está associada a 6% dos pacientes que são
resiliência. Outros autores reportam que a etiologia do transtorno da atenção primária, 10% dos pacientes da área ambulatorial de
borderline está fortemente associada aos fatores genéticos, fatores saúde mental e 20% dos pacientes que se hospitalizam nas diversas
constitucionais, familiares, bioquímicos, psicodinâmicos e instituições de saúde (APA, 2014).
psicossociais (Kernberg, 1995). Os autores cruzam muitas informações
O Transtorno da Personalidade Borderline é diagnosticado em cerca
no que diz respeitos as possibilidades etiológicas do transtorno.
de 75% dos casos no sexo feminino, o diagnóstico do transtorno é
Não existe um fator determinante para a concretização do transtorno comumente realizado entre o fim da adolescência e o início da vida
na vida humana, no entanto, chama-se atenção para o fato de que as
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adulta, podendo ser um fator variável (APA, 2014). pressupõe uma possível indefinição ou mesmo uma considerável
insegurança em várias fronteiras relativas a mecanismos de regulação
Nos comportamentos auto lesivos e/ou de automutilação a
e demarcações relativas ao psiquismo do sujeito que sofre com o
prevalência entre os sexos está relacionada com a maior frequência ao
transtorno (Silva, 2014). Como por exemplo, fragmentações no que diz
gênero feminino, corrobora-se que os comportamentos iniciam na
respeito ao processo da fantasia e da realidade, do corpo e da mente,
adolescência, em meados dos 17 anos de idade, e se perpetuam para a
da ação e aos pensamentos, do real e do imaginário, dentre outras
vida adulta, com comportamentos que geralmente são bastante
rupturas.
semelhantes de um sujeito para o outro (Garreto, 2015).
É muito recorrente observar que sujeitos com personalidade
borderline possuem uma crença muito forte de que algo ou alguém
Sintomatologia constantemente o quer ameaçar/prejudicar ou quer romper com as
suas relações com o mundo exterior. Por essas e outras crenças
Existem alguns sintomas marcadamente relacionados ao Transtorno
apresentadas que os pacientes borderline perdem as fronteiras
de Personalidade Borderline, levando em consideração que, possuem
básicas de relação com o outro, sendo assim, é possível considerar que
pacientes que apresentam poucas sintomatologias associadas e outros
esses pacientes vivem uma constante relação de proximidade versos
apresentam grande parte do quadro borderline sendo eles: 1) O
uma relação de afastamento contínuo (Silva, 2014). Cruzando assim, a
Narcisismo; 2) Sangramento psíquico; 3) Hipersensibilidade
perspectiva de constantes e repetidas relações instáveis e não
desordenada; 4) Rigidez psíquica; 5) Tendência a reações terapêuticas
duradouras com o outro.
conturbadas/negativas; 6) Sentimentos e/ou complexo de
inferioridade; 7) Masoquismo; 8) Insegurança “somática”; 9) O sujeito que desenvolve o transtorno de personalidade possui
Mecanismos de projeção constantes; 10) Dificuldades para testar o notoriamente uma agressividade e uma devastadora instabilidade
processo da realidade (Pereira, 1999). afetiva, visto que, as tendências associadas a ordem das
impulsividades são muito presentes e frequentes em sua dinâmica de
Os comportamentos de risco são em muitas vezes apresentados
vida. Existem alguns padrões diagnósticos que são fundamentais para
também nas sintomatologias da personalidade borderline, risco esses
caracterizar a patologia, visto que, não necessariamente o paciente
que podem estar relacionados a comportamentos de ideação e
precisa apresentar todos os padrões de comportamentos para possuir
tentativa suicida, comportamentos auto lesivos, comportamentos
diagnóstico. Alguns sintomas são importantes a observação do clínico,
sexuais sem cuidado e/ou preservação e também muitas vezes se
como cita Pereira (1999): uma manifestação repetitiva de ansiedade
colocam em situações de risco social (Gunderson, 2008). Os
crônica, fobias, obsessões, compulsões, sintomas de conversão
comportamentos de riscos geram, em algumas situações a pacientes
bizarra, dissociações, hipocondria, tendência sexuais perversas e com
borderline, sentimentos de satisfação e de desejos que são
natureza polimórficas, tendências constantes a impulsividade, uso
inconscientes, ou seja, ele se depara com a situação adversa perigosa
abusivo de drogas e álcool, labilidade emocional, grandes
e negativa e não compreender que a situação tem caráter
necessidades de exibicionismo, sentimentos crônicos de vazio,
autodestrutivo e perigoso.
comportamentos auto lesivos.
A pulsão autodestrutiva relacionada com os comportamentos auto
Além da dinâmica constante presente de agressividade, impulsividade
lesivos também se levam em consideração nos comportamentos de
e de instabilidade afetiva e emocional, o Transtorno de Personalidade
risco, onde, o sujeito traça o comportamento de lesão como um
Borderline pode ser acentuado e trazer também sintomatologias de
instrumento e/ou técnica de livrar-se da tensão e angustia vivenciada.
ideação e de tentativas e pulsões relacionadas ao suicídio, o que
Por exemplo, o sujeito tem um sofrimento existencial por conta da
agrava ainda mais o tratamento e seu posterior prognóstico médico
separação de um casamento, e em um determinado dia sente-se só e
(Scherer, 2016). Visto que, não existe a possibilidade de uma
confuso, ao invés de elaborar o sentimento da perda do parceiro,
modificação da estrutura da personalidade subjetiva, no entanto, é
corta os pulsos como um mecanismo de compensação e punição
possível que com tratamento e acompanhamento adequado o sujeito
inconsciente.
consiga ter uma melhor qualidade de vida e formas mais adaptativas
Alguns autores defendem a perspectiva de que o paciente com o de funcionamento e convívio social, sem maiores prejuízos pessoais e
transtorno de personalidade possui uma mente nomeadamente sociais.
perturbada e fragmentada, possuindo relações vinculares que são
Dentre as características sintomatológicas apresentadas, o narcisismo
caracterizadas como sendo muito intensas, mas com vinculações
é uma das bases de construção do quadro clínico do paciente
marcadamente instáveis. Esses pacientes com frequência apresentam
borderline, ou seja, via regra geral, pacientes que possuem
angustia de abandono, variações afetivas bruscas, como por exemplo
diagnóstico médico possuem comportamentos de ordem narcísica. A
o amor/ódio, comportamentos muito constantes de agressividade e de
constituição do narcisismo está muito associada a sujeitos que
raiva, acompanhados quase sempre com o sentimento de
vivenciaram situações muito devastadoras e de ordem traumáticas,
impulsividade, fragmentação e ruptura (Gunderson, 2008).
como por exemplo, experiencias muito primitivas de abandono,
A denominação do termo borderline na contemporaneidade violência, agressividade, negligência, brutalidade, maus tratos e
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Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação RP&E online V2N1 2019

real da prática da automutilação, onde, existe uma resposta muito


crueldade. Compreende-se que experiencias negativas com essa
rápida aos estímulos aversivos que são apresentados, trazendo assim
dinâmica, repercutem em profundas lesões narcísicas relacionadas ao
repercussões ao comportamento de risco. (Garreto, 2015).
amor, ao autoconceito, a segurança e a autoconfiança frente as
situações adversas da vida (Scherer, 2016 citado por Stern, 1999). Os comportamentos de automutilação são caracterizados em três
categorias, sendo elas, a categoria leve, a moderada e grave,
Segundo os perfis traçados no DSM – 5 (2014), o percurso de
predominante em ambos os sexos. Os comportamentos leves estão
desenvolvimento do Transtorno da Personalidade Borderline é muito
relacionados a morder-se, arranhar-se e fazer-se sentir dor intensa; os
inconstante e variável, visto que, os padrões iniciais mais comuns em
comportamentos moderados estão associados a bater, arrancar
geral são: a constante presença de instabilidade em esfera crônica no
cabelo, inserção de objeto no corpo e/ou auto tatuagem; e os
início da vida adulta, descontrole dos afetos, perda do auto controle
comportamentos graves são os relacionados ao cortar, sangrar e
(automutilação), descontrole dos impulsos para com o outro, uso
queimar (Garreto, 2015).
demasiado de medicamentos e psicotrópicos e posteriormente a
procura inicial por ajuda de especialistas (APA, 2014). Alguns comportamentos de automutilação comuns a pacientes com
personalidade borderline podem ser considerados como, por exemplo,
É comum que dentro das repercussões sintomatológicas os
cortes constantes na pele, cutucar e/ou mexer em ferimentos, morder-
especialistas observem uma tendência muito flutuante para a vivência
se, bater-se, cutucar áreas do corpo até sangrar, esfolar a pele,
de emoções bastante intensas, abruptas, marcada por grandes
queimar-se, arrancar os pelos de vários hemisférios do corpo, inserir
impulsividades, demasiadas intensidades nos relacionamentos
objetos sob a unha, auto tatuagem, cortar o punho, dentre outros
externos, alta incongruência e constantes dificuldades de
(Garreto, 2015). A repetição dos comportamentos irá depender das
desvinculações (APA, 2014). É muito alta a probabilidade de que os
impulsividades que estão associadas a constituição subjetiva do
sintomas mais graves se mantenham ao longo de toda a vida,
paciente, podendo assim, o paciente apresentar dos comportamentos
posteriormente, diminuindo sua intensidade com os processos
mais leves até os comportamentos mais graves.
psicoterápicos, uso de psicotrópicos e acompanhamento médico
contínuo. Alguns autores divergem e outros convergem nas sintomatologias
que são apresentadas, mas de forma geral, entram em concordância
É perceptível quem pacientes diagnosticados com o transtorno de
de como o Transtorno da Personalidade Borderline e os
personalidade possuem características com frequência de apresentar
comportamentos de automutilação se manifestam e trazem
sentimentos de insegurança para com o mundo exterior, onde
repercussões de sofrimento e solidão no desenvolvimento e percurso
enraízam a conexão de que a pessoas estão lhe oferecendo constante
da vida do sujeito.
perigo e insegurança. Stern (1999) contextualiza que esses pacientes
possuem uma hipersensibilidade que é considerada desmedida, o que
acarreta em repetitivas precauções desordenadas para os possíveis
perigos que venham a surgir. Ou seja, em situações que esses Avaliação Neuropsicológica
pacientes se sintam ameaçados ou mesmo em perigo eles podem vim O transtorno de Personalidade Borderline ainda está atravessado a
a manifestar ou desenvolver ideias da ordem da paranoia e da psicose. muitas dúvidas e pesquisas relacionadas ao campo, e é de grande
As dificuldades associadas as ponderações no que diz respeito as interesse tanto dos familiares do sujeito que convive com a doença,
relações a dois possuem delimitações disfuncionais, pelo fato de, como também para a comunidade cientifica da neuro (psicologia),
comumente possuírem poucos mecanismos e recursos para lidar com visto que, é necessário que exista uma avaliação neuropsicológica nos
as questões sentimentais e emocionais que lhe são apresentados transtornos de personalidade para existir uma melhor compreensão e
(Scherer, 2016). Por exemplo, em uma situação adversa de aprofundamento sobre os comportamentos do sujeito.
discordância no relacionamento, o sujeito com transtorno de A Avaliação Neuropsicológica busca a utilização de estudos
personalidade borderline pode não conseguir elaborar um diálogo de comportamentais para investigar como se dar os processos do
forma produtiva e assertiva, atravessando suas pulsões para a funcionamento cerebral do sujeito, efetuando assim posteriores
hostilidade e agressividade. diagnósticos diferenciais e determinando as possíveis alterações e/ou
O comportamento de automutilação é comum nos transtornos de disfunções que são apresentadas no quadro clínico do paciente e as
personalidade e o respectivo configura-se como um comportamento formas de intervenção (Melfe, 2017). No caso dos pacientes que
do espectro das representações impulsivas e compulsivas, onde existe sofrem com o Transtorno de Personalidade Borderline e
uma grande dificuldade de controlar e/ou resistir ao impulso do automutilação, a avaliação neuropsicológica é importante para
comportamento. Os comportamentos de automutilação podem ser compreender as esferas que estão comprometidas e as formas mais
predominantes tanto no percurso da adolescência como também na adequadas de intervenção do profissional para prevenir maiores
vida adulta, observa-se que existe uma grande predominância para danos.
que esses comportamentos sejam acompanhados com rituais antes e O foco da Neuropsicologia é investigar os estudos sobre as possíveis
depois de concretizar o ato lesivo. A impulsividade, como já retratada áreas comprometedoras das estruturas cognitivas, emocionais e
anteriormente, é um grande preditor para compreender o processo
43 Silva, Maia
RP&E online V2N1 2019 Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação

comportamentais do sujeito. Ela pode utilizar instrumentos como profissional busca investigar e analisar frente a condição patológica
testes, observação, anamnese, avaliação, entrevista, dentre outros, do paciente, isto é, o profissional fica responsável por todas as etapas
para avaliar aspectos psicológicos relacionados a concentração, a do processo de desenvolvimento da avaliação. É importante que todas
atenção, a memória e as funções executivas do sujeito. Permitindo as etapas sejam concluídas com sucesso e que ambos, profissional/
assim, pôs diagnóstico, que o profissional trace o tratamento mais paciente entejam em constante integração.
adequado e as posteriores indicação e encaminhamentos (Melfe, 2017
Neste direcionamento, a literatura da neuropsicologia em
citado por Maia, 2009).
Transtornos Borderline sugere a utilização de algumas técnicas e
Verifica-se nos estudos sobre a estrutura cognitiva dos pacientes com instrumentos para uma avaliação em pacientes que apresentam
Transtorno de Personalidade Borderline que existes algumas transtornos de personalidade e comportamentos auto lesivos, é
alterações neurológicas que podem explicar/justificar alguns sempre importante que o profissional domine a aplicação das
comportamentos que são apresentados, como por exemplo: 1) Claras avaliações para se obter um resultado satisfatório. Para avaliar a
alterações no processo do funcionamento dos receptores da atividade personalidade Borderline vamos utilizar: Entrevista aberta;
serotoninérgica que está totalmente vinculada a repercussão dos Rorschach; Teste de Apercepção Temática (TAT), A Escala de
comportamentos impulsivos/compulsivos (Silva, 2014 citado por Paris, Inteligência Wechsler para Adultos (WAIS-III), Escala de
1997); 2) Disfunção na atividade colinérgica, que está vinculada com a Comportamento de Automutilação, Escala de Impulsividade de Barrat,
instabilidade afetiva que o sujeito apresenta (Silva, 2014 citado por Figura Complexa de Rey e o Problem-Solving Inventory (PSI).
Skodol, 2002); 3) A ativação em constante excesso dos sistemas de
A entrevista aberta e/ou anamnese versam compreender conteúdos
vigilância, ligados ao processo do funcionamento das glândulas supra-
associados a dinâmica de vida do paciente, como se dá sua rotina,
renais, que estão muito vinculadas a estimulação e/ou exposição
dados sobre percurso familiar e social, utilização de medicação,
ainda no período da infância a episódios que ordem traumática,
conflitos emergenciais, dentre outros. O neuropsicólogo pode
evidenciando assim, consideráveis disfunções orgânicas (Silva, 2014
observar e avaliar toda a história de vida que o paciente reporta,
citado por Gabbard, 2006); 4) Vulnerabilidades de caráter biológico
estando sempre atento as expressões corporais e verbais que são
existentes podem contribuir para uma hiperativação da amígdala,
apresentados ao longo da entrevista (Scherer, 2016).
repercutindo em sujeitos mais sensíveis a estímulos externos que são
relacionais (Silva, 2014). Ou seja, existem disfunções muito potentes O método de avaliação das pranchas do Rorschach pressupõe a análise
nas esferas da impulsividade e da instabilidade afetiva, onde os da maneira como o sujeito observa e percebe os estímulos que lhes
comportamentos de automutilação serão mais evidenciados no são apresentados, traçando assim a forma como o sujeito lida com as
histórico clínico do paciente. situações adversas em um contexto concreto, percebendo as suas
expressões sensoriais e os seus mecanismos utilizados de
Nos transtornos de personalidade existem alguns fatores
compensação. Sendo assim, essa avaliação permite ao neuropsicólogo,
neuropsicológicos que estão intrinsecamente associados, como por
obter a percepção do processo cognitivo das vivencias de contato com
exemplo, grande vigilância atencional, uma disfunção na modulação
o real que o sujeito possui e os seus posteriores elementos de
afetiva, déficits no controle inibitório, déficits na flexibilidade
contradição e oposição desafiadora. O teste projetivo do Rorschach
cognitiva, déficits no processo do planejamento, na inibição adequada
remete o sujeito a conteúdos relacionados a fantasia (irrealidade),
de respostas e nas tomadas de decisão (Garreto, 2015).
onde, pode-se ocorrer as projeções sob as reais necessidades e
As representações dos impulsos nos comportamentos de processos impulsivos que o sujeito possui (Cunha, 2008).
automutilação estão vinculadas a déficits no processo da esfera
O Teste de Apercepção Temática (TAT) é também um teste de caráter
atencional, com prejuízos muito associados a estrutura do lobo
projetivo que tem por finalidade compreender como as pessoas
frontal, onde permite-se as manifestações das funções executivas. As
observam e projetam diversas situações pessoais e sociais. A forma
funções executivas são responsáveis pela organização das vinculações
como o sujeito elabora a sua experiência diante de uma determinada
dos relacionamentos sociais (Garreto, 2015 citado por Goudriann,
gravura, denota claramente a estrutura do sujeito frente ao seu
2004).
contexto real, ou seja, o profissional tem acesso aos conteúdos
Não existem testes psicológicos que são propriamente ditos para latentes da personalidade do sujeito pois o respectivo expõe seus
identificar alterações neuropsicológicas das funções de um sujeito sentimentos a partir das confrontações apresentadas (Cunha, 2008).
com Transtornos de Personalidade Borderline que possui demanda de Podem surgir na avaliação conteúdos relacionados a solidão, a
autolesão/automutilação. Existem alguns testes que auxiliam e agressividade, a negligencia, ao desamparo, aos processos de ruptura,
direcionam o profissional a identificar potencialidades relacionadas a dentre outros.
impulsividade, a raiva, a agressividade, ao processo empático, aos
A Escala de Inteligência Wechsler para Adultos (WAIS-III) é
padrões persistentes de instabilidade emocional, a autoimagem, a
direcionada a avaliar/analisar a inteligência e/ou os aspectos
ideação Paranóide, o pensamento suicida, a instabilidade afetiva,
intelectuais tanto de adultos como de adolescentes. A avaliação
dentre outros pontos de investigação.
reporta o processo de habilidades cognitivas que foram desenvolvidas
A Avaliação Neuropsicológica será sustentada diante do que o pelo sujeito e seus respectivos problemas de foro psiquiátrico,
Silva, Maia 44
Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação RP&E online V2N1 2019

as melhores possibilidades e estratégias de tratamento a depender da


neurológico e emocional apresentadas (Cunha, 2008). Podem surgir
idiossincrasia apresentada. O cruzamento entre os processos
no desenvolvimento da avaliação conteúdos relacionados a dor
psicoterápicos e os fármacos trazem grandes potencialidades para
psíquica, aos sentimentos de angustia/ansiedade, a capacidade do
esses pacientes, trazendo posteriormente equilíbrio emocional,
rendimento intelectual, dentre outros.
controle dos impulsos, melhorias na comunicação, níveis de stress
A Escala de Comportamento de Automutilação traz indicativos das menos acentuados e autodestrutivos. No entanto, o processo
possíveis frequências e/ou razões pelas quais ocorrem os psicoterápico é fundamental concomitante a quaisquer outros
comportamentos da automutilação, as motivações existentes, o uso tratamentos em que o sujeito se disponibilize a participar.
de drogas e substancias psicoativas, a intensidade do processo da dor,
A literatura refere-se a alguns medicamentos/psicotrópicos que são
dentre outros. O instrumento avalia basicamente 11 subtipos de
comumente utilizados no tratamento dos Transtornos de
automutilação durante os últimos 12 meses, sendo normalmente
Personalidade Borderline com características auto lesivas, sempre a
direcionado a pacientes com mutilações moderadas e graves (Garreto,
depender da sintomatologia e da gravidade do caso clínico que é
2015).
apresentado. Carvalho e Colaboradores (2004) reportam a utilização
A Escala de Impulsividade de Barrat é um instrumento utilizado para a dos Antipsicóticos típicos, dos Antipsicóticos atípicos, dos
avaliação das repercussões relacionadas a impulsividade motora, ao Estabilizadores do humor, dos Inibidores Seletivos de Recaptação da
processo da atenção e das falhas existentes no campo do Serotonina, dos Inibidores da monoaminooxidase, da Venlafaxina, dos
planejamento processual (Garreto, 2015). É uma escala bastante Ansiolíticos e da Naltrexona e suas posteriores repercussões positivas
utilizada para identificar impulsividades que o sujeito não consiga no tratamento de pacientes borderline.
controlar, como por exemplo a autolesão.
Os antipsicóticos típicos são importantes pois, pacientes
A Figura Complexa de Rey está baseada em uma figura complexa e caracterizados limítrofes comumente apresentam episódios de ordem
com muitos estímulos e formas geométricas que são ilustradas ao psicótica acentuada, que normalmente são desencadeados por fatores
paciente. Após a apresentação da figura, é solicitado que o paciente estressores do meio. Alguns antipsicóticos como o tiotixeno,
desenhe tudo que ele lembra que está relacionado a figura que trifluoperazina, haloperidol, fenelzina, apontaram melhorias na
acabou de ver. O teste avalia as potencialidades relacionadas a redução da severidade dos sintomas depressivos, do processo da
habilidades de organização visuoespacial, o desenvolvimento de ideação paranoide, do funcionamento psicótico, da sensibilidade
estratégias, a delimitação de planejamentos e o processo de interpessoal, dos sintomas psicóticos, obsessivo-compulsivos e fóbico-
sustentação da memória (Garreto, 2015). ansiosos, e uma considerável melhoria nos sintomas relacionados a
Por fim, temos o Problem-Solving Inventory (PSI), que é um inventário hostilidade e a raiva (Carvalho e Colaboradores, 2004).
caracterizado pela investigação da capacidade de resolução de Os antipsicóticos atípicos por vezes são considerados melhores do que
problemas que o sujeito apresenta. O inventário é composto por três os típicos, pois, apresentam menor índice de sintomatologias
escalas, sendo elas a escala de confiança na solução/resolução de extrapiramidais no decorrer do tratamento farmacológico. Os
problemas, a escala do estilo aproximação/evitação e a escala do antipsicóticos atípicos mais comuns de utilização nesse público de
controle subjetivo pessoal. Avalia-se no sujeito as capacidades pacientes são o clozapina, olanzapina, risperidona trazendo
cognitivas relacionadas a autoconfiança, a elaboração de resolução de repercussões positivas na melhoria dos impulsos de agressividade e
problemas, a resiliência e o controle existente nas situações de grande melhoria do equilíbrio dos sintomas de ordem afetiva (Carvalho e
adversidade (Garreto, 2015). Colaboradores, 2004).
Contudo, apesar das muitas possibilidades de testes que avaliam o Os estabilizadores do humor podem ser bastante eficazes para tratar
transtorno borderline e os comportamentos de automutilação é pacientes considerados como limítrofes, principalmente aqueles que
importante que o neuropsicólogo saiba quais os melhores métodos/ apresentam descontrole severo dos impulsos de variação do humor.
técnicas de aplicação, a partir da eventual demanda que está sendo Os estabilizadores mais utilizados são o Amitriptilina, os
apresentada pelo paciente. Visto que, a neuropsicologia não utiliza antidepressivos tricíclicos, o carbamazepina, o lítio, o desipramina, o
apenas testes para a compreensão de um transtorno, ela pode vim a divalproato e a lamotrigina. As medicações podem repercutir em
utilizar o processo da observação, da entrevista clínica, da escuta melhorias sintomáticas globais no que diz respeito a irritabilidade, a
clínica, dentre outros. raiva, aos sintomas suicidas, a hostilidade e na sensibilidade
interpessoal (Carvalho e Colaboradores, 2004).

Os Inibidores seletivos da recaptação da serotonina podem trazer


Tratamento
melhorias em relação à impulsividade e a melhoria dos sintomas de
O tratamento contínuo dos pacientes com transtorno de oscilação do humor dos pacientes com transtorno borderline,
Personalidade Borderline e os comportamentos de lesão está inibidores seletivos como o Fenfluramina e a fluoxetina, trazem
associado a muitos fatores e áreas especificas, onde, a psiquiatria, a melhorias nos sintomas da depressão e de agressividade. Já os
psicologia e a neuropsicologia trabalham em conjunto para fornecer Inibidores da monoaminooxidase demonstram grandes melhorias em
45 Silva, Maia
RP&E online V2N1 2019 Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação

sintomas afetivos, sintomas impulsivos e agressivos, a tranilcipromina atenção, a maleabilidade, a flexibilidade, a memória de trabalho e as
e a fenelzina sugerem efetivação no tratamento de sintomas capacidades cognitivas de planejar e de executar determinada
depressivos atípicos, como por exemplo, a raiva e a hostilidade atividade (Pastore, Lisboa, 2014).
(Carvalho e Colaboradores, 2004).
Além do diagnóstico da neuropsicologia é necessário também um
A Venlafaxina é um conhecido antidepressivo utilizado em casos exame físico especifico a nível neurológico, pois, apresentam-se nos
clínicos de diagnóstico de personalidade borderline, tendo por estudos evidências muito claras de interrupções e de falhas nos
competência a inibição, a recaptação e o resgate da norepinefrina e circuitos cerebrais. As chamadas interrupções cerebrais estão, no
da serotonina, ou seja, ela resgata a estabilidade e o equilíbrio dos diagnóstico borderline, muito relacionadas a falhas nos mecanismos
pacientes que apresentam constantes processos depressivos severos intelectuais, falhas na impulsividade da agressividade, falhas nos
(Carvalho e Colaboradores, 2004). mecanismos de regulação afetiva, falhas na capacidade de tomadas de
decisão, rigidez cognitiva, atitudes equivocadas e interpretações com
Os agentes ansiolíticos como o alprazolam, Clonazepam, Buspirona,
caráter distorcido (Pastore, Lisboa, 2014).
trazem efeitos antimaníacos que aumentam a neurotransmissão
serotoninérgica para o cérebro, pode ser um excelente agente para o No que diz respeito aos pensamentos suicidas e aos comportamentos
tratamento de crises graves de ansiedade em pacientes com de automutilação, observa-se que as deficiências cognitivas são
transtornos de personalidade (Carvalho e Colaboradores, 2004). amplamente comprometidas no transtorno borderline, acarretando
assim em falhas no processo das funções executivas. Sendo assim, as
Por fim temos a Naltrexona que é muito indicada em casos que
funções executivas que também são reguladoras responsáveis pelos
repercutem o processo de automutilação, onde a demanda da
aspectos emocionais, tornam-se instáveis, fazendo com que o sujeito
automutilação é muito comum em pacientes limítrofes que possuem
tenho comprometimentos para controlar os seus posteriores impulsos
com frequência pensamentos obsessivos-compulsivos. A Naltrexona é
comportamentais (Pastore, Lisboa, 2014).
muito potente para aniquilar comportamentos de possíveis
insensibilidades à dor devido a uma excessiva atividade que é É necessário que o clínico neuropsicólogo obtenha competências e
apresentada pelo cérebro, fazendo assim com que o sujeito obtenha aptidões para compreender os resultados dos testes projetivos e
com menos frequência comportamentos de risco, nomeadamente a quantificáveis, junções e interpretações da recolha de informações da
autolesão/automutilação (Carvalho e Colaboradores, 2004). entrevista aberta, sempre traçando novas hipóteses diagnósticas,
quando se fizer necessário (Melfe, 2017). Torna-se útil também que o
A medicação não é demasiadamente excluída do processo por parte da
clínico decida de forma responsável a seleção dos testes e os métodos
clínica neuropsicológica, porém, compreende-se que a psicoterapia é
e técnicas que serão realizadas ao longo do processo da avaliação
fundamental para o trabalho de melhoria da qualidade de vida do
diagnóstica.
paciente com Transtorno de Personalidade Borderline concomitante
aos comportamentos de automutilação. Ou seja, a medicação correta É importante que se possível, a família esteja de certa forma
e adequada também é fundamental para o cruzamento dos integrada no processo do acompanhamento neuropsicológico e do
tratamentos e posterior sucesso desejado. respectivo tratamento, visto que, é necessário que o paciente e a
família compreendam o que se passa diante do diagnóstico, como
surgem as sintomatologias associadas, o processo da psicoeducação, o
Discussão uso das medicações necessárias, dentre outras demandas que podem
surgir ao longo do processo de diagnóstico e tratamento.
Fica evidenciado que o Transtorno de Personalidade Borderline tem
associações multifatoriais e é necessário que o profissional esteja
atento a todo o corpo dos sintomas psicopatológicos que são
Conclusão
apresentados, principalmente com os sintomas relacionados as
manifestações iniciais, aos aspectos cognitivos, as impulsividades, as O Transtorno de Personalidade Borderline é uma patologia psíquica
pulsões e os constante riscos de suicídio e/ou automutilação (Scherer, que tem uma variedade muito vasta de sintomas que são
2016). O clínico precisa estar atento ao longo das avaliações sobre apresentados durante o desenvolvimento, os sintomas são muito
aspectos relacionados a forma de como o sujeito percebe e interpreta invasivos, devastadores e aniquiladores, onde, torna-se necessário o
os acontecimentos internos e externos, visto que, um sujeito com acompanhamento para que o sujeito obtenha uma melhor qualidade
diagnóstico borderline tem maiores difusões sobre existir e/ou mesmo de vida. Nos casos clínicos de diagnósticos borderline a
negar os seus problemas (Pastore, Lisboa, 2014). neuropsicologia trabalha em conjunto com a neurologia e com a
psiquiatria, a fim de neutralizar as repercussões negativas e
Alguns autores reportam que após o diagnóstico neuropsicológico
autodestrutivas do transtorno.
existem identificações de graves falhas cognitivas em sujeitos que
apresentam o diagnóstico de personalidade borderline. As falhas É necessário identificar ao longo do processo, se o paciente e/ou a
estão muito associadas aos comprometimentos nos domínios de própria família compreendem o diagnóstico, quais os sintomas e
esfera cognitiva, como por exemplo, nos processos relacionados a comorbidades que estão associados ao transtorno, e suas posteriores
Silva, Maia 46
Transtorno de Personalidade Borderline com Comportamento de Automutilação RP&E online V2N1 2019

formas de tratamento. O clínico neuropsicólogo, necessariamente, Referências bibliográficas


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