Fleith (2022)
Fleith (2022)
Fleith (2022)
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Universidade de Brasília
em 2015, uma agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, contendo 17 objetivos que
conveniados. Tanto na esfera internacional quanto nacional, nota-se uma preocupação com a
milhão, um aumento de 34,4% em relação a 2015, sendo que a maior parte concentrou-se no
classes comuns do ensino regular tem aumentando gradualmente para todas as etapas de
ensino. Na educação básica, por exemplo, mais de 89% dos estudantes estavam incluídos em
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inclusão educacional, indaga-se como o processo está sendo implementado e em que medida
as necessidades e demandas desse alunado estão sendo atendidas. No caso específico dos
superdotados, eles sempre estiveram matriculados em classes comuns. O que significa então
educação inclusiva para esse estudante? Para além da inserção em sala de aula, o que mais
precisa ser feito? Ademais, são poucos os identificados em sala de aula e encaminhados a
foram registrados como superdotados no censo escolar brasileiro de 2019 (INEP, 2020).
propor ações que contribuam para sua inclusão. O capítulo está estruturado em três seções.
e sugerir ações em favor de uma cultura de inclusão do estudante com altas habilidades no
ambiente escolar. Espera-se com este capítulo apontar avanços e conquistas na educação do
inclusão e superdotação, dar voz ao estudante superdotado na defesa de seus direitos, bem
não basta inserir o estudante, é preciso criar condições para que ele participe, interaja e
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contribua (Figueiredo, 2010). Sem dúvida, essa é uma das metas mais importantes de uma
sociedade democrática.
têm sido estabelecidas com vistas a assegurar atendimento especial aos estudantes
escola (Souto, 2019). Nos anos 90, por exemplo, o Ministério da Educação (1996)
deveriam ter acesso a currículos, métodos, técnicas e recursos específicos para atender às
estudantes que demonstravam potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas,
formação autônoma e independente (Souto, 2019). Ela teve como alicerces os princípios de
que igualdade e diferença são valores indissociáveis, o educando tem direito a uma educação
de qualidade, e é direito de todos aprender e participar da vida escolar sem nenhum tipo de
especial e ensino regular (Fleith, 2011). O Decreto No 7.611 (Presidência da República, 2011)
estudante.
envolvimento com as atividades escolares. Entre seus objetivos, figura-se o de “assegurar aos
sustentável e compatível com as diversidades locais e culturais” (Art. 4). O que essa nova
política traz como novidade é a possibilidade dos estudantes serem atendidos não somente na
que tem sido muito criticado e avaliado como um retrocesso por parte de especialistas,
referenciais teóricos assinalados como os mais utilizados foram o Modelo dos Três Anéis de
Renzulli (1978, 2016), com 60% das respostas, seguido da Teoria das Inteligências Múltiplas
de Gardner (1999), com 32% (Alencar, Fleith, & Carneiro, 2018). As atividades mais
No que diz respeito à aceleração escolar, nota-se uma resistência por parte de pais,
escolar. Contudo, não há regulamentação acerca de como implementar essa ação pedagógica.
positivo, de estabelecer sob que condições ele será promovido (Maia-Pinto & Fleith, 2012).
No estudo conduzido no Brasil, por Maia-Pinto e Fleith (2015), acerca de como alunos
avaliavam essa prática. Os resultados indicaram que a aceleração foi uma intervenção bem-
alunos acelerados.
Vale ressaltar que práticas de diferenciação curricular em classes comuns não são
estudantes com altas habilidades no Brasil são atendidos mais frequentemente por meio de
sem que haja vinculação com o que acontece na sala de aula regular. Vale destacar que não
há como determinar a melhor prática para o superdotado. Isso depende do perfil do indivíduo,
O importante é que a escola crie uma cultura que seja receptiva e responsiva à diversidade e
para superdotados? Para Solar (2020), uma escola inclusiva deve, antes de mais nada,
Gläser-Zikuda e Ziegler (2020), um contexto inclusivo pode ser definido como é aquele no
pela educação especial em que superdotados aprendem somente na companhia de outros com
Vale ressaltar que a promoção da inclusão escolar desses estudantes não se resume a
discutir práticas pedagógicas. É preciso considerar outras dimensões que influenciam nesse
superdotado. Segundo Eyre (1997), “a identificação parcial ou ambígua pode ser mais
prejudicial do que a não identificação, uma vez que os estudantes podem ser ativamente
excluídos em vez de passivamente ignorados” (p. 11). Não existe uma fórmula mágica de
identificação que possa ser aplicada a todos os sujeitos com indicadores de superdotação.
Contudo, alguns princípios devem ser seguidos de maneira a garantir que nenhum
superdotado seja deixado para trás (Fleith, 2018; ver Tabela 1). O foco da avaliação deve ser
Tabela 1
Princípios
rígidos e, muitas vezes, irrealistas, o que pode gerar sentimentos de frustração, culpa e
tempo. Preocupação excessiva em não errar, acrescida de expectativas muito elevadas por
baixa autoestima (Alencar & Fleith, 2001). A sensibilidade e intensidade apresentada nas
São formas intensas de experienciar e responder aos estímulos do ambiente em cinco áreas
avançado intelectualmente mas apresenta uma coordenação motora fina pobre ou imaturidade
habilidades.
Como resultado, o superdotado pode se sentir diferente dos demais, sem entender
exatamente o porquê, reconhecer que não é compreendido por seus pares e professores, e
em uma cultura que rejeita as diferenças individuais? Nos anos de 1930, Leta Hollingworth já
e ofensas dos outros, de ser exposto a modelos que deram contribuições à sociedade e de ser
treinado na arte da argumentação (Silverman, 1993b). Silverman (1994), por sua vez, propôs
Exemplos de tópicos a serem incorporados a esse currículo são: autoexpectativas, pressão dos
Tabela 2
Atividades
valor e uma garantia de que todos encontrem seu lugar na sociedade ... criar um sentimento
tomada de decisão acerca das práticas educacionais mais apropriadas aos seus filhos com
estimular o potencial de seus filhos. Alguns pais sentem-se pouco amparados e apoiados por
suas famílias, amigos ou sociedade em geral, que os acusam de elitistas e de tentarem mudar
a estrutura da escola para beneficiar seus filhos (Silverman, 1993a). Também há pais que não
maneira observada em seu filho. Por outro lado, há aqueles que enfatizam exageradamente as
mediante os feitos de seus filhos (Aspesi, 2007). Nem sempre os pais sentem-se preparados
para atender às necessidades de seus filhos em função de vários fatores: falta de informação
se destacam por um potencial superior (Silverman, 1993a). Então, como promover a parceria
Tabela 3 apresenta sugestões de como o esse profissional pode auxiliar os pais de estudantes
família. Sem dúvida, a inclusão escolar do superdotado também passa pela inclusão da sua
Tabela 3
Atribuições
membros da equipe recebam uma formação apropriada na área e que o trabalho seja
estudantes.
estudantes (Mitjáns-Martinez, 2005). Isso exige dos educadores repensar e reformular suas
habilidades e interesses. Segundo Salciado (2020), todos têm o direito a uma educação de
família.
A partir dos desafios identificados, que ações poderiam ser então recomendadas no
para os superdotados? No que diz respeito à família, a parceria com a escola pode se tornar
oferecem dicas de como grupos de pais de superdotados podem se organizar em defesa dos
direitos do seu filho. Ao invés de focar apenas nas necessidades individuais de cada filho, os
pais podem advogar em prol do grupo de estudantes superdotados. Segundo as autoras, isso
tem mais força do que a defesa “um a um”. Outra sugestão é destacar o que eles querem que
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ocorra em sala de aula ao invés do que não querem. Também relevante é que os pais, como
grupo, apresentem à escola mensagens consistentes e claras. Outra estratégia é articular suas
necessário identificar a qual audiência se dirigir (quem precisa ouvir sua mensagem? Quem
pode atuar como mediador entre família e escola?). Tão importante quanto falar é escutar a
outra parte. Neste sentido, é essencial que os pais apresentem indicadores de que estão de fato
escutando o interlocutor. Por exemplo, tomem notas, mantenham contato visual, parafraseiem
o que ouviram para ver se entenderam corretamente. Manter-se informado e atualizado acerca
questionamento ou resistência que a escola possa vir a apresentar. Ter acesso à literatura da
prol do superdotado são excelentes alternativas. Os pais não devem esperar os problemas
surgirem, mas precisam se antecipar e conversar com pessoas que são peças-chave na
superdotado que atue em diferentes frentes. As autoras indicam, por exemplo, estabelecer
parcerias com associações e instituições que desenvolvem trabalhos em prol dos estudantes
professor: (a) buscar conhecer quem são os estudantes, (b) evitar focar nas primeiras
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aprendizagem, (d) acompanhar e monitorar o caminho dos estudantes em sala de aula, (e)
para vê-los e também ajudá-los a se enxergarem sob outras perspectivas, (g) antecipar
requeiram o uso do pensamento crítico e criativo, (j) ensinar com foco no sucesso e
Neumeister (2016), o ambiente escolar deve considerar os erros como pistas informativas e o
professores também podem compartilhar suas falhas e estratégias utilizadas para lidar com
seus erros.
escolares não são as únicas conquistas da vida e que todos deveriam ter acesso a
gênero. Segundo a autoras, embora as meninas devam ser encorajadas cada vez mais a se
envolverem em domínios de ciências exatas, a sua participação nas ciências humanas também
de aula. Segundo Baum (2009), suporte social, emocional e acadêmico é fundamental para
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esses estudantes. Caso seus pontos fortes não sejam devidamente trabalhados, eles podem vir
existente entre suas limitações e seu potencial elevado. Souto (2019) conduziu um estudo de
estudante contou, ao longo de sua trajetória escolar, com uma rede sistematizada de apoio
desenvolvimento global.
escolar também é uma proposta bem-vinda. É preciso ampliar e flexibilizar nosso olhar
estabelecer parcerias com instituições que possam a vir trabalhar colaborativamente. Por fim,
inclusão de estudantes com necessidades especiais, não seria o caso de revertermos a situação
“educação para superdotados deve ser parte das discussões que formatam e reformatam a
educação para todos” (p. 10). No caso de países em desenvolvimento, como o Brasil, torna-se
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urgente a implementação de uma agenda que valorize as conquistas obtidas e avance cada
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