Do 2
Do 2
Do 2
20/09/2017
• OBJECTO DO DIP são as relações privadas internacionais: têm contacto com vários
ordenamentos jurídicos – tratam-se de relações jurídicas plurilocalizadas, não estão localizadas
num único local apenas. Ex:
A (português) casa com B (espanhola) e residem ambos em França. A morreu e deixou bens
que estão em Inglaterra. Para quem vão esses bens?
A lei de ESP dita que vão para B + os filhos existentes; a de PT a mesma coisa; a de ING dita
que vão para quem A quiser que vão e a de FR que vão para os filhos.
Para a resolução de relações plurilocalizadas há um método a seguir. Temos desde logo o método
CLÁSSICO/SAVIGNIANO que nos diz que se deve escolher uma lei aplicável. Trata-se de um
MÉTODO CONFLITUAL que usa como critério de escolha da tal lei aplicável a ligação mais forte ao
caso. De todas as leis passíveis de ser aplicadas este método vai escolher uma delas, há uma
determinada norma (chamada regra de conflito) de DIP que nos irá dizer qual.
• PRINCÍPIOS DO DIP
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Ana Luísa Ribeiro
Princípio da TERRITORIALIDADE DAS LEIS: já não se usa hoje! Propugna que aos factos ocorridos
em x território se aplica a lei desse território, independentemente de qualquer outro elemento do
caso. Tinha como vantagem o facto de que o aplicador do direito aplicava a lei que conhecia
melhor, a do seu território. Ex:
A (Israelita) casa com B (Alemã), vivem em Espanha e pedem o divórcio em Portugal. De acordo
com o princípio da territorialidade a lei aplicável era a PT (o divórcio, o facto, ocorreu/foi pedido
em Portugal). Mas...
Não podemos aplicar a lei portuguesa uma vez que ela não tem elemento de conexão ao caso!
Este princípio gera instabilidade das relações privadas internacionais pois o estatuto das
relações mudaria com o cruzamento de fronteiras e isto não deve acontecer, é justamente um
dos problemas que o DIP quer evitar!
Isto violaria as expectativas das partes, pois ia ser aplicada uma lei que as partes nunca
previram que lhes fosse aplicada. Ex: B celebra um contrato de aluguer em PT e ao ir a ESP como
a lei aplicável a este contrato é diferente da portuguesa o contrato que B celebrou (válido em
PT) passa a ser inválido em ESP, de acordo com a lei espanhola.
Geraria situações não efetivas. Ex: o casamento gay não é permitido em todo o mundo. Logo, se
um casal gay se viesse casar a Portugal aqui era considerado como um casal, mas ao voltar p.ex.
à Arábia Saudita não estão como casados nunca.
25/09/2017
Ex: A (inglês) reside na Alemanha e tem um prédio no Algarve. Quer construir até à extrema do seu
terreno e abrir janelas, o que é permitido pela lei da Inglaterra. Poderá fazê-lo?
De acordo com o PP. DA NÃO-TRANSACTIVIDADE apenas podemos aplicar leis que têm conexão
com o caso → PT (é onde está o prédio); ALM (é onde A reside) e ING (é a nacionalidade de A).
Usando um CRITÉRIO DE JUSTIÇA FORMAL vamos escolher uma das leis passíveis de aplicação. Será
a lei que tem a ligação mais forte. Os artgs. 14.º a 65.º do Código Civil regulam os conflitos de
leis, vão escolher qual a lei a aplicar aos casos. No nosso caso será o art. 46.º CC a dizer qual será a
lei aplicável ao caso, uma vez que trata de direitos reais.
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Ana Luísa Ribeiro
1) CONCEITO QUADRO - Está para a regra de conflitos como a hipótese para as normas materiais.
Vai determinar o âmbito de aplicação da regra de conflito.
2) ELEMENTO DE CONEXÃO – É uma circunstância de facto, eleita pelo legislador, para determinar
a lei aplicável, é a mais relevante circunstância do caso em apreço. No exemplo acima será a
situação (local) dos bens.
No art. 50.º p.ex. o conceito-quadro em causa já será a forma do casamento e o elemento de
conexão será o local da sua celebração.
3) CONSEQUÊNCIA JURÍDICA – Vai ser a aplicação da lei determinada pelo elemento de conexão à
matéria determinada pelo conceito-quadro. Ex: aplicação da lei da situação dos bens
(portuguesa) ao nosso caso.
Há matérias que são SEMPRE reguladas pela LEI DO FORO. É o caso da LEI PROCESSUAL,
embora possa aplicar substancialmente lei estrangeira a lei processual aplicada é sempre a
do foro! Isto é assim porque, em princípio, a lei processual não tem influência na resolução
do caso. O processo é apenas o modo como se chega ao resultado. A regra de conflito é
apenas uma norma indireta/formal, não nos dá a solução ao caso, mas escolhe sim a lei que
irá dar (que como se viu também não é a processual!) – isto para a Escola de Coimbra.
b) FRANCESA/MAXIMALISTA entende que o DIP trata todo e qualquer problema suscitado por
uma relação internacional, ou seja, 1qual a lei aplicável, 2qual a jurisdição aplicável, 3qual o
valor das sentenças. Ademais diz que DIP deverá ainda tratar de 4direito da nacionalidade
(quem deverá ter certa nacionalidade) e 5direitos dos estrangeiros (art. 14.º CC dá-nos a
condição dos estrangeiros).
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Ana Luísa Ribeiro
Resolve este problemas e não outros pois esses têm diferenças estruturais:
Tipo de normas de DIP não solucionam o caso, são apenas normas formais, normas
sobre normas que irão dizer que normas (essas sim) dão solução ao caso.
Nas relações jurídicas internacionais colocam-se SEMPRE estes problemas. As
restantes acima apontadas são eventuais.
No entanto, os pontos 4 e 5 acima mencionados acabam por ser estudados em DIP pois caso
contrário não seriam de todo estudados. Em DIP vamos estudar apenas a parte geral dos
conflitos de leis e de modo superficial, a nacionalidade apenas a dupla nacionalidade e os
apátridas, em relação aos direitos dos estrangeiros vemos apenas as coisas fundamentais.
02/10/2017
Os outros dois problemas, que não fazem parte do âmbito do direito internacional privado, o
direito da nacionalidade (quem tem uma dada nacionalidade...) e o direito dos estrangeiros (a
questão de saber se os estrangeiros, quando estão em Portugal, gozam dos mesmos/demais
direitos que os portugueses...). Quanto a estes pontos vamos apenas ver pequenos problemas.
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Ana Luísa Ribeiro
O único ponto que é mais relevante neste problema (para o programa da cadeira), é dos conflitos
de nacionalidades - saber como consideramos as pessoas que têm mais de uma nacionalidade
(conflito positivo de nacionalidade) ou que não têm nenhuma nacionalidade (conflito negativo de
nacionalidade). Se tivermos um cidadão que é simultaneamente português e brasileiro, ele, em
Portugal, é tratado como português ou como brasileiro? Ex:
Artigo 62º C.C. - remissão para o artigo 31.º/1: para regular a sucessão de alguém,
precisamos de saber qual a lei de nacionalidade dessa pessoa. Mas e se tiver duas
nacionalidades? Ou até nenhuma? O que aplicamos?
Mas isto não resolve o problema colocado: o senhor era espanhol e francês e residência em
Portugal. Logo, não se pode aplicar. Mas nestes artigos, diz o 28º/parte final que se o interessado
não tiver residência em nenhum dos países de que é natural, conta a nacionalidade com que ele
tenha uma relação mais estreita (este é um critério residual). Na verdade, o legislador não escolheu
nenhuma e passou a escolha para o julgador. O critério final do artigo 28.º não é um critério global
– passa para o julgador a escolha, tem de procurar a nacionalidade que considera ser mais forte
para o individuo. É necessário ver isto em concreto. E como é que isto se resolve? Através de todas
as questões empíricas que ajudam a determinar uma maior ligação a um dos seus países de origem.
A que matéria é que se aplica o artigo 62º do Código Civil? Sucessões por morte. E qual é o
elemento de conexão? O artigo 31º, que diz que a lei pessoal é a lei da nacionalidade. Este
elemento de conexão está a falhar no exemplo dado; mandou-se aplicar a lei da nacionalidade mas
esta falhou porque o senhor não tem nacionalidade. A solução é dada no artigo 32º do Código Civil,
onde se vai substituir o elemento de conexão da nacionalidade – porque ele não a tem – por a da
residência habitual. E assim se resolve os conflitos negativos de nacionalidade.
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Ana Luísa Ribeiro
E se ele não tiver uma residência habitual? O artigo 32.º/2 manda-nos aplicar o artigo 82º, ou seja,
a sua residência ocasional. E se ele não tiver a residência ocasional? No local onde ele se encontrar.
Tal como em todos os ramos do Direito, o direito da união europeia vem intervindo no Direito
Internacional Privado, criando modificações:
→ Caso Ac. Micheletti: este senhor tinha dupla nacionalidade, era argentino e italiano, era
dentista e queria abrir um consultório em Espanha. As autoridades espanholas estavam a criar uma
série de obstáculos à criação do seu consultório de medicina dentária e ele alegou estar a utilizar
uma liberdade da União Europeia (liberdade de estabelecimento). Mas esta liberdade só é
concedida a quem tiver a nacionalidade de um Estado-Membro, e havia em discussão um conflito
de nacionalidades. A regra em Espanha é igual a nossa, em Portugal. No caso de alguém ter duas
nacionalidades e se uma for espanhola, conta a espanhola (semelhante ao nosso art. 27.º LN) Mas
ele residia na Argentina (e não em Itália) – logo, não se aplica a segunda forma (art. 28.º LN).
Houve reenvio prejudicial e o TJUE determinou que cada Estado é que sabe como resolve os
conflitos de nacionalidade, mas há um limite: a forma como os resolve não pode negar a alguém
que seja cidadão europeu os direitos próprios da cidadania europeia. Logo, o acórdão Micheletti
vem dizer que Espanha é que sabe que se ele é italiano ou argentino mas se tiverem em causa
direitos da União Europeia, da cidadania europeia, ele é cidadão europeu mesmo que para todos os
outros efeitos ele seja argentino.
O efeito disto foi diminuir o âmbito do funcionamento do artigo 28º da Lei de Nacionalidade
Portuguesa. Passa a haver agora uma exceção: se estiverem em causa direitos conferidos pela
cidadania europeia e uma das suas nacionalidades for de um Estado Membro da União Europeia,
não conta o critério da residência – nestes casos, conta sim a nacionalidade do Estado Membro. Foi
criada uma modificação ao sistema de conflito de nacionalidades.
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Ana Luísa Ribeiro
são mais “restringidos” que outros: os de Estados Membros, dos PALOP geralmente têm mais
direitos fruto das relações com o nosso país, a história...
A história do direito internacional privado é matéria facultativa, não sendo perguntada nos exames.
No entanto, a parte do método é muito importante, vamos dar várias propostas metodológicas
que já são matéria de avaliação!
• CONFLITOS DE LEIS
O método Savigniano é um método conflitual em que para uma situação internacional se utilizam
regras de conflitos que escolhem a lei aplicável. Vamos estudar quais os interesses que o DIP visa
satisfazer, o que queremos atingir com o uso de regras de conflito? Como se deve escolher a lei
aplicável a um conflito internacional? Quais as razões de ser do DIP?...
Primeira questão é a de saber se o DIP quer atingir a solução mais justa. Estando a discutir o
divórcio entre o senhor A e a senhora B temos de determinar qual a lei aplicável ao divórcio. Senhor
A é sueco, a Senhora B é dinamarquesa, residem em Portugal, e o património está no Brasil. A lei
aplicável ao divórcio, deve ser a que for mais justa, com uma maior igualdade?
O critério do DIP não é o da justiça material; o que nos interessa é um critério de justiça formal,
escolher a lei com que o caso tenha uma ligação mais forte, a mais próxima, com que as partes
estavam a contar/tinham expetativa de ser aplicável.
Mas não pode ser só este o objetivo! Se nós nos preocuparmos apenas em escolher a lei mais
próxima, corremos um risco → imaginemos que as partes acima que se divorciam em Portugal e um
deles vai para o Brasil, para vender o seu património. Lá descobre que a lei aplicável ao divórcio era
a Brasileira, o que leva a que o seu divórcio (em Portugal) não seja válido. No BR são casados, em PT
são divorciados. Ocorre com isto a instabilidade de relações particulares internacionais. Como
conseguir que o direito internacional privado atinja o princípio da lei formal + estabilidade de
relações particulares internacionais, isto é, que o estatuto das pessoas não varie consoante a
passagem de uma fronteira? Isto conseguir-se-ia se houvesse uma uniformização da lei; ao aplicar
uma mesma lei, o resultado será o mesmo independentemente de onde se aprecia a questão do
divórcio.
Este será, talvez, o principal princípio do DIP: harmonia jurídica internacional, significa um
consenso internacional quando à solução dada ao caso, que deve ser reconhecida em todo o
mundo, igual. Pretende-se que, onde quer que o problema se proponha, seja sempre aplicada a
mesma lei para que não varie o estatuto dos cidadãos consoante as fronteiras que passam.
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Ana Luísa Ribeiro
Como conseguimos isto, que se mande aplicar sempre a mesma lei? Através de um movimento de
unificação internacional do DIP em que os vários países do mundo tentam unificar o seu direito
internacional privado. Há até uma organização com este objetivo: Conferência da Haia sobre o
direito internacional privado. Podemos também observar uma uniformização continental, que a
União Europeia tem procurado atingir, no Direito Internacional Privado dos Estados-Membros.
Ferrer Correia diz que o direito internacional privado tem uma vocação ecuménica. Significa que o
objetivo do DIP só estará plenamente garantido quando as mesmas regras de conflito vigorarem no
mundo inteiro, pois só assim se consegue a estabilidade das relações internacionais privadas.
04/10/2017
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Ana Luísa Ribeiro
1. Se houver discordância entre o que se quer as partes vão colocar ações em locais diferentes, o
que gera uma corrida aos tribunais e o primeiro a propor e a obter uma sentença vai conseguir o
resultado que quer. A existência do forum shopping, a possibilidade de escolher o tribunal, vai
promover a litigiosidade porque vão querer o resultado que mais desejam.
2. E depois, porque gera problemas de reconhecimento de decisões. Muito provavelmente, vai
acontecer que tenhamos duas decisões judiciais em sentido contrário.
Ou seja, isto é tudo o que o DIP não quer: instabilidade das relações internacionais e haver forum
shopping. Mas, como é que se combate isto? A solução era a unificação das regras de conflito, que
é o objetivo do DIP: o ideal seria que as regras de conflito dos dois países conflituantes fossem a
mesma, porque se dissessem o mesmo, o resultado seria igual nos dois países. E por isso, a ideia é
haver unificação do direito internacional privado. No entanto isto ocorre a poucos níveis.
• UNIFICAÇÃO EUROPEIA
Desde 1999 foi atribuída à UE a competência para unificar o DIP entre os países europeus – já que
não se está a conseguir a unificação do DIP a nível mundial, conseguir-se-á a nível europeu.
Porque está a UE interessada nisto? O cidadão europeu pretende a liberdade de circulação mas se
não houver estabilidade das relações internacionais, haverá mesmo liberdade de circulação? NÃO,
e por isto mesmo a UE está interessada na unificação pois é forma de garantir a liberdade de
circulação. Portanto, estamos neste momento a assistir na EU a substituição do DIP a nível interno
por um DIP europeu. E já houve várias fontes de unificação:
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Ana Luísa Ribeiro
2015. O que conta é a data da morte, e o problema das partilhas só se coloca muitos anos
depois da morte das pessoas.
E nos domínios que ainda não houver unificação? Como conseguiremos a tal harmonia jurídica
internacional? O legislador de DIP deve ser o menos criativo possível, deve adotar os elementos de
conexão que são adotados pela maioria dos outros países. É esta a preocupação para o direito
interno. O legislador não deve mandar aplicar uma nova lei que nenhum outro país aplique, deve
escolher aplicar a lei que a maioria dos países aplica. Quando isto não for possível – quando
tivermos escolhido uma lei que os outros países não escolherem – há um elemento de correção: o
reenvio, que vai corrigir os casos em que o nosso legislador divergiu dos outros.
• PRINCÍPIOS
→ Princípio da harmonia jurídica material: significa que o DIP tem de evitar contradições
insanáveis. Ex:
Temos o senhor A, que é alemão, e a senhora B que é grega e tiveram um filho com nacionalidade
alemã e que reside na Alemanha com a mãe. E coloca-se a questão de saber se o pai tem direito de
visita à criança, se o pai gozava ou não do direito a visitar a criança.
A regra de conflito alemã dizia que as relações entre progenitor e o seu filho regem-se pela lei da
nacionalidade do respetivo progenitor. Ou seja, que lei é que vai reger a relação entre o pai
(alemão) e o filho? A lei alemã. E que lei é que vai reger a relação entre a mãe (grega) e o filho? A
grega. A lei alemã diz que o pai tem direito a visitar o filho. A lei grega diz que a mãe tem o direito a
impedir que o pai visite o filho.
O DIP tem que evitar a desarmonia material, não deve chamar leis diferentes que tenham soluções
incompatíveis. Como vamos conseguir a harmonia material? Segundo Wengler, o DIP deve
esforçar-se por escolher uma só lei para cada relação jurídica, desde que isso não ponha em causa a
harmonia internacional. Ao escolher várias leis para a mesma relação, corre o risco de as leis terem
soluções diferentes.
Artigo 57.º/1 CC: se os pais não tiverem uma nacionalidade em comum, aplicamos a lei da
residência. E se ainda assim, residem em países diferentes? Aplica-se a lei pessoal do filho. Uma
única lei. Esta é a preocupação com a harmonia internacional.
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Ana Luísa Ribeiro
efeitos é a Suíça (onde está o imóvel) logo, não serve de nada se a lei portuguesa não produzir
efeitos na Suíça porque pode acontecer que na Suíça se mande aplicar a lei Suíça. Sendo assim, não
seria melhor mandarmos aplicar a lei suíça? É isso que diz o princípio da efetividade: é melhor
aplicar a lei do país que está em condições de a fazer aplicar. É preciso mandar aplicar a lei do
Estado que tenha condições físicas de a fazer cumprir; caso contrário, corremos o risco de criar as
situações claudicantes. Se mandarmos aplicar a lei portuguesa, vamos criar uma situação que
produz efeitos em Portugal mas não na Suíça, que é onde querem que surta efeitos. Quanto a
direitos reais a nossa lei no artigo 46º manda aplicar a lei do Estado em que a coisa se encontra
situada.
→ Princípio da igualdade de tratamento: refere-se a um tratamento igual que deve ser dado a
todas as legislações, por parte do DIP. Não se pode fazer diferenciação de uma lei em relação às
outras. O direito internacional privado não pode tratar melhor a lei do foro (o local onde se coloca o
problema) do que a lei estrangeira, não pode haver diferenciação entre a lei do foro e a lei
estrangeira. Admitindo como pressuposto que pode ser aplicada a lei estrangeira, não se pode
entender que a nossa é pior ou melhor que a estrageira, tem de se estar em posição de abertura.
Então o DIP não pode mandar aplicar a lei do foro? Pode, só que só pode mandar aplicar a lei do
foro apenas nos casos em que a lei do foro é a lei eleita pelas regras de conflito. Não se pode criar
uma situação de favor à lei do foro.
→ Princípio da Boa Administração da Justiça: DIP deve privilegiar a lei que o juiz conhece
melhor a fim de evitar o erro judiciário. Este princípio aponta para a aplicação da lei do foro, pois é
esta melhor conhecida do juiz. Mas isto entra em conflito com o princípio da igualdade de
tratamento (que diz que não devemos privilegiar nenhuma lei face a outra)! Em que ficamos? O
princípio da boa administração da justiça é residual; o DIP só o terá mais em conta quando os
outros 4 estiverem satisfeitos. No entanto, há casos em que podemos usar o princípio da boa
administração da justiça como critério de aplicação.
• Natureza do DIP – será direito nacional/interno (como as normas reguladoras de direitos reais,
família...) ou é internacional (uma vez que trata de relações internacionais? Quanto a isto,
encontramos várias teses:
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Ana Luísa Ribeiro
Assim sendo entendido o DIP, seria nas fontes de direito internacional que estariam as regras de
conflito (costumes...). Mas não é isto que sucede, é no Código Civil que elas estão! Se o DIP é
internacional, as regras de conflito deviam estar nas leis internacionais, e não nas leis internas.
2. Doutrinas NACIONALISTAS: o DIP é puro direito interno. É igual aos direitos reais, da família...
cada ordem jurídica tem o seu sistema de DIP. Mas isto desrespeita o sentido do DIP, cujo
objetivo é a harmonia internacional. O objeto do DIP são as relações privadas internacionais,
logo, o seu objeto é internacional. Logo, um ramo de direito que tem um objeto internacional
não pode ser puramente interno.
3. Doutrinas ECLÉTICAS:
Teoria do Dr. Ferrer Correia – quanto ao objeto o DIP é direito internacional porque trata de
relações internacionais (tal como o DIPúblico), mas quanto à fonte é nacional/interno. Outras
fontes como conferências internacionais e os regulamentos da União Europeia são tidos como
fonte interna pois um estado só se vincula a uma convenção internacional se ele quiser, com
um ato nacional, a ratificação. E o mesmo ocorre para a legislação europeia (art. 8.º CRP
plasma um acolhimento automático).
Teoria do Dr. Moura Ramos – o DIP, quanto ao objeto, é sempre internacional. Quanto à
fonte, varia: às vezes, é internacional (quando as regras de conflito estão em convenções
internacionais, por exemplo); outras vezes, é europeu (regras de conflito estão em
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Ana Luísa Ribeiro
regulamentos europeus...); nos restantes casos (ainda são a maioria) a fonte é o direito
interno de cada Estado, logo nestes casos o DIP será interno quanto à sua fonte.
DIP vs. Direito Interlocal/Interterritorial - Tem normas exatamente iguais, regras de conflito que
resolvem conflitos de leis no espaço. A diferença está no facto de que os conflitos de leis no espaço
ocorrem dentro de UM ÚNICO ESPAÇO. As normas de direito interlocal funcionam dentro de um só
país. Isto ocorre em países com SISTEMAS PLURILEGISLATIVOS - um único país tem, no seu interior,
vários sistemas jurídicos como p.ex. os Estados Unidos e Espanha. Em cada ordem jurídica vigora
um determinado direito interterritorial, que será único para todo esse sistema.
O direito interterritorial NUNCA utiliza como elemento de conexão a NACIONALIDADE! Também
existe no DIP uma válvula de escape (ordem pública internacional) que não existe no direito
interterritorial.
Em Portugal NÃO TEMOS este tipo de direito! Embora tenhamos regiões autónomas somos um
Estado unitário, com legislação unitária, aplicando o mesmo Código Civil em qualquer parte do
território. No entanto, podemos ter de lidar com problemas internacionais em que entram sistemas
interterritoriais.
DIP vs. Direito Interpessoal – em alguns ordenamentos plurilegislativos (um Estado que tem
vários sistemas jurídicos) cada uma das partes desse sistema aplica-se não pelo território onde
vigora, mas de acordo com o tipo de pessoas a que se referir. Isto é, nesses ordenamentos, a
aplicação dos vários sistemas não está territorialmente dividida (como em Espanha) mas sim
consoante os cidadãos em causa, seja em que parte do país for.
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Ana Luísa Ribeiro
São exemplos deste sistema a Jordânia ou a síria, que são estados de direito opcional. Como o
direito destes países tem como matriz uma origem religiosa, ele só se aplica às pessoas que
professam aquela religião. Às restantes, aplica-se um regime diferente.
Isto não ocorre em Portugal, pois somos um país de legislação única.
09/10/2017
a. A conceção tradicional que diz que as regras de conflito estão à margem de fiscalização
constitucional, tendo vigorado durante 200 anos. Uma vez que as regras de conflito não são
normas materiais, mas sim de 2.º grau (normas sobre normas), não têm um conteúdo
suscetível de violar a Constituição – as normas que as regras de conflito escolhem podem
violar a constituição mas as regras de conflito em si mesmas não.
b. Contra esta conceção tradicional, temos a tese do Dr. Moura Ramos. Veio dizer que as regras
de conflitos podem ser inconstitucionais quando o juízo formal, o juízo de DIP, seja em si
mesmo contrário à constituição.
Imaginemos que ao definir as relações conjugais entre o marido A e a mulher B a nossa regra
de conflito diz que as relações em causa são regulados pela lei da nacionalidade do marido
(que é até bastante igualitária). Mas, ainda assim, a regra de conflitos não será
inconstitucional? A própria escolha, o próprio critério de escolha de lei aplicável, é aquele que
viola a constituição. O facto de as regras de conflito serem normas formais não as isenta de
um controlo de constitucionalidade, uma vez que têm de respeitar todas as normas que se
encontram na constituição.
É esta a teoria disseminada: uma regra de conflito pode ser inconstitucional quando viole
princípios constitucionais (nomeadamente o da igualdade), sendo isso visto ao nível do
critério de escolha que adota.
Assim, vendo hoje o artigo 52º CC: o conceito-quadro é as relações entre os cônjuges. Este
artigo foi alterado em 1977, eliminando uma discriminação entre os cônjuges. Hoje estas
relações são reguladas pela lei nacional comum (se ambos tiverem a mesma nacionalidade).
Mas isto pode não ocorrer, caso em que o /2 nos diz aplicar-se a lei da residência habitual
comum. É chamada uma única lei para que não haja conflitos e se assegure o princípio da
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Ana Luísa Ribeiro
harmonia material. Se não houver sequer uma residência nestes termos, o final do /2
prescreve ainda aplicar-se a lei mais estreitamente conexa com a vida familiar. Este elemento
de conexão – “lei mais estreitamente conexa” – é avaliado pelo julgador, desde 1977, em
respeito do princípio da igualdade (pois antes, não tendo os cônjuges a mesma nacionalidade
nem residência habitual comum, aplicava-se a lei da nacionalidade do marido)
2 → Pode o juiz português recusar a aplicação de uma lei estrangeira quando esta viole a nossa
Constituição? Em princípio NÃO, há só UMA exceção.
Ex: Num tribunal de trabalho português, está a ser julgado um litígio entre o senhor A (canadiano) e
a empresa B (norte-americana). A era trabalhador da empresa B, e o trabalho era realizado na
África do Sul. Intentou-se uma ação em Portugal com o seguinte problema: B tinha despedido A
sem justa causa.
Não podemos aplicar logo a lei portuguesa (embora estejamos num tribunal português) pois não
vigora o princípio da territorialidade! Sendo uma situação internacional (tem contacto com mais do
que uma ordem jurídica), temos de ver qual a lei que tem uma maior conexão com o caso, qual a lei
que deve ser aplicada. Esta lei vai ser definida por uma regra de conflito, que no caso diz que a lei
aplicável é a da África do Sul, que admite poder haver despedimento livre (algo que a nossa
constituição proíbe!). Deverá então a lei Sul-Africana ser aplicada?
A solução tradicional seria a sua não aplicação. Mas isto violará um dos princípios de DIP, que nos
diz que deve haver uma igualdade no tratamento entre as legislações, não devemos privilegiar a
lei do foro face a outra, não a podemos achar “melhor”. Ao submeter uma lei estrangeira aos
nossos parâmetros constitucionais será que não estamos a violar o princípio da igualdade de
tratamento? A lei da África do Sul respeita a Constituição da África do Sul. Ao “força-la” a cumprir a
nossa CRP não estamos a respeitar o princípio da igualdade de tratamento, estamos a privilegiar a
lei do foro. Se a lei estrangeira for competente para regular o caso, ela não deve ser submetida à
nossa Constituição.
Outra razão para uma resposta negativa a esta questão é a harmonia jurídica internacional. A
solução dada no tribunal português deve ser a mesma que o tribunal sul-africano (uma vez que é
esta a lei a aplicar). Ao submeter a lei aplicável no caso à CRP iria haver instabilidade das relações
jurídicas, pois teríamos diferentes soluções. Por tudo isto, não se submete a lei estrangeira
competente à nossa Constituição.
Mas será isto sempre assim, sem qualquer limite? Imaginemos que uma lei estrangeira,
aplicável, permite o homicídio. Podemos tolerar a sua aplicação nos tribunais portugueses? ↓
Exceção: o art. 22º C.C. é um expediente de Direito Internacional Público que permite recusar o
resultado da aplicação da lei estrangeira quando tal resultado seja desconforme aos nossos
valores fundamentais. Estes princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa estarão na
Constituição, mas isso é um fator acidental.
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Ana Luísa Ribeiro
Não é pelo fato de uma lei estrangeira estar contrária à nossa CRP que não a vamos
aplicar, mas sim quando o resultado da aplicação da lei estrangeira for contrária aos
nossos valores fundamentais [o que conta são os valores, não a CRP em si, simplesmente
acontece que a maioria desses valores estão nela presentes]
3 → Pode um juiz português ao aplicar lei estrangeira recusar a sua aplicação quando ela viole a
constituição do país de onde é proveniente (p.ex.: recusa aplicar lei francesa porque viola constituição
francesa)? DEPENDE.
Ex: Morreu em Portugal, em 2015, o senhor A, francês mas residente no Algarve. Coloca-se a
questão de saber para quem vão os bens dele.
Artigo 62º CC Indica-nos que a sucessão do senhor vai ser regulada pela lei da sua nacionalidade,
ou seja, lei francesa. A lei francesa deixa os bens aos filhos e nada ao cônjuge (apenas recebe o
usufruto, mas não a propriedade). No entanto o notário/juiz português crê que esta norma
(francesa) viola a constituição (francesa), o que realmente acontece. O que deve fazer o juiz
português? Recusa a aplicação da norma francesa com base na violação da respetiva constituição?
A solução está no art. 23.º/1 CC: a lei estrangeira é interpretada dentro do sistema a que
pertence. O juiz português ao aplicar a lei francesa tem de a interpretar à luz do sistema francês
(sistema a que as normas aplicadas pertencem). Vigorando em França um sistema de fiscalização
constitucional difuso em que o juiz francês, de primeira instância, pode recusar a aplicação da lei
francesa porque ela viola a Constituição francesa, então o juiz português também pode. Se o juiz
francês não puder declarar a inconstitucionalidade da norma, então o juiz português também não
pode.
O porquê desta opção prende-se com a harmonia jurídica internacional, conferindo a um juiz
português os mesmos poderes do juiz francês isso contribui para uma uniformidade de soluções
nos países envolvidos.
11/10/2017
• As relações entre o DIP e o DUE - este ponto não está no livro do Dr. Ferrer Correia. Há 4 grandes
interações entre estes dois ramos do direito:
1. O DIP de fonte interna submete-se, como todo o direito nacional, aos princípios de DUE.
Ex: Uma regra de conflito diz que à responsabilidade civil aplica-se a lei do local onde
ocorreu a atividade geradora do prejuízo. No entanto diz ainda que, se o lesante for
português, pode escolher a lei aplicável.
Uma regra de conflitos deste género não poderia existir! De acordo com o princípio da não-
discriminação em razão da nacionalidade alguém, devido à sua nacionalidade, não pode ter
um direito deste tipo, sendo que outros cidadãos europeus (não portugueses) não teriam.
Quer isto dizer que os princípios de DUE vigoram, integralmente, no DIP.
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Ana Luísa Ribeiro
3. O princípio do reconhecimento mútuo diz-nos que os países confiam uns nos outros ao
ponto de todos terem vindo a assinar tratados que constituem a UE como a conhecemos
hoje. Logo, devem ter essa confiança mútua ao nível legislativo. Portugal deve confiar na
legislação francesa e vice-versa, bastando por isso em certas questões ser apenas cumprida
uma lei do país de origem. Este princípio é tido como semelhante às regras de conflito, que
escolhem uma lei aplicável, devendo nós confiar que essa lei também irá resolver o caso da
melhor forma.
Alguma doutrina entende que existe por isso uma regra de conflitos (pp. reconhecimento
mútuo) oculta nos vários tratados. Outra parte entende que não, que não se deve entender
assim este princípio, mas sim como um terceiro instituto – reconhecimento de direitos
adquiridos no estrangeiro – sendo já isto do estudo do DIP.
17
Ana Luísa Ribeiro
MÉTODOS
O MÉTODO (ver pág. 3) CONFLITUAL
1. Conceito-Quadro
- Usando como exemplo o art. 50.º do C.C. vemos que é uma regra de conflitos clássica/bilateral
pois ora tanto pode resultar na aplicação de lei estrangeira como na aplicação da lei do foro. A
certas matérias x será aplicada a lei y, conforme o local da celebração do casamento, se foi em
França que se celebrou esta R.C. manda aplicar lei francesa, se foi em Portugal manda aplicar lei
portuguesa.
- Art. 46.º tem como conceito-quadro “posse, propriedade e demais direitos reais”, o elemento
de conexão aqui é o território onde a coisa em questão se encontra. Tanto pode mandar aplicar
lei estrangeira (coisa situa-se em Inglaterra, p.ex.) como do foro (coisa situa-se no Alentejo).
- Art. 62.º o conceito-quadro é “sucessão por morte” e o elemento de conexão é a lei pessoal do
de cujus (a lei da sua nacionalidade – art. 31.º/1). Tanto pode ser portuguesa como estrangeira...
No fundo, as regras de conflito bilaterais ESCOLHEM A LEI APLICÁVEL, tanto podendo mandar
aplicar lei estrangeira como do foro. Há regras de conflito que não o fazem! Nestes casos o juiz
tem de ir procurar qual a lei aplicável.
18
Ana Luísa Ribeiro
O conceito-quadro enuncia então conceitos jurídicos (ex: “divórcio” no art. 55.º), que podem
mudar de país para país (o divórcio é uma coisa em Portugal e outra completamente diferente
na Arábia Saudita). O conceito-quadro é ≠ de normas materiais/substantivas que descrevem sim
factos da vida, uma regra de comportamento e sua consequência. Surge então o PROBLEMA de
saber ao que se refere o conceito-quadro. Há 4 posições que pretendem responder a isto:
i) SAVIGNY diz que o conceito-quadro tem como objeto uma relação jurídica. Define uma
relação jurídica para a qual vai indicar a lei competente. Ex: o art. 52.º CC regula as
relações entre os cônjuges, ou seja uma relação de casamento. Se A e B vivem juntos há
5 anos qual a lei aplicável a esta relação? Só sabemos qual a relação jurídica em questão
depois de aplicar x lei, mas a regra de conflitos é que nos diz qual a lei a aplicar. É por
isto que a posição de Savigny falha. O objeto do conceito-quadro NÃO É uma relação
jurídica!
ii) Roberto AGO diz que o objeto do c.q. não é uma relação jurídica mas sim uma
relação/situação da vida. No entanto, o c.q. como vimos não descreve factos mas sim
conceitos jurídicos! Além disso vejamos que para uma situação da vida – A e B querem
casar – há vários conceitos conceitos-quadro/jurídicos mobilizáveis e não só um, e é aqui
que esta conceção falha! Ex: ao “querer casar” aplica-se art. 49.º (capacidade para
casar), art. 50.º (forma do casamento), art. 53.º (regime e convenções).
iii) ZITOMANN o c.q. refere-se a um problema jurídico, p.ex. a tem 15 anos e casa. no
entanto, falha de modo semelhante a Savigny, pois só percebemos qual o problema
jurídico em causa depois de aplicar uma certa lei.
19
Ana Luísa Ribeiro
ii.) Factuais – conseguimos concretizar o elemento de conexão olhando apenas para os factos.
Ex: situação da coisa (sabemos onde está a coisa olhando apenas para factos, usando os
sentidos); residência habitual...
iii.) Móveis – são aqueles que podem sofrer alterações na sua concretização, podem no futuro
mandar aplicar uma lei diferente daquela que mandam aplicar agora. Ex: a residência,
nacionalidade... visto que uma pessoa pode mudar o local onde mora e a sua
nacionalidade.
Imóveis – mandam aplicar sempre a mesma lei uma vez que o elemento não muda nunca.
Ex: local da situação de um imóvel, local da celebração de um contrato...
Algumas vezes o legislador de DIP cristaliza elementos de conexão móveis, tornando-os
imóveis. Ou seja, embora o elemento pudesse vir a mudar no futuro, o que alterava a lei
aplicável o legislador “para-o” para certos efeitos. Ex: art. 53.º/1 tem como conceito-
quadro as convenções antenupciais (...) sendo o elemento de conexão a nacionalidade dos
nubentes (que é um e.c. móvel), no entanto o legislador ao introduzir a expressão “ao
tempo da celebração” cristalizou o elemento móvel, tornando-o imóvel. Mesmo que os
cônjuges mudem de nacionalidade posteriormente, a lei aplicável será sempre a da sua
nacionalidade ao tempo em que celebraram o casamento. Também o art. 62.º que trata a
sucessão por morte cristalizou o elemento “nacionalidade” usando a expressão “ao tempo
do falecimento”, conta a nacionalidade que ele tinha quando faleceu e não qualquer outra
que possa ter tido antes.
20
Ana Luísa Ribeiro
16/10/2017
Um sistema de conexão único realiza o propósito de justiça formal do DIP, uma vez que
indica a lei com a conexão mais forte ao caso.
21
Ana Luísa Ribeiro
22
Ana Luísa Ribeiro
lei pessoal dos cônjuges, mas apenas é usado este elemento no /1 se ambos tiverem
a mesma nacionalidade. Aqui só está um elemento de conexão.
Já o artigo todo será um caso de Sistema de Conexão Múltipla Subsidiária (e não
cumulativa!) pois falhando este elemento os números seguintes apresentam outros.
18/10/2017
o Subsidiária – são chamadas várias leis, mas com uma relação de hierarquia entre
elas. Só se uma falhar é que passamos à seguinte.
Art. 52.º - tem como conceito-quadro “relações entre os cônjuges” e diz que
são reguladas 1.º pela lei nacional comum dos cônjuges mas se os cônjuges
não tiverem mesma nacionalidade (falha este elemento) são reguladas 2.º a
lei da residência habitual comum e por aí fora
Art. 53.º - semelhante ao art. 52.º
o Ditributiva – o legislador chama várias leis e aplica cada uma apenas a uma certa
parte da relação jurídica.
Art. 49.º CC será o único caso no nosso CC. A (FRA) e B (PT) querem casar, a
capacidade para o casamento é determinada para A segundo a lei francesa e
para B segundo a lei portuguesa (leis pessoais).
O OBJETIVO será a realização de uma maior justiça formal – aplica a cada parte a lei
que com ela está mais conexionada. Alguém Francês conta mais com lei francesa e
alguém Português com lei portuguesa. Além disso facilita a constituição das
relações jurídicas. Imaginemos que A (espanhol de 22 anos) e B (francês de 20 anos)
querem casar. A lei espanhola diz que as pessoas se podem casar a partir dos 21
anos e a lei francesa diz a partir dos 18. Se a lei de Espanha se aplicasse a ambos os
nubentes então o casamento não poderia ocorrer pois B, francês, ainda só tem 20.
Mas com este sistema de conexão o casamento já pode ocorrer pois a A é aplicada a
lei espanhola e a B a lei francesa.
23
Ana Luísa Ribeiro
Qual a FUNÇÃO das Regras de Conflito? Tais regras podem ser bilaterais ou unilaterais, e
consoante isso irão ter diferentes funções:
1. Regras BILATERAIS escolhem qual a lei aplicável! Determinam a lei aplicável ao caso, que tanto
poderá ser a lei do foro como lei estrangeira. É o exemplo do art. 52.º cujo elemento de conexão
no /1 é único (lei nacional dos nubentes) mas é bilateral pois tanto pode mandar aplicar lei do
foro (se nubentes forem PT) como lei estrangeira (nubentes são alemães).
2. Há autores que defendem as regras de conflito nunca deviam ser bilaterais. Surgem as regras
UNILATERAIS que dizem quando é que a lei do foro é ou não aplicável, mas nos casos em que
não é aplicável a do foro também não dizem qual será! Podem ser:
a. Introversas – delimitam os casos em que se aplica a lei do foro, indicando apenas aqueles
em que ela se vai aplicar.
Em vez de escolher como as bilaterais fazem vai dizer apenas os casos em que se aplica a
do foro. Ex: “a capacidade das pessoas que tenham nacionalidade portuguesa é regulada
pela lei portuguesa”. Diz apenas que a lei do foro (PT) se aplica se estivermos perante
alguém português. Agora, se for alguém brasileiro NÃO aplicamos a lei do foro. Então
qual aplicamos? A regra unilateral não diz! Apenas nos informa de que não é a
portuguesa/do foro. Atenção, que uma regra unilateral continua a admitir aplicação de
lei estrangeira, não confundir! Apenas não nos diz que lei é essa (as bilaterais dizem).
b. Extroversas – fazem o mesmo só que para a lei estrangeira. Não dizem qual lei, apenas
indicam que em certos casos determinados é aplicada lei que não a do foro.
Entendimento de AGO quanto às regras de conflito unilaterais extroversas → à partida
aplica-se a lei do foro aos casos, quando não for assim a regra de conflitos indicará os
casos excecionais em que se aplicará a lei estrangeira. Seria algo do género “às pessoas
estrangeiras aplica-se a lei da sua nacionalidade”, “aos casamentos celebrados no
estrangeiro aplica-se a lei do local onde o casamento foi celebrado. Com este método de
Ago sabemos quando aplicar a lei estrangeira (ex: quando A e B se casam em Espanha
aplicamos a lei espanhola), mas também quando aplicar a do foro (ex: se casarem em
Portugal aplicamos a lei portuguesa). Ou seja, no fundo escolhe a lei aplicável, neste
esquema que Ago defende, acaba a fazer o mesmo que uma regra bilateral!
→ Que sistema devemos escolher? As regras que compõem o método tradicional de Savigny são
BILATERAIS, mas há quem defendem que devemos apenas utilizar regras UNILATERAIS
INTROVERSAS:
Por questões de SOBERANIA ESTADUAL, séc. XIX – cada Estado não tem o poder para
mandar aplicar a lei estrangeira, apenas tem poder para mandar aplicar a sua própria lei.
24
Ana Luísa Ribeiro
Sucede que escolher a lei aplicável ao caso (estrangeira ou não) ainda é exercer uma
soberania própria (e não imiscuir-se em soberania estadual alheia!). Se mandar aplicar a lei
estrangeira fosse exercer soberania estrangeira, então nunca se poderia mandar aplicá-la.
Sucede que sistemas unilaterais, embora não escolhendo diretamente lei estrangeira como
aplicável, admitem a sua aplicação!
QUADRI – desenvolveu uma conceção que defende que um sistema de regras UNILATERAIS
consegue uma melhor estabilidade das relações internacionais e reconhecimento dos
direitos adquiridos. Vejamos um exemplo:
o A é Brasileiro (BR) e reside em Portugal (PT) e quer constituir uma sociedade com
sede na Austrália.
O notário em PT precisa de uma regra de conflitos pois está perante uma
relação plurilocalizada (contacto com mais de um ordenamento jurídico). A
capacidade de A para constituir a sociedade é regulada pela lei pessoal dele,
logo o notário vai aplicar lei brasileira.
No BR a lei reguladora da capacidade de A para constituir a sociedade é a da
residência. Logo o notário lá aplica a lei portuguesa. A lei do Brasil não se
considera competente para se aplicar a ela própria.
Em PT escolhíamos a lei brasileira e no BR a lei brasileira escolhe a
portuguesa. Se A tivesse celebrado o negócio no Brasil seria lá válido
(aplicada a lei PT, da sua residência). No entanto em Portugal o negócio seria
inválido, pois para nós deveria ter sido aplicada a lei brasileira e não a
portuguesa!
QUADRI entende que são as regras bilaterais que causam estas situações.
Assim, o art. 25.º CC deveria estar formulado da seguinte forma: “a quem tiver
nacionalidade portuguesa aplica-se a lei portuguesa”. Quem não for português não lhe é
aplicada a lei portuguesa, mas o artigo também não diz qual será.
QUADRI diz que “a aplicação de uma lei depende da sua vontade de aplicação”.
Quer isto dizer que:
o Em primeiro vamos ver se a regra de conflitos do foro manda aplicar/tem vontade
de aplicar a lei do foro ao caso. No nosso exemplo não tem (remeteu para a lei
brasileira).
o Devemos aplicar a lei que tem vontade de se aplicar. Qual será? Temos de ver na
regra de conflitos estrangeira se ela também terá ou não vontade de aplicação. No
exemplo seria:
Brasil diz que “à capacidade das pessoas residentes no Brasil aplica-se a lei
Brasileira”
25
Ana Luísa Ribeiro
Austrália diz que “a capacidade é regida pela lei Australiana quando a sede
está na Austrália”
Assim, a lei PT não se quer aplicar (remeteu para outra pois A é brasileiro –
BR). A lei do Brasil também não (remeteu para PT pois A é lá residente). A lei
Australiana quer ser aplicada (pois a sede da p.c. é lá)! O notário português
deve então aplicar a lei da Austrália.
o Será uma solução uniforme? Foi aplicada a lei que tinha vontade de ser aplicada
(que remeteu para ela mesma). Conseguiu-se a harmonia jurídica internacional e o
reconhecimento de direitos adquiridos no estrangeiro, o negócio será válido em
todos ordenamentos jurídicos com os quais teve contacto (BR, PT, AUS).
o Em segundo devemos aplicar a lei que tem vontade de se aplicar. No nosso exemplo
fizemos isto, aplicamos lei AUS, e ela tinha vontade de se aplicar. Fizemos esta
aplicação através de um sistema unilateral, pois não fomos nós a escolher em
específico a lei AUS, foi ela que tinha vontade de se aplicar e se escolheu a ela
própria! Concretizamos assim o método [a frase] de Quadri para a aplicação das leis.
23/10/2017
Os sistemas bilaterais por vezes escolhem leis que não têm vontade de aplicação, mas os unilaterais
podem ter várias leis com essa vontade. É preferível um sistema bilateral, embora tenha de ser
corrigido.
• Tese Intermédia de Autolimitação Espacial das Regras de Conflito – FRANCESCAKIS – não tem
aplicação em nenhum país!
26
Ana Luísa Ribeiro
É sensível à argumentação unilateral, mas vê insuficiências nela. Diz que o campo de aplicação das
regras de conflito do foro não deve ser ilimitada, nem se devem aplicar a todos os casos! Não deve
ser suficiente o facto de o problema de colocar no nosso país para que apliquemos as nossas regras
de conflito (é isto que o sistema bilateral faz). Temos de separar 2 tipos de situações:
Há algum contacto com o foro (nacionalidade dos envolvidos, etc) – o foro tem então a
possibilidade de aplicação das suas regras de conflito. Serão bilaterais e escolherão x lei.
Não há nenhum contacto com o foro, exceto ser o local onde a questão está a ser julgada –
aqui o foro não tem legitimidade para aplicar as suas regras de conflito, não podemos ser
nós a escolher a lei aplicável ao caso. O juiz deve aplicar a lei que tiver sido aplicada no
estrangeiro. Este caminho é mais próximo do sistema unilateral.
Ex: em Portugal ajuizamos da validade de um casamento entre A (PT) e B (ESP), que residem em
Espanha. De acordo com Francescakis vamos um caminho bilateral. Há um contacto do caso com o
foro – A é português – logo podemos usar as nossas regras de conflito, decidir a lei aplicável. Sem
ligação a Portugal não podemos aplicar a nossa lei, temos de aplicar a lei que tiver sido aplicada no
estrangeiro, quando A e B se casaram. PORQUÊ? Isto favorece a validade das relações jurídicas e,
portanto, reconhecimento de situações constituídas no estrangeiro, o reconhecimento de direitos
adquiridos.
CRÍTICAS:
1. Seguindo esta tese, o legislador não se interessa por todas as situações, tem apenas interesse
em vigiar situações que já têm contacto com o foro. Vendo isto, então seria melhor um sistema
unilateral (que basicamente faz isto, tem interesse em dizer apenas quando é a lei do foro a
competente). O interesse do legislador de DIP é resolver conflitos (qualquer que seja) e não
apenas vigiar situações próximas do foro. Francescakis vê a regra de conflitos de forma errada.
2. Também não é certo que o legislador só tenha interesse em escolher lei + próxima ao caso
quando a situação tem uma ligação a Portugal! Mesmo sem contacto com o foro o legislador
tem sempre interesse em tratar os indivíduos privados, aplicando a lei com que têm maior
contacto.
3. Não se faz qualquer controlo da lei aplicável quando estrangeira. Será justo aceitar isto apenas
assim? Até o sistema unilateral faz algum controlo, quando se refere à “vontade de aplicação da
lei”.
27
Ana Luísa Ribeiro
Ex: A casa com B em 1965 (casamento ainda ocorrido na vigência do antigo código civil/de
Seabra). Hoje (2017) qual a lei aplicável às relações entre os cônjuges? Será o art. 52.º CC atual?
ZITELMANN entendia que as regras de conflito são iguais às outras, logo a sucessão de regras no
tempo é tratada como a comum sucessão de normas. A lei nova vale, em princípio, só para o
futuro e a lei velha para o passado. No caso acima, o que conta é a data do casamento, e
portanto aplica-se-lhe a norma vigente nesse momento. Ou seja, o casamento entre A e B é
regulado ainda pelo Código de Seabra.
KAHN (seguido por Ferrer Correia e Baptista Machado) entende que as regras de conflito não
são iguais às outras, são normas de segundo grau, normas sobre normas. Têm um juízo de
proximidade e não um juízo material! Se a regra de conflito não dá uma concreta solução ao
caso não há obstáculo a que se uso o juízo de proximidade mais moderno. Deve então aplicar-se
a nova regra de conflitos, não violando isto o Princípio da Não-Retroatividade.
Como se sabe se havia expectativa? FERRER Não havia ligação ao foro, as partes não
dá-nos um critério: viram a regra de conflitos nem a lei
o Se no momento da constituição da aplicável e, por isso, não tinham qualquer
relação jurídica em causa havia um expectativa na sua aplicação.
contacto com o foro, podemos presumir
28
Ana Luísa Ribeiro
→ A (BR) casa com B (BR) em 1960, no Brasil. Hoje devemos aplicar a nova regra de conflitos, a
não ser que as partes tenham expectativa na aplicação da antiga regra. A e B no momento do
seu casamento não tinham qualquer ligação com o foro (PT), logo presume-se que não tinham
expectativa. Aplicamos o art. 52.º CC novo.
Se B fosse português já havia contacto com o foro e uma possível expectativa e, por isso, ter-
se-ia de aplicar a antiga regra de conflitos, do código de Seabra.
25/10/2017
2. Alteração das normas da lei competente (a lei indicada pelas regras de conflito muda)
A regra de conflitos permanece a mesma, são as próprias normas materiais da lei indicada como
competente que mudam! Ex: art. 52.º CC regula as relações entre os cônjuges. A e B casaram em
2000, e em 2017 querem saber a situação dos seus bens. O artigo tem vários elementos de
conexão: nacionalidade comum, residência comum, etc. A e B são ambos franceses, logo a nossa
regra de conflitos manda aplicar a lei francesa. Sucede que a lei francesa alterou-se, qual
devemos aplicar? A lei francesa antiga ou a nova? Temos de ver a solução no direito
transitório/intertemporal francês (como regula a lei francesa a sua própria sucessão de
normas?). Este problema já não é de DIP, mas sim da própria lei competente (FR). O DIP já fez a
sua parte, já indicou uma lei competente para resolver o caso (FR).
3. Conflito móvel/Sucessão de estatutos (r.c. indicava lei x e passou a indicar lei y porque mudou a
concretização do elemento de conexão, p.ex. nacionalidade de alguém)
Devemos olhar à concretização do elemento de conexão antiga ou à nova? Este é desde logo um
problema unicamente surgido quando os elementos de conexão em causa são móveis
(nacionalidade, residência...), nunca para os imóveis (situação de uma casa). Mesmo nos e.c.
móveis pode não surgir este problema, se ele for cristalizado/imobilizado pelo legislador (“ao
tempo da morte”; “no momento da celebração”...).
Este problema não é de sucessão de leis no tempo, mas sim de sucessão no espaço, há uma
deslocalização/movimentação da relação jurídica. Não houve nenhuma norma a mudar, mas sim
o elemento de conexão tem agora uma diferente concretização. Como resolver então?
A e B eram espanhóis quando casaram, em 2006. Hoje (2017) são franceses e estão em
litígio quanto aos bens do casal em Portugal, o que nos remete para a aplicação do art.
52.º CC. O elemento de conexão lá presente (lei nacional comum) é móvel e não está
cristalizado. Então temos um problema, havendo 4 propostas de solução (podendo nós
seguir qualquer uma, desde que fundamentada!):
29
Ana Luísa Ribeiro
30
Ana Luísa Ribeiro
Ex: art. 49.º CC tem como conceito-quadro “capacidade para contrair casamento
e celebrar convenção antenupcial”. Imaginemos que A (brasileiro) casou com B
(portuguesa) no Brasil. Hoje, ambos têm nacionalidade portuguesa e estão agora
em Portugal. Este artigo tem um sistema de conexão múltipla distributiva (aplica x
lei a uma parte e lei y à outra). Se analisarmos a validade do casamento devemos
aplicar a lei antiga indicada pela regra de conflito, ou seja aplicamos a A a lei
brasileira e a B a lei portuguesa. Já se estivermos a analisar a lei reguladora do seu
matrimónio hoje devemos aplicar a lei nova (portuguesa a ambos).
REVOLUÇÃO AMERICANA
Ocorreu nos Estados Unidos e foi uma reação contra o método usado na Europa – o
conflitual/clássico/Savigniano, que utiliza as regras de conflito. Teve 3 momentos revolucionários:
A. Revolução JURISPRUDENCIAL/Tribunais
O caso Babcock vs. Jackson foi muito famoso. J comprou um carro novo e foi experimentá-lo
com B para o Canadá (CAN), tendo lá um acidente rodoviário. B teve danos e intentou uma ação
contra J em Nova Iorque (USA). Temos então dois americanos de Nova Iorque (B e J), que
tiveram um acidente no Canadá e uma ação intentada nos EUA. Temos então duas ordens
jurídicas conflituantes (americana e canadense), pelo que temos conflito de leis.
A regra de Nova Iorque indica que J (condutor) tem obrigação de indemnizar B dos danos
causados. A regra do Canadá está numa legislação especial para fundamentar as boleias dadas,
dizendo que passageiros transportados a título gratuito (como B) não têm direito a
indemnização.
No nosso direito português temos uma regra de conflito – art. 45.º - que nos diz que em casos
de responsabilidade extracontratual (como é o caso) esta é regulada pela lei do Estado onde
ocorreu o principal facto causador do prejuízo. Isto sendo julgado em PT ia ter aplicada a lei do
Canadá (onde foi o acidente) que nos diz que não há indemnização.
31
Ana Luísa Ribeiro
O juiz no caso B vs. J pensou que seria injusto B não ter indemnização pelos danos que sofreu.
Entendeu que não há ligação efetiva ao Canadá, eles apenas lá foram passear, em concreto a lei
canadiana não é a mais próxima, as partes nem conhecem a lei de lá. Além disso a política
legislativa subjacente à lei do Canadá é destinada a canadianos e não aos indivíduos americanos
em questão. Resumindo: em abstrato a lei do Canadá era a mais próxima, mas em concreto não;
a lei de fomento só se aplica aos canadianos. A regra de conflitos que determina a aplicação da
lei canadiana é cega, não olha ao caso em concreto. O juiz americano recusou então a aplicação
da regra de conflitos que indicava como competente a lei canadiana, gerando um descrédito nas
regras de conflito.
B. Revolução DOUTRINAL/Doutrina
Deu razão aos juízes e propôs outras soluções, havendo 3 propostas mais famosas:
a. CAVERS
Entende que as regras de conflito não servem pois escolhem leis (ordenamentos jurídicos) e
não é isso que devem fazer! Devem sim escolher normas. No caso B vs. J temos em confronto
os ordenamentos EUA e CAN e a regra de conflitos escolheu a lei mais próxima (CAN). Mas,
não olhou especificamente para a norma da Responsabilidade Civil Extracontratual, não olhou
ao resultado dessa escolha, se iria resultar numa indemnização ou não.
Qual deve ser então o critério orientador da escolha das normas? Para Cavers é um critério de
justiça material, de um resultado mais justo. Mas... isto suscita problemas:
i. O juiz americano vai achar mais justa a sua lei (americana), um juiz canadiano ia achar o
mesmo mas em relação à lei canadiana. Ou seja, a lei “mais justa” vai variar consoante
o juiz que resolve o caso. Isto vai gerar desarmonia jurídica internacional.
ii. Este método tem subjacente um casuísmo insuportável! Há uma imprevisibilidade,
insegurança jurídica pois não há possibilidade de previsão de qual lei será a escolhida
pelo juiz.
Cavers criou então uma correção a este seu método, mas mantendo a matriz da solução mais
justa → contra-revolução, uma segunda fase, em que lança um segundo livro. O legislador
deve então criar pontos de preferência: orientações para os juízes conseguirem optar pela
solução mais justa, sendo que todas as áreas terão um ponto de preferência.
No caso, para a RCEC este ponto deve ser: ao escolher a lei mais justa, o juiz tem de escolher
a lei do local onde ocorreu o facto lesivo e a lei de onde se produziu o dano ou a lei que tenha
a indemnização maior (a menos que o lesante e o lesado tenham a mesma nacionalidade ou a
32
Ana Luísa Ribeiro
b. CURRIE
As regras de conflito não servem porque desconsideram a política legislativa por detrás das
leis envolvidas. No nosso caso, a lei canadiana tinha uma política legislativa para fundamentar
as boleias na sociedade canadiana. Propõe então um método alternativo: Governmental
Interests Analysis (análise da política legislativa). Perante uma situação internacional o que
temos de fazer é perceber qual o Estado que quer mais aplicar as suas regras, que tem um
interesse governamental nisso. Como sabemos isto? Olhando para a política legislativa.
No caso, entre a lei americana e a canadiana, qual quer aplicar as suas normas? O que levou
cada um dos estados a fazer estas normas?
i. Canadá: há interesse em aplicar a lei a B e J? Não, a norma é para aplicar aos
canadianos.
ii. N.Y.: tem todo o interesse em aplicar a norma, a nacionalidade e a residência de B e J é
de lá.
Escolhemos então a lei cujo estado tem mais interesse legislativo-político em aplicar.
30/10/2017
1
Assim, o litígio está conectado com a L1 e L2. O juiz deve determinar quais as normas das
duas leis em contacto que iriam resolver o caso. Vê isto como um conflito de normas e não
2
um conflito de leis! Depois tem de procurar a política legislativa por detrás de cada uma
das normas.
33
Ana Luísa Ribeiro
iii. A norma do Canadá não concede indemnização, a política por detrás disto está em
fomentar o transporte coletivo, através de boleias, no Canadá. Havendo indemnização
as pessoas teriam “medo” de dar boleia pois poderiam ter de pagar.
iv. A norma dos EUA tem em vista proteger os passageiros nova-iorquinos em caso de
acidente quando estão a ir de boleia, concedendo indemnização.
3
Por fim, o juiz tem de ver qual o Estado que tem interesse político-legislativo em aplicar
as suas normas e regular o caso concreto. O interesse do Canadá é fomentar as boleias no
Canadá, este interesse não é realizado com a aplicação das normas canadenses, pois B e J
não viviam no Canadá, nem são Canadianos. A ligação de ambos é com Nova Iorque, e esta,
ao aplicar as suas normas, já irá realizar o interesse por detrás delas (proteger os nova-
iorquinos que andam à boleia). Logo, deve ser a NORMA DE NOVA IORQUE A APLICAR-SE. B
irá receber indemnização de J.
Mas... pode acontecer que os dois ou mais Estados tenham interesse em aplicar as suas
normas, e realizar o interesse político-legislativo que as funda; ou até que nenhum estado
tenha esse interesse.
CRÍTICA a este método prende-se com a aplicação da lei do foro sempre que se depara com
um problema! Isto vai causar desarmonia jurídica internacional, pois consoante o lugar
onde se coloca a questão variam as soluções. Também leva a que possa ocorrer fórum
shopping (compra de foro), em que as pessoas colocam as ações em certos locais, consoante
o fim que pretendem.
↓
O método de Currie bloqueia nestes casos. De resto ↓
Pode haver casos em que nem sequer é possível determinar a política legislativa por
detrás da norma e seu âmbito de aplicação. Ex: impedimento de casamento entre
irmãos.
34
Ana Luísa Ribeiro
Ex: temos uma COMPRA E VENDA em que o Sistema 1 exige escritura pública para a
validade do negócio e o Sistema 2 plasma a liberdade de forma (não exige nada).
1.º o juiz irá determinar quais as normas aplicáveis dentro de cada sistema; 2.º irá
determinar a política legislativa por detrás de cada norma aplicável e 3.º aplicar as normas
cujo Estado tem mais interesse político-legislativo na sua aplicação.
c. EHRENZWEIG
Enquanto os autores anteriores recusam liminarmente regras de conflito este autor não é tão
radical, dizendo que temos de dividir entre duas situações:
a. Lex Certa – não há dúvida da lei a aplicar
i. Casos forum law by non choice – é o caso das normas processuais; normas de
aplicação necessária e imediata
35
Ana Luísa Ribeiro
b. Lex Incerta – em casos em que há dúvidas da lei a aplicar não deve haver regras de
conflitos. Propõe um novo método em que o juiz faz uma dupla operação:
i. Se fosse uma situação puramente interna, qual a norma do foro que se
aplicaria ao caso? Faz isto para determinar a política legislativa do foro.
ii. Caso é conectado com várias leis, juiz deve escolher as normas da lei que
melhor realizar a política legislativa do foro.
6/11/2017
Aplica então a norma estrangeira que melhor realizar a política legislativa do foro. Este
método é CRITICÁVEL:
Nem sempre se consegue determinar a política legislativa
De um ponto de vista metodológico não faz sentido ir buscar o objetivo da norma à
lei portuguesa e as consequências à francesa. Estamos a separar a ratio da norma do
seu conteúdo!
No fundo este método vê o DIP como “política legislativa”, olha aos interesses do
Estado e não aos interesses das partes e objetivos do DIP
a. Primeiro capítulo tem princípios orientadores do juiz na escolha da lei aplicável e esses
princípios é que serão relevantes.
i. Juiz tem de escolher a lei aplicável tendo em conta os interesses político-legislativos das
normas aplicáveis (Currie).
ii. Realizado o interesse político-legislativo o juiz deve escolher a norma aplicável tendo em
atenção os interesses das partes (Cavers).
iii. Realizados os interesses anteriores deve escolher-se a norma que melhor realiza o
comércio jurídico/constituição de relações (que é um interesse de DIP).
Já o MÉTODO JURISDICIONAL entende que devemos resolver qual a lei aplicável + o tribunal
competente de uma só vez. Devíamos escolher criteriosamente o tribunal competente/mais
próximo ao caso. Aplicando-se depois a lei do foro, do país desse tribunal competente. Ex: pessoas
não residentes em Inglaterra que lá proponham ação de divórcio não a verão dar entrada pois a
regras de conflitos inglesa não deixa.
Vantagens: apenas aplica a lei do foro, que é a lei que o juiz melhor conhece. Isto reduz o risco de
erro judiciário, de sentenças mal dadas.
Desvantagens:
O método só funciona bem se os países combinarem entre eles os critérios de conexão. Pode
acontecer que ou nenhum tribunal se considere competente para julgar, ou então que vários se
considerem competentes. Isto causará desarmonia jurídica internacional.
37
Ana Luísa Ribeiro
8/11/2017
Por tudo isto na Europa continuamos a ter como método base o método conflitual, apesar dos
métodos propostos pelos autores americanos não serem uma verdadeira alternativa têm alguma
razão nas críticas que fazem:
1. A regra de conflitos é cega – como se viu pelo caso Babcock e Jackson. Há uma grande rigidez
do método conflitual.
2. Cavers defende que o juiz deve escolher a lei que reconduza ao resultado mais justo - o
método conflitual não olha à justiça material, é exclusivamente formal, podendo não oferecer
a solução mais justa (materialmente).
3. Currie diz que não se deve utilizar a regra de conflitos pois não leva em conta a política
legislativa.
4. O método conflitual tem uma série de defeitos que o método jurisdicional não tem: o método
Savigniano redunda muitas vezes na aplicação de lei estrangeira, que o juiz não conhece tão
bem, logo há maior risco de erro judiciário.
O DIP conflitual de hoje é muito diferente daquele do tempo de Savigny, as propostas norte-
americanas trouxeram alguma modificação ao método conflitual. Tivemos 4 fatores de
aproximação do método conflitual às propostas dos autores norte-americanos:
Cláusulas de exceção: cria uma exceção à regra de conflitos. Coloca-se um inciso (parte de uma
lei com sentido complementar ou independente dela) na regra de conflitos que vai permitir ao
julgador afastar o juízo subjacente à regra de conflitos. Regras de conflitos mais modernas
possuem estas cláusulas, que podem ser classificadas de várias formas:
o Abertas - o juiz afasta lei indicada pela regra e escolhe ele a lei alternativa. São as mais
flexíveis, dão mais discricionariedade ao julgador.
o Fechadas - cláusula de exceção afasta a lei indicada pela regra, mas dá ela mesma a lei
alternativa.
o Materiais - legislador cria estas cláusulas por razões materiais, permite ao juiz afastar a
lei aplicável e escolher a lei que conduz à solução mais justa.
38
Ana Luísa Ribeiro
o Formais - o legislador cria estas cláusulas por razões de justiça formal - para o juiz
afastar a que era aplicada e escolher a lei mais próxima.
Exs: art. 45º/2 CC é exceção ao /1 - cláusula de exceção material (permitir que
haja indemnização) e fechada (regra diz logo qual a lei aplicável).
"O contrato é regulado pela lei do local da celebração, salvo se houver uma lei
mais próxima das partes "- cláusula de exceção aberta e formal
o Gerais - aplicam-se a todas as regras de conflitos (em Portugal não temos, a Suíça tem)
Especialização ou Dépeçage: Savigny dizia que devíamos escolher uma lei para cada relação
jurídica, e com isso as regras de conflitos ficaram muito rígidas pois aplicam-se a todos os
aspetos da relação jurídica. Agora, as regras de conflitos apenas se aplicam a determinado(s)
aspeto(s) da relação jurídica.
2. Materialização: hoje o DIP quando escolhe a lei aplicável não o faz só por critérios de
proximidade, mas também por justiça material/atenção ao resultado material - caso do sistema
de conexão múltipla alternativa que escolhe a lei tendo em conta o resultado. Ex: art. 65º CC –
tenta ao máximo que o testamento seja tido como válido.
Por força da materialização, hoje distinguimos regras de conflitos com conexão material
(escolhem a lei aplicável por atenção ao resultado material) e regras de conflitos com conexão
puramente localizadora (escolhem a lei aplicável por atenção ao critério de proximidade). Exs:
Art. 50º - regra de conflitos com conexão material, dado que o legislador escolheu a lei
porque é a forma de conseguir a validade do casamento
39
Ana Luísa Ribeiro
3. Politização: hoje o DIP quando escolhe a lei aplicável leva em conta as políticas legislativas por
detrás das leis (contributo de Currie). Temos atualmente um DIP onde se vê um pluralismo
metodológico, existem outras normas e não só regras de conflitos.
a. Surgiu um novo corpo de normas que vigora ao lado das regras de conflito e leva em conta as
políticas legislativas - as normas espacialmente autolimitadas que são normas materiais pois
prescrevem certos comportamentos e vão determinar o seu próprio âmbito de aplicação.
Estas subdividem-se em 2 categorias:
ii. Normas de aplicação necessária e imediata: são normas materiais mas que se vão
aplicar mais vezes do que aquelas em que a lei a que pertencem não seja a lei
competente. Basicamente a lei portuguesa não vai ser a competente, mas a norma
aplica-se na mesma.
Ex: 1682º-A/2 o legislador queria proteger a casa de morada de família das pessoas que
residem em Portugal - mesmo que a regra de conflitos não mande aplicar a lei
portuguesa ela tem aplicação necessária e é imediata dado que vamos aplicar antes de
ver qual é a lei competente.
40
Ana Luísa Ribeiro
WENGLER (alemão) diz que o DIP cria um carro com “peças” diferentes e pode acontecer que
as normas diferentes sejam incompatíveis e gerem antinomias. Até surgir este movimento o
juiz nada fazia perante os acidentes técnicos, mas hoje, com o instituto da adaptação, pode
modificar o sistema. BAPTISTA MACHADO diz que a adaptação é o instituto mais difícil e
perigoso do DIP na medida em que dá um "cheque em branco" ao juiz. O juiz pode modificar
o sistema tendo em conta 2 teses:
i. Modificação das regras de conflitos para atingir um resultado querido pelas leis. A
adaptação é um mecanismo de politização pois o juiz vai modificar o sistema para
respeitar a política legislativa.
13/11/2017
As influências da revolução americana no direito europeu passam por uma flexibilização (atribui
mais poderes ao juiz); materialização (o critério de escolha da lei aplicável deixa de ser apenas a
proximidade da lei ao caso e passado a ter também em conta o resultado).
Existem porque espelham interesses político-legislativos muito importantes. De tal forma que o
legislador entende aplica-las mesmo a casos em que a sua lei não é competente.
São uma consagração da proposta de Currie uma vez que levam em conta a política
legislativa.
41
Ana Luísa Ribeiro
Ex: A (PT) foi despedido sem justa causa na Arábia Saudita e intentou uma ação num tribunal em
Portugal. Ele NÃO podia ser assim despedido!
O juiz aplica as normas de aplicação necessária e imediata do foro e aplica normas deste tipo, só
que estrangeiras, desde que sejam de uma certa lei, a lei que tiver sido indicada pela regra de
conflitos como competente. No caso do despedimento aplicaria a lei portuguesa (art. 53.º CRP) -
nas suas normas de aplicação necessária e imediata - pois o trabalhador era português e há um
interesse político-legislativo a realizar. E a lei da Arábia saudita – neste mesmo tipo de normas e
outras - pois é a lei indicada como competente de acordo com a regra de conflitos.
Juiz deve aplicar as normas do foro, da lei competente e ainda as de alguma lei que tenha uma
conexão especial/importante para o caso. Assim a aplicação seria nos termos acima (PT + AS) e
ainda a aplicação de normas deste tipo na lei angolana pois era o local de trabalho do português
despedido. Porque devemos também aplicar a lei angolana?
Se a ação fosse posta em Angola as suas normas de aplicação necessária e imediata (NANI) seriam
certamente aplicadas. Se não as levarmos em conta também pode ocorrer desarmonia jurídica
internacional (as decisões serão diferentes consoante o local onde se colocar o problema).
Se virmos bem, o próprio estado estrangeiro é que determina a aplicação das suas NANI. Há quem
critique isto, a lei de certo estado não é competente, mas está a aplicar-se na mesma! Surgem
então variantes:
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Ana Luísa Ribeiro
MARQUES DOS SANTOS – só se aplicam NANI estrangeiras quando o DIP do foro tem uma
autorização imediata para a sua aplicação. Ocorre no Reg. Roma I, art. 9.º
Não se aplicam as normas estrangeiras, mas juiz não se pode esquecer que elas existem.
o A (PT) faz um contrato e a ação relativa ao contrato é colocada em PT (foro). A regra de
conflitos diz que a lei ESP é a competente para julgar o caso. A execução do contrato, no
entanto, seria em FRA, local que proíbe um contrato daquele tipo, lá seria nulo. Quid
iuris?
o A conexão especial aplica TODAS as leis. A 2ª variante desta tese aplica a lei espanhola
(uma vez que é a competente) mas não se pode esquecer da norma francesa que proíbe
o contrato! Pode o juiz p.ex. atenuar ou excluir a culpa (pressuposto da responsabilidade
contratual junto com a violação do contrato e o nexo de causalidade) pois uma norma
francesa (não aplicada, mas também não esquecida) invalida o contrato todo.
15/11/2017
DIP MATERIAL - não utiliza regras de conflito e pode ser usado como alternativa. Em vez de
escolher lei aplicável às situações internacionais o ideal era ter só normas substantivas/materiais,
tanto para situações internas como para as internacionais. Haveria como que uma dupla
normatividade (um código civil para situações internas e outro para internacionais). A sua razão de
ser parte do pressuposto de que as situações internacionais têm especificidades logo as normas
internacionais seriam criadas pensando logo nisto. Era algo semelhante aos ius romanum, em que
havia um direito para os cidadãos de Roma e outro para as restantes pessoas.
Tem a vantagem de levar em conta as especificidades das situações internacionais. No entanto tem
2 grandes desvantagens:
As tais especificidades nem sempre se verificam e não são assim tão peculiares
Mesmo assim, não conseguimos abdicar de regras de conflito, mesmo tendo “2 códigos”
pois isto ocorreria em todos os países e não sabíamos qual aplicar. Se cada país aplica-se o
seu “código civil internacional” isso poderia levar na mesma a desarmonia jurídica
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Ana Luísa Ribeiro
internacional, o que nos levava a precisar de novo das regras de conflito! No fundo não é
um método alternativo.
Nos tempos mais recentes a Checoslováquia (atuais República Checa e Eslováquia) teve este
método quanto ao Direito Comercial e hoje em dia alguns países talvez ainda tenham este método.
Embora não sirva como método alternativo pode servir como auxiliar. Chama a atenção para
especificidades das relações internacionais, é possível que um C.C. tenha disposições particulares
(ex: 2223.º CC PT) para situações internacionais.
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Ana Luísa Ribeiro
O conceito-quadro gera uma especificidade/dificuldade, uma vez que há muitos conceitos que não
são iguais no mundo inteiro (ex: liberdade religiosa), daí a dificuldade de saber se está ou não
preenchido nos casos em análise. Ademais, o OBJETO do conceito-quadro são NORMAS JURÍDICAS,
ex: art. 50.º CC → conceito-quadro é “forma do casamento”, serão as normas referentes à forma
do casamento, mas...temos de saber exatamente que normas são essas. O que são normas sobre
forma do casamento?
Ex: A, Argentino, e lá residente morreu. Deixou os bens a B, Português e cá residente, que é casado
com C, portuguesa e aqui residente. B e C são casados em comunhão de adquiridos. Sendo que A
deixou uma casa a B, de quem será a casa? Só de B? De B e de C? Quid Iuris?
A lei ARG diz que havendo uma disposição testamentária a favor de alguém casado o bem
comunica-se ao cônjuge, logo o bem será dos 2, de B e de C. Isto é regulado pelo direito das
sucessões argentino.
A lei PT, no art. 1722.º/b) diz que o bem é só de B, pois é um bem próprio. Isto é regulado
no regime de bens.
PROBLEMA → que normas vamos aplicar então, a Argentina que atribui o bem a ambos ou a
Portuguesa que só atribui a B? Será isto um problema de sucessões (ARG) ou regime de bens (PT)?
A lei escolhida terá de depender do tipo de problema que se entende estar em causa. Qual será a
regra de conflitos a usar, uma relativa a sucessão (art. 62.º - que manda aplicar a lei ARG) ou a
regime de bens (art.53.º - que manda aplicar a lei PT)?
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Ana Luísa Ribeiro
VANTAGENS:
É simples
No fundo aplicamos uma só lei, o que não leva a conflitos entre leis
O foro controlou a escolha da lei aplicável, conservou uma autoridade conflitual
DESVANTAGENS:
Na modalidade de Robson (chamamento circunscrito) há um problema. Exemplifiquemos:
A é Inglês e reside em Inglaterra. Não tem ninguém que herde os seus bens, e morre,
deixando um prédio em Portugal. A lei PT tem normas de sucessões que ditam que em
caso de não haver ninguém para herdar os bens é o Estado o herdeiro – art. 2133.º/1/e).
Trata esta questão como um problema de sucessões, usamos então a r.c. do art. 62.º CC
que manda aplicar a lei Inglesa (está feita a qualificação primária, sabemos já qual a lei
competente). No entanto a lei Inglesa tem uma norma que diz que em casos deste surge, a
favor da Coroa, um direito real de aquisição sobre os bens, ou seja, trata como um
problema de direitos reais.
Neste esquema que Robson defende ao só chamar normas relativas ao conceito-quadro
pode acontecer que na lei tida como competente (inglesa) não existam esse tipo de
normas (relativas às sucessões, na circunstância descrita), pois o problema é tido como de
direitos reais. Ao suceder este impasse Robson diz então que em casos assim se chama
todo o ordenamento da lei competente (todo o o.j. inglês), o que vai dar ao mesmo que
Ago defende!
CRÍTICAS:
Este tipo de qualificação viola um princípio fundamental de DIP, o da paridade de
tratamento das ordens jurídicas, pois trata melhor a lei do foro do que outras (é a lei do
foro que escolhe que tipo de problema está em causa, que escolhe a lei competente, etc;
ao fazer isto desconsidera assim o juízo do problema feito por outras ordens).
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Ana Luísa Ribeiro
Gera desarmonia jurídica internacional. Cada sistema apreciará o mesmo caso de formas
diferentes. Mesmo que as regras de conflito sejam iguais o entendimento que cada
sistema faz dos conceitos-quadro é diferente, o que leva a que sejam mobilizadas
diferentes regras de conflito.
A qualificação primária acaba por ser desnecessária uma vez que as regras de conflito em
si já indicam a lei competente.
Rejeitamos a qualificação lege fori! O nosso artigo 15.º CC consagra expressamente outra.
No entanto países como FRANÇA utilizam este sistema de qualificação.
CRÍTICAS:
Cria um ciclo vicioso! Queremos saber a lei competente pois é ela que vai classificar o
conceito-quadro. Que nos vai dizer que assunto está em causa. No entanto esta lei
“competente e classificadora” já está baseada numa lei tida como competente. Estamos a
perguntar à lei ING: quando estamos perante um caso sucessório? É isto um caso
sucessório? Mas... para a lei ING entrar “em jogo” é porque já foi indicada pela regra de
conflitos do art. 62.º, que é uma regra portuguesa de sucessões. Daí ser um ciclo vicioso.
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Ana Luísa Ribeiro
Há perda de controlo sobre juízos conflituais. O legislador escolhe a lei aplicável ao caso,
segundo noções de certos institutos à luz das suas conceções. Mas, vai perder o controlo
daquilo para que criou a lei. Se a lei aplicável é de uma conceção diferente, se entende o
conceito “divórcio” como diferente do nosso então este conceito passa a ser algo
totalmente diferente daquele que foi tido em vista aquando da criação da [nossa] norma.
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Ana Luísa Ribeiro
iii. À luz do foro, mas no seu direito formal/conflitual (e não no material!) – lex formalis
fori
Devemos interpretar o conceito-quadro à luz do nosso DIP, das leis conflituais. Isto leva-
nos a uma interpretação específica, própria para um conflito internacional. Trata-se de
uma interpretação AUTÓNOMA e TELEOLÓGICA.
ART. 30.º CC é a prova de que o legislador quer que isto seja assim feito, pois ao dizer
“institutos análogos” admite esta interpretação.
i. ART. 15.º CC – este artigo foi elaborado por Ferrer Correia, e reúne o consenso da
doutrina portuguesa. A qualificação deve ser feita através de um chamamento
circunscrito. O art. 46.º utilizado para um trust sobre um imóvel (pois já vimos que
devemos interpretar o conceito “direitos reais” de forma abrangente!) em Inglaterra
mobiliza algumas normas inglesas – só aquelas que pelo seu conteúdo e função que
têm na própria lei inglesa são relativas a direitos reais. Esta parte da qualificação já é
lege causa, pois já olhamos à função e conteúdo das normas na própria lei mobilizada
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Ana Luísa Ribeiro
como competente (chegámos a ela pela primeira fase lege fori (abrangente!) da
qualificação). Temos de ver as leis inglesas e caracterizá-las, saber a que se referem
(família, reais...), vemos na lei aplicável que normas dela são relativas ao instituto já
previamente definido, classificando-as (esta é relativa a direitos reais, esta não é...).
No nosso sistema não utilizamos apenas uma regra de conflitos para um certo
caso, mas sim várias, aplicando leis que são diferentes, ao mesmo tempo. Mas...
sucede que isto pode levar a que tenhamos normas (que p.ex. o o.j. de ING tem
como relativas a direitos reais) incompatíveis com normas (que p.ex. o o.j. PT tem
como relativas a família)!
22/11/2017
O nosso método de qualificação como vimos está presente no art. 15.º CC sendo por isso
imperativo. Aplica várias leis diferentes, em matérias diferentes. Há um problema que pode, surgir
na aplicação do método. Não acontece sempre, apenas pode acontecer! Vejamos um exemplo: A
(PT e aqui residente) morre sem deixar quem herde os seus bens. Tem um prédio sito em Inglaterra.
Quid iuris?
Resolução:
O que vamos qualificar acerca do caso em questão são as normas mobilizáveis para o resolver. As
regras de conflitos que identificamos como relevantes são as dos artgs. 62.º (cujo conceito-quadro
é “sucessões” e nos remete para a aplicação da lei PT) e 46.º (c.q. são “direitos reais” e remete para
a aplicação da lei ING). Não vamos dizer que tipo de problema/facto está em causa pois não
fazemos uma qualificação primária! Dizemos sim que vamos aplicar normas portuguesas em
matéria de sucessão e normas inglesas em matéria de direitos reais, pois é para esses
ordenamentos jurídicos que as regras de conflito mobilizadas remetem. Qualificamos todas as
normas potencialmente aplicáveis que são chamadas pelas leis aplicáveis (ING e PT).
• Art. 62.º (sucessões) → art. 2133.º/1/e) → diz que no nosso caso quem herda o prédio de A vai
ser o Estado Português
• Art.46.º (reais) → norma inglesa → diz que Coroa Inglesa tem um direito de aquisição sobre o
prédio
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Ana Luísa Ribeiro
Vamos olhar ao conteúdo e função (15.º CC) que essas normas têm no ordenamento
jurídico a que pertencem. O art. 2133.º CC diz quem é herdeiro, se não houver família do
falecido os bens não devem ficar sem dono! O Estado Português irá então herdá-los. Trata-
IMPORTANTE
se de uma norma sucessória, logo subsumida ao art. 62.º CC. Já a norma inglesa institui um
direito real a favor da Coroa, relativamente aos bens que ficaram sem dono. Estes bens
devem ser adquiridos pela Coroa para não ficarem sem titular. É uma norma de direitos
reais, subsumida portanto ao art. 46.º CC. Esta regra define como competente a lei ING,
logo será a norma inglesa aplicada ao caso, na situação do prédio.
Salienta-se que nem sempre isto acontece, pois a aplicação das diferentes leis ocorre em diferentes
matérias MAS... estas não são estanques, as normas projetam-se umas nas outras gerando
Como a teoria tradicional aplica uma só lei determinada como competente na qualificação que faz
isto nunca acontece lá! É por esta razão (de evitar conflito de qualificações) que alguns países usam
essa teoria e a defendem (França). FERRER CORREIA entende que estre problema do nosso sistema
aparece só às vezes e tem solução ↓ , já os problemas subjacentes à teoria tradicional aparecem
sempre e não têm solução.
1. Juiz deve tentar compatibilizar as normas chamadas que são entre elas incompatíveis. Se
conseguir realizar isto já resolve o caso, as normas deixam de ser incompatíveis. E se não
conseguir? ↓
a. Conflito é entre qualificação REAL (de direitos reais) vs. PESSOAL (capacidade, família,
estado e sucessões) = prevalece a REAL. Porquê esta preferência?
①
A ligação de um Estado às coisas (imóveis apenas!) que aí se situam é mais forte
que a ligação de um Estado aos seus residentes (que podem abandonar o país, mudar
51
Ana Luísa Ribeiro
②
a sua nacionalidade...). Se não fosse assim, o Estado Português iria registar o seu
bem em Inglaterra mas as autoridades registrais de lá poderiam não deixar isso
acontecer pois a lei Inglesa entende que o prédio devia ser da Coroa Inglesa. O Estado
Inglês está em melhor condição de ficar com a coisa, ele é que sabe melhor o que faz
com ela, está em melhores condições de mandar (ser o dono) dela. O Estado onde a
coisa se situa está em melhor condição de aplicar a sua lei!
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Ana Luísa Ribeiro
Pode acontecer ainda que estes 3 critérios de hierarquização não sejam suficientes!
Se tudo isto não resolve o nosso problema de conflito de qualificações resta-nos escolher entre as
normas materiais. Como? Da mesma forma que escolheríamos se elas fizessem parte do mesmo
sistema (como se fosse uma situação puramente interna) → normas especiais prevalecem
sobre normas gerais → p.ex. liberdade de forma (219.º) vs. escritura pública obrigatória (875.º)
irá prevalecer o 875.º CC
Resumindo e concluindo, no caso acerca do prédio em ING que pertencia a A (português residente
em PT) o prédio ficaria para a Coroa Inglesa!
Tudo o que foi dito até aqui serve para CONFLITOS POSITIVOS DE QUALIFICAÇÕES. Ou seja,
quando várias normas, embora contraditórias, são aplicáveis.
Mas imaginemos agora o seguinte caso: A é Inglês, reside em Inglaterra e deixa um prédio no
Algarve (PT). Não tem família que herde o prédio, para quem vai?
ART. 46.º c.q. “posse, propriedade e demais direitos reais” → será competente a lei
portuguesa pois o prédio está em PT
ART. 62.º c.q. “sucessão por morte” → será competente a lei Inglesa pois A é inglês.
A isto ↑ chama-se qualificação/caracterização das normas, de todas as leis indicadas pelas
regras de conflito.
Difere do caso já apresentado pois agora a lei portuguesa é competente não em termos
sucessórios mas em questões de direitos reais, logo já não aplicamos o nosso 2133.º CC (pois é
uma norma sucessória portuguesa, e não uma norma de direitos reais portuguesa)! Quanto à lei
inglesa, também já não podemos mobilizar a tal norma de direitos reais que criava um direito real
de aquisição a favor da Coroa pois agora a lei ING é competente em matéria de sucessão e essa sua
norma que vimos antes é uma norma inglesa sobre direitos reais e não uma norma inglesa sobre
sucessão.
Chamam-se leis diferentes para matérias diferentes mas estas leis chamadas não têm normas
(materiais) relativas ao título/matéria para que foram chamadas (para o que foram consideradas
competentes). Dizemos a lei portuguesa é competente em matéria de direitos reais, mas não temos
nenhuma norma que se possa dizer “real” que regule a matéria! Como resolver?
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Ana Luísa Ribeiro
Terá de ser o JULGADOR a MODIFICAR o sistema para saber qual norma aplicar ao caso. O juiz terá
de fazer uma ADAPTAÇÃO, terá de intervir. A Doutrina é unânime quanto a isto, diferindo sim no
modo como o irá fazer:
2. ISABEL COLLAÇO
Entende que não podemos mexer nas normas materiais, apenas nas regras de conflito!
Vamos começar por fazer o mesmo que Ferrer e Baptista → vamos ver qual a classificação
mais importante, segundo os tais critérios, achando assim a prevalecente, que vai ser a
qualificação real. De seguida, NÃO MEXE em regras materiais, vai sim modificar a regra de
conflitos, que determina como competente a lei inglesa, para que passe a determinar como
competente a lei portuguesa, em termos sucessórios. Assim a lei aplicável (PT) já tem uma
qualificada como sucessória que pode ser aplicada (não tinha antes pois era chamada a
título real e não temos nenhuma norma real para este caso).
Até agora vimos conflitos de qualificações, agora vamos ver CONFLITO DE SISTEMAS DE DIP. São
conflitos entre os sistemas de DIP dos vários países. Isto é diferente do conflito de qualificações,
pois estes ocorrem num só país, em termos da qualificação das normas aplicáveis quando a
questão está a ser julgada nos tribunais do foro!
Tomemos de exemplo o art. 56.º CC que manda aplicar à “constituição da filiação” a lei pessoal do
progenitor, ou seja a lei da nacionalidade. A, brasileiro e residente em Portugal ao perfilhar vê-lhe
aplicada, em Portugal, a lei do Brasil. No entanto, se A perfilhasse no Brasil como era? Brasil tem
outro elemento de conexão, manda aplicar à constituição da filiação a lei da residência do
progenitor, ou seja, aplicava-lhe a lei portuguesa. O nosso sistema (PT) escolheu como critério
54
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Surge a questão: quando PT determina como competente a lei BR será que a devemos aplicar
em si mesma (as suas normas materiais reguladoras da relação) ou devemos aplicar a lei que a
lei BR mandaria aplicar (a lei indicada pelas suas próprias regras de conflito)?
É neste contexto que surge o instituto muito importante do REENVIO. Quando mandamos
aplicar x lei devemos mesmo aplicá-la a ela (que não se considera competente) ou devemos
aceitar o reenvio e aplicar a lei que essa x lei considera competente/manda aplicar?
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11/12/2017
L1 → L2 mas surge, no processo a questão de saber se A é filho de B (importante para definir quem
herda o quê). Isto trata-se de uma questão prévia, deverá ser então regulada por que lei? L1 ou L2
(que é a lei do problema principal)?
Para reconhecer situações constituídas no estrangeiro aplicamos a nossa regra de conflitos, mas ao
fazê-lo devemos ignorar as regras de conflito da lei estrangeira? No caso o nosso legislador
escolheu como lei mais próxima a da nacionalidade (PT) enquanto o legislador brasileiro escolheu a
da residência (BR), temos um CONFLITO POSITIVO DE SISTEMAS que é DIFERENTE DO NEGATIVO
(este acontece quando escolhemos uma lei que não se considerando competente remete para
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PILLET – situações já constituídas não devem sequer ser alvo de regra de conflitos, são
situações a reconhecer, isso sim. A teoria do reconhecimento dos direitos adquiridos de Pillet
indica que apenas vamos reconhecer situações já constituídas.
o Falha no ponto em que não faz controlo nenhum sobre a escolha da lei aplicável no país
de origem!
o Art. 31.º/2 CC aceita a relevância da lei da residência1 e partes também têm de ter
expectativas em ver aplicada esta lei ao seu negócio. Temos 4 requisitos cumulativos:
Esta teoria só vale no ESTATUTO PESSOAL. Porquê? É neste domínio que o
legislador reconhece que há 2 leis muito importantes para a pessoa, logo não
pode ser absoluto e querer impor só as suas soluções. Quase todos os países no
mundo escolhem um ou outro elemento. Geralmente países mais velhos (como os
Europeus) escolhem a nacionalidade, pois são países de emigrantes e assim
aplicam a sua lei a mais pessoas. Os países mais novos como o Brasil tendem a
escolher a lei da residência, pois são países de imigrantes, e aplicam assim a sua
lei a mais pessoas também.
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Os negócios cuja validade está em causa têm de ter sido celebrados no país da
residência
+
Os negócios em causa têm de ser conformes à lei do país da residência e este
tem de se considerar competente.
Estes dois últimos pontos justificam-se pelo facto de os interessados
estando no país da sua residência iam ver a lei de lá, e sendo-lhes aplicável
essa lei (que se considera competente) então é essa a lei em que eles
possivelmente tinham reais expectativas!
o Apenas com todos estes requisitos cumpridos reconhecemos negócios. Até aqui são
todos REQUISITOS LITERAIS, estão mesmo no art. 31.º. MAS a Doutrina acrescenta mais
3 REQUITOS:
FERRER CORREIA:
Que não haja ainda uma sentença acerca daquele negócio, pois se houver já
estamos no domínio do reconhecimento de sentenças estrangeiras. O que se
pretende aqui reconhecer é um negócio!
MOURA RAMOS:
Art. 31.º/2 → só serve para o reconhecimento de direitos adquiridos no
estrangeiro a título principal e não a título de exceção! Não utilizamos este
preceito para questões prévias (que surgem no seio da discussão da principal e é
importante a sua solução.
18/12/2017
Se não conseguirmos concretizar o elemento de conexão a resposta a dar será a mesma de quando
não conseguimos determinar a lei aplicável quanto ao seu conteúdo (pois no fundo o problema é o
mesmo). No problema da lei aplicável, quando indeterminado o seu conteúdo, aplicamos o direito
provavelmente vigente. No problema do elemento de conexão por vezes temos lei subsidiária
aplicável – art. 23.º/2 CC. Se mesmo assim isso falhar vamos ao art. 348.º/3
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→ Só os tribunais é que têm de fazer isto, é que estão a esta solução vinculados? Ou será que
autoridades extrajudiciais – conservadores e notários – também têm de determinar oficiosamente
o direito estrangeiro? O art. 348.º refere-se especificamente aos tribunais, mas e para os outros,
como devemos entender?
CONSERVADORES exercem uma função parajudicial, decidem acerca da celebração de certos atos,
toma decisões com base em regras de direito. Se a sua função é parajudicial então no fundo o que
fazem é muito semelhante ao que os juízes fazem. Logo, o art. 348.º é-lhes aplicável, SALVO UMA
NORMA ESPECIAL o art. 43.º - A do Código do Registo Predial, que diz que quem pede um registo
com base em direito estrangeiro deve entregar os documentos que comprovam o conteúdo da lei
estrangeira. Não derroga as regras de conflito, apenas muda sim a oficiosidade de procura da lei
estrangeira.
Para LIMA PINHEIRO aplica-se a todos os atos do notário, pois trata-se da única norma a
referir-se a esta questão em todo o Código do Notariado, logo é o regime que devemos
entender para tudo.
Ao aplicar lei de um sistema como o Inglês (common law) que leva em conta os precedentes
devemos levá-los em conta? Ou seja, interpretamos de acordo com a lei inglesa (como ela manda)
ou de acordo com a nossa lei (ignorando precedentes)? Se os tais casos já decididos forem
obrigatórios, então temos de os usar! Porquê? Harmonia jurídica internacional exige isso. Para
conseguirmos uma solução uniforme ao aplicar direito inglês temos de o interpretar como o
sistema em que está inserido manda.
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Ana Luísa Ribeiro
Fraude à lei – art. 21.º CC: trata-se de um instituto polémico, que hoje em dia apenas existe em
alguns países (nosso incluído), e tenta evitar que os indivíduos evitem a aplicação de certos
preceitos por manipularem a regra de conflitos. Exemplo:
R é casado com A, mas vive com outra mulher M (que não é sua esposa). R e A têm 3 filhos, mas R
pretende fazer um testamento deixando tudo a M, o que ignora os seus filhos e esposa (A). Esta
disposição é proibida pela lei portuguesa (aplicável de acordo com o art. 62.º), que não permite
deixar bens em testamento a favor de um cúmplice de adultério. No entanto segundo a lei Inglesa
pode fazer tal coisa.
O que acontece é que R sente-se tentado a mudar a sua nacionalidade (PT→ING) de forma a validar
esta disposição. É isto que a fraude à lei quer evitar, que as partes criem uma situação artificiosa. O
art. 21.º manda ignorar o novo elemento de conexão, ou seja, devemos continuar a tratar R como
se ele fosse português, a disposição continua a ser inválida.
Esta tentativa de fraudar a lei apenas ocorre quando se tratam de elementos de conexão
móveis (os imóveis nunca podem mudar).
Mesmo nos móveis apenas se coloca quando não houve uma imobilização do elemento.
3. Norma fraudada – norma que seria aplicável na falta do artifício e a norma a que o interessado
se quis evadir (norma do direito material português que o impedia de fazer aquela disposição
testamentária).
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Ana Luísa Ribeiro
4. Norma instrumento – regra de conflito com elemento de conexão móvel e que o interessado
manipulou para escapar à aplicação de uma certa lei. In casu é o art. 62.º CC.
Cada vez mais hoje se utiliza um elemento de conexão que não pode ser posteriormente
alterado, logo não é compatível com a fraude à lei. Este elemento é a ESCOLHA DAS PARTES
(usado p.ex. no Reg. Roma II, Reg. acerca dos regimes de bens...). Isto não se consegue
fraudar, o próprio DIP dá a escolher às partes a lei que querem que seja aplicável.
É um instituto ilógico. Apenas quando R morrer é que vemos exatamente qual a lei
aplicável, e apenas neste momento é que se pode avaliar se houve fraude à lei. A intenção
fraudulenta pode ter desaparecido entretanto.
20/12/2017
É um mecanismo de evicção de direito estrangeiro, ou seja, vai afastar a sua aplicação, repudia-lo.
Faz isto nos casos em que o RESULTADO da aplicação da lei estrangeira ofenda o nosso sistema
jurídico. Apenas é usado depois do funcionamento da regra de conflitos, pois apenas aqui sabemos
já qual a lei aplicável e qual o resultado que terá para o caso!
→ Aplicação do art. 22.º - acontece só depois da regra de conflitos e quando o tal resultado da
aplicação ofenda o direito interno português, o nosso sistema de Direito. Isso acontece quando
esse resultado leva à violação da ordem pública internacional.
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Ana Luísa Ribeiro
a OPI alegando que o resultado a que leva a aplicação da lei espanhola viola os
princípios do nosso ordenamento? NÃO!
No fundo a OPI irá funcionar quando a lei estrangeira que for determinada como aplicável seja
muito diferente da nossa, pois aí sim levará a resultados também muito contrários aos que o nosso
ordenamento defende. Atualmente, este mecanismo tem vindo a ser dispensável em algumas áreas
devido à convergência legislativa (unanimidade) verificada em variados países, que estão a prever
soluções semelhantes nessas áreas (p.ex. adopção e divórcio). No entanto, em outras áreas tem
ocorrido exatamente o contrário (p.ex. na aceitação do casamento homossexual).
EXCEPCIONALIDADE
Este mecanismo tem o seu primeiro momento de funcionamento depois da regra de conflitos
conflitos (já temos a lei estrangeira competente determinada). Vai excecionar a regra de
conflitos. Tem por isso um funcionamento aposteriostíco uma vez que é posterior à regra de
conflitos. Deve ser usado apenas em casos excecionais, quando realmente necessário.
ACTUALIDADE
Imaginemos que A casado com B, adotaram no Brasil em 1960 uma criança. Em 1960 a
adopção não era reconhecida em Portugal pois contrariava a ordem pública internacional (ia
contra os nossos princípios na altura). A e B pedem hoje o reconhecimento da adopção em
Portugal. Será reconhecida? A lei competente é a lei brasileira, que o irá permitir. Será que
devemos mobilizar a ordem pública internacional? Não! A adopção não era reconhecida entre
nós no ano de 1960, mas hoje em dia já é! O que interessa para avaliar a mobilização da OPI
são os VALORES ATUAIS, e não os que vigoravam à data da constituição da relação!
NACIONALIDADE
Serve para proteger valores nacionais. A lei estrangeira leva a um resultado que está a violar
os princípios que vigorem em Portugal. Eventualmente esses princípios podem também ter
uma dimensão internacional, mas em primeira linha é a nossa ordem que o resultado está a
violar.
IMPRECISÃO: não conseguimos fazer uma lista de casos específicos que violem a ordem
pública internacional. Como é o resultado da aplicação que se censura só perante um caso
concreto é que dá para avaliar se é possível invocar ou não a OPI. Ou seja, uma mesma lei,
dependendo do caso concreto em que é aplicada pode, ou não, estar a levar a esta tal violação
de princípios. Contra ela pode ou não ser invocada a OPI. Assim, há vários fatores que
influenciam a exigência que vamos ter face ao resultado obtido e invocação ou não da OPI:
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o Ligação ao estado do foro – quanto maior for, mais exigentes seremos. Exemplo:
A é casado com B, sendo ambos sauditas, de 62 e 12 anos, respetivamente. Pedem o
reconhecimento do seu casamento em Portugal, uma vez que estão cá a residir.
Reconhecemos? NÃO! Alguém de 12 casar vai contra os nossos princípios mais básicos.
Invocamos a ordem pública internacional, que afasta a aplicação da lei saudita, que
levaria ao resultado de validade desta união.
O mesmo caso, mas A e B estão apenas a fazer uma viagem com escala em Portugal. No
aeroporto de Lisboa há uma sala cuja entrada apenas é permitida a cônjuges. Devemos
invocar na mesma a OPI? Não! Eles estão apenas de passagem, não têm cá nada, não vão
ficar...
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normas mais apropriadas da lei estrangeira competente (que não são aquelas que
acabamos de afastar, por considerar inadequadas aos nossos valores, obviamente!) – art.
22.º/2. Ou seja, afastámos as normas do ordenamento competente que diziam que a dívida
não iria prescrever e depois vamos procurar nesse ordenamento normas mais apropriadas.
E se mesmo assim não encontrarmos uma norma apropriada, que leve a um resultado que
possamos aceitar face aos nossos princípios? – art. 22.º/2 determina que se aplique então
as regras do nosso direito interno.
Os tribunais portugueses tendem a invocar demasiado este expediente, o que pode culminar na
violação do princípio da paridade das ordens jurídicas internacionais. Não devemos entender que
o nosso sistema é melhor ou pior que outro, que deve ser nossa a lei aplicável porque é a melhor.
No entanto se invocarmos a OPI sem ser na medida do estritamente necessário acaba por ser isso
que estamos a fazer, pois a solução irá redundar na aplicação da lei do foro...
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