Mup - Orientação Extensão 2009
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FUNCIONAMENTOS DE
GRUPOS ESTUDANTIS DE
EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
EDIÇÃO EXPERIMENTAL NÚMERO 1
AGOSTO/SETEMBRO DE 2009
APRESENTAÇÃO
O
Movimento Por uma Universidade Popular (MUP) foi criado em
2006 na UFSC. Da necessidade do movimento estudantil de discutir
uma estratégia que o norteie, na direção de uma universidade
transformadora, criadora de indivíduos críticos a essa sociedade capitalista, o
MUP surge com o enorme desafio de compreender a situação histórica de
nosso povo, e o papel que a universidade pode potencializar para a
transformação.
Compreendemos que a Universidade deve ser um pólo de
fermentação cultural e científica, onde se discuta e problematize as
necessidades mais prementes de nosso povo. Para tanto, desde 2006, já
realizamos vários espaços de discussão, mini-cursos sobre o funcionamento
dessa sociedade capitalista e o processo de consciência, colaboramos nas
Jornadas pela Educação Pública, lutas contra a privatização e organizamos à
três anos, em conjunto com outras organizações, os Estágios Interdisciplinares
de Vivência com os movimentos da Via Campesina, em Santa Catarina.
Esta cartilha é um processo que nasceu da necessidade de elaborar e
auxiliar os estudantes em mais uma tática possível do movimento
universitário na direção da disputa ideológica da universidade brasileira. Ela
não pretende ser a versão final, e sim um processo profundo de acúmulo, que
dimensiona vários aspectos da concepção de universidade popular a ser
construída pelos movimentos sociais e populares, incluindo nesse bojo o
Movimento Universitário.
Boa leitura e reflexão sobre um tema que tem tudo para ser uma das
táticas mais eficazes de aproximação de nossa formação profissional, com a
realidade objetiva de nosso povo. Que façamos da Universidade Popular o
nosso horizonte estratégico!
O
processo histórico de desenvolvimento da universidade brasileira e do
saber científico é composto por transformações que vieram das
perspectivas “modernizadoras” de cada época. Ou seja, foram
construídas a partir das exigências “de fora”, no desenvolvimento das forças
produtivas em um país capitalista dependente e subdesenvolvido.
Os primeiros cursos superiores (Direito e Medicina) vieram das demandas
das elites colonialistas que necessitavam apenas de legisladores e médicos para
sobreviver. As inovações tecnológicas do processo de produção não chegavam
aqui e nem eram incentivas a serem produzidas. Com as demandas da
“modernização conservadora” (a partir da década de 30), onde setores estratégicos
começavam a ser explorados (petróleo e siderurgia, por exemplo) a constituição de
cursos e centros de pesquisa vinham apenas para reforçar a produção de
conhecimento na direção de um capitalismo monopolista (não concorrencial).
Com a Ditadura Civil-Militar de 1964, os anos de chumbo vieram na
direção oposta dos pequenos ganhos da eufórica luta pelas reformas nacionais
democráticas (década de 50 e 60). A proliferação de universidades no período de
1964 a 1968, não foi realizada em concordância com as propostas que o movimento
estudantil da década de 60 reivindicava: uma reforma universitária de caráter
popular, crítica e criadora de conhecimento novo e necessário para as demandas
de nosso povo. A “reforma consentida” de 1968 (dos militares e imperialistas:
MEC/USAID) auxiliou a fragmentação dos estudantes (sistema de créditos),
interferiu em currículos na direção conservadora (Ex: instituiu a disciplina EPB*),
cassou professores ligados aos movimentos populares, tudo na direção mais
conservadora de uma modernização que viera apenas para auxiliar um Estado
autocrático e a emergência de um capitalismo monopolista.
Nas duas últimas décadas fora bombardeada pela lei do mercado, em que
uma Contra-Reforma Universitária maquiada e fatiada, encontra terreno fértil
para uma maior fragmentação e afastamento das demandas dos movimentos
sociais e populares. São tempos de cursos pagos, empresas juniores, Lei de
inovação tecnológica (professores empreendedores!), ranqueamento de cursos,
destinação de verbas públicas pra salvar universidades (empresas!) privadas, etc.
*Estudo dos Problemas Brasileiros, disciplina que a universidade exigia a todos os cursos no
sentido de uma formação não crítica e ideológica a favor do estado autocrático brasileiro.
O
s estudantes sempre foram protagonistas das lutas que buscam aproximar
essa importante instituição, da vida cotidiana dos “de baixo”, da
resolução de dilemas históricos, como: a erradicação do analfabetismo; da
elaboração e implantação da Reforma Agrária e da Reforma Urbana; da construção
de um ensino básico, fundamental e médio, crítico e criador; da ligação umbilical
com uma lógica que tenha como primado e missão histórica, a constituição de uma
sociedade justa e igualitária.
Mas não só os estudantes têm que empunhar essas lutas. A exigência de um
bloco no interior da universidade que una estudantes, técnico-administrativo e
professores é fundamental, aliada aos movimentos sociais e populares na direção
da DISPUTA REAL DA UNIVERSIDADE! Ou será que já seríamos suficientes nos
dias de hoje, lutando apenas por mais “verbas” para a educação, numa situação
que as mesmas na maioria das vezes têm destinos privados? Prova disso são os
laboratórios que guardam “segredos” em nome de empresas, ou que respondem
exclusivamente as empresas, e não ao povo que as mantêm, ou mesmo para a
administração geral da universidade.
É por isso que lançamos as questões que Florestan Fernandes entende
enquanto “problemas da universidade”:
*Como transformar a “radicalidade intelectual”, em motor dessa sociedade?
*Como romper a “situação intramuros” atual, em que a universidade se fecha em si
mesma?
*Como superar a “tutela exterior cega e inflexível”, impondo uma agenda
autônoma de nosso povo, na direção da resolução das necessidades mais sentidas?
*Como fortalecer a condição do jovem no fluxo da reconstrução dessa sociedade?
Um dos caminhos é repensar a “extensão universitária” nestes dilemas.
O
protagonismo estudantil na direção do mesmo constituir e formar “campos
de trabalho” que o aproximem do conhecimento prático da realidade
objetiva de nosso povo, sempre foi um dos eixos de luta do movimento
estudantil. A problematização dos currículos demonstra que a preocupação com a
formação é uma constante, que aponta questionamentos importantes:
1°) Qual é a relação do conteúdo teórico com a prática a ser exercida na profissão?
2°) Das demandas dos movimentos populares e sociais, em que medida os currículos
se comprometem com os mesmo?
3°) O controverso confronto “mercado de trabalho” e “campo de trabalho”, aponta
quais questões ideológicas a serem vistas?
4°) Pra emancipação popular, ou seja, transformar o nosso povo em ator direto da
dinâmica social coletiva, qual é a contribuição que jovens estudantes podem dar?
E
m um dos momentos mais ricos
de mobilização estudantil, a
principal reivindicação dos
estudantes era por uma Reforma
Universitária, que constituísse nos
currículos dos cursos a UNIVERSIDADE
POPULAR, numa “aliança estudante-
operário-camponês”. Nesse início da
década de 60, ficariam famosos o Centro
Popular de Cultura (CPC da UNE), e as
“caravanas de alfabetização popular”
que a essa entidade geral estudantil (nos
bons tempos da UNE) e outros grupos de
estudantes, construíram enquanto forma
de enfrentamento a produção de um
conhecimento que passava por um
'banho de realidade”, do qual hoje
estamos distantes na academia.
ORIENTAÇÃO À CRIAÇÃO E FUNCIONAMENTOS DE GRUPOS
ESTUDANTIS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA
Atualmente temos experiências isoladas, mas de uma imensa importância
pra disputa interna da universidade. O exemplo mais claro que usaremos aqui,
advém do curso de Arquitetura, criado pela Federação Nacional dos Estudantes de
Arquitetura (FeNEA). Os Escritórios Modelos de Arquitetura e Urbanismo
(EMAUs) são experiências criadas pelo protagonismo estudantil, na direção da
formação prática, não assistencialista, que os projetos arquitetônicos podem ter
com a construção popular.
Neste sentido é que os estudantes não devem se afastar das lutas mais essenciais
dentro da universidade, pra construir com os movimentos sociais e populares uma
realidade de fora da universidade. A disputa se dá “de dentro pra fora” e “de fora
pra dentro”, numa relação dialética. Ou seja, não cabe somente lutar pelas
demandas populares de conhecimento, se dentro da própria universidade não
garantimos os direitos essenciais para a permanência dos estudantes. Se não
disputamos as verbas e a infra-estrutura pública que nos garantirão uma melhor
intervenção prática na sociedade. O movimento estudantil deve ligar as suas
pautas específicas, as pautas gerais que ligarão umbilicalmente as lutas da classe
explorada por esse sistema.
De tudo isso, as entidades estudantis não são grupos estudantis de extensão
universitária, mas nem estarão distantes das mesmas. Devem caminhar na mesma
direção, na construção de um processo histórico que permita a estudantada lutar
pelos direitos mais essenciais, de seu protagonismo estudantil:
? Direitos estudantis que garantam a permanência dos estudantes, e luta pelo
acesso universal;
? Luta contra a privatização da universidade, contra os cursos pagos, taxas e
mensalidades;
? Democracia interna com paridade nos colegiados e voto universal para a escolha
de dirigentes.
Tudo isso pensando na constituição de um movimento que possa
criar autonomamente os grupos estudantis de extensão universitária, que aliem
ensino, pesquisa e extensão. Que possam profundamente interagir com nosso povo,
aliando o conhecimento científico com as demandas populares, na construção de um
conhecimento novo e emancipador. Para tanto outras lutas se desdobraram:
? Projetos de ensino, pesquisa e extensão com caráter popular, não mercadológico;
? Acesso a verbas e infra-estrutura pública, para a constituição desses projetos;
? Espaços físicos que permitam a construção desses trabalhos;
? Livre acesso na universidade aos movimentos sociais e populares.
A
experiência de grupos de extensão universitária de iniciativa e gestão
estudantis, até onde se sabe, é recente. Hoje, o que se conhece neste sentido
são os Escritórios Modelo de Arquitetura (EMAUs), fomentados pela
Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura (FeNEA). Os EMAUs – ou a
discussão sobre eles - existem desde o início da década de 90, e já representam uma
pauta permanente dentro do movimento estudantil nacional de arquitetura.
O documento da FeNEA que orienta a criação de escritórios modelo chama-se
POEMA (Projeto de Orientação a Escritórios Modelo de Arquitetura) e a dica
fornecida por ele nos parece a mais pertinente para qualquer grupo de extensão
desta natureza que esteja pretendendo nascer: reunir o grupo interessado, discutir
profundamente os porquês daquela ação e jamais esquecer-se que o que move um
grupo de extensão é o trabalho prático. A formalização do grupo, formulação de
estatuto, conquista de espaço físico, enfim, todas estas questões, ficarão mais
acessíveis assim que o grupo for capaz de demonstrar que já existe um trabalho em
andamento, ou seja, quando a ação do grupo já estiver se materializando. Estas são,
portanto, questões secundárias.
Assim sendo, a grande questão passa a ser outra: de que formas pode atuar
um grupo de extensão universitária de iniciativa e gestão estudantis?