A Origem Da Poesia Questão Homérica À Conremporaneidade

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

SÉRGIO GABRIEL CONCENÇA CORREIA

A ORIGEM DA POESIA: QUESTÃO HOMÉRICA À


CONTEMPORANEIADADE

Recife
2022
INTRODUÇÃO
A partir do contexto da filologia clássica alemã e dentre as investigações e
experimentos feitos inicialmente no texto do que veio a ser depois de transcrito,
Homero e a Filologia Clássica, cogitando a possibilidade de delimitar a personalidade
do criador poético, que Nietzsche discursa na posse da Basiléia em 1869 na sua fase
ainda jovial encontra-se bem fundamentada em descobrir a personalidade, girada em
torno da questão do gênio em Homero e que posteriormente vai tomar novas
proporções, também uma questão científica que vai de encontro à conjuntura estética.
Por tanto é válida a investigação quanto à questão da personalidade, mas elucidando um
desencadeamento de novas questões que até então pareciam estar despercebidas no
período jovial do Nietzsche.
É notável que na investigação filológica e filosófica, Nietzsche percebe que com
Homero os modernos pela primeira vez puderam se privilegiar com um ponto de vista
histórico, do cenário da Antiguidade Clássica
Os gregos foram os primeiros artistas realistas da história, ou seja, os
primeiros a se preocupar em representar a natureza tal como ela é. A
finalidade da arte estava associada à procura da beleza, da unidade e
da harmonia universais, alicerçadas, é claro, por uma filosofia que
buscou a relação do homem com o mundo e a sua origem, com a vida
e a morte, assim como com a dimensão interior do próprio ser
humano. (CECILIA, 2017, p.29)
Aprendendo a conhecer representações nas figuras previamente fixas no
cotidiano dos antigos, reconhecendo a alma nacional, traduzindo costumes e crenças em
forma de personalidade. Foi o Friedrich August Wolf, que notou o ponto determinante
em que a questão homérica escapa da Antiguidade grega na qual o seu apogeu foi
conduzido pelos gramáticos Alexandrinos. É também com a perspectiva Aristotélica em
seu escrito Poética, que fica registrado uma também postura protagonista onde na obra
completa o admirava em uma hierarquia de mais alto nível, possuindo uma “natureza
divina” e impecável da literatura de Homero, indo de mãos dadas com a precipitada
constatação com a filosofia ainda Jovem do Nietzsche.
Perspectiva que vai se alterando com as novas investigações e um maior
amadurecimento das ideias de Nietzche, em que por ter sido uma forma de preâmbulo,
Homero e a Filologia Clássica, é superado e a questão da personalidade genial ainda
ecoa nas suas obras posteriores, tomando novas proporções e fundamentos que veremos
a seguir, nesta investigação.
HOMERO E A INVESTIGAÇÃO FILOSÓFICA DO AUTOR

Os mesmos gramáticos compreendiam as duas obras a Ilíada e a Odisséia como


sendo criadas por um único Homero, teoria rivalizada pelos corizontes, que
desconfiavam diante da face individual de cada obra, pois consideravam como obras de
autores distintos. Os críticos imaginaram que por conter diversas expressões de
pensamentos linguísticos, a tamanha falta de uniformidade era acarretada por seus
compiladores, visto que os poemas se passavam de boca em boca diante de muitos anos.
Temos então o ponto que mais torna difícil a formação da tese do gênio. Hipótese que
marca a época do tirano Pisístrato em que coloca a antiguidade em evidência, uma das
mais significativas em meio aos estudos literários.
É somente muitos anos à frente que F.A. Wolf inaugura uma segunda hipótese,
onde a personalidade de Homero deve ser levada em conta a harmonia e a regularidade
interna, renovando qualquer conceito que coloque em xeque algo não homérico. Sendo
até então a teoria de um único Homero aceita com mais rigidez, tomando forma e se
consolidando. Todavia, ao retroceder no tempo até antes deste apogeu dos gramáticos
percebe-se uma coletânea cada vez maior de epopeias sobre a identidade de Homero,
retomando cada vez mais a incapacidade de capturarmos uma personalidade.
Evaporou-se paulatinamente a personalidade de Homero, até tornar-se
um nome vazio, pelo fato de que não se podia apreendê-la? Ou
corporificou-se e tornou-se visível naquele tempo, sob a figura de
Homero, de modo ingenuamente popular, toda a poesia heróica? Fez-
se então um conceito a partir de uma pessoa ou uma pessoa a partir de
um conceito? Esta é a genuína “questão homérica”, aquele problema
central da personalidade. (BONNACINI, 2006, p.14)
Retornar a este período, com um pano de fundo a estas questões, a descoberta de
quem era Homero é particularmente um enigma, o qual passado de mão em mão tem
perdido cada vez mais seu cunho original. Atravessando obras poéticas encontramos um
nome vazio, em que são tidos como modelos inalcançáveis, possuidores de perfeição a
impossibilidade de alcançar Homero, em que no Homero e a Filologia Clássica o
Nietzsche aponta que Goethe encara tamanho desafio, agora introduzindo o conceito de
poesia nacional a este problema. Em que coloca a nação em seu período mais glorioso
criadora poética daqueles poemas incomparáveis, promovendo um ambiente com
talento artístico uma alma nacional potencializando uma massa popular poética,
teríamos então um coletivo de gênios artísticos que circundam esta época, onde também
a individualidade de nada teria importância.
Obviamente, tamanha representação gerou desconfiança para aquilo onde era de
se esperar uma singularidade. Na qual um dos grupos dizia que somente encontrariam
em cantos isolados de obras, pois na estrutura completa se apresentava completamente
defeituosa. Já um segundo grupo que assim como Aristóteles admiravam o todo da obra,
em mais alto grau a divindade de Homero, e se tal efeito não fosse evidenciado com
clareza, tratava-se de uma imperfeição da tradição com retoques, de cujo ato
responsabilizavam os compiladores.
Mas Homero, tal como foi supremo poeta no gênero sério, pois se
distingue não só pela excelência como pela feição dramática das suas
imitações, assim também foi o primeiro que traçou as linhas
fundamentais da comédia, dramatizando, não o vitupério, mas o
ridículo. (ARISTÓTELES, 1448 b 33- 1449 a)1
Em que, linhas antes na mesma obra, Poética, Aristóteles conceitua o poeta
como sendo o ser capaz de estruturar em versos um texto, contendo ainda assim, uma
melodia e metrificação, na qual indo além, o mesmo arrisca em definir as os gêneros
epopeia e tragédia como imitações
Pois tal como há os que imitam muitas coisas, exprimindo-se com
cores e figuras (por arte ou por costume), assim acontece nas
sobreditas artes; assim acontece nas sobreditas artes: na verdade, todas
elas imitam com o ritmo, a linguagem e a harmonia, usando estes
elementos separada ou conjuntamente. (ARISTÓTELES, 1447a 13-
17).
Nesse sentido os poetas são os que possuem o deleite da escrita em versos, ritmo
e melodia, porém a partir destas constatações Aristotélicas, os que fazem “bem” suas
atividades, como o flautista que toca flauta, e a toca bem, é que se destacam, sendo
assim, a diferença de um grande poeta, quiçá um gênio, para um poeta é apenas cumprir
sua função bem?

1
Aristóteles, Poética. Trad. E. Sousa
No meio desse fogo cruzado, entre as duas posturas em que a primeira procurava
contradições no plano total da obra, e a segunda convicta da existência de um gênio que
marcou a época como precursor das perfeitas epopeias artísticas, estava o pressuposto
de que o problema seria resolvido sobre um juízo estético. Então até este ponto da
investigação estão sendo guiadas e resumem-se a um ponto de vista puramente estético
na questão da personalidade do grande gênio.

A PERSONALIDADE NO NIETZSCHE MADURO

Juízo esse que gera uma apreensão quanto a definição correta entre indivíduo
genial e a alma nacional poética, apresentados em Homero e a Filologia Clássica, o que
a princípio essa rivalidade posta desta maneira induz a erros, onde não existe contraste
mais perigoso na estética moderna que o feito entre poesia nacional e poesia individual,
ou como é de costume titular poesia artística. Onde essa rivalidade fez com que a
ciência filológica-histórica, com autoria de Wolf, descobrisse o surgimento da alma
nacional.
Pois com ela conquistou-se pela primeira vez o terreno para uma
consideração científica aproximativa da história, a qual até então, e em
muitas formas até agora, era uma simples reunião de material, com a
expectativa de que este material se amontoasse infinitamente, e jamais
se conseguisse descobrir a lei e a regra deste embate eternamente novo
das ondas. (BONNACINI, 2003, p.16)
Agora, poderia conhecer tudo o que realmente existia de forma grandiosa que
supera o aspecto da vontade, se fazendo notar os instintos da massa e os impulsos
inconscientes da nação, alavancando a história universal. Logo, não pode existir de
maneira alguma a oposição acima, pois uma poesia pressupõe a outra, toda poesia
nacional necessita de um indivíduo mediador. Então essa oposição apenas pode deter
um sentido quando a poesia individual é composta por um criador não popular em um
meio de intelectuais. Quando tratamos de Homero, de nada se ganha com a teoria da
alma nacional, pois deve-se reter ao indivíduo poético, mas com uma preocupação em
perceber o indivíduo Homero e aquilo que foi amontoado com a tradição oral. E todas
irregularidades que encontram nos poemas homéricos foram atribuídas a chula tradição,
restando apenas belas passagens que foram determinadas por uma orientação estética,
dando forma ao núcleo do erro homérico.
Pois o nome de Homero não teve desde o princípio uma relação
necessária com o conceito de perfeição estética, nem tampouco com a
Ilíada e a Odisséia. [Considerar] Homero como o poeta da Ilíada e da
Odisséia não é uma tradição histórica, mas um juízo estético .
(BONNACINI, 2006, p.18)
Sendo assim, a única diferença entre o grande poeta de uma era literária e de qualquer
outro poeta nacional de um período “menos literário” é a tradição, a proporção e
principalmente a divulgação que irão conduzir à um contexto de cunho tradicional.
Até aqui temos consolidado a filosofia jovial que desemboca numa continuidade
e posterioridade da indagação que envolve a questão do gênio, que o próprio Nietzsche
demonstra ainda estar em busca dessa resposta. Não muito satisfeito com a resposta, ou
o início dela, após o discurso da Basiléia o mesmo escreve a obra A filosofia na época
trágica dos gregos publicada pela primeira vez em 1873, a questão da personalidade
perdura como ponto principal da obra, mostrando-se também uma certa distância à
Schopenhauer. E em 1889, publica a obra Crepúsculo dos Ídolos em que em um de seus
parágrafos faz uma relação do gênio com a época, na que a relação dos dois me parece
ainda ser dependente, porém uma dependência de certa forma autônoma, beirando a
independência. Onde nesse limbo, o gênio é necessário e dominante sobre a época, o
período; sendo o gênio mais forte e explosivo até que em certo momento, sob qualquer
estímulo, mais casual que seja, emerge o grande homem, colocando o caráter do sujeito
como determinante para a consolidação de um grande gênio. Perspectiva essa que foi
lapidada ainda em na sua obra Humano, demasiado, Humano, onde nota-se uma
transgressão quanto ao pensamento iniciado em Homero e a Filologia, do gênio como
“santo intocável” e sobrenatural para algo mais simples, onde o grande poeta é visto
como o resultado de atividades e aprimoramento de qualidades, que em si são
humanamente alcançáveis com determinação, incentivo e tempo, removendo do ideário
a noção de algo inato.
No artigo O destino do gênio e o gênio enquanto destino: o problema do gênio
no jovem Nietzsche, Eduardo Nasser constata que a genialidade não é um dom, nem um
talento inato, é grandeza adquirida sem distinção do gênio ou por exemplo um arquiteto
e a tradição e período de que em Homero e a Filologia Clássica são os elementos que
distinguem um grande poeta de um poeta nacional, apontando que nada mais é do que
uma estrutura política que não só valoriza como produz a sua arte política voltada para
os artistas. Premissa essa que se levarmos em consideração ao período clássico, arrisco
inferir que Homero só se tornou um cânone literário devido a um privilégio referente as
políticas publicas que regiam a Grécia antiga.
Para que o gênio seja alcançado, as instituições políticas e
educacionais devem estar a serviço da finalidade da natureza. No
entender de Nietzsche, o Estado, a educação e a cultura (Bildung 6) são
utensílios da vontade encarregados de proteger e oferecer as condições
necessárias para a vinda dos gênios7. (NASSER, 2012 p.293)
Constatado como tal, o fim ultimo das instituições políticas, educacionais e
culturais o gênio, nota-se uma hierarquia social entre a figura do gênio e da massa, em
que a estrutura política-social-econômica teria em mais alta “classe” o núcleo de gênios
que por consequência, quando formados se firmam como os mais gloriosos guias
culturais. Percebe-se aqui um ciclo vicioso para existência harmônica dessa natureza
desigual. Mesmo sem deixar muito claro de que período histórico o Nietzsche ressaltava
a ferramenta do Estado como cultivador de gênios, ao pensarmos em como a
modernidade trata seus gênios, nos conduz a uma transição tenebrosa. Na que as
pessoas antes de reconhecerem e serem vistas como gênios, são ignoradas e até
enfrentam uma força repressora para desenvolver esta capacidade, onde se adquire uma
logica utilitária a cultura, daí surge a indústria cultural, produção de massa na que visam
produtividade e fins lucrativos, deixando de lado a criatividade e liberdade artística.

CONCLUSÃO

Por tanto, vimos que a origem da poesia sofreu algumas adaptações na medida
em passaram-se os anos e o amadurecimento do Nietzsche foi se consolidando e desde
seu discurso da Basiléia mostrou-se disposto a investigação da personalidade do poeta.
Na questão Homérica que se concretiza e se deu até certo ponto por um juízo puramente
estético, é retornando um único caminho para o período anterior a Pisístrato que não se
encontra em nenhum local o nome Homero atribuindo além de poeta da Ilíada e
Odisseia. Foi então quando a antiga significação material de Homero vai de o pai da
poesia épica heroica à significação estética como pai da poética e ao mesmo tempo
inigualável. Sendo assim, mais uma vez, considerar Homero como poeta de Ilíada e
Odisseia é um juízo estético. Apesar do mecanismo de estudo da história da literatura
tentar esclarecer as formas como a individualidade se mostra, estudando dados
biográficos do poeta, relações e acontecimentos é impossível definir e comprovar a
personalidade quando se detém apenas obras (Ilíada e Odisseia) e o nome do autor.
Assim fica dito de passagem que Homero seja um mero produto da imaginação,
impossibilidade estética e só alguns filólogos compartilham desta opinião, acredita-se
finalmente que de fato existia um grande poeta da Ilíada e odisseia, mas este não
acredito que seja Homero.
E partindo disto, Nietzsche intensifica suas investigações no que circunda a
personalidade do grande poeta, demonstrando que em uma de suas perspectivas o poeta
pode ser o fim de um povo, no que depois será o guia de completude poética, apesar de
não estabelecer uma “receita” de como ser um poeta temos bons indícios de que é algo
difícil, mas possível. Em uma conjuntura política ideal que não furte energia e tempo
que seriam usados para um aprimoramento e desenvolvimento de obras de um poeta,
um grande poeta pode nascer, mas quando direcionamos nosso olhar para a atual gestão
politica do Brasil e notamos que os gênios poetas e cantores, são em sua maioria
pessoas que usam da arte como uma ferramenta de ecoar vozes e reivindicar condições
mínimas de um governo que em si redirecione politicas publicas favoráveis de uma vida
não só minimamente digna, mas uma vida humana na que com certeza teríamos grandes
poetas.

REFERÊNCIAS

Homero e a filologia clássica. Trad. Juan Bonnacini. In: Princípios: Revista de Filosofia
(UFRN), v. 13, n. 19-20, 2006.
Crepúsculo dos ídolos. Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Comp. Das Letras, 2006
NASSER, E. O destino do gênio e o gênio enquanto destino: o problema do gênio no
jovem Nietzsche. In: Cadernos Nietzsche, v. 30, 2012.
ARISTÓTELES. Poética. Trad. Eduardo de Sousa. São Paulo: Edições 34, 2019.
CECÍLIA, A. História da Arte. 1. ed. Editora Sobral,2017

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