O Currículo Da Academia Militar Das Agulhas Negras e A Formação Profissional Das Origens Ao Início Do Século XXI
O Currículo Da Academia Militar Das Agulhas Negras e A Formação Profissional Das Origens Ao Início Do Século XXI
O Currículo Da Academia Militar Das Agulhas Negras e A Formação Profissional Das Origens Ao Início Do Século XXI
CAMPO GRANDE
2017
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CAMPO GRANDE
2017
FICHA DE CATALOGRÁFICA
Dados internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, MS, Brasil)
À minha orientadora Profa. Dra. Lucrécia Stringhetta Mello, pela orientação, dedicação,
superação, amizade, autonomia e apoio desde o início da escolha da temática e na condução
dos trabalhos.
A Ana Maria, amor de minha vida, companheira de todas as horas, pelos dias, noites, finais de
semana e feriados que renunciei ao convívio familiar em prol da realização do sonho de
concluir o mestrado em educação.
A meus filhos queridos, Deborah, João Guilherme e Anna Paula presentes divinos. A meus
sogros Ildefonso e Judite, os quais considero como se fossem meus pais. A meus cunhados
Judite, Idalci e Artur pelo incentivo.
Agradeço especialmente a Liliane Pelzl e Horácio Porto, pelo apoio prestado na Secretaria do
Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul,
sempre com cordialidade, interesse, educação e disponibilidade em bem atender.
A Profa. Dra. Jucimara Rojas pelo diálogo quando da construção do projeto de pesquisa e
pelo entusiasmo pela educação.
Às Profas. Dras. Sonia da Cunha Urt e Rosana Carla Cintra Gonçalves, integrantes da Linha
de Pesquisa Educação, Psicologia e Prática Docente, pela dedicação e disponibilidade em
contribuir com seus conhecimentos e orientações.
À Profa. Dra. Kátia Cristina Nascimento Figueira (UEMS) pela contribuição na qualificação
desse trabalho.
Ao Jefferson Gomes Nogueira, que desde 1997, na cidade de Vila Velha – ES, incentivador e
propagador da educação entre os militares.
Ao demais amigos de caserna; Juscelino Batista Guedes, Ignácio Nascimento Neto e Marcelo
Dias Pinheiro pela contribuição nessa dissertação.
Aos queridos colegas do mestrado 2015.1, Cida, Carol, Evellyn, Douglas, Heloise, Felipe,
Jorismary, Laís, Nelson, Priscila, Paula, Rizete e Rubens, com os quais compartilhei minhas
dúvidas, angústias como também alegrias e vitórias nesses mais de dois anos.
De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver
prosperar a desonra, de tanto ver crescer a
injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes
nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-
se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de
ser honesto.
Rui Barbosa
Jurista, político, diplomata, escritor,
filólogo (1849-1923)
RESUMO
O estudo apresenta o currículo da formação dos chamados “profissionais das armas” formados
pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), que é um dos centros de formação
profissional do Exército Brasileiro e uma das mais importantes da América Latina. Pretendeu-
se neste trabalho compreender as especificidades da formação profissional militar cujos
princípios e valores são norteados pelo ethos castrense. Buscou-se, na evolução histórica da
educação militar no Brasil, os princípios e concepções doutrinários empregados na construção
da grade curricular da AMAN. Objetivou-se analisar se os conteúdos constantes desses
currículos capacitam esses profissionais para atuar dentro da vigência do estado democrático
de direito, cujos princípios basilares encontram fundamento na dignidade da pessoa humana e
nas concepções dos direitos humanos. Dos preceitos regulamentares que regem a educação
militar, através da técnica de análise documental e de conteúdo foram retirados os elementos
constitutivos do ethos militar. A interdisciplinaridade tornou-se a diretriz e a base construção
dessa pesquisa de cunho qualitativo que por meio do diálogo com teóricos como: Castro (2002),
Chizzotti (2010), Fazenda (1979; 2001; 2009; 2012), Foucault (2013), Gomes (2007), Japiassú
(1976), Ludwig (1998), Mello (2004), Rojas (2007) e Weber (1982), buscou-se analisar e
compreender os fundamentos e princípios que regem a formação militar. Acrescente-se a isso o
aporte documental contendo informações do currículo da AMAN, das quais com a Análise de
Conteúdo foram levantadas categorias de análise. Uma escola de formação de Aspirante-a-
Oficial a qual habilita o bacharel em Ciências Militares para os cargos de Tenente e Capitão não
aperfeiçoado, que visa desenvolver a visão sistêmica sobre a sua atuação na esfera política,
social, jurídica, cultural, cientifico-tecnológica, humanística, educacional e ambiental nas
organizações militares do Exército Brasileiro. O currículo é construído com base em leis,
decretos e normas internas, assim concluímos que o currículo obedece aos predicados do estado
democrático de direito, ao obedecer ao princípio da legalidade e os predicados de direitos
humanos. Carece de uma maior integração da educação militar com a educação civil, a fim de
superar o isolamento da “sociedade militar” da “sociedade civil” como forma de prevenção para
que períodos autoritários não se repitam.
LISTA DE QUADROS
INTRODUÇÃO
Para Rojas (2001) a “Metáfora como convite à descoberta é um processo mental que,
1
Poeta brasileiro (1847-1871). Poema retirado livro Espumas Flutuantes. Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000067.pdf>. Acesso em: 30 Jan. 2017.
16
2
Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-10/forcas-armadas-sao-instituicao-em-que-
populacao-mais-confia-diz-pesquisa>. Acesso em: 12 Mar. 2017.
17
3
João Belchior Marques Goulart nasceu em São Borja - RS, em 1º de março de 1919, conhecido popularmente
como "Jango", foi um advogado e político brasileiro, 24° presidente do país, de 1961 a 1964. Foi deposto pelo
Golpe Militar de 1964. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Goulart>. Acesso em: 23 Abr.
2016.
4
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Minist%C3%A9rio_da_Defesa_%28Brasil%29>. Acesso em: 25
Jun. 2015.
5
Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/defesa-e-seguranca/2014/05/defesa-deseja-que-investimentos-no-
setor-cheguem-a-2-do-pib>. Acesso em: 25 Jun. 2015.
6
Orçamentos da União para o Exercício Financeiro de 2015. Disponível
em:<http://www.orcamentofederal.gov.br/orcamentos-anuais/orcamento-2015-2/ploa/volume_i_ploa_2015>.
Acesso em: 27 Jun. 2016.
7
Disponível em: <http://www.defesanet.com.br/bid/noticia/20054/Industrias-de-Defesa-geraram-PIB-de-R$-202-
bilhoes-em-2014/>. Acesso em: 13 Ago. 2015.
18
O projeto Guarani é desenvolvido pela Iveco Veículos de Defesa de Sete Lagoas (MG)9,
na fábrica inaugurada em 2014 que conta com uma capacidade instalada que pode chegar a 140
viaturas por ano, a nova fábrica gerará royalties e divisas ao atender às Forças Armadas de
Nações Amigas. Já na inauguração a empresa afirmará que havia um contrato com a Argentina
para a construção de 14 unidades e também informará que o foco é atender países da América
Latina. Porém o foco principal da empresa é atender as necessidades do governo brasileiro,
tendo uma expectativa de produzir ao todo 2.044 viaturas para o Exército Brasileiro (EB) até
2029, ao custo de R$ 6 bilhões10, sendo que até setembro de 2014 haviam sido entregues 100
unidades11.
Por outro lado, as FA vêm em crescente participação no dia a dia do país, seja nas
Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), em Ações Cívicas Sociais (ACISO),
Operações Pipa, Jornada da Juventude, Copa do Mundo de 2014, construção de poços
8
Revista Verde Oliva, Ano XLII, nº 227, ABR 2015. Brasília: CCOMSEx, 2015. Disponível
em:<http://pt.calameo.com/read/00123820660b5c8449895>. Acesso em: 9 Jan. 2017.
9
Revista Verde Oliva, Ano XLI, nº 223, ABR 2014. Brasília: CCOMSEx, 2014. Disponível
em:<http://pt.calameo.com/read/001238206ef0c1faaa57b>. Acesso em: 9 Jan. 2017.
10
Disponível em: <http://www.forte.jor.br/2015/07/11/blindado-militar-guarani-exportado-para-o-libano/>.
Acesso em: 9 Jan. 2017.
11
Disponível em: <http://www.defesa.gov.br/noticias/13879-centesima-unidade-do-blindado-guarani-e-entregue-
ao-exercito-brasileiro>. Acesso em: 9 Jan. 2017.
12
Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/defesa-e-seguranca/2016/04/conheca-a-aeronave-cargueiro-kc-390-
1>. Acesso em: 9 jan. 2017.
19
Em que pese toda relevância econômica e social que representa nos dias atuais as FA
para o Brasil, não podemos esquecer que a finalidade precípua dessas instituições é a defesa
externa da Pátria e como instituições nacionais permanentes e regulares, com organização
baseadas na “hierarquia” e “disciplina”. Esse rigor disciplinar e a organização em escala
hierárquica também se aplica ao ensino militar e na vida dos discentes e docentes. Para o
sociólogo Weber (1982), a disciplina
[...] não só elimina o carisma pessoal como também a organização baseada na honra
estamental; pelo menos um de seus resultados é a transformação racional da estrutura
estamental. O conteúdo da disciplina é apenas a execução da ordem recebida,
coerentemente racionalizada, metodicamente treinada, e exata, na qual toda crítica
pessoal é incondicionalmente eliminada e o agente se torna um mecanismo preparado
exclusivamente para a realização da ordem (WEBER, 1982, p. 292).
13
Disponível em: <http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2013/09/exercito-inaugura-poco-artesiano-
movido-energia-solar-no-rn.html>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
14
Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/saude/2016/02/dilma-ministros-e-220-mil-militares-farao-
mobilizacao-contra-o-aedes-aegypti>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
15
A MINUSTAH foi criada pela Resolução 1529/2004 do Conselho de Segurança da Organização das Nações
Unidas após uma avaliação multidisciplinar. O Conselho de Segurança através da Resolução 1542/2004
estabeleceu a MINUSTAH por um período inicial de seis meses, a partir de 1º de junho de 2004. Disponível
em:<https://ajonu.org/tag/minustah/>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
16
Disponível em: <http://www.ccopab.eb.mil.br/index.php/pt/operacoes-de-paz/missoes-em-andamento>. Acesso
em: 23 Abr. 2016.
20
[...] poder que implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos. Não basta
olhá-los às vezes ou ver se o que fizeram é conforme a regra. É preciso vigiá-los
durante todo o tempo da atividade de submetê-los a uma perpétua pirâmide de olhares.
É assim que no exército aparecem sistemas de graus que vão, sem interrupção, do
general chefe até o ínfimo soldado, como também os sistemas de inspeção, revistas,
paradas, desfiles, etc., que permitem que cada indivíduo seja observado
permanentemente (FOUCAULT, 1984, p. 106).
Dentro desse contexto, necessário se faz estudar a educação e a formação militar dos
integrantes das FA, tanto por sua importância dentro da própria história da educação brasileira,
quanto para o papel desempenhado, dentro do contexto da história política recente de nosso
país. Por outro lado, pretende-se chamar atenção e trazer essa discussão para o campo
acadêmico, com o propósito de refletir sobre a importância da formação dos militares das FA,
que são os servidores públicos detentores legítimo do monopólio da força física (WEBER,
21
1982), e que integram um dos mais relevantes aparelhos repressivos do Estado, que funciona
pelo uso da violência.
Fazenda (2012) relata que no Brasil o eco dessa discussão ocorrida na Europa chega
ainda no final na década de 1960, porém com sérias distorções ocasionadas por aqueles que se
apressaram a aplicar o novo sem reflexão, por modismo sem medir as consequências. Um dos
pioneiros a discutir, teorizar e tentar implantar a interdisciplinaridade foi Hilton Japiassú
(1976), com sua obra Interdisciplinaridade e Patologia do Saber.
Nesse sentido a atitude interdisciplinar adotada por este pesquisador permite dialogar
com a pesquisa qualitativa pois; “[...] parte do fundamento de que há relação dinâmica entre o
mundo real e o sujeito, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do
sujeito” (CHIZZOTTI, 2006, p. 79).
A pesquisa foi composta além da introdução e das considerações finais, por mais quatro
capítulos. No capítulo I abordamos a formação dos militares profissionais do Exército, sendo
que para melhor compreensão do objetivo fizemos a conceituação de segurança e defesa
nacional, apontando que são coisas distintas e com finalidades e objetivos diferentes.
Mostramos a busca pelo remodelamento das atribuições das forças armadas no Brasil e no
mundo, principalmente após o fim da Guerra Fria. Mostramos o contexto da criação da
Comissão Nacional da Verdade (CNV) e o afastamento dos militares do centro do poder
político, após a criação do MD. Abordamos a origem e a evolução da educação militar,
evidenciando a importância dessa educação para o Brasil, já que os militares sempre estiveram
ligados ao processo político brasileiro, de forma direta ou indireta.
“[...] Duas grandezas neste instante cruzam-se! Duas realezas hoje aqui se abraçam!... Uma—é um livro
laureado em luzes... Outra— uma espada, onde os lauréis se enlaçam [...]”. Castro Alves
Castro Alves, o poeta da liberdade classifica o “livro” e a “espada” como duas grandezas
que se abraçam destacando a importância de ambas para a construção de uma nação. Naquela
ocasião de guerra, onde muitos perderam seus entes queridos, a união do livro com a espada se
fez presente na construção de uma instituição destinada a amparar os órfãos e necessitados da
Guerra do Paraguai. O livro pela forma em que é vazado deve ser visto como um instrumento
de transformação social e a espada como um instrumento de defesa permanente do mais fraco,
do despossuído, do oprimido. Para o EB os deveres de “soldado” devem andar sempre em
consonância com o continuo “aperfeiçoamento” intelectual, sendo cobrado e propiciado a seus
quadros oportunidades de formação e aperfeiçoamento, seja com cursos militares e/ou civis
mediante convênios com diversas instituições de ensino públicas e privadas. Essa preocupação
em manter seus militares atualizados tem por objetivo atender as necessidades do Brasil, tanto
na defesa contra ameaças externas, como na consecução dos objetivos da política externa.
A importância de se ter forças armadas fortes, bem treinadas e equipadas para garantir
a defesa do Estado já eram apontadas por Maquiavel (2012), em O Príncipe, em sua concepção
de estado moderno, seja esse estado um principado ou uma república. Para Maquiavel, o Estado
deve ter condições de impor a ordem a seus cidadãos, quando eles não puderem mais serem
firmados na persuasão. A segurança e defesa do país é obrigação de seu governante, podendo
essa defesa depender do uso de armas para a manutenção da ordem, e sustentar o poder do
príncipe, e consequentemente do Estado.
25
A Guerra Fria iniciada após o término da Segunda Guerra Mundial, entre os Estados
Unidos e a União Soviética, que disputavam a hegemonia política, econômica, e militar no
mundo opunham dois sistemas econômicos, a saber: A antiga União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) possuía um sistema socialista baseado na economia planificada, partido
único, igualdade social e ausência de democracia. Já os Estados Unidos da América (EUA), a
outra potência mundial defendia a expansão do sistema capitalista, que se baseava na economia
de mercado, sistema democrático e propriedade privada. Da segunda metade da década de 1940
até 1989, estas duas potências como estratégias para aumentar suas influências e dominação no
mundo tentaram implantar em outros países os seus sistemas políticos e econômicos. A
expressão “Guerra Fria” vem de um conflito que aconteceu apenas no campo ideológico, não
ocorrendo nenhum combate declarado ou direto entre EUA e URSS. Figueira (2011), ao apontar
as peculiaridades desse período, relata que:
[...] apesar de durante quarenta anos o mundo conviver com a iminência de uma
grande guerra esse perigo objetivamente não existiu, visto que havia uma aceitação
da distribuição global e desigual de forças pelas superpotências. Esta configuração,
entretanto, viria a ser alterada a partir de 1970 quando ocorreu uma crise no sistema
internacional (FIGUEIRA, 2011, p. 52).
[...] o papel das Forças Armadas na América Latina tem sido definido (e até mesmo
imposto) pelo hegemon ocidental e seu bloco militar aliado, a Otan. Assim, durante a
Guerra Fria, os países latino-americanos deveriam lutar contra o comunismo dentro
de suas fronteiras, enquanto os Estados Unidos defenderiam o hemisfério ocidental
contra possíveis agressões externas do bloco soviético (SANTOS, 2004, p. 115).
Com o fim da Guerra Fria e o advento de uma nova ordem mundial, onde aqueles
inimigos definidos em objetivos anteriores deixaram de existir ou representar perigo houve a
necessidade de uma redefinição de objetivos e conceitos. As “novas ameaças”, segundo Santos
(2004) passaram a ser o:
26
17
Disponível em: <http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/publicacoes-oficiais/catalogo/fhc/politica-de-defesa-
nacional-1996.pdf>. Acesso em 25 Fev. 2017.
27
[...] reunindo as três Forças que passaram a ser comandos militares, respondia
certamente ao anseio político-institucional de se constituir um aparato de controle
civil sobre os militares, de buscar elementos de negociação em nível político por
intermédio de um ministro civil que poderia transitar de maneira confortável nos
trâmites do jogo de interesse junto ao Legislativo e Executivo para um incremento
harmonioso entre as Forças e, de proporcionar uma aproximação dos representantes
políticos civis com relação às questões militares na mediação de um ministro civil
(OLIVEIRA, 2004, p. 63).
18
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições
nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema
do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa
de qualquer destes, da lei e da ordem.
19
Ao EMCFA cabe assessorar o ministro da Defesa na direção superior das Forças Armadas, na organização, o
preparo e o emprego, visando o cumprimento de sua destinação constitucional e de suas atribuições subsidiárias.
Disponível em: <http://www.defesa.gov.br/forcas-armadas/estado-maior-conjunto>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
28
Oliveira (2004) observa que os militares se sentiam pouco valorizados pela sociedade
civil, mesmo sendo eles muitas vezes os únicos representantes do estado nos mais distantes
rincões do país. Uma das possibilidades consideradas pelos militares contra a criação do MD
seria o receio de que com a perda do status de ministério poderia haver por parte da sociedade
civil uma postura “revanchista”, em virtude das ações dos militares quando na posse do poder
político. Esse seria mais um elemento que contribuiu para o estremecimento quanto a aceitação
dos militares a se subordinarem a uma liderança civil sobre as FA, que passaria a ser exercido
pelo MD (OLIVEIRA, 2004, p. 63-65).
Numa primeira leitura esta ação do governo federal pode ser entendida como uma forma
de adequação da estrutura administrativa militar às novas tendências do mundo moderno,
transformando as FA numa instituição mais profissional e adequada aos fins que lhe cabem,
entretanto, pela estrutura constante do organograma acima pode-se constatar o afastamento dos
militares de seu Comandante Supremo. Uma das possíveis explicações desse afastamento dos
militares seria devido a tradição intervencionista das FA20, e após o advento da promulgação da
CF/1988 e implementação das mudanças acima, os militares seriam afastados definitivamente
da arena política brasileira, sendo confinados de vez na caserna.
Em mais um capítulo dessa convivência, nem sempre muito pacífica entre civis e
militares, uma nova rusga se originou com a edição pela Presidenta da República Dilma
Rousseff do Decreto nº 8.515, de 3 de setembro de 2015, no qual o Executivo retirou dos
Comandantes Militares das três FA a competência para a edição de atos normativos relativos a
pessoal, passando-os para o MD. A polêmica se originou principalmente pois esse decreto
deslocou a competência para o MD de atos normativos tradicionais na caserna, que eram
executados pelos comandantes, principalmente os relativos a promoção ao oficialato e aos
postos de oficiais generais.
20
O Exército Brasileiro durante sua história interveio em diversos episódios: em 1889 da Proclamação da
República; em 1930 do impedimento da posse do presidente eleito Júlio Prestes e na ascensão ao poder de Getúlio
Vargas; em 1937 do Estado Novo; em 1945 fim da ditadura do Estado Novo; em 1955 “Golpe Branco”, do
Marechal Lott - Posse de JK e JANGO; em 1961 da renúncia de Jânio Quadros e Posse João Goulart e o
Parlamentarismo; e em 1964 do golpe civil/militar.
30
aprovado uma resolução sobre a conjuntura nacional e assumindo alguns de seus erros e
constatando que foram
21
Resolução do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, de 17 de maio de 2016, sobre a conjuntura
nacional. Disponível em: <http://www.pt.org.br/wp-content/uploads/2016/05/Resolu----es-sobre-conjuntura-
Maio-2016.pdf>. Acesso em: 6 Jul. 2016.
22
Cerimônia no Palácio do Planalto para restituição de poderes aos Comandantes das Forças Armadas e revogação
do Decreto nº 8.515, de 3 de setembro de 2015. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=ST0UiBehGtM>. Acesso em: 6 Jul. 2016.
31
do uso da força, para manter a ordem democrática, tanto na esfera interna como na externa.
[...] uma condição na qual os Estados consideram que não há perigo de ataque militar,
pressão política e coerção econômica, de modo que possam, livremente, buscar o seu
próprio desenvolvimento e progresso. A segurança dos indivíduos e das comunidades
que compõem os Estados é assegurada pela garantia do exercício da liberdade e dos
direitos políticos, sociais e econômicos individuais, bem como pela preservação ou
restauração de um meio ambiente saudável para as gerações presentes e futuras
(PINTO, ROCHA, SILVA, 2004, p. 170).
O EB entende Defesa Nacional como sendo “o conjunto de ações do Estado, com ênfase
na aplicação da expressão militar, para a proteção do território, da soberania e dos interesses
nacionais contra ameaças externas” (PINTO, ROCHA, SILVA, 2004, p. 171).
No Brasil a segurança e a defesa nacional são assuntos pouco discutido pela sociedade
e pelos seus representantes nos poderes legislativos e executivos. O Congresso Nacional
desempenha um papel sem protagonismo sobre o assunto, conforme adverte Santos (2004):
Uma demonstração dessa falta de interesse está no “[...] programa dos candidatos ao
Congresso Nacional nas últimas eleições, por representação proporcional ou majoritária, assim
como nenhuma plataforma eleitoral dos candidatos a postos executivos discutiram esse tema”.
Nenhum dos candidatos incluiu em seu programa de governo propostas e projetos sobre
segurança e defesa nacional, em que pese a violência causada pelo tráfico de drogas fruto da
falta de uma vigilância mais intensa e eficaz das fronteiras (SANTOS, 2004, p. 121).
O golpe, deflagrado pelos militares, foi saudado por importantes setores civis da
sociedade. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da
Igreja Católica, vários governadores de Estados importantes — como Carlos Lacerda,
da Guanabara; Magalhães Pinto, de Minas Gerais e Ademar de Barros, de São Paulo
— e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar,
como modo de pôr fim à suposta ameaça de esquerdização do governo e de se
controlar a crise econômica. O golpe também foi recebido com alívio pelo governo
dos Estados Unidos, que não via com bons olhos a aproximação de Goulart com as
33
O Grupo de Trabalho (GT) da CNV, por intermédio da Sra. Rosa Cardoso e da Sra.
Carolina de Campos Melo membro e pesquisadora, respectivamente, ao apresentaram a
contextualização, fundamentação e as razões do Golpe Civil/Militar de 1964 na reunião
ampliada da CNV com Comissões da Verdade e Instituições Conveniadas, em Brasília, em 25
de fevereiro de 2013. O foco principal do GT foi contextualizar o golpe até maio de 1967. O
período abordado cobre eventos relacionados ao momento da ruptura com o regime anterior e
sua institucionalização a partir de abril de 1964, incluindo a assinatura do Ato Institucional nº
1, e prosseguindo até a criação do Centro de Informações do Exército (CIE), um ano e dois
meses depois.
O GT enfatiza que o ocorrido em 1964 não foi um golpe das oligarquias ou elites
políticas e econômicas nacionais contra um governo trabalhista e popular tendo como testa de
ferro parcela das FA. Foi um golpe fundado na violência tradicionalmente exercitada no Brasil
contra os destituídos. Na visão do GT:
O período dos Governos Militares (1964-1985) foram marcados por muitos movimentos
de resistência sendo que o mais conhecido foi o da Guerrilha do Araguaia23, com participação
de várias organizações tratadas pelo regime como guerrilheiras. Em julgamento de um dos casos
de violação, à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)24, ao apreciar o caso Gomes
23
Foi um movimento de luta armada que ocorreu na região do Araguaia (divisa entre os estados de Tocantins e
Pará), entre os anos de 1972 e 1975. Este movimento era contrário à ditadura militar implantada no Brasil, através
de golpe, em 1964. Disponível em: <http://www.historiadobrasil.net/resumos/guerrilha_araguaia.htm>. Acesso
em: 23 Abr. 2016.
24
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, sediada em São José da Costa Rica, é um órgão judicial
internacional autônomo do sistema da Organização dos Estados Americanos, criado pela Convenção Americana
dos Direitos do Homem, que tem competência de caráter contencioso e consultivo. Disponível em:
<http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/113486>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
34
A CIDH dispôs que o Estado Brasileiro dentre outras ações deveria continuar com as
ações desenvolvidas em matéria de capacitação e implementar, em um prazo razoável, um
programa ou curso permanente e obrigatório sobre direitos humanos dirigido a todos os níveis
hierárquicos das Forças Armadas, em conformidade com o estabelecido na sentença imposta
pela referida Corte. Em cumprimento parcial da sentença da CIDH e em conformidade com o
artigo 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias foi criada a CNV, por iniciativa
do Executivo Federal e aprovação do Congresso Nacional através da Lei nº 12.528/2011. A
CNV teve como finalidade examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos
praticadas no período de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988, data da promulgação
da Constituição Federal de 1988, tendo como um de seus objetivos efetivar o direito à memória,
à verdade histórica e promover a reconciliação nacional através de uma catarse que cicatrizaria
as feridas causadas pelos 21 anos de ditadura civil/militar.
O currículo das escolas militares foi objeto de debate durante os trabalhos CNV onde
em seu relatório final na parte de Conclusões e Recomendações, os relatores propõem quanto
aos processos seletivos, tanto para as Forças Armadas quanto para as Forças Auxiliares: “[5]
Reformulação dos concursos de ingresso e dos processos de avaliação contínua nas Forças
Armadas e na área de segurança pública, de modo a valorizar o conhecimento sobre os preceitos
inerentes à democracia e aos direitos humanos” (BRASIL, 2014, p. 967).
21. É necessário que a formação dos integrantes das Forças Armadas e dos órgãos de
segurança pública seja precedida por processos de recrutamento que levem em conta
o conhecimento dos candidatos sobre os princípios conformadores do Estado
democrático de direito e sobre os preceitos teóricos e práticos relacionados à
promoção dos direitos humanos. Também nos processos de avaliação contínua a que
os efetivos dessas forças e órgãos são submetidos, esse conhecimento deve ser
considerado, de modo a assegurar a compatibilidade de sua atuação com aqueles
25
Em 26 de março de 2009, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu à Corte uma demanda
contra o Brasil, que se originou na petição apresentada, em 7 de agosto de 1995, pelo Centro pela Justiça e o
Direito Internacional e pela Human Rigths Watch/Americas, em nome de pessoas desaparecidas no contexto da
Guerrilha do Araguaia e seus familiares. Disponível em: <http://pt.slideshare.net/justicagovbr/01-derecho-a-la-
vida-web>. Acesso em: 23 Abr. 2016.
35
Para a educação nacional seja nos níveis básicos ou superiores, os relatores propõem a
promoção dos valores democráticos e dos direitos humanos na educação, como sendo o
[...] compromisso da sociedade com a promoção dos direitos humanos deve estar
alicerçado na formação educacional da população. Assim, deve haver
preocupação, por parte da administração pública, com a adoção de medidas e
procedimentos para que, na estrutura curricular das escolas públicas e privadas dos
graus fundamental, médio e superior, sejam incluídos, nas disciplinas em que
couberem, conteúdos que contemplem a história política recente do país e incentivem
o respeito à democracia, à institucionalidade constitucional, aos direitos humanos e à
diversidade cultural (BRASIL, 2014, p. 967. Grifo nosso).
22. O conteúdo curricular dos cursos ministrados nas academias militares e de polícia
deve ser alterado, considerando parâmetros estabelecidos pelo Ministério da
Educação (MEC), a fim de enfatizar o necessário respeito dos integrantes das Forças
Armadas e dos órgãos de segurança pública aos princípios e preceitos inerentes à
democracia e aos direitos humanos. Tal recomendação é necessária para que, nos
processos de formação e capacitação dos respectivos efetivos, haja o pleno
alinhamento das Forças Armadas e das polícias ao Estado democrático de direito, com
a supressão das referências à doutrina de segurança nacional (BRASIL, 2014, p. 968).
Dentro desse contexto, importante se faz que os efetivos militares tenham uma educação
interdisciplinar que conjugue a Formação Militar com a Formação em Direitos Humanos, haja
vista que os integrantes das FA cumprem um papel importantíssimo, tanto no que diz respeito
as ações internas de garantia da lei e da ordem, quanto nas missões no exterior. A importância
de uma formação sólida e com respaldo nos direitos humanos desses agentes que são servidores
públicos, que segundo Weber, possuem o monopólio legítimo do uso da força física (WEBER,
26
Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
36
1982).
A escola, seja ela civil ou militar, é um espaço dinâmico político por excelência.
Ela é politicamente determinada, seu processo educativo é político e os seus resultados
também são políticos. Assim ela exprime as relações de força vigentes na sociedade
(LUDWIG, 1998, p. 07. Grifo do autor).
27
Propaganda veiculada diariamente, em horário nobre, numa das maiores redes de televisão brasileira, a Rede
Globo, com o intuito de reaproximar os militares da sociedade civil.
37
neste sentido ele deve possuir uma educação plural condizente com o atual quadro do Estado
Democrático de Direito; uma educação crítica reflexiva que o possibilite entender a
complexidade da realidade brasileira compreendendo-se como um protagonista de direitos e
deveres, instrumentalizando-o para a compreensão do seu estar no mundo com os outros.
Para tanto necessário se faz que o currículo das escolas de formação militares sejam
objetos de pesquisa da comunidade acadêmica, para que juntos, todos, militares e sociedade
brasileira possam repensar suas práticas e atualizar sua metodologia em consonância com o
atual momento democrático que se encontra a sociedade brasileira.
A Lei 9.394/96 estabelece como uma das finalidades centrais do Ensino Médio a
construção da cidadania do educando, evidenciando, assim, a importância do
ensino da Sociologia no Ensino Médio. Tendo em vista que o conhecimento
sociológico tem como atribuições básicas investigar, identificar, descrever,
classificar e interpretar/explicar todos os fatos relacionados à vida social, logo
permite instrumentalizar o aluno para que possa decodificar a complexidade da
realidade social (PCNEM, p. 318. Grifo nosso).
No Brasil o número de escolas básicas públicas geridas pelas Polícias Militares já chega
a 93 instituições. O Estado que mais possui escolas assim em todo o país é o Estado de Goiás,
38
onde a Secretaria de Educação28, recentemente, anunciou que várias escolas públicas estaduais
ainda passarão a ser administradas pela Polícia Militar, como foi o caso da Escola Estadual
Fernando Pessoa, em Valparaíso/GO.
No início do 2º semestre de 2015 foram mais oito colégios que voltaram às aulas naquele
estado nesses moldes. Atualmente apenas nove estados brasileiros não possuem colégios de
educação básica públicos geridos pelas Polícias Militares. Goiás passou a ser o líder no quesito,
com 26 escolas neste formato (2015), seguido de perto por Minas Gerais — que possui 22
colégios militares29.
Essa influência das especificidades do ensino militar no ensino público brasileiro suscita
algumas perguntas: Onde começa a “militarização” dos alunos e onde termina o ato de educar?
Quais os limites que separam estas práticas? Há limites? Se há, eles são respeitados? Este
ambiente permeado pelo ethos militar permite a formação de cidadãos críticos e autônomos?
Como nos diz o Filósofo Immanuel Kant30, “O homem não é nada além daquilo que a educação
faz dele”.
28
Há que ressaltar a diferença entre os Colégios das Polícias Militares e das Escolas Públicas que estão passando
para a gestão militar. Disponível em http:/colegiomilitarhugo.g12.br. Acesso em 13 Fev. 2014.
29
Modelo de colégios geridos pela Polícia Militar está em expansão no país. Jornal Folha de São Paulo. Em
números. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2015/08/1666631-cresce-no-brasil-o-numero-
de-escolas-basicas-publicas-geridas-pela-pm.shtml>. Acesso em: 14 Mai. 2016.
30
Immanuel Kant (1724-1804) foi um Filósofo prussiano. Amplamente considerado como o principal filósofo da
era moderna.
39
O objetivo é fazer um levantamento que nos mostre como anda nos meios acadêmicos,
as pesquisas acerca da formação militar no EB em geral e especificamente dos oficiais
combatentes realizadas pela AMAN, tradicional academia militar responsável pela formação
dos oficiais combatentes da Força Terrestre, aqueles que acenderão aos postos de oficiais
generais e serão os comandantes e que guiaram a Força quanto a suas funções constitucionais.
Esse estado da arte servirá como um balanço, indicando tendências e possíveis direções para
novas pesquisas.
Tânia Regina
O Estudo da Guerra e a
Pires de Godoy
2004 D Educação Formação da Liderança UFSC
Torres de
Militar Brasileira.
Oliveira
Guardiões da Nação:
Formação Profissional,
Ciência Eduardo Munhoz
2006 D Experiências Compartilhadas UFRGS
Política Svartman
e Engajamento Político dos
Generais de 1964.
Desafios da Internalização de
Valores no Processo de
Psicologia Daniela Schmitz
2006 M Socialização Organizacional: UERJ
Social Wortmeyer
Um Estudo da Formação de
Oficiais do Exército.
A Política de Ensino do
História e
Exército Brasileiro na Nova
2008 D Cultura Ednéia Fázio UNESP
República: O Projeto de
Política
Modernização (1985-2000).
Uma Carreira: As formas de
Acesso à Escola de Formação
Fernando da Silva
2008 D História de Oficiais do Exército UERJ
Rodrigues
Brasileiro no Período de
1905 a 1946.
A Formação Profissional do
Oficial do Exército na
Primeira Metade do Século Fernando da
2011 A - UERJ
XX: A Influência dos Jovens Silva Rodrigues
Turcos, da Missão Indígena e
da Missão Militar Francesa.
41
A análise da prática pedagógica responsável pela formação dos oficiais das três Forças,
é estabelecida, segundo o autor, para preservar os interesses dos setores hegemônicos da
sociedade. Conclui que a democratização da prática pedagógica castrense, constitui um
expediente adequado para a superação do papel intervencionista, frequentemente exercitado
pelos militares no decorrer da história e em sua ótica favorecedor dos setores privilegiados da
estrutura social.
42
Eduardo Munhoz Svartman apresentou tese de doutorado onde faz uma análise da
formação profissional dos Oficiais Generais que participaram ativamente do movimento de
1964, com o tema: GUARDIÕES DA NAÇÃO: FORMAÇÃO PROFISSIONAL,
EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS E ENGAJAMENTO POLÍTICO DOS GENERAIS
DE 1964, tese apresentada ao programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, na cidade de Porto Alegre, maio de 2006, não apresentou as
palavras-chave. O Autor investiga a atuação política de um grupo de 24 generais, identificados
com o polo intervencionista controlador do Exército Brasileiro, que esteve envolvido nas
conspirações que levaram à derrubada do governo João Goulart, em 31 de março de 1964.
Identifica que estes atores tiveram uma formação profissional intensamente politizada e
acumularam experiências que os distinguiam das demais frações do EB, em função da
recorrente ocupação de cargos públicos na esfera política, do elevado grau de
internacionalização e de atribuir as derrotas eleitorais da União Democrática Nacional (UDN)
às manipulações do populismo e à infiltração comunista.
O principal objetivo foi analisar a eficácia deste processo para a internalização dos
valores responsabilidade, iniciativa, disciplina, honestidade e lealdade pelos sujeitos. A coleta
de dados foi realizada por meio de questionário, grupos focais e observação participante. Os
resultados demonstraram a eficácia da socialização para a internalização da disciplina e da
lealdade aos pares e sua ineficácia para a internalização da lealdade aos superiores. Não foi
possível avaliar a internalização da responsabilidade, da iniciativa e da honestidade pelos
sujeitos, tendo em vista as condições de intensivo controle que caracterizam o processo em
pauta. Foram levantadas as principais estratégias de socialização empregadas pela organização
e seus efeitos sobre o ajustamento dos indivíduos ao papel.
O interesse pelo EB se deu por causa da maior participação política na história brasileira
em detrimento da participação mais técnica e insular das Forças irmãs e pela falta grave de
trabalhos sobre esta instituição e a educação castrense. A importância que se dá neste trabalho
para o fim da ditadura militar, reside no fato de que, acreditamos ser esta passagem e a maneira
como foi processada, uma das principais causas, responsáveis pela reformulação designada de
reforma militar ou reestruturação, visando uma nova orientação para o ensino militar que forma
os quadros profissionais e uma identidade própria diferenciando os militares dos civis.
O segundo período, de 1918 até 1922, foi marcado por uma onda modernizadora que
tinha como objetivo formar um oficial com conhecimentos técnicos e profissionais mais
avançados, com uma rígida disciplina e preparo para exercer a função de comandar tropas. O
terceiro e último período se inicia em 1922 com a penetração dos oficiais franceses na EMR
com a elaboração de um novo regulamento para a escola militar que propunha a formação de
um oficial que mantivesse seus conhecimentos técnicos e profissionais, uma rígida disciplina,
e o preparo para exercer a função de comandar tropas, mas que via como pressuposto para a
incorporação dessas habilidades uma formação cultural científica mais ampla do que a vinha
sendo oferecida.
Uma classe raramente estudada, as praças, foi a tese de doutorado apresentada por Aline
Prado Atassio do programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais do Centro de Educação e
Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos, São Carlos - SP teve o tema: A
ESCOLA DE SARGENTO DAS ARMAS: UM ESTUDO SOCIOPOLÍTICO SOBRE A
46
O trabalho visou descobrir quem são e o que desejam os futuros sargentos, formados
pela Escola de Sargentos das Armas (ESA). O trabalho aborda um tema pouco estudado nas
Ciências Sociais brasileira, que é o próprio sargento, daí sua importância. Dentre os enfoques
do trabalho estão a história dos sargentos, a formação desses ao longo do tempo e o cotidiano
dos alunos da EsSA. O estudo apresenta estatísticas que visam mostrar a origem social dos
alunos e entrevistas que apresentam as histórias dos alunos e suas aspirações com a carreira.
O resultado da pesquisa nos mostrou que os sargentos são, em sua maioria, advindos de
famílias de classe baixa, vindos da região sul e sudeste, com idade entre dezenove e vinte e
cinco anos, sem parentes militares e com ensino médio concluído, porém sem grandes
oportunidades de avançar nos estudos e garantir uma carreira fora do Exército. Comprovou a
tese de que o Exército serve, historicamente, como um meio de ascensão social daqueles que
se encontram mais abaixo da pirâmide social brasileira.
Quando, então, passa-se para a coleta dos dados referentes a produção científica a
respeito do Ensino Militar no Brasil e, subsequentemente, à análise dos dados coletados tendo
47
pouca quantidade pode-se constatar que as temáticas militares ainda não motivam os Programas
de Pós-graduação, apesar das apontadas relevâncias econômicas e sociais das FA sempre
representaram para o país. Das pesquisas selecionadas temos, 06 (seis) teses de doutorado, 03
(três) dissertações de mestrados, 02 (dois) artigos cientificas publicados. As áreas contempladas
pelas pesquisas selecionadas são as seguintes: 04 (quatro) na área de Educação; 01 (uma) na
área de Ciências Políticas; 01 (uma) na área da Psicologia Social; 01 (uma) na área da História
e Cultura Política; 01 (uma) na área de História; 01 (uma) na área de Ciências Sociais; 02 (dois)
artigos científicos tratando sobre a Educação Militar.
31
Disponível em: <http://www.espcex.ensino.eb.br/downloads/Edital_EsPCEx_2015.pdf>. Acesso em: 26 Jan.
2016.
49
em duas fases, sendo a 1ª fase composta do exame intelectual e a 2ª fase composta pela
comprovação dos requisitos biográficos pelos candidatos, inspeção de saúde e exame de aptidão
física como condição para o ingresso na EsPCEx. O funcionamento
A EsPCEx é a porta de entrada para a carreira militar bélica e o primeiro ano dos cinco
anos de Formação do Oficial da Linha Bélica Militar, por isso é preparatória. Hoje o ensino na
EsPCEx passa por transformações significativas, saindo da proposta de Ensino por Objetivos
para aquela do Ensino por Competências, e do Ensino Médio para o Ensino Superior. O Ensino
por Competências começou a ser implantado com o objetivo de desenvolver um projeto para o
Sistema de Ensino do Exército (SEE) e para o Sistema de Instrução Militar do Exército
Brasileiro (SIMEB), o projeto ainda está em curso. “Competência” foi conceituada como sendo
“[...] a ação de mobilizar recursos diversos, integrando-os para decidir e atuar em uma família
de situações”. Atualmente o Ensino por Competência está em fase de implantação no SEE e no
SIMEB.
32
Disponível em: http://www.espcex.ensino.eb.br/index.php?option=com_content&view=article&id=515&Item
id=147&lang=pt>. Acesso em: 26 Jan. 2016.
50
“E foram grandes teus heróis, ó pátria, — Mulher fecunda, que não cria escravos —, Que ao trom da guerra
soluçaste aos filhos: "Parti — soldados, mas voltai- me — bravos". Castro Alves
Esse pequeno excerto do poema, relata o ambiente em que partiram os filhos, pais,
maridos para a guerra, deixando o lar seguro para lutar pela pátria. Partiram soldados e voltaram
heróis. Na busca por novos horizontes, partimos para nossa guerra diária, em busca do
conhecimento, travamos nossas batalhas e nos tornamos heróis dessa pátria chamada
conhecimento. Que ao regressar da jornada, tenhamos a consciência de ter lutado o bom
combate e ao final preservado a fé.
Entre 1808 e os dias atuais, a Força Terrestre teve várias academias destinadas a
formação de seus oficiais, vindo a consolidar a AMAN como o celeiro de formação da
oficialidade do Exército Brasileiro, as academias de formação dos Oficiais Combatentes
passaram por diversas transformações, de acordo com a época e a finalidade: Ela foi a Casa do
Trem (1792-1810); a Escola do Largo do São Francisco ( 1812– 1858); a Escola Militar da
Praia Vermelha (1855-1904); a Escola de Guerra (1906-1910) Porto Alegre –RS; a Escola
Militar do Realengo (1912-1944); e a Academia Militar das Agulhas Negras, desde 1944.
Para ele se constituía como Estado todos os governos que tinham autoridade sobre os
cidadãos, podendo este Estado ser governando na forma de uma república ou de um principado.
Uma das características para ser um Estado, na sua concepção deveria ser a capacidade de impor
a ordem aos seus concidadãos. Fez ele um alerta, expondo exemplos que durante toda a história,
quem resistiu teve a ajuda dos exércitos e das armas para fazer valerem suas constituições:
O estabelecimento de uma força armada, bem treinada, bem equipada e bem comandada
para a defesa do Estado, seja ela contra desordens internas, causadas pelos próprios concidadãos
ou as causadas por forças externas, que porventura tentem perturbar a ordem. O poder que uma
república ou principado tem de se defender, sobretudo é necessária pela própria natureza do
52
homem. A natureza humana, aqui traduzida pelo pensamento de Hobbes de que “o homem é o
lobo do homem”, suscita a manutenção de uma força capaz de conter o ímpeto humano e é
fundamental para a manutenção do Estado e do governo. Maquiavel destaca que a natureza do
povo é varia, sendo difícil firmá-la apenas na persuasão.
Rei D. João III decreta a edificação da Capital como se fosse uma fortaleza
defensiva15 tanto de ataques indígenas quanto de invasões estrangeiras. Há também
a preocupação de colocar toda a comunidade local sob o comando de um capitão,
hierarquizando a relação social do mando e obediência. O documento, que se revestia
de diretrizes militar e civil, permitia ao donatário, o exercício do poder militar e a
função de comandante. A existência de uma força militar composta de pessoas
especializadas em artilharia e nas munições pressupõe a existência de especialistas,
de origem lusitana, capazes de operarem tais atividades (LUCHETTI, 2006, p. 48)
A preocupação com a defesa da colônia por parte de Portugal, se dava não só do possível
inimigo externo, mas também com relação ao possível risco representado pelos nativos, que por
lei eram proibidos de portar e manusear arma de fogo, conforme o estabelecido pelo Regimento
de Tome de Sousa:
Por quamto per direito e polas leis e ordenações destes reinos he mandado que se não
dem armas a mouros nem a outro s imfieis porque de se lhe darem se segue muito
deserviço de Nosso Senhore prejuizo aos christãos mando que pesoa allgûa de
quallquer calidade e condição que seja não dê aos jentios da dita terra do Brasill
artilaria arcabuzes espigardas polvora nem monições pera elas beestas lamças e
espadas e punhaes nem mamchis nem fouces de cabo de paao [...] (REGIMENTO
TOMÉ DE SOUSA, 1548, p.348 apud LUCHETTI, 2006, p. 48)
53
Para Luchetti (2006), naquela época existia três formas de organizações militares agindo
na colônia: as forças regulares, as semirregulares e as irregulares. Sendo as regulares vindas de
Portugal para levarem a cabo as grandes operações, podendo serem destacadas as operações de
expulsão dos franceses na Guanabara e posteriormente no Maranhão. Depois a manobra que
resultou na expulsão dos holandeses de Pernambuco. Já as forças semirregulares eram
compostas pelas forças dos Serviços e Ordenações Gerais e guerreiros sem formação
profissional-militar. As tropas irregulares eram aquelas que se organizavam por iniciativa dos
povoados, moradores e colonizadores, ou seja, sem obedecer às normais legais vigentes, tanto
as da colônia como na Metrópole (LUCHETTI, 2006, p. 49).
33
Constituição Política do Império do Brasil, elaborada por um Conselho de Estado e outorgada pelo Imperador
D. Pedro I, em 25.03.1824. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm>. Acesso em: 26 Jun. 2016.
34
Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (de 24 de fevereiro de 1891). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm>. Acesso em: 26 Jun. 2016.
54
dos próprios nativos, que àquela altura já detinha a consciência da importância de defender sua
terra. Para as Batalhas de Guararapes pela primeira vez a união de índios, pardos e brasileiros,
num mesmo esforço coordenado na defesa nacional contra a invasão dos holandeses. Foi aquela
batalha de fundamental importância para que a instituição fizesse um diagnóstico do que ela
era e do que ela pretendia ser.
A importância da referida batalha foi tanta que o EB consagrou o dia 19 de abril como
“O dia do Exército Brasileiro”, em homenagem a 1ª Batalha dos Guararapes transcorrida em 19
de abril de 1648, nas proximidades do Recife, esse episódio resultou na vitória do "Exército
Patriota", integrado por combatentes das três raças formadoras da nacionalidade brasileira,
contra as tropas de ocupação do invasor holandês que, dominava boa parte da Região Nordeste.
Em Guararapes, disse o eminente historiador Gilberto Freire, "escreveu-se a sangue o endereço
do Brasil: o de ser um Brasil verdadeiramente mestiço, na raça e na cultura". Segundo o General
Flamarion Barreto em conferência proferida durante a Semana da Pátria de 1966, "O Brasileiro
nasceu nos Guararapes"35.
Figura 2: Tela de Victor Meirelles: "retrata o lugar, onde se deu a batalha, conforme se refere a História".
Disponível em: <http://www.ensino.eb.br/aaex/lt_01.htm>. Acesso em: 26 Abr. 2017.
35
Disponível em: <http://www.ensino.eb.br/aaex/lt_01.htm>. Acesso em: 26 Jun. 2016.
55
A epopeia dos Guararapes, que hoje celebramos, amalgamou negros, brancos e índios,
grupos étnicos matrizes de nosso povo, em torno do nascente sentimento de
nacionalidade que os lançou, de armas em punho, a defender aquela terra que já
identificavam e amavam como a sua pátria36.
36
Ordem do Dia, referente ao Dia do Exército de 19 de abril de 2016. Disponível em:
<http://www.eb.mil.br/documents/16541/7263485/NE+EB+2016.pdf/a642bad6-5b20-4c57-9cd7-
40d58629a802>. Acesso em: 27 Jun. 2016.
56
O último Estatuto dos Militares das FA aprovado pela Lei Federal nº 6.880, de 9 de
dezembro de 1980, que regula todos os direitos e obrigações dos seus membros, tendo definido
em seu artigo 2º que as FA são essenciais à execução da política de segurança nacional,
destinam-se a defender a Pátria e a garantir os poderes constituídos, a lei e a ordem, sendo
instituições nacionais, permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na
disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República e dentro dos limites da lei.
A sociedade Militar tem um caráter de sociedade fechada por seu particularismo e seu
isolamento dentro da comunidade nacional, definindo assim sua essência. É uma sociedade
composta por membros de diferentes seguimentos da escala social, de diversas regiões do país,
com costumes e culturas diferentes. Essa sociedade é constantemente chamada de “Família
Militar”, cujos laços são formados com a convivência diária de seus membros, e pelo exercício
de um dos atributos mais importante, se não o mais importante, o qual o militar deve possuir e
o exercitá-lo diariamente, qual seja, a lealdade. Essa lealdade deve ser dirigida a seus
companheiros, mas principalmente à Pátria, razão de ser dessa sociedade. O termo “Família
Militar” é uma construção ideológica que confere a identidade a identidade dessa sociedade.
[...] família em que a autoridade era mais ou menos paterna e que tinha seu caráter
próprio impresso por seu chefe ou por um antigo coronel mais temido ou mais amado
que seus antecessores. Mas todos os regimentos possuíam em comum o espírito
militar e, se é possível expressar assim, o espírito antiburguês (GIRARDET, 200, p.
63).
partir desta data, será ele separado da massa de seus concidadãos, sendo incluído em uma nova
ordem. A condição de soldado o coloca em um plano moral diferente dos demais, passando a
impor às suas consciências outras exigências, submetendo-lhe a outras leis, em geral mais
rigorosas e pedindo-lhe, em nome do Estado, nada menos que o sacrifício da própria vida.
[...] As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica,
são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na
hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e
destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa
de qualquer destes, da lei e da ordem (BRASIL, 1988, Art. 142).
A educação militar no Brasil, segundo Ludwig (1998), tem por propósito formar um
aplicador da violência estatal adequado ao jogo de forças existente no seio da sociedade
capitalista, para isso utiliza um ethos apropriado para atingir esses fins. Para adequar-se ao
modo de ser militar, o soldado precisa conhecer a biografia da Pátria e dos seus heróis, não
apenas para cultuar essas personalidades, mas para deixar-se envolver por seu espírito de
renúncia e sua tenacidade.
Definir o significado de ethos não é tarefa fácil e muito menos exata. Podemos definir
ethos como como um conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação
a outros homens na sociedade em que vive, a fim assegurar a convivência harmônica na
consecução do bem-estar social dessa dada sociedade. É um modo de ser, uma espécie de síntese
dos costumes de um povo, indica os traços característicos de um grupo social específico do
ponto de vista sociocultural em diferença a outros grupos. Desse modo formando uma
identidade social de uma determinada categoria social.
e para outros ethos é tratado com a derivação de ética, citando o conceito etimológico do termo
ethos adotado Chauí (2003).
Na língua grega existem duas vogais para pronunciar e grafar nossa vogal e: uma
vogal breve, chamada épsilon, e uma vogal longa chamada eta. Éthos, escrita com a
vogal longa, significa costume; porém, se escrita com a vogal breve, éthos, significa
caráter, índole natural, temperamento, conjunto das disposições físicas e psíquicas de
uma pessoa. Nesse segundo sentido, éthos se refere às características pessoais de cada
um, as quais determinam que virtudes e que vícios cada indivíduo é capaz de praticar
(CHAUÍ, 2003, p. 320, apud NOGUEIRA, 2014, p. 69).
O ethos militar é introjetado na personalidade do militar por meio das práticas rotineiras
e eminentemente militares, como os discursos oficiais, as falas dos comandantes e superiores
hierárquicos que são assimiladas prontamente, sem questionamentos pelos subordinados sob
pena de ferir de morte os pilares de sustentação das instituições militares, qual seja; a hierarquia
e a disciplina, que são fundamentos da carreira militar, os pilares de sustentação de todas as
ações de comandantes e comandados. Esses valores são marcados na alma do soldado pelo culto
as tradições militares, aos vultos militares e aos símbolos nacionais como, a bandeira e o hino
nacional.
De fato, o que nos é aqui pregado não é apenas um meio de fazer a própria vida, mas
uma ética peculiar. A infração de suas regras não é tratada como uma tolice, mas como
um esquecimento do dever. Essa é a essência do exposto. Não se trata de mera astúcia
de negócios, o que seria algo comum, mas de um ethos. Essa é a qualidade que nos
interessa (WEBER, 2002, p. 46 apud NOGUEIRA, 2014, p. 71).
59
Uma boa compreensão do que seja esse ethos militar é expressa no Vade-Mécum de
Cerimonial Militar do Exército - Valores, Deveres e Ética Militares, que traz as principais
"ideias-força" referentes aos valores, deveres e ética militares, visando a contribuir para o
continuado aprimoramento das virtudes militares. O referido Vade-Mécum apresenta como
valores a serem cultuados diuturnamente pelos militares, o patriotismo, o civismo, a fé na
missão do Exército, o amor a profissão, o espírito de corpo e o aprimoramento técnico-
profissional.
Já a carreira militar não deve ser encarada como uma simples ocupação, um emprego,
deve ser encarada como um ofício exclusivista e absorvente, dos mais nobres e necessários à
defesa e segurança Pátria:
Castro (2004) cita que para Berger e Luckmann o processo de socialização militar é de
natureza tão intensa que o indivíduo acaba “mudando de mundos”. Para Vidich e Stein o
processo de ensino aprendizagem para a criação de um soldado é como se houvesse uma
“dissolução” de sua identidade anterior de “civil” e a criação de uma nova identidade, a de
militar:
37
Disponível em: <http://www.sgex.eb.mil.br/index.php/vadem-mercum/86-cerimonial/vade-mecum/120-
valores-deveres-e-etica-militares>. Acesso em: 15 Fev. 2016.
60
A origem do ensino militar no Brasil é tão antiga quanto a própria educação civil,
remontando ao final do século XVII, segundo Pirassinunga (1958) encontramos o primeiro
vestígio do ensino militar, em 1698, na cidade do Rio de Janeiro, nas lições mandadas dar aos
contestáveis e Artilheiros dessa Praça, sobre uso e manejo da artilharia. Este ensino foi ordenado
pelo Rei em Carta Régia de 22 de outubro de 1699.
[...] e ser conveniente a meu serviço haver Mestre que lhes dê lição por estarem
comendo os seus soldos com pouco préstimo no seu ofício. E pareceu-me, dizer-vos
que quando o Engenheiro que eu nomear em lugar de Gregório Gomes, não tenha a
ciência que convém do uso e manejo da arma para o ensinar, neste caso se tratará de
prover outrem no posto de Capitão da Artilharia desta Praça, e por ora esta doutrina
pode dar na Cadeia o Engenheiro onde é mais fácil recebê-la os que quiserem aprendê-
la do que ir o mesmo Engenheiro às fortificações para cuja diligência o mando
desembaraçar na prisão em que está (PIRASSINUNGA, 1958, p. 9, apud
NOGUEIRA, 2014, p. 1-17).
38
No século XIX Napoleão Bonaparte tornou-se soberano do império da França, tendo como objetivo apoderar-se
de toda a Europa. Naquele momento da história, Portugal era governado Dom João. Portugal e Inglaterra eram
velhos cúmplices, o que deixou Dom João em uma posição delicadíssima com relação a Napoleão. A saída
encontrada, em conluio com os ingleses, foi a mudança da Corte Portuguesa para a então Colônia. Em novembro
61
Gomes (2007), ao retratar a vinda da Corte e da Família Real para o Brasil fez um
diagnóstico das condições do ensino na então Colônia, incluindo evidentemente o ensino
militar, que naquela época era incipiente.
Antes da chegada da corte, toda a educação no Brasil colônia estava restrita ao ensino
Básico e confiada aos religiosos. As provas eram muitas vezes ministradas dentro das
igrejas, com plateia para assistir ao desempenho dos alunos. Ao contrário das vizinhas
colônias espanholas, que já tinham suas universidades, no Brasil não havia uma só
faculdade. D. João mudou isso ao criar uma escola superior de Medicina, outra de
técnicas agrícolas, um laboratório de estudos e análises químicas e a Academia Real
Militar, cujas funções incluíam o ensino de Engenharia Civil e Mineração (GOMES,
2007, p. 217).
Luchetti (2006) pontua que o ensino militar no Brasil Colônia era precário e as aulas
eram ministradas de forma avulsas e descentralizadas. O primeiro núcleo de formação de ensino
militar no Brasil foi o Curso Prático de Fortificação instalado em 1699 na cidade do Rio de
Janeiro.
Nogueira (2014), cita ainda, como curiosidade que as primeiras aulas foram dadas na
cadeia da cidade do Rio de Janeiro, ministradas pelo Capitão-Engenheiro Gregório Gomes, em
de 1807, sob proteção da força naval inglesa, D. João, sua linhagem e a nobreza que o rodeava mudaram-se para
o Brasil. Disponível em: <http://www.infoescola.com/historia/a-vinda-da-corte-portuguesa-para-o-brasil/>.
Acesso em: 23 Abr. 2016.
62
Artur de Sá e Menezes. Amigo. Eu El Rei vos envio muito saudar. Por ser conveniente
a meu serviço, Hei por bem que nessa capitania em que há engenheiro, haja aula em
que possa ensinar a fortificar, havendo nela três discípulos de partido, os quais serão
pessoas que tenham capacidade necessária para poderem aprender, e para se aceitarem
terão ao menos 18 anos de idade, os quais sendo soldados se lhes dará além do seu
soldo meio tostão por dia; e não o sendo, vencerá só o meio tostão; e todos os anos
serão examinados para ver se (sic) adiantam nos estudos e se tem gênio para eles,
porque quando não aproveitem incapacidade serão logo excluídos, e quando não seja
pela pouca aplicação. Se lhes assinará tempo para se ver o que se melhoram; e, quando
se não aproveitem nele serão também despedidos. E quando haja pessoas que
voluntariamente queiram aprender sem partido, serão admitidas, e ensinadas para que
assim possa nessa mesma Conquista haver engenheiros, e se evitem as despesas que
se fazem ao meu serviço, enquanto chegam depois dos outros serem mortos, de que
me pareceu avisar-vos, para que tenhais entendido a resolução que fui servido tomar
neste particular; e esta ordem mandareis regular nas partes necessárias, e fareis com
que se faça pública para que venha a notícia a todos. Eu vi-a “Rei”. Conde de Alvor
(PIRASSINUNGA, 1958, p. 9, apud NOGUEIRA, 2014, p. 1-17).
[...] o corpo de oficiais, são os elementos desse grupo que geralmente participam das
articulações golpistas, mobilizam contingentes de apoio aos conspiradores e lideram
subalternos no combate aos movimentos perturbadores da ordem social (LUDWIG,
1998, p. 7).
39
Junker eram denominados os membros da nobreza constituída por grandes proprietários de terras nos estados
alemães anteriores e durante o 2.º Reich (1871-1918). Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Junker>.
Acesso em: 23 Abr. 2016.
63
um lado a classe dominante, a burguesia nacional, liderada pela indústria, preocupada com sua
sobrevivência, sempre em busca de lucros imediatos e benefícios estatais.
Esse processo de ensino do EB hoje está consolidado por marcos legais e tem conforme
o artigo 3º da Lei nº 9.786/1999, os seguintes princípios fundamentais: I - integração à educação
nacional; II - seleção pelo mérito; III - profissionalização continuada e progressiva; V -
pluralismo pedagógico; VI - aperfeiçoamento constante dos padrões éticos, morais, culturais e
de eficiência; VII - titulações e graus universitários próprios ou equivalentes às de outros
sistemas de ensino. Como se vê, a Educação Militar no Brasil tem origem histórica anterior ao
nascimento do Brasil como nação independente e destacada importância na nossa consolidação
como nação.
A referida lei foi regulamentada pelo Decreto nº 3.182, de 23 de setembro de 1999, não
prevendo qualquer forma de fiscalização e controle por parte do legislativo ou executivo nas
atividades de ensino da caserna. Ficou a cargo da própria instituição aprovar, conduzir,
especificar, regular, designar, todas as atividades de ensino, incluindo aí a elaboração dos
currículos escolares, seja dos alunos dos colégios militares do ensino fundamental ao ensino
médio, aos cadetes da AMAN, que serão os futuros oficiais e comandantes das frações pelos
mais diversos rincões deste país.
64
na Campanha do Sul (1751-59), onde ocorreu a Guerra Guaranítica (1754-56), que culminou
com a expulsão dos jesuítas e índios dos Sete Povos das Missões, com a ajuda do exército da
Espanha. O ensino militar acadêmico nas Américas e o ensino acadêmico geral no Brasil
remontam a Casa do Trem que foi
[…] a pioneira no ensino acadêmico militar nas Américas. Data de 1792, dez anos
antes da instalação da Academia de West Point (1802) pelo Congresso dos EUA, e
destinada a formar oficiais das quatro armas do Exército de então. É, também, pioneira
do ensino acadêmico no Brasil. A Academia Real de Guardas-Marinha (1782 em
Portugal) só chegou ao Brasil em 1808, 16 anos depois da instalação da Real
Academia (1792)40.
Foi também a Casa do Trem que, além de ter servido de berço para a indústria, o
nascedouro do ensino acadêmico civil no Brasil,
Foi nas instalações da Casa do Trem, que a Real Academia de Artilharia, Fortificação e
Desenho destinada a formação de oficiais de Infantaria, Cavalaria, Artilharia e Engenheiros
para o Exército brasileiro foi instalada em 179242, por ordem do Vice-Rei o Conde de Resende,
destinada a formação de oficiais, a fim de suprir as necessidades de pessoal, funcionaria neste
local até 1810. Luchetti (2006), aponta a remodelação do ensino militar, ocorrida em 1972,
como condição para a transformação das aulas, a fim de valorizar o mérito intelectual e a
liberdade da escolha das armas:
40
BENTO, Cláudio Moreira. Escolas de formação de oficiais das Forças Armadas do Brasil. Disponível em:
<http://www.ahimtb.org.br/escolas.htm>. Acesso em: 18 Jan. 2016.
41
Idem.
42
Construção destinada a abrigar o Material Bélico do Exército Demarcador do Tratado de Madrid em 1750,
conforme o Informativo Guararapes, Disponível em: <http://www.ahimtb.org.br/escolas.htm#ctrem>. Acesso em:
18 Jan. 2016.
66
Remeto á V. Exa. Os Estatutos da nova Aula Militar que no dia 17 do presente mês,
por ser o dos Anos de Sua Majestade, mandei abrir nesta Cidade, á qual assisti com
um grande numero de oficiais e concurso de muitas pessoas, que além dos
matriculados, a quem com antecedência havia prevenido e feito avisar para assistirem
a este ato, poderão aproveitar-se dos Estudos da mesma Aula (PIRASSINUNGA,
1958, p. 29, apud NOGUEIRA, 2014, p. 43).
Nogueira (2014) pontua ainda, que em 1795 foi desmembrado a Real Academia e
formado a Academia Militar destinada, exclusivamente, para formar oficiais da Arma de
Infantaria pelo fato da não adaptação dos alunos infantes às aulas ministradas na Real Academia
da Artilharia, Fortificações e Desenho. Seria uma Academia exclusivamente para os alunos
infantes, denominada de Nova Academia de Aritmética, Geometria Prática, Fortificação,
Desenho e Língua Francesa, que também funcionaria da cidade do Rio de Janeiro no ano de
1975. Tinha como características a rigidez no tratamento aos alunos (NOGUEIRA, 2014, p.
151).
Em 1808 D. João VI que naquela época governava o Reino de Portugal em nome de sua
mãe, D. Maria I, fugindo da eminente invasão de Portugal pelo Exército Francês de Napoleão
Bonaparte, desembarca no Brasil, instalando-se em Salvador na Bahia. Dom João se depara
com a precariedade das forças destinadas a segurança territorial e incumbiu seu Ministro dos
Negócios Estrangeiros e da Guerra da criação de um Exército, pois “[...] os corpos de tropa
eram poucos e bisonhos, mal instruídos, precariamente armados e, sobretudo, faltava-lhes
articulação e o sentido de conjunto, próprios dos organismos militares evoluídos” (VIANNA,
1956, p. 268, apud NOGUEIRA, 2015, p. 44).
Gomes (2007), ao retratar a vinda da Corte e da Família Real para o Brasil fez um
diagnóstico das condições do ensino no Brasil Colônia, ali também incluído o ensino militar,
que naquela época era bastante incipiente e pouco para a defesa da Família Real e das riquezas
da Colônia.
[…] Antes da chegada da corte, toda a educação no Brasil colônia estava restrita ao
ensino Básico e confiada aos religiosos. As provas eram muitas vezes ministradas
dentro das igrejas, com plateia para assistir ao desempenho dos alunos. Ao contrário
das vizinhas colônias espanholas, que já tinham suas universidades, no Brasil não
havia uma só faculdade. D. João mudou isso ao criar uma escola superior de Medicina,
outra de técnicas agrícolas, um laboratório de estudos e análises químicas e a
Academia Real Militar, cujas funções incluíam o ensino de Engenharia Civil e
Mineração (GOMES, 2007, p. 217).
67
Nogueira (2014) cita que foi nessa data, 5 de maio de 1808, que teve início a
remodelação do ensino militar no Brasil, com restabelecimento da Real Academia de Guardas
Marinha no Convento de São Bento, no Estado do Rio de Janeiro. Fruto dessa onda
modernizadora foi criada a Academia Real Militar pela Carta de Lei de 4 de dezembro de 1810,
pelo então Príncipe Regente D. João e destinada à formação de oficiais para a Colônia e demais
partes do Reino de Portugal, que funcionava junto a Casa do Trem, tendo iniciado suas aulas
em 23 de abril de 1811, aproveitando as estruturas físicas da Real Academia. Após ser
remodelada, a Casa do Trem integra, desde 1922, o conjunto que forma o Museu Histórico
Nacional no Rio de Janeiro.
A academia não tinha um comando unificado, era dirigida por uma junta que se reunia
uma vez por mês, comparado com os padrões atuais ela seria considerada uma academia
desmilitarizada. O curso na Academia se desenvolvia em caráter de externato conforme o
regulamento de 1810, não era requisito indispensável para o ingresso no oficialato e nem para
a ascensão na carreira militar. Castro (2004) afirma que o surgimento dessa Academia Militar
se insere em dois contextos históricos,
Visando propiciar uma formação mais ampla dos alunos, Nogueira (2014) destaca que
por ordem de D. João VI, a Academia Militar teve a incumbência de ir além de o ensino militar
e oferecer,
68
A Academia Real teve novo estatuto apresentado em 1833, com o intuito de “militarizá-
la” através da organização do comando e de um novo regime militar. A intenção da reforma era
implantar uma academia nos moldes das nações mais ilustradas. Em discurso na Câmara dos
Deputados em maio de 1833 o ministro da Guerra, brigadeiro Antero José Ferreira de Brito,
observa:
Em 1858, em substituição à Academia Real Militar, foi criada pelo decreto número
2.116, de 1o de março de 1858, a Escola Central do Exército que, além de atender à
dupla formação, de militares e de engenheiros, passou a funcionar em dois prédios
diferentes: na Praia Vermelha, com a formação de oficiais, e no Largo de São
Francisco, o centro de formação de engenheiros civis, o único do período. “Numa as
matemáticas, as ciências físicas, o estudo da Engenharia; noutra o regime militar
rigoroso, a ordem unida, o acampamento, o manejo das armas, a prática do tiro”
(MOTTA, 1998, p. 113 apud NOGUEIRA, 2014, p. 47).
Essa separação das escolas trouxe vantagens para a Escola Central do Exército, do Largo
de São Francisco, no período de 1855 a 1874, no tratou da formação dos engenheiros civis, após
a desvinculação destes dos tratos militares, conforme pontua Luchetti (2006):
Foi nessa academia onde a engenharia militar e civil foram forjadas, conforme afirma
Braga (2011) “[...] a mais antiga e tradicional Escola de Engenharia, berço da Engenharia Civil
no nosso país. Ao longo dos anos e durante a grande parte do século XIX, o ensino da
70
Luchetti (2006) afirma que essa divisão proporcionou uma dicotomia na forma de
ensino do Exército, na Praia Vermelha focava na formação do oficial operacional e enquanto na
Escola Central do Exército era proporcionada uma formação técnica e científica, formando os
engenheiros civis, delimitando com clara e objetiva definição a formação de cada uma das
escolas deveria proporcionar aos discentes.
A Escola Militar da Praia Vermelha, existente no período de 1855 a 1904 teve várias
denominações e funções, funcionou como: Escola Militar de Aplicação; Escola Militar; Escola
Militar da Corte; Escola Militar da Capital Federal; e Escola Militar do Brasil. Formou os
oficiais para o Exército Brasileiro entre 1859 e 1904. Na Praia Vermelha estudaram e se
formaram tenentes e capitães que lutaram na guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai. Nessa
academia estudou o marechal Hermes da Fonseca Presidente da República (1906-14); o
Marechal Mascarenhas de Moraes, Comandante da Força Expedicionária Brasileira.
Na Escola Militar da Praia Vermelha a formação era eminentemente militar. Essa escola
recebeu o nome de Escola de Aplicação do Exército, passando por várias reformulações. Essas
reformulações primavam, principalmente, na tentativa de regulamentação do currículo
eminentemente militar, com rigorosa disciplina e em regime de internato, predeterminando
horários rígidos e o tempo destinado ao estudo.
Com essa desvinculação podemos dizer que o objetivo era afastar os oficiais
combatentes da ceara política:
[...] por autorização do Poder Legislativo, em 1873, e foi regulamentado pelo decreto
número 5.529 de 17 de janeiro de 1874. Essa reformulação levou à desvinculação
entre a formação dos militares e dos engenheiros, união que vinha se efetivando desde
1811, e foi a medida tomada para transformar os assuntos militares mais adequados
ao que a profissão exigia, ou seja, para a “militarização dos estudos”, num ambiente
único, sob uma única escola, e em regime de internato. Anteriormente, as duas escolas,
militar e de engenharia, funcionavam em prédios diferentes, porém, sob uma mesma
72
diretriz superior com o curso de engenheiros civis apoiando o curso militar na arma
de engenharia. Esse intercâmbio profissional favorecia a troca de interesses e,
paulatinamente, essa sinergia de interesses tornou-se um incômodo porque as
influências políticas civis passaram a interferir diretamente na conduta dos militares,
os quais são obrigados, por lei, à obediência constitucional (LUCHETTI, 2006, p. 73).
Para Luchetti (2006), essa efervescência se explicaria pelas ideias europeias e o material
didático, principalmente os franceses.
Um dos canais que possibilitou o fervilhar das idéias européias no centro das escolas
militares pode ser justificado, em parte, pelo material didático escolar em forma de
exemplares europeus, principalmente franceses. Algumas disciplinas utilizavam
compêndios nacionais, fato que não eliminou o predomínio e a preferência pelos livros
estrangeiros. Esses livros possibilitaram que as idéias reformadoras européias
adentrassem, aos poucos, nos costumes nacionais (LUCHETTI, 2006, p. 76).
Mais uma reforma foi levada a termo em 1890, com esta reforma passou os estudos
preparatórios para três anos e o profissionalizante para cinco e seis anos, para os alunos de
infantaria, de cavalaria e de sete anos para os oficiais do Estado-Maior. Essa reforma ficou
popularmente conhecida como reforma Benjamin Constant. A nova sistemática de ensino afetou
negativamente o ensino prático militar, fruto da grande amplitude do ensino de ciências gerais.
A formação ficou excessivamente teórica em detrimento da instrução militar que era o objetivo
da Escola Militar da Praia Vermelha.
A Revolta da Vacina Obrigatória, em 1904, na Praia Vermelha, foi a gota d’água, que
culminou com seu fechamento e a adoção do Regulamento de Ensino de 1905, ponto de inflexão
do bacharelismo para o profissionalismo militar. Foram extintos os títulos de Bacharel em
73
Ciências Físicas e Matemáticas e o posto de Alferes. Este foi substituído pelo de Aspirante a
Oficial. A Escola Militar da Praia Vermelha, através de seus corpos docente e discente, teve
assinalada projeção nas campanhas cívicas que culminaram com a Abolição e a República43.
A fim de afastar a formação dos oficiais, do centro de cidade, a formação passou para o
bairro de Realengo, periferia da cidade, longe das agitações políticas. Com essa mudança, por
intermédio do Marechal Hermes da Fonseca, criou-se uma nova mentalidade no trato do ensino
militar. Implantou-se uma nova ação pedagógica voltada para a efetiva profissionalização dos
oficiais, com vistas à preparação para a guerra e para missões estritamente militares.
43
BENTO, Cláudio Moreira. Escolas de formação de oficiais das Forças Armadas do Brasil. Disponível em:
<http://www.ahimtb.org.br/esoclas.htm>. Acesso em: 18 Jan. 2016.
74
Entre 1906 e 1909, o Ministro da Guerra Hermes da Fonseca levou a cabo uma nova
remodelação do Exército, o que resultou em mais uma modernização ao criar de caráter
permanente, as grandes unidades chamadas de brigadas estratégicas, organização militar mais
adequada à realidade do país, pela grande extensão territorial. Foi com essa reforma que houve
a introdução do serviço militar obrigatório, através da Lei de 4 de janeiro de 1908. O Ministro
da Guerra enviou três turmas de oficiais para estagiar no Exército Alemão.
Após a Primeira Guerra Mundial em 1918, o ensino foi unificado na Escola Militar do
Realengo, existente de (1912 a 1944) foi a responsável pela formação de oficiais do Exército.
A unificação no Rio ocorreu na Presidência do Marechal Hermes da Fonseca. Ele evitara como
comandante da Escola Preparatória e Tática do Realengo (1898-1905), que ela tomasse parte
na Revolta da Vacina Obrigatória (14 de novembro de 1904) a qual aderiu a Escola da Praia
Vermelha. Funcionou também nesse espaço a Fábrica de Cartuchos do Realengo, fundada no
final do século XIX. Estudaram nessa escola os oficiais que elevaram bem alto o nome do
Exército, que atuaram na campanha da Força Expedicionária Brasileira na Itália. Pelos bancos
44
Disponível em: <http://www.ahimtb.org.br/esoclas.htm>. Acesso em: 18 Jan. 2016.
75
Após a sedição militar que envolveu seus alunos, em 14 de novembro de 1904, durante
a Revolta da Vacina, a Escola Militar do Brasil foi fechada e dividida em quatro
escolas: a Escola de Guerra de Porto Alegre, a Escola Preparatória e Tática do Rio
Pardo, a Escola Preparatória e Tática no Realengo e a Escola de Aplicação de
Artilharia e Engenharia no Realengo, que tinham como ideia principal abandonar o
cientificismo anterior e imprimir um conceito mais prático e objetivo na formação do
oficial do Exército. As quatro Escolas que sucederam a Escola Militar do Brasil foram
sendo unificadas até serem transformadas, em 1913, na Escola Militar do Realengo
(RODRIGUES, 2008, p. 58, apud NOGUEIRA, 2014, p. 48).
76
A mudança no currículo iniciada em 1920 foi fruto da modernização trazida pela Missão
Francesa (1919-1937), que veio com a incumbência de atuar na formação e afastar os jovens
oficiais da política, conforme (HORTA, 2012, p. 17).
Assim também ressalta Viana (2009) sobre a crescente participação na vida pública dos
discentes e docentes da referida escola e suas participações em episódios da nossa história.
A importância da escola também pode ser avaliada pela crescente participação de seus
integrantes na vida política brasileira, em episódios como o movimento tenentista da
década de 1920; a Revolução de 1930, que conduziu Getúlio Vargas ao poder; a
Revolução Constitucionalista de 1932; a implantação do Estado Novo em 1937 e sua
derrubada, em 1945; a Segunda Guerra Mundial; e o golpe militar de 31 de março de
1964 (VIANA, 2009, p. 7).
[...] o Exército, como uma instituição democrática por excelência, verdadeira ossatura
da nacionalidade é, por natureza a instituição que primeiro e mais rapidamente deve
se recompor, tanto é verdade que a integridade da Pátria, mais do que de qualquer
regime, repousa em sua eficiência (CASTRO, 2004, p. 126).
[...] o aluno das armas científicas (Engenharia e Artilharia) gozava de regalias que o
colocavam em condições excepcionais, muito diferentes das dos oficiais combatentes
(Infantaria e Cavalaria) e praças arregimentados nos Corpos de Tropa. Ao fim do curso
levava um ano praticando em comissões de construção de estradas de ferro, linhas
telegráficas etc. Terminado o período de seis anos, no mínimo, a Escola formava um
oficial inteiramente estranho à verdadeira profissão militar, sem o hábito da disciplina
e subordinação, com pronunciada tendência a discutir e criticar as ordens recebidas, e
que, por todos os meios, procurava esquivar-se de uma vida, cujos misteres
considerava pouco compatíveis com o seu preparo teórico e o seu título científico
(RODRIGUES, 2008, p. 74).
competentes e não cientistas. Esses oficiais preferiram a participação política que o interesse
pela carreira no Exército.
O Ministro conclui que, a não ser que se fizesse uma reforma radical em que as Escolas
militares se reduzissem a estabelecimentos de ensino destinados a formar oficiais de
Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Estado-Maior e Engenharia Militar, e não cientistas
e bacharéis, o melhor seria deixá-las como estavam, evitando as repetidas
reorganizações que aconteciam desde o século XIX, e que na maior parte das vezes,
em nada melhorava o sistema, apenas contribuía para perturbar ainda mais o que
estava feito. Toda reforma que conservasse na Escola um curso de bacharel em
Matemática e Ciências Físicas combinado com os cursos técnicos militares, sem
dúvida alguma, teria como conseqüência, na prática, o sacrifício do ensino
profissional (RODRIGUES, 2008, p. 74).
Foi na Escola Militar do Realengo onde iniciou a ideologia presente até os dias atuais
na AMAN, conforme Castro (2004), José Pessoa pretendeu criar “uma ideologia, que é um
misto de brasilidade e sentimento militar, amalgamados pelo culto do passado, pelo espírito de
tradição”. Para Castro (2004) essas medidas constituem um exemplo daquilo que Hobsbawn
chamou de “invenção das tradições”. Uma tradição inventada na concepção de Hobsbawn
significa:
A Escola Militar do Realengo presenciou nove reformas nos estatutos do ensino militar,
relacionadas a formação de oficiais. Todas as reformas estavam voltadas para a busca incessante
de novos rumos, a procura de estilos e padrões adequados, no que se relaciona ao
enquadramento militar e ao currículo da formação dos oficiais. Em 1931 foi idealizada a
transferência da sede da Escola Militar do Realengo para a cidade de Resende, buscando maior
espaço físico e melhor localização geoestratégica. Com essa necessidade iniciou-se a
construção da nova Escola Militar de Resende em 1938.
Braga (2011) afirma que com a criação Escola Militar de Resende e o fim da campanha
da Itália significou para o EB o fim da Doutrina Militar Francesa e o início da nova doutrina
79
Em 1944 foi criada a Escola Militar de Resende e declarada extinta a Escola Militar do
Realengo. Em 23 de abril de 1952, foi assinado decreto que transformou a Escola Militar de
Resende em Academia Militar das Agulhas Negras, localizada em Resende no Estado do Rio
de Janeiro.
dezembro de 1944, a AMAN passou a formar os oficiais combatentes do Exército Brasileiro até
os dias atuais, com reconhecida excelência.
Entre 1808 e os dias atuais onde a AMAN se consolidou como o celeiro de formação da
oficialidade do Exército Brasileiro, as academias de formação dos Oficiais Combatentes do EB
passaram por diversas transformações. Foi a Casa do Trem (1792-1810); a Escola do Largo do
São Francisco ( 1812– 1858); a Escola Militar da Praia Vermelha (1855-1904); a Escola de
Guerra (1906-1910) Porto Alegre –RS; a Escola Militar do Realengo (1912-1944); e pôr fim a
Academia Militar das Agulhas Negras, desde 1944.
Figura 10: Organograma dos órgãos de planejamento e direção de ensino do Exército Brasileiro
Disponível em: <http://www.detmil.ensino.eb.br/index.php/organograma>. Acesso em: 26 Abr. 2017.
45
Revista Verde Oliva, Ano XXXIX, nº 209, Especial, JAN/FEV/MAR 2011. Brasília: CCOMSEx, 2011.
Disponível em:<http://pt.calameo.com/read/001238206b923b64933d4>. Acesso em: 3 Jun. 2016.
81
Já na a Diretoria de Educação Técnica Militar (DTMil) tem por missão exercer ação de
comando, coordenar, controlar e supervisionar a execução e a avaliação do processo ensino-
aprendizagem nos estabelecimentos de ensino subordinados, voltados para especialização,
extensão, formação e aperfeiçoamento, bem como estabelecer a ligação técnica com as
46
BRASIL. Ministério da Defesa da República Federativa do Brasil. Exército Brasileiro. Portaria n.1.138, de 23
de setembro de 2014. Brasil, 2014. Aprova o Regulamento do Departamento de Educação e Cultura do Exército
e dá outras providências.
82
Organizações Militares (OM) com encargos de ensino que lhe forem determinadas para essas
atividades.
A evolução da educação militar no Brasil, como vimos, pode ser dividido em duas fases,
a primeira fase anterior a vinda Família Real Portuguesa para o Brasil, período em que o ensino
era ministrado de forma precária e improvisada. Já na segunda fase que começou com a chegada
da Corte Portuguesa e da Família Real em janeiro de 1808 foi executada uma grande
reestruturação do Exército, para criar uma força militar mais eficiente e menos amadora. A
origem do ensino militar no Brasil é bastante antiga, e remonta ao fim do século XVII.
Viu-se também que o processo de ensino do Exército Brasileiro está consolidado por
marcos legais e tem conforme o artigo 3º da Lei nº 9.786/1999 os princípios fundamentais: I -
integração à educação nacional; II - seleção pelo mérito; III - profissionalização continuada e
progressiva; V - pluralismo pedagógico; VI - aperfeiçoamento constante dos padrões éticos,
morais, culturais e de eficiência; VII - titulações e graus universitários próprios ou equivalentes
às de outros sistemas de ensino.
47
Disponível em: <http://www.espcex.ensino.eb.br/downloads/Edital_EsPCEx_2015.pdf>. Acesso em: 26 Jan.
2016.
83
2ª fase composta pela comprovação dos requisitos biográficos pelos candidatos, inspeção de
saúde e exame de aptidão física como condição para o ingresso na EsPCEx.
É a única porta de entrada para a carreira militar bélica e o primeiro ano dos cinco anos
de Formação do Oficial da Linha Bélica Militar, por isso é preparatória. Hoje o ensino na
EsPCEx passa por transformações significativas, saindo da proposta de Ensino por Objetivos
para aquela do Ensino por Competências, e do Ensino Médio para o Ensino Superior. O Ensino
por Competências começou a ser implantado após o Comandante do EB baixar a Portaria nº
137, de 28 de fevereiro de 2012, aprovando a Diretriz de Projeto de Implantação do Ensino por
Competências no EB. O objetivo é o desenvolvimento de um projeto de ensino por
competências no Sistema de Ensino do Exército (SEE) e no Sistema de Instrução Militar do
Exército Brasileiro (SIMEB), o projeto ainda está em curso.
48
Disponível em:<http://www.espcex.ensino.eb.br/index.php?option=com_content&view=article&id=515&Item
id=147&lang=pt>. Acesso em: 26 Jan. 2016.
84
“[...] Duas grandezas [..]! Uma—é um livro [..] Outra— uma espada [...]”. Castro Alves
A relação entre o “livro” e a “espada” na vida dos futuros oficiais da AMAN é muito
grande. Nas escolas militares os valores do auto aperfeiçoamento, da meritocracia e da
avaliação são introjetados diariamente na personalidade discente, para que eles adquiram esses
valores a companhia do “livro” é fundamental, por outro lado a “espada” os faz lembrar dos
propósitos das instituições militares e do objetivo maior da jornada, que é a preparação para a
guerra, assim a “espada” mantém viva a lembrança do juramento realizado, onde foi oferecido
a pátria, o sacrifício da própria vida.
Ainda, dentro da Cidade Acadêmica existem agências bancárias, agência dos correios,
igrejas, uma escola estadual, o Círculo Militar das Agulhas Negras e o Clube de Subtenentes e
Sargentos das Agulhas Negras, que visam proporcionar apoio e serviços aos cadetes e aos
moradores das vilas residenciais.
A corrente filosófica do Positivismo, que na concepção de Bussola (2002), teve sua raiz
histórica nas ideias de Galileu e Descartes, que acentuavam o valor das pesquisas cientificas
acima das demais. O positivismo nasceu como uma reação ao idealismo Hegel, defendendo um
maior respeito para a experiência e os dados positivos. O positivismo no século XIX
representou a realização do sonho dos homens de cultura e de dinheiro daquela época
(BUSSOLA, 2002, p. 36).
49
Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br/acesso-a-informacao/institucional/cidade-academica>. Acesso
em: 6 Mar. 2017.
86
Um dos maiores expoentes do positivismo foi Auguste Comte (França, 1798 – 1857),
grande entusiasta das realizações de seu tempo, que pregava a substituição da especulação
racional da filosofia, pela pesquisa cientifica. Comte propôs uma coletânea de ciências cuja
ramificação deveria esgotar dos os saberes humanos através dos dados coletados pela pesquisa
cientifica. Comte cunhou um lema que dizia: “nada de filosofia, nada de pura especulação e
sim, sistematização e metodologia das ciências” (BUSSOLA, 2002, p. 36).
O positivismo alcançou seu auge com a proclamação da República, que contava com
grande quantidade deles no Governo provisório e nas Forças Armadas. Bussola (2002), ainda
ressalta que era difícil encontrar um intelectual brasileiro que não fosse positivista ou que não
simpatizava com a corrente (BUSSOLA, 2002, p. 39).
as escolas militares e a doutrina, disseminando sua influência por toda a corporação. Outro fator
segundo o autor foi a falta de projeção social vivida pelos militares, que de certa forma
auxiliaram nessa aproximação, pois apresentava uma alternativa para o papel social e político
dos militares ao propor, na ausência de uma identidade profissional, uma identidade política: a
doutrina do soldado-cidadão (BELLINTANI, 2009, p. 4).
Kneipp (2016) explicita que os trabalhos pioneiros sobre o currículo foram realizados
nos Estados Unidos, em 1918 com o livro de Bobbitt The curriculum, como resposta sobre a
educação em massa, propunha que a escola funcionasse como uma empresa e o sistema
educacional fosse capaz de “especificar, precisamente, que resultados pretendia obter, que
pudesse estabelecer métodos para obtê-los de forma precisa e formas de mensurar que
permitissem saber com precisão se eles foram realmente alcançados” (KNEIPP, 2016, p. 57).
50
Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_e_Progresso>. Acesso em: 24 Jan. 2017.
88
junto com a formulação de tudo – “metas e objetivos”, conjuntos e roteiros – que, por
assim dizer, constitui as normas, regulamentos e princípios que orientam o que deve
ser lecionado (GOODSON, 2002, p. 117).
No Brasil, as primeiras preocupações com o currículo datam dos anos 1920. De 1920
a 1980, o campo foi marcado pelas teorizações americanas, inclusive os modelos para a
elaboração dos currículos, em sua maioria de víeis funcionalista, eram viabilizados através de
acordos bilaterais entre o Brasil e EUA, através do programa de ajuda à América Latina. Esse
quadro só começou a mudar após a redemocratização do Brasil e o enfraquecimento da Guerra
Fria, abalando o referencial funcionalista norte-americano, passando a ganhar força no
pensamento curricular as vertentes marxistas. Dois grupos nacionais se destacavam e passavam
a disputar a hegemonia – pedagogia histórico-crítica e pedagogia do oprimido (LOPES;
MACEDO, 2002, p. 13).
Para Sacristán (2000), o currículo é “[...] é uma práxis antes que um objeto estático
emanado de um modelo coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das
crianças e dos jovens, que tampouco se esgota na parte explicita do projeto de socialização
cultural nas escolas” (SACRISTÁN, 2000, p.15).
traçar objetivos que vão fazer toda a diferença. Serão com base nesses preceitos que o cidadão
tomará conhecimento de sua história e compreenderá o mundo globalizado em que vivemos.
Em um currículo descontextualizado, para Menezes & Araújo (2007) apud Martins (2004), não
importa se
preparar os recursos humanos para suprir as necessidades específicas da Força, deve capacitá-
los para interagir em todos os níveis com a sociedade brasileira.
O conceito de currículo para o EB, está baseado nas NCC, dispondo que “é um conjunto
de experiências de ensino espontâneas ou intencionais que permeiam os contextos educativos”,
e se manifesta “por meio das diretrizes e normas estabelecidas pelas políticas de ensino dos
órgãos gestores, do planejamento e da realização de atividades pedagógicas nos Estb Ens e OM
com encargos de ensino” (BRASIL, 2014c, p. 6).
desenvolvidas pelos concludentes dos cursos. Os perfis dos cursos de formação e graduação da
AMAN foram aprovados pelo Chefe do Departamento de Educação e Cultura do Exército e
publicados no Boletim nº 32, de 5 de maio de 2016. No ato de aprovação o chefe do referido
departamento faz referência que os referidos perfis profissiográficos foram aprovados de acordo
com as NCC.
Ao todo na AMAN funcionam sete cursos de formação e graduação, são eles: infantaria,
cavalaria, artilharia, engenharia, comunicações, intendência e material bélico. Todos esses
cursos tem a mesma finalidade, que é formar o Aspirante-a-Oficial, habilitando-o para os cargos
de Tenente e Capitão não aperfeiçoado. Graduar o bacharel em Ciências Militares e iniciar a
formação do chefe militar. E ainda desenvolver a visão sistêmica sobre a sua atuação na esfera
política, social, jurídica, cultural, cientifico-tecnológica, humanística, educacional e ambiental
nas organizações militares do EB (BRASIL, 2014c, p. 2).
Então, como se vê, os cursos têm duas finalidades precípuas, formar o Aspirante-a-
Oficial que é a parte militar da formação e graduar o bacharel em ciências militares, a parte
universitária da formação. Ao término do curso, o discente será diplomado como bacharel
ciências militares e declarados Aspirante-a-Oficial. O curso tem a duração de cinco anos, sendo
o primeiro deles realizado na EsPCEx, em Campinas (SP) – instituição responsável pela seleção
nacional para ingresso na AMAN. Nos quatro anos em que cursa a AMAN, o aluno recebe uma
formação humanística, científica e tecnológica – essenciais para o prosseguimento na carreira
militar.
51
Disponível em: <http://www.eb.mil.br/web/guest/armas-quadros-e-servicos>. Acesso em: 19 Jan. 2017.
92
As Ciências Militares foram incluídas no rol das ciências estudadas no país, pela Câmara
de Educação Superior, órgão do Conselho Nacional de Educação, ambos vinculados ao
Ministério da Educação, através do Parecer nº 1.295, de 6 de novembro de 2001, que
estabeleceu normas relativas à admissão de equivalência de estudos e inclusão das Ciências
Militares. No referido parecer, o relator, ao proferir seu voto, ressaltou a importância das
ciências militares desenvolvidas no âmbito das três Forças Armadas e Forças Auxiliares, para
ele:
[...] justifica sua inclusão no rol das ciências estudadas no Brasil, resguardando-se os
aspectos bélicos, exclusivos das Forças Armadas. Quando convier aos interessados, o
registro de diplomas expedidos pelo sistema militar poderá ser realizado por
universidades que atendam às exigências do Parecer CNE/CES 771/2001.
O aproveitamento de estudos nas diferentes ciências realizados no sistema militar ou
no sistema civil poderá ser efetivado sempre que do interesse de ambos e respeitadas
a legislação e normas específicas de cada sistema 52.
52
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2001/pces1295_01.pdf>. Acesso em: 22 Jan. 2017.
93
(BRASIL, 2010, p. 1-2). São áreas sensíveis e de grande importância para a transição do EB,
da Era Industrial para Era do Conhecimento.
O perfil também estabelece eixos transversais que devem ser trabalhados na formação
do futuro oficial. A educação transversal é conceituada pelo MEC como:
[...] temas que estão voltados para a compreensão e para a construção da realidade
social e dos direitos e responsabilidades relacionados com a vida pessoal e coletiva e
com a afirmação do princípio da participação política. Isso significa que devem ser
trabalhados, de forma transversal, nas áreas e/ou disciplinas já existentes (MENEZES;
SANTOS, 2001, p. 1).
Dos oficiais de artilharia espera-se que, dado o caráter técnico da arma de artilharia,
desenvolvam a capacidade de: planejar e conduzir o emprego tático de uma bateria de comando;
uma bateria de obuses; uma seção de operações; uma seção de reconhecimento e inteligência;
uma seção de comunicações; uma seção de logística; uma bateria de tiro; uma seção de
reconhecimento, comunicações e observação, tudo em operações convencionais. Deve também
desenvolver capacidades para conduzir uma fração em operações não convencionais,
manutenção da paz, ações subsidiárias e de segurança integrada.
O futuro oficial de comunicações deve ser capaz de: planejar e conduzir o emprego de
fração em operações convencionais comandando pelotões de comunicações; operações
convencionais de resistência e integrando força expedicionária; em operações de paz sob a
égide de organismos internacionais; em ações subsidiárias; ações de segurança integrada. Deve
estar capacitado para planejar e conduzir o emprego tático de frações de tropa, e como os demais
oficiais realizar atividades jurídicas e/ou penais, e administrativas. Quanto à educação
transversal é trabalhada os mesmos componentes dos cursos anteriores.
A grade curricular da AMAN é fruto de várias documentos e normas legais que vai de
lei a portaria, das quais destacamos: a lei de ensino do EB, Lei nº 9.786/1999, e seu regulamento,
Dec nº 3.182/1999; Política de Ensino do EB; Diretriz Estratégica de Ensino; Normas para a
Construção de Currículos; Normas para Desenvolvimento e Avaliação dos Conteúdos
Atitudinais; e Perfil Profissiográfico.
97
Essa grade curricular deve ser capaz de conduzir a formação dos oficiais combatentes
da linha bélica, sobre os quais serão depositadas as responsabilidades de conduzir um exército
que deve ser forte, ágil e moderno, capaz de contribuir com a dissuasão interna e externa, como
forma de expressão da política externa brasileira e sendo ao mesmo tempo o “Braço Forte” e a
“Mão Amiga”, a ser estendida sempre que o país precisar, seja em solo pátrio ou no estrangeiro.
O oficial formado com esse currículo deve ser capaz de administrar o uso da violência legitima
delegada as FA, pelo Estado Democrático, se abstendo de qualquer resquício de violência
pessoal.
Ao término do curso básico, os alunos no mês de agosto, numa marcante cerimônia, são
confirmados como “Cadetes” e recebem o “Espadim”, réplica em miniatura do sabre de Caxias,
“Símbolo da Honra Militar”. Nesse período, o Cadete estuda a legislação e as normas da
AMAN e do EB, além de tiro, técnicas de progressão em campanha, observação e orientação,
comunicações, higiene e
primeiros socorros em combate, técnicas especiais, instruções especiais, fortificação em
campanha, vigilância e reconhecimento, entre muitas outras disciplinas, conforme discriminado
na Grade Curricular53.
53
Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br/index.php/cc/curso-basico>. Acesso em: 22 Jan. 2017.
98
A filosofia, que para Aristóteles é “a ciências dos princípios e das últimas causas” e para
Platão o “uso do saber supremo e último, em proveito do homem” (BUSSOLA, 2002, p. 13),
disciplina que prega e incentiva a reflexão, a fim de que entendamos o mundo onde vivemos.
Para a AMAN a ação didático-pedagógica da filosofia é aplicada aos discentes do Curso de
Ciências Militares visando contribuir para o desenvolvimento de atitudes coerentes com os
compromissos éticos assumidos por todos os oficiais do EB. Portanto, essa ação pedagógica
tem como finalidade colaborar para a educação dos cadetes, futuros chefes e líderes de uma
Força Armada, dentro das características previstas para a sua formação, de acordo com o perfil
profissiográfico54.
O estudo do Direito, hoje mais que no passado, é importante pelo rol de atribuições e
possíveis intervenções do EB, seja nas operações de garantia da lei e da ordem, como nas
operações de paz, assim deve o futuro oficial reconhecer e atuar sobre os princípios da
legalidade e direitos humanos. Já a psicologia, tem por objetivo desenvolver, através dos
conteúdos procedimentais, as características atitudinais, inerentes ao futuro chefe militar, bem
como fornecer subsídios próprios da disciplina aplicáveis ao cotidiano militar de forma a
54
Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br/index.php/div-ens/37-de>. Acesso em: 22 Jan. 2017.
99
No terceiro ano, são trabalhadas as disciplinas de: Sociologia, Direito Penal e Processual
Penal Militar, Ética Profissional Militar, Iniciação a Pesquisa Cientifica, Língua Espanhola IV,
Língua Inglesa IV, Metodologia do Ensino Superior, Relações Internacionais, e repetem como
no segundo ano as disciplinas de Formação Técnico-Profissional, Complementação do Ensino
e Medidas Administrativas.
De forma clara e objetiva as contribuições das Ciências Sociais são apresentadas para a
formação de oficiais aptos a captar e analisar os sinais sociais e culturais emitidos a sua volta.
Essa nova capacitação contribui para a rica aquisição de informações situacionais necessárias
para as ações militares, visando decisões mais oportunas e adequadas no nível tático55.
55
Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br/index.php/div-ens/37-de>. Acesso em: 22 Jan. 2017.
100
56
Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br/index.php/div-ens/37-de>. Acesso em: 22 Jan. 2017.
101
O ensino propriamente dito, é conduzido pelo Corpo de Alunos, ao qual cabe: conduzir
o ensino das disciplinas acadêmicas de cunho especificamente militar; sob a coordenação da
Divisão de Ensino, assessorar o Diretor de Ensino nas atividades de planejamento,
programação, execução, avaliação e controle do ensino; exercer ação educacional permanente
sobre os cadetes, assegurando-lhes enquadramento e vivência militares.
“[...] Nem cora o livro de ombrear coto sabre... Nem cora o sabre de chamá-lo irmão [...]”. Castro Alves
O material que tivemos acesso e que julgamos necessário para a consecução dos
objetivos da referida, em parte foi obtida nos sites institucionais do EB e outra parte que não
estava no sítio do EB, AMAN e DECEx foi solicitado através do PPGEdu/UFMS diretamente
a AMAN através do OFICIO nº 031/2016/PPGEDU/CCHS/UFMS, de 23 de junho de 2016,
que foi encaminhado àquela Academia e remetido por meio de Ofício nº 2-SCP/DE/AMAN,
EB: 64000.254718/2016-26, de 27 de janeiro de 2016, no dia 3 de outubro de 2016.
104
Através dos sítios da AMAN, DECEx e EB tivemos acesso aos seguintes documentos:
Ao iniciar esta pesquisa nos imbuímos da atitude interdisciplinar uma vez que optamos
por uma interdisciplinaridade histórico/sócio/cultural que segundo Mello (2004) “buscamos
aquilo que nos afeta” pela familiaridade com o tema escolhido. Daí enveredamos para o
universo do Exército brasileiro, sua história, a cultura pela sua natureza social e antropológica.
Descrevemos situações nas quais compartilhamos em nossa vida no exército.
Por outro lado, ao sair do positivismo nos deparamos com o estruturalismo pós-moderno
com grande ênfase ao tecnicismo e às competências assinalados no currículo da escola militar
focada na formação de uma categoria profissional extremamente importante para a garantia da
soberania externa do país e responsável pela manutenção da paz interna, através das chamadas
operações de Garantia da Lei e da Ordem.
Para Mello (2004), a fundamentação das ciências humanas se encontra no modo de ser
do homem e são produzidas pelas descrições em um diálogo qualitativo. Ainda segundo a autora
quanto a colheita dos dados e provas.
Nesse sentido a atitude interdisciplinar adotada por este pesquisador permite dialogar
com a pesquisa qualitativa pois; “[...] parte do fundamento de que há relação dinâmica entre o
mundo real e o sujeito, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do
sujeito” (CHIZZOTTI, 2006, p. 79).
Assim o primeiro passo deste trabalho foi realizar a busca documental que arregimenta
grande parte da dissertação. A pesquisa com fontes primárias foi realizada em dois momentos
distintos, sendo: o primeiro momento o de coleta e seleção dos documentos a serem analisados;
já no segundo momento a análise de conteúdo, buscando entender como se deu a
profissionalização, a organização social do conhecimento e a elaboração do currículo da
AMAN, identificando os valores e os objetivos explícitos e implícitos.
Para Bardin (2012), a análise de conteúdo pode ser definida como um conjunto de
técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos
de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção e recepção destas mensagens. Caracteriza-
se, assim, como um método de tratamento da informação contida nas mensagens. Para a
utilização desse método é necessária a criação de categorias relacionadas ao objeto de pesquisa.
As deduções lógicas ou inferências que serão obtidas a partir das categorias serão responsáveis
pela identificação das questões relevantes contidas no conteúdo da mensagem.
A pesquisa documental pode ser definida, conforme Bardin (2012), como “uma
operação ou um conjunto de operações visando representar o conteúdo de um documento sob
uma forma de diferente da original, a fim de facilitar, num estado ulterior, a sua consulta e
referenciação” (BARDIN, 2012, p. 51). Tendo como objetivo representar de outro modo a
informação após a transformação.
[...] três fatores não se sucedem, obrigatoriamente, segundo uma ordem cronológica,
embora se mantenham estreitamente ligados uns aos outros: a escolha de documentos
depende dos objetivos, ou, inversamente, o objetivo só é possível em função dos
107
[...] deve fazer compreender a Unidade de Registro, tal qual a frase para a palavra. Ex.
as unidades de registro são algumas palavras e as unidades de contexto são um ou
alguns parágrafos (MEIRELES; CENDÓN,2010 apud NOGUEIRA, 2014. p. 96).
A fase de pré-análise dos documentos recolhidos, seja nos sítios oficiais dos órgãos
citados e nos documentos solicitados oficialmente e remetidos pela AMAN, deu-se de forma
prudente, cautelosa e criteriosa. Quanto a veracidade e a credibilidade dos documentos não
houve a necessidade de uma checagem, tendo em vista terem sido obtidos de domínios públicos
e oficiais. A pesquisa centrou-se na seleção adequada dos documentos obtidos, que mais
contribuiriam com a elucidação dos objetivos da pesquisa.
Por se só, a fase de pré-análise não seria suficiente para o tratamento e a interpretação
dos documentos obtidos. Para maior exatidão, extração e interpretação dos conteúdos explícitos
e implícitos nesses documentos, julgamos necessário uma fase mais adiante, onde faremos a
exploração do material, tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação, sempre
108
3) Proatividade.
4) Autoconfiança.
5) Iniciativa.
1) Análise.
2) Compreensão verbal.
3) Expressão verbal.
Capacidades cognitivas
4) Planejamento.
5) Raciocínio dedutivo.
6) Raciocínio indutivo.
1) Agilidade.
2) Coordenação motora.
Capacidades físicas e motoras
3) Resistência aeróbica.
4) Resistência muscular localizada.
1) Empatia.
Capacidades morais 2) Julgamento moral.
3) Sensibilidade moral.
1) Postura.
2) Obediência.
Disciplina
3) Assiduidade.
4) Pontualidade.
1) Dever.
Lealdade 2) Espírito de corpo.
3) Camaradagem.
1) Amar a Pátria.
Patriotismo
2) Cumprir à missão.
1) Espírito de corpo.
Valores
2) Fé na missão do Exército.
Muito dos valores acima, cultuados pela educação militar, também são encontrados na
educação civil, em que pese como já dissemos acima, não constar explicitamente na Lei nº
9.394/1996. A diferença é que na educação militar, esses valores são considerados como os
fundamentos que sustenta a instituição, principalmente a hierarquia e a disciplina57, que
legitima as relações de comando e obediência. Esse conjunto de valores produz “[...] como
resultado [sentimento] institucional de se pertencer a um grupo baseado na hierarquia e na
disciplina, na crença absoluta no valor da corporação, por ser ela leal a algo superior a ela
própria, a nação (LEINER, 1997, p. 68).
57
O artigo 142 da Constituição Federal de 1988, estabelece que as Forças Armadas são organizadas com base na
hierarquia e disciplina.
110
CATEGORIAS
NCC NDACA
COMUNS
1. Existem disciplinas que, 1. O desenvolvimento dos conteúdos 1. Instrumentalização.
dependendo da natureza do curso ou atitudinais deverá ser de caráter 2. Fundamentação.
estágio, possuem caráter obrigatório em todas as disciplinas do
generalizador, reflexivo e abstrato ou curso, exceto nas disciplinas de
instrumental. Estas disciplinas são fundamentação e de
consideradas Disciplinas de instrumentalização.
Fundamentação ou de
Instrumentalização.
2. O módulo de ensino pode ser 2. Os conteúdos atitudinais também 1. Interdisciplinaridade
definido como um agrupamento de podem ser desenvolvidos por
disciplinas que favorece a intermédio do Projeto Interdisciplinar,
111
52. Disciplina consciente: capacidade 52. Disciplina consciente: capacidade 1. Disciplina consciente.
que permite ao discente agir em que permite ao discente agir em
conformidade com normas, leis e conformidade com normas, leis e
regulamentos que regem a Instituição, regulamentos que regem a Instituição,
voluntariamente, sem necessidade de voluntariamente, sem necessidade de
coação externa. coação externa.
53. Empatia: capacidade que permite 53. Empatia: capacidade que permite 1. Empatia.
compreender os sentimentos, ideias e compreender os sentimentos, ideias e
valores das pessoas, de uma valores das pessoas, de uma
comunidade específica ou da comunidade específica ou da
sociedade. sociedade.
54. Julgamento moral: capacidade que 54. Julgamento moral: capacidade que 1. Julgamento moral.
permite reconhecer e refletir sobre permite reconhecer e refletir sobre
situações que apresentam situações que apresentam
interface com valores. Permite ainda interface com valores. Permite ainda
julgar a situação com isenção de julgar a situação com isenção de
ânimo, sem se envolver ânimo, sem se envolver
emocionalmente, a partir de emocionalmente, a partir de
determinados valores, parâmetros determinados valores, parâmetros
técnicos e dos objetivos estabelecidos técnicos e dos objetivos estabelecidos
para a atividade ou missão. para a atividade ou missão.
55. Sensibilidade moral: capacidade 55. Sensibilidade moral: capacidade 1. Sensibilidade moral.
de se sentir moralmente afetado por de se sentir moralmente afetado por
conflitos e captar os aspectos das conflitos e captar os aspectos das
situações. A sensibilidade moral situações. A sensibilidade moral
supera a empatia, pois consiste em se supera a empatia, pois consiste em se
colocar no lugar do outro. colocar no lugar do outro.
56. Amor à profissão: apreciar as 56. Amor à profissão: apreciar as 1. Amor à profissão.
atividades próprias da carreira militar. atividades próprias da carreira militar.
Inclui o sentimento de respeito e Inclui o sentimento de respeito e
consideração à Instituição, a suas consideração à Instituição, a suas
características, papel histórico e características, papel histórico e
missão constitucional. missão constitucional.
57. Aprimoramento técnico- 57. Aprimoramento técnico- 1. Aprimoramento técnico-
profissional: Relaciona-se com a profissional: Relaciona-se com a profissional.
atitude de constante procura por atitude de constante procura por
conhecimentos relacionados à conhecimentos relacionados à
atividade profissional. atividade profissional.
58. Civismo: valorização dos 58. Civismo: valorização dos 1. Civismo.
símbolos nacionais, tradições símbolos nacionais, tradições
históricas, heróis nacionais e chefes históricas, heróis nacionais e chefes
do presente e do passado. do presente e do passado.
Os preceitos constantes do quadro acima são utilizados pelo EB, para desenvolver no
discente da AMAN a visão sistêmica sobre sua atuação na esfera política, social, jurídica,
cultural, científico-tecnológica, humanística, educacional e ambiental nos diversos quartéis
espalhados pelos mais distantes rincões desse país continental, de leste a oeste, de norte a sul,
do Oiapoque ao Chuí. Para Ludwig (1998), esses valores empregados nos bancos escolares,
tem o objetivo de inculcar no psiquismo dos discentes a ideologia da corporação introjetando
na rotina e formação dos alunos, a doutrina do EB.
Dos atributos comuns das NCC e das NDACA, destacamos os principais a hierarquia e
a disciplina, preceitos basilares do EB que devem ser respeitados por superiores e subordinados,
devem serem internalizados pelos discentes através da disciplina consciente e exteriorizados
através de atitudes e valores, traduzindo-se na ética militar. Outros atributos também são muito
valorizados na caserna, destacamos os seguintes: patriotismo, civismo, lealdade, auto
aperfeiçoamento e dedicação.
As categorias abaixo incidem nas Normas para Construção Curricular, nas Normas para
Desenvolvimento e Avaliação dos Conteúdos Atitudinais e nos Perfis Profissiográficos:
A categoria “avaliação” foi a que mais se repetiu demonstrando um reflexo natural, por
se tratar de um currículo que premia a meritocracia, assim uma avaliação constante reflete os
méritos e acirra a competição entre os alunos. Para as NCC a avaliação “ permite estabelecer
parâmetros ideais de uma atividade ou produto, que são comparados a elaborações realizadas
pelos indivíduos ou instituições, para emitir um julgamento de valor” (BRASIL, 2014, p. 26).
[...] rigorosa e estrita sujeição aos preceitos regulamentares, mesmo àqueles que
pareçam insignificantes; é o respeito e a consideração que habitualmente o
subordinado tem para com o superior, não só em atos de serviço, mas também fora
das paredes dos quarteis60 [...] (SCHIRMER, 2007, p. 35).
[...] implica uma vigilância perpétua e constante dos indivíduos. Não basta olhá-
los às vezes ou ver se o que fizeram é conforme a regra. É preciso vigiá-los durante
todo o tempo da atividade de submetê-los a uma perpétua pirâmide de olhares. É
assim que no exército aparecem sistemas de graus que vão, sem interrupção, do
general chefe até o ínfimo soldado, como também os sistemas de inspeção,
revistas, paradas, desfiles, etc., que permitem que cada indivíduo seja observado
permanentemente. (FOUCAULT, 1984, p. 106).
2014, p. 29). A hierarquia não é um atributo exclusivamente militar, ela existe no seio da
organização social como, “[...] formas de classificação, sistemas de representações, ou qualquer
outra área que se pretende mostrar ordenada a partir de escalas de alguma forma cumulativas,
praticamente em todas as sociedades, ao menos desde o registro de sua história escrita”
(LEIRNER, 1997, p. 47).
[...] além de ser um princípio geral, norteia toda a vida da instituição militar, reunindo,
de maneira singular, um princípio dado na lei e uma conduta a ela associada. Ela é o
princípio primeiro de divisão social de tarefas, papéis e status dentro do Exército,
determinando as condutas e estruturando as relações de comando obediência,
sistematizando a ação e a elaboração do conhecimento militar e mapeando o modo
como as relações de poder devem estruturar-se (LEIRNER, 1997, p. 53).
Para os profissionais das armas uma formação interdisciplinar é muito importante, pois
com essa formação pode-se superar a fragmentação do saber e colaborar na construção do
caráter e personalidade. Uma formação adequada criará condições para que quando necessário
o uso da força, seja ela utilizada na medida certa e que o respeito aos preceitos dos direitos
humanos, seja uma linha clara e intransponível, para aquele que comanda e que tem a
responsabilidade de mostrar e exigir que seus subordinados cumpram seu dever e ao mesmo
tempo também respeitem esses mesmos preceitos.
interligadas e com inter-relação definida, que seriam melhores apresentadas que de forma
isolada, dispersa ou fracionada. Com o crescente desenvolvimento científico-tecnológico,
originou-se o nascimento de diversos ramos científicos, ocasionando um fracionamento
crescente dos ramos do saber, isolando-os cada vez mais, causando um distanciamento entres
disciplinas correlatas.
Para haver a interdisciplinar Mello (2004) destaca algumas qualidades e práticas para
que devem existir em sala de aula, o profissionalismo do professor, a competência em sua área
de atuação, seu método do saber e o diálogo constante com os colegas são determinantes para
uma efetiva prática interdisciplinar. O processo interdisciplinar envolve e exige integração e
engajamento de educadores:
[...] num trabalho conjunto, de interação das disciplinas do currículo escolar entre si e
com a realidade, objetivando a formação integral do aluno, a fim de que possam
exercer criticamente a cidadania, mediante uma visão global do mundo e serem
capazes de enfrentar os problemas complexos, amplos e globais da sociedade atual
(LÜCK, 1994, p. 64).
Por seu turno a “fé na missão do Exército” advém da crença inabalável na missão do
EB, e das FA, em defender a Pátria, garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, cooperar
com o desenvolvimento nacional e a defesa civil e participar de operações internacionais.
Resume-se no sentimento de amar o Exército Brasileiro. O “patriotismo” pode ser entendido
como o amor incondicional à Pátria. Esse amor impele o militar a estar pronto a defender sua
122
soberania, integridade territorial, unidade nacional e paz social. É caracterizado pela vontade
inabalável do cumprimento do dever militar, mesmo que isto prescinda o sacrifício da sua
própria vida. Esse valor pode ser sintetizado em “Servir à Pátria”.
O atual Perfil Profissiográfico da AMAN, elaborado com base nas Normas para
Construção Curricular e das Normas para Desenvolvimento e Avaliação dos Conteúdos
Atitudinais, foi aprovado pelo Chefe do Estado-Maior do Exército58 através da Portaria nº 152-
EME, de 16 de novembro de 2010, é uma síntese do que o EB espera do discente durante a sua
formação e na vida nos corpos de tropa nas organizações militares espalhadas pelo Brasil. A
referida portaria estabelece que as finalidades dos cursos da AMAN é formar o Aspirante-a-
Oficial das armas de Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Engenharia, Comunicações, Intendência
e Material Bélico, habilitando para os cargos de Tenente e Capitão não aperfeiçoado. Graduar
o bacharel em Ciências Militares e iniciar a formação do chefe militar. Desenvolver a visão
sistêmica sobre a sua atuação na esfera política, social, jurídica, cultural, cientifico-tecnológica,
humanística, educacional e ambiental nas organizações militares do EB.
Como se vê para que o discente atinja os objetivos acima, a instituição como dissemos
utiliza de suas “ideias-força”, cultuando valores como o patriotismo, o civismo, a fé na missão
58
Órgão de Direção Geral é o responsável pela elaboração da Política Militar Terrestre, pelo planejamento
estratégico e pela emissão de diretrizes estratégicas que orientem o preparo e o emprego da Força Terrestre, visando
ao cumprimento da destinação constitucional e das atribuições subsidiárias do Exército e de operações de paz.
123
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Há duas cousas neste mundo santas: — O rir do infante, — o descansar do morto... O berço — é a barca,
que encalhou na vida. A cova — é a barca do sidéreo porto..". Castro Alves
Como retrata a poesia, após dois anos navegando em águas calmas e as vezes tortuosas
nos aproximamos do final da jornada, a barca se aproxima de atracar no porto e a jornada de
ser concluída. A jornada iniciada em 2014, quando o desafio foi proposto para os anos de 2015
e 2016, tendo como horizonte distante e desafiador para todos nós, independentemente da
experiência que cada um carregava naquele momento, a defesa da dissertação no início de 2017.
Pois bem, o ano de 2017 chegou e com ele a hora de apresentarmos os resultados da jornada
que hora se aproxima do fim. Posso garantir que a jornada foi difícil, porém valeu a pena cada
dia dessa batalha e que o viajante que embarcou em 2014 chega agora em 2017, na hora do
desembarque com a certeza do cumprimento do dever e com a esperança renovada no poder
transformador da educação e reverenciando o filósofo Immanuel Kant, para quem “O homem
não é nada além daquilo que a educação faz dele”.
Superada a Guerra Fria e com o advento de uma nova ordem mundial, onde aqueles
inimigos definidos em objetivos anteriores deixaram de existir ou representar perigo houve a
necessidade de uma redefinição de objetivos e conceitos. As novas ameaças passaram a ser o
terrorismo, o tráfico de drogas, a pobreza extrema, o crescimento populacional desordenado, a
desigualdade de renda, a questão ambiental e a proliferação de armas de destruição em massa.
Para os países latino-americanos isso implicou dentro das fronteiras nacionais, uma mudança
no papel atribuído às forças armadas – para o assim chamado "papel de polícia”.
Fruto das normais acima surge o perfil profissiográfico e o currículo da formação dos
discentes, cujos os valores e objetivos é formar o Aspirante-a-Oficial, habilitando-o para os
cargos de Tenente e Capitão não aperfeiçoado e graduar o bacharel em Ciências Militares,
iniciando a formação do chefe militar. E ainda desenvolver a visão sistêmica sobre a sua atuação
na esfera política, social, jurídica, cultural, cientifico-tecnológica, humanística, educacional e
ambiental nas organizações militares do EB.
126
Uma das críticas que fazemos que também pode ser encarada como uma oportunidade
de melhoria, diz respeito a falta de uma maior integração com a educação civil, já que a
educação no EB ao ser regulada por lei própria ficou fora da fiscalização e controle do Estado,
por intermédio do MEC, o que gera desconfianças quanto aos fundamentos históricos e
filosóficos empregados pela educação militar na elaboração de seus currículos, dos valores e
objetivos empregados na prática pedagógica. Importante lembrar que a Lei nº 9.786/1999 que
regulamentou o ensino no EB, também trouxe a regulamentação do ensino preparatório e
assistencial de nível fundamental e médio, prestado por intermédio dos colégios militares.
127
Outra crítica é quanto à caraterística da sociedade militar de ser fechada e isolada dentro
da comunidade nacional, o que não contribui para uma maior interação com a sociedade em
geral e passa uma ideia de ser o militar antipático, fechado e se achar melhor que as demais
categorias do serviço público ou privado. Para superar essa constatação poderia as FA abrir
espaço para maior integração com a sociedade, seja com atividades onde seria mostrado sua
finalidade ou franqueando os meios acadêmicos acesso a seu patrimônio histórico e cultural.
Essa falta de participação nos assuntos de segurança e defesa nacional poderia ser
suprida pela criação de um fórum, que seria composto pelas universidades do estado, pelas
forças de segurança e das organizações da sociedade civil organizada, onde cada um traria sua
experiência e sugestões para a construção de uma solução equilibrada e que atenda os pleitos e
128
anseios de todos, o que contribuiria com a segurança e a defesa nacional, gerando a tão sonhada
paz social que tanto desejamos. Vislumbra-se um papel de vanguarda que poderia ser ocupado
pelo UFMS e pelas FA nesse processo, por ter essas instituições unidades na linha de fronteira
o que facilitaria as pesquisas de campo.
Em que pese o passado recente de uma ditadura militar que durou vinte e um anos, que
inegavelmente ainda causa constrangimentos, a educação e a formação militar merece mais
estudos por parte das universidades, a fim de se conhecer melhor essa educação e saber se a
mesma está contribuindo para a formação de profissionais comprometidos com a democracia e
o respeito aos direitos humanos, até mesmo como forma de prevenção para que períodos
autoritários não se repitam.
129
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2017.
ANEXOS
OFICIO nº 031/2016/PPGEDU/CCHS/UFMS
Campo Grande, MS, 23 de junho de 2016
2. Para dar continuidade a sua pesquisa, uma das técnicas de coleta de informação é
a realização de uma pesquisa documental. A partir deste procedimento, pretende-se analisar a
construção do currículo da formação na Academia Militar das Agulhas Negras.
4. O material poderá ser encaminhado através dos Correios para o endereço: Rua
Amélia Gelelaite Mônaco, 158, Residencial Sírio Libanês II – CEP 79.115-357, Campo Grande
- MS ou pelo e-mail: [email protected]. O acadêmico se compromete a arcar com
os custos de eventual envio através do Serviço de Correios.
5. É importante salientar que a utilização dos dados se dará apenas dentro dos
objetivos desse projeto de pesquisa, não sendo destinados a outros fins e o pesquisador se
compromete, ainda, em socializar a devolutiva dos resultados da investigação às instituições.
Atenciosamente,