Módulo 3 - O Dever Das Empresas de Proteger Os Direitos Humanos
Módulo 3 - O Dever Das Empresas de Proteger Os Direitos Humanos
Módulo 3 - O Dever Das Empresas de Proteger Os Direitos Humanos
Humanos
Módulo
3
O dever das empresas
de proteger os direitos
humanos
Fundação Escola Nacional de Administração Pública
Presidente
Diogo Godinho Ramos Costa
Conteudista/s
Danielle Anne Pamplona, (Conteudista, 2019)
Equipe responsável:
Carlos Eduardo dos Santos (Coordenador Web, 2020)
Guilherme Teles da Mota (Designer Gráfico e Implementador Articulate, 2020
Iara da Paixão Corrêa Teixeira, (Coordenadora Desenho Instrucional, 2020)
Patrick Oliveira Santos Coelho (Implementação, 2020)
Paulo Ivan Rodrigues Vega Junior (Revisão de texto, 2020)
Vanessa Mubarak Albin (Diagramadora, 2021)
Enap, 2021
Enap Escola Nacional de Administração Pública
Diretoria de Educação Continuada
SAIS - Área 2-A - 70610-900 — Brasília, DF
Referências...................................................................................... 15
Muitas empresas atuam para apoiar e promover direitos humanos de alguns grupos. Tome-
se como exemplo empresas que abrem berçários para que seus funcionários possam estar
próximos de seus filhos. Ou ainda, o caso de empresas que adotam medidas de cuidado com o
meio ambiente de seu entorno, adotando ruas e cuidando de seus canteiros.
É claro que essas medidas são positivas e devem ser incentivadas. Elas são bastante exploradas em
programas como o Pacto Global, que é uma iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU)
que busca o comprometimento das empresas com princípios nas áreas de direitos humanos,
relações de trabalho, meio-ambiente e corrupção.
1_ Devida diligência (due diligence) Instrumento de auditoria para que organizações administrem os impactos potenciais adversos
que sua atividade possa ter em relação aos direitos humanos.
Quando falamos sobre as relações de empresas e direitos humanos, a ONU, por meio dos
Princípios Orientadores para Empresas e Direitos Humanos, sugere que se dê um passo adiante,
fazendo com que as empresas se comprometam com o respeito aos direitos humanos naquilo
que eles se relacionam com sua atividade fim. Por isso, todas essas condutas e boas práticas
não excluem outras responsabilidades que demonstrem seu compromisso com o respeito dos
direitos humanos.
Uma das questões recorrentes quando se trata das obrigações das empresas diante dos direitos
humanos diz respeito a quais são os direitos humanos que merecem tal proteção. Há um
consenso na Organização das Nações Unidas e entre os estudiosos do tema de que as empresas
devem respeitar:
Mesmo que haja este núcleo mínimo de direitos humanos, é relevante destacar que quando
analisamos a realidade das atividades empresariais, certos direitos humanos se mostram mais
em risco que outros, merecendo mais atenção por parte das empresas.
As empresas são responsáveis por diferentes condutas: em primeiro lugar, são responsáveis por
boas práticas. As boas práticas aproximam a atividade empresarial da sociedade e do Estado. Elas
estabelecem uma relação de confiança entre as partes e indicam que a empresa está consciente
da relevância do seu papel e das potencialidades que apresenta para promover direitos humanos.
No Brasil, algumas empresas tiveram uma iniciativa importante. Elas assinaram, em 2018, a Carta
Aberta Empresas pelos Direitos Humanos reconhecendo seu papel ao aportar contribuições para
a economia, as relações trabalhistas, relações de consumo, cadeia produtiva, desenvolvimento
nacional e regional sustentáveis. A Carta Aberta Empresas pelos Direitos Humanos foi inspirada
nos Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos aprovados pelo Conselho de
Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 2011.
• Políticas ou programas
As empresas signatárias têm o compromisso de adotar políticas ou programas de
Direitos Humanos e integrá-los em todas as áreas da empresa.
• Atividade Educativas
As empresas que aderiram a Carta Aberta devem implementar atividades educativas
na temática dos direitos humanos para toda a sua força de trabalho e colaboradores.
• Valorização do trabalho
A promoção de ações de valorização do trabalho de afrodescendentes, de pessoas
com deficiência física ou sensorial, de mulheres, de pessoas idosas, de defensores de
Direitos Humanos, ambientalistas e comunicadores sociais deve ser perseguida pelas
empresas signatárias da Carta Aberta.
• Auditorias periódicas
Trata-se da obrigação de realizar periodicamente auditorias (due diligence) em matéria
de Direitos Humanos, aferindo o impacto real e potencial de suas atividades, prestando
contas sobre tais impactos por meio, inclusive, de publicação de relatórios.
Para além disso, o comprometimento com os direitos humanos pode ser um diferencial
para recrutar a mão-de-obra disponível no mercado. Os profissionais que compreendem a
responsabilidade que as empresas têm em relação aos direitos humanos e os impactos positivos
que podem produzir na vida das pessoas serão mais comprometidos com os resultados que a
empresa produz.
Saiba mais
A leitura da Carta Aberta Empresas pelos Direitos Humanos é relevante para
quem quer saber um pouco mais sobre o quanto as empresas podem contribuir
para o avanço do tema dos direitos humanos no Brasil. Você quer saber
quem são as empresas parceiras? Acesse o conteúdo da Carta para descobrir!
(https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2018/novembro/premio-
direitos-humanos-2018-homenageia-personalidades-e-entidades-brasileiras-
e-internacionais/CartaEmpresasMDHMPTeEmpresas4.pdf)
Mas de nada adianta a adoção de procedimentos para a promoção e respeito aos direitos
humanos se esses dispositivos não estiverem disponíveis e não forem divulgados para todos os
envolvidos da empresa, sejam eles, colaboradores, parceiros, clientes e a própria comunidade.
Qualquer que seja esse dispositivo ele deve ser transparente e acessível ao público que matem
relações com a empresa.
Esse compromisso deve ser aprovado pelo mais alto nível organizacional da empresa e pode ser
elaborado com o auxílio de uma assessoria especializada interna e/ou externa. Esse documento,
portanto, estabelece quais as condutas que a empresa espera de seus funcionários e deve ser
difundido amplamente tanto dentro quanto fora da empresa.
Outro ponto importante é o alinhamento do compromisso de respeito aos direitos humanos com
as políticas e procedimentos operacionais da empresa. Portanto, esse documento deve refletir
os valores da empresa, demonstrando que ele está incorporado em sua cultura.
Não são somente as grandes empresas que podem ter impactos positivos. Há vários exemplos
de micro e pequenas empresas que fazem da sua atividade um veículo de mudanças substanciais
na vida de pessoas. Veja, por exemplo, o caso da cafeteria inclusiva chamada Cafeteria Especial,
localizada na cidade de Blumenau, em Santa Catarina, onde os atendentes são portadores de
Síndrome de Down, contratados obedecendo-se a legislação trabalhista. Sabendo que a inclusão
no mercado de trabalho de pessoas com deficiência é difícil, essa iniciativa é um exemplo do que
uma empresa pode fazer para promover o respeito aos direitos humanos.
Saiba mais
Para saber mais sobre o projeto inclusivo da cafeteria, acesse a página da
Cafeteria Especial (https://www.educareforma.com.br/cafeteriaespecial).
No caso de ocorrência ou mesmo da prevenção de alguma violação aos direitos humanos espera-
se que as empresas realizem auditorias permanentes para avaliar o impacto real e potencial
de suas atividades, indicando como serão remediados os problemas relacionados a direitos
humanos. Essas auditorias são chamadas pelos Princípios Orientadores de due diligence, ou
devida diligência, em português.
Para o Grupo de Trabalho da ONU sobre Empresas Transnacionais, é necessário que ocorra uma
mudança fundamental para que as empresas integrem em suas operações uma visão a partir
dos direitos humanos, levando em consideração os impactos adversos sobre as pessoas, com o
objetivo de prevenir e remediar tais impactos.
As empresas que fazem a due diligence conseguem perceber os riscos de sua atividade e, por
isso, conseguem também se preparar para enfrentá-los.
A Organização das Nações Unidas, por meio do seu Alto Comissariado para Direitos
Humanos, e refletindo o texto dos Princípios Orientadores, explica quais são os quatro
componentes essenciais de um procedimento de due diligence:
Saiba mais
A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com
sede em Paris, França, é uma organização internacional composta por 35
países membros, que reúne as economias mais avançadas do mundo bem
como alguns países emergentes como a Coreia do Sul, o Chile, o México e a
Turquia. A Organização foi fundada em 14 de dezembro de 1961, sucedendo
a Organização para a Cooperação Econômica Europeia, criada em 16 de abril
de 1948.
Por meio da OCDE, representantes dos países membros se reúnem para trocar
informações e alinhar políticas com o objetivo de potencializar seu crescimento
econômico e colaborar com o desenvolvimento de todos os demais países
membros. Por meio dessa cooperação, a OCDE tornou-se uma fonte importante
de soluções para políticas públicas em um mundo globalizado.
O processo de due diligence não isenta as empresas da responsabilidade sobre suas atividades,
todavia, serve para demonstrar a legítima preocupação da empresa e a tomada de medidas
necessárias para prevenir ou mitigar esses impactos.
Estas iniciativas refletem a relevância do processo de due diligence para a concretização do dever
de todos, Estado, empresas e sociedade. Ela é um importante instrumento para reforçar as boas
práticas das empresas e para enfrentar potenciais impactos adversos que sua atividade possa
causar.
Os grupos afetados são essenciais para avaliar os impactos negativos e quando a empresa não
conseguir alcançar tais pessoas, deve pensar em alternativas, como consultar especialistas em
direitos humanos. Esta avaliação é de suma importância para as fases da auditoria. As empresas,
ao tomarem esses cuidados, estão afirmando sua preocupação em respeitar direitos humanos.
Importante
Esses cuidados são essenciais para que toda a sociedade possa desfrutar de
toda a potencialidade da empresa em impactar nossa vida positivamente!
Além disso, a empresa também promove o bem-estar da sociedade quando utiliza sua influência
para diminuir qualquer consequência negativa que possa existir. É por isso que os Princípios
Orientadores indicam que a empresa deve, se for possível, modificar suas práticas quando não
atendem às necessidades da sociedade e, especialmente, se prejudicam as pessoas.
A preocupação com o impacto que a atividade da empresa pode causar em relação aos direitos
humanos não se resume ao momento em que a empresa inicia ou sofre qualquer alteração
em sua atividade econômica. É preciso estar vigilante o tempo todo. O respeito aos direitos
humanos deve fazer parte do cotidiano da empresa e de todos os seus colaboradores, sejam eles
internos ou externos.
Nessa perspectiva, o monitoramento das medidas tomadas pela empresa é de suma importância
para que se possa verificar a eficácia das respostas que as empresas fornecem. Ele pode sinalizar
se as políticas de direitos humanos utilizadas estão sendo efetivas e pode indicar necessidade de
aprimoramento. O monitoramento deve ser feito de forma sistemática com fundamentação em:
Todo esse trabalho realizado pela empresa é relevante para entender se sua política de prevenção
está funcionando da melhor maneira que poderia, respondendo de forma eficaz aos impactos
e contribuindo para manter as melhorias. Esse monitoramento deve dar atenção especial aos
grupos com maiores riscos de marginalização e vulnerabilidade. Além disso, o monitoramento
deve ser integrado aos processos pertinentes de comunicação interna, ou seja, os funcionários
também devem conhecê-lo.
As medidas tomadas pela empresa também devem ser comunicadas externamente, assim, o
Estado e a sociedade civil tomam conhecimento do quanto a empresa se esforça para respeitar
os direitos humanos.
Vejam que é possível que uma empresa se engaje na reparação de algum dano causado mesmo
que não tenha contribuído diretamente para ele. É o caso de efeitos causados por outras empresas
que se relacionam com ela (fornecedores, prestadores de serviço, etc.). Esse engajamento da
empresa na busca de uma solução para o problema reflete a consciência a respeito de seu
papel na reparação e promoção dos direitos humanos. Contudo, essa responsabilidade pode
variar conforme o tamanho, setor, contexto operacional, bem como em função da gravidade dos
impactos que as atividades de outras empresas possam gerar.
A empresa pode estabelecer um mecanismo interno para que as pessoas possam dialogar e
apresentar eventuais denúncias ou sugestões de melhorias. Este mecanismo auxilia para que a
reparação seja eficaz. Os Princípios Orientadores estabelecem que tais mecanismos devem ser:
• Legítimos
As partes confiam em procedimentos legítimos e daí a relevância de as empresas darem
atenção a esse requisito dando liberdade para que as pessoas possam apresentar suas
ideias e contribuições.
• Acessíveis
Todas as pessoas conseguem utilizá-los. Em uma empresa muito grande, por exemplo,
é provável que seja estabelecido um procedimento para ouvir os funcionários que
dependa do computador. Todavia, em uma empresa pequena, disponibilizar uma
caixinha de sugestões dentro do banheiro já é suficiente para a empresa demonstrar
sua preocupação em estabelecer o diálogo.
• Previsíveis
Os procedimentos devem ser claros e com prazos fixados, sem prejuízo de alguma
flexibilização para evitar que as pessoas se sintam prejudicadas.
• Equitativos
A empresa e os grupos afetados devem estar no mesmo nível, especialmente porque
essas pessoas possuem um acesso limitado às informações, e a empresa tem um papel
importante para equilibrar a relação.
• Aprendizagem contínua
Todas as partes envolvidas (empresa, as pessoas que se relacionam com ela, como
funcionários, clientes, fornecedores e a sociedade) devem aprender com o processo.
• Participação e diálogo
A participação e o diálogo de todas as partes envolvidas podem resultar em ganhos
conjuntos.
A devida diligência em direitos humanos, quando efetiva, pode auxiliar as empresas na redução
de riscos de ações judiciais contra elas, além de sinalizar que a conduta adotada na promoção e
respeito aos direitos humanos está sendo satisfatória para todos os envolvidos na atividade da
empresa.
Neste módulo você ficou sabendo que as empresas têm uma especial responsabilidade em relação
aos direitos humanos: elas precisam respeitá-los. Isso decorre dos Princípios Orientadores para
Empresas e Direitos Humanos, aprovados pela Organização das Nações Unidas. Os consumidores
são seletivos e podem preferir consumir de empresas comprometidas com o respeito aos direitos
humanos, e os funcionários também podem preferir cooperar com as empresas que claramente
adotam uma política de respeito aos direitos humanos. Para que as empresas cumpram os
princípios, elas precisam prevenir os impactos negativos decorrentes de suas atividades. O
principal instrumento para fazer isso é a chamada devida diligência, ou due diligence, em inglês.
É importante que as empresas adotem procedimentos que permitam que todas as pessoas
envolvidas possam ser ouvidas sobre os processos que ela pretende adotar. Assim, as empresas
reforçam os impactos positivos que têm sobre a sociedade e se esforçam para que os impactos
negativos não ocorram.
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