Ddoa Trabalho Backup
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30-06-2023
Índice................................................................................................................................1
Introdução........................................................................................................................1
3. Considerações Finais.............................................................................................23
Bibliografia.....................................................................................................................24
Introdução
1
O Direito Internacional do Ambiente
É através duma análise histórica das relações internacionais entre Estados envolvendo
os recursos naturais que compreendemos que o fundamento da lei internacional em
matéria ambiental.
Inicialmente, essa lei estava em estrita ligação com uma visão utilitarista da natureza e
de domínio sobre os recursos biológicos, numa clara afirmação de soberania e de
desenvolvimento económico.
Até ao séc. XIX, a produção normativa, a nível internacional, sobre os recursos naturais,
enquadrava-se maioritariamente nas questões relativas à pesca.
Neste âmbito, destaca-se o caso que opôs os E.U.A. ao Reino Unido, sobre a caça de
focas no mar de Bering:
1
https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/biocentrismo
2
(Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar), que prevê poderes de
soberania de exploração e conservação dos recursos naturais2.
Esta decisão arbitral, além de uma inspiração para as negociações internacionais que
culminaram na adoção de um Tratado em 1911, para a proteção das focas do Pacifico
Norte, também acentuou a necessidade da cooperação para a proteção da natureza, em
particular, das espécies migratórias.
No conflito que ficou conhecido por Caso da Fundição de Trail, os E.U.A. invocaram
os danos materiais e ambientais sentidos no Estado de Washington, oriundas da
fundição.
2
https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/$zee
3
Aqueles, instrumentos do direito não vinculantes; estes, instrumentos do direito vinculantes, i.e., os Tratados e Costume são hard law porque são
imperativos e vinculantes; já soft law consubstancia normas ou princípios que expressam os valores da comunidade internacional, mas não são
vinculantes, não obstante, devem ser respeitados pelos estados, estando desprovidas de qualquer sanção, pois os Estados não lhes atribuem efeitos
jurídicos – caso desrespeitadas, o Estado não incorre em nenhuma sanção, mas pode ter uma manifestação de desaprovação pela comunidade
internacional, i.e., a própria sociedade internacional pode entender que aquele Estado não segue os seus valores comunitários – consequência política,
mas não jurídica – exemplos temos como a Declaração do Rio de Janeiro sobre o Meio Ambiente que é um instrumento de soft law, bem contenha
disposições que relembram aos Estados da existência de normas de hard law; essa declaração faz referência ao princípio da cooperação, que não é soft
law mas hard, o instrumento, que é a declaração, é que é, em si, soft law.
3
Neste contexto, importa referir o dever de adotar ações de prevenção (ex.: notificação,
informação, monotorização, avaliação de impacto ambiental, etc.) e a responsabilidade
por danos ambientais é extensível às áreas fora da jurisdição dos Estados, como por ex.,
ao alto-mar.
Em 1962, a Assembleia Geral das Nações Unidas adota a resolução 1831 (XVII),
mediante a qual se considera fundamental conciliar a preservação dos recursos naturais,
da fauna e da flora, com o desenvolvimento económico – cabe referir que já nesta
resolução constava um dos fins do PEE (Pacto Ecológico Europeu), que respeita à
separação da lógica causal entre crescimento económico e a utilização de recursos, no
entanto, apenas como embrião, i.e., é um dos objetivos do PEE a sustentabilidade, que
se traduz, atualmente, num desígnio, visto que ainda não é possível ter desenvolvimento
económico, sem ser gerada pegada ecológica em virtude desse desenvolvimento; na
resolução mencionada, consta o princípio do desenvolvimento sustentável, o cujo
postula que todo o desenvolvimento económico deve ser harmonizado e
compatibilizado com técnicas e mecanismos que atenuem ou minorem o prejuízo
ambiental.
Desta forma, a riqueza dum país não se deverá medir apenas pelo desenvolvimento
económico, mas também pelo estado de conservação da natureza de cada território
soberano.
4
As medidas tomadas para reforçar a segurança e reduzir a poluição resultante destes acidentes levaram a uma diminuição importante quer dos
acidentes, quer da poluição por hidrocarbonetos. Não há, no entanto, motivo para complacências. Com o desastre do Torrey Canyon, a atitude dos
cidadãos europeus passou bruscamente da aceitação relutante da poluição como um preço a pagar pelo desenvolvimento económico para a intolerância
e a indignação. É de salientar que nenhum outro tipo de desastre marítimo levou jamais à deterioração de áreas tão extensas do meio marinho e causou
tanto impacto nas vidas e atividade económica de tão grande número de pessoas. Consequentemente, embora seja de saudar a tendência para uma
melhoria da segurança dos petroleiros, é evidente que muito mais pode e deve ser feito para tentar eliminar os acidentes desta natureza.
4
O conceito de integração da proteção do ambiente nas políticas e ações económicas é
alguns anos mais tarde evidenciado na Conferencia das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente Humano5, realizada em Estocolmo (1972).
5
https://cetesb.sp.gov.br/posgraduacao/wp-content/uploads/sites/33/2016/09/Declara%C3%A7%C3%A3o-de-Estocolmo-5-16-de-junho-de-1972-
Declara%C3%A7%C3%A3o-da-Confer%C3%AAncia-da-ONU-no-Ambiente-Humano.pdf
6
https://sustainabledevelopment.un.org/content/documents/5987our-common-future.pdf
5
todos os métodos e aplicando todos os princípios que possam ajudar nesta missão. A
implementação do desenvolvimento sustentável depende da boa governação.
É com esta realidade em mente que se entende ser importante prever nos Tratados
mecanismos económicos e financeiros, de forma a facilitar o cumprimento dos Tratados
ambientais, sobretudo quando estes são entendidos como uma ameaça ao
desenvolvimento económico. Por exemplo, o problema das alterações climáticas só
7
https://www.cm-ansiao.pt/agenda21local/docs/1_declaracoes/Declara%C3%A7%C3%A3o%20Joanesburgo.pdf
8
§140 “sustainable development”
6
pode ser resolvido de forma global. A Convenção quadro sobre as alterações climáticas
de 1992 (CQNUAC) e os acordos subsequentes como o Protocolo de Kyoto ou o mais
recente Acordo de Paris, desenvolveram um conjunto de obrigações de carácter
económico, como por exemplo, a figura do comércio de títulos de emissões de gases
com efeito de estufa, com o intuito de diminuir as emissões de gases com efeito de
estufa sem impedir o total desenvolvimento económico. Ademais, o princípio previsto
na Declaração do Rio de Janeiro de 1992, da responsabilidade comum, mas diferenciada
entre Estados, que viria a ser um princípio central em vários assuntos ambientais, em
particular no âmbito das alterações climáticas, veio reforçar a necessidade de ajuda
financeira dos países em desenvolvimento aos países mais pobres, de forma a os ajudar
a cumprir as obrigações dos tratados. Este princípio parte da constatação de que, durante
décadas, os países desenvolvidos contribuíram para uma maior pressão sobre os
recursos naturais, obtendo o seu desenvolvimento económico à custa da degradação do
planeta, pelo que, apesar da responsabilidade de proteger o ambiente ser comum a todos
os Estados, os países desenvolvidos devem ter obrigações adicionais, em especial no
que diz respeito à cooperação tecnológica e à assistência financeira.
Desta realidade decorre também a importância do recurso ao soft law para que os
problemas ambientais não sejam esquecidos, na medida em que este pode orientar
políticas nacionais, decisões judiciais e, com o tempo, ser consagrado em tratados ou,
com a prática reiterada dos Estados e a convicção da sua obrigatoriedade, dar origem ao
costume internacional.
Lembremo-nos, por exemplo, do tempo que foi necessário para encontrar um sucedâneo
ao Protocolo de Quioto de 1997 à CQNUAC, o Acordo de Paris de 2015 ou o número
de anos para se obter um consenso sobre o texto da CNUDM.
Desta forma, a adoção de soft law apresenta-se como um abre-caminho para a solução
urgente dos problemas ambientais, possibilitando que os Estados se unam em torno de
um consenso sobre o dever de agir sem a necessidade de se esperar pelo fim do moroso
processo de entrada em vigor de um tratado multilateral. O soft law servirá assim de
fonte de interpretação dos tratados, podendo ser incorporado por estes e até se
transformar em costume.
Neste contexto, Dinah Shelton aponta alguns aspetos que justificam a relevância do soft
law, nomeadamente a sua capacidade de permitir codificar a norma internacional
8
consuetudinária, ajudando a melhorar a sua precisão através de um texto escrito;
consolidar uma tendência em relação a uma norma particular, superando as visões
divergentes, e pressionando os organismos que têm pouco ou nenhum poder de
influência para discordar sobre o desenvolvimento de normas a que se vão submeter;
ajudar e preceder a formação da norma internacional consuetudinária; consolidar a
opinião política em relação à necessidade de ação de um novo problema, fomentando o
consenso necessário às negociações de tratados ou de normas de soft law futuras;
preencher as lacunas dos tratados; ser parte da subsequente prática dos Estado na
interpretação dos tratados; fornecer orientação ou servir de modelo para às leis
nacionais, sem obrigação internacional.9
Nem sempre é fácil distinguir soft e hard law. Algumas disposições aparecem em
tratados, como por exemplo, as cláusulas de ratificação e de entrada em vigor. No
entanto, como bem sublinha Dinah Shelton, algumas características do hard law
também podem aparecer no soft law, é o caso, por exemplo, das reservas dos Estados a
um instrumento soft law, sendo exemplo a reserva dos Estados Unidos à Declaração do
Rio de Janeiro de 1992 no que diz respeito ao seu direito ao desenvolvimento.10
9
Cf. DINAH SHELTON, Soft Law. Handbook of International Law. George Washington University Law School, Routledge Press, 2008, p. 8
10
Cf. DINAH SHELTON, Soft Law. Handbook of International Law, pp. 5-6. Ver Questões, Casos e Materiais, docs. 259, 260, 261, 262 e 263.
11
Cf. JOÃO HENRIQUE SOUZA DOS REIS e LIVIA GAIGHER BÓSIO CAMPELLO, Razões para a Utilização de Normas de Soft Law no Direito
Internacional do Meio Ambiente. Revista Brasileira de Direito Internacional. Volume 4, n.º 1, 2018, p. 90.
9
Todavia, nem sempre assim é. Muitos dos instrumentos jurídicos ambientais são
tratados de cooperação ou criados de acordo com um fundamento de cooperação. O
incumprimento das obrigações destes tratados tem acarretado, na prática, meras
consequências políticas, ou até nenhuma consequência. Por sua vez, verifica-se que "o
insucesso na implementação de normas de soft law pode resultar em sanções
retaliatórias indistinguíveis de simples contramedidas na lei de responsabilidade do
Estado".12
Ademais, os efeitos políticos ou morais do não cumprimento das normas de soft law
ambiental, como a pressão política, podem ser mais relevantes do que os efeitos do não
cumprimento de um tratado, impelindo os Estados a assumir compromissos
internacionais vinculativos, ou a transpor para o seu ordenamento interno o soft law.
Se no passado o conteúdo desses princípios poderia ser entendido, por alguns Estados,
como um ataque à sua soberania, hoje são aceites como obrigatórios. Por exemplo,
segundo o princípio 19 da Declaração do Rio "Os Estados deverão notificar, prévia e
atempadamente, os Estados potencialmente afetados, e fornecer-lhes todas as
informações pertinentes sobre as atividades que possam ter um efeito transfronteiriço
adverso significativo sobre o ambiente, e deverão estabelecer consultas atempadamente
e de boa-fé com esses Estados." O dever de notificação e de informação é um
imperativo da prevenção de danos ambientais e está também consagrado na Declaração
do Rio nos seguintes termos: "Para que o ambiente seja protegido, será aplicada pelos
Estados, de acordo com as suas capacidades, medidas preventivas. Onde existam
ameaças de riscos sérios ou irreversíveis não será utilizada a falta de certeza científica
total como razão para o adiamento de medidas eficazes em termos de custo para evitar a
degradação ambiental." (princípio 15). Não só a prevenção é aqui evidenciada como
também a precaução. O princípio da prevenção evoluiu com base na certeza entre os
12
CfJOÃO HENRIQUE SOUZA DOS REIS E LIVIA GAIGHER BÓSIO CAMPELLO, Razões para a Utilização de Normas de Soft Law no Direito
Internacional do Meio Ambiente, 90 e DINAH SHELTON, Soft Law. Handbook of International Law, p. 6.
10
efeitos de determinada ação e o dano ambiental, enquanto o princípio da precaução é o
resultado do desenvolvimento tecnológico e da incerteza científica quanto aos efeitos
que novas aplicações, usos ou ações podem provocar no ser humano e no ambiente.13
O contributo do soft law na área ambiental é, assim, um dos impulsos para repensar
doutrinalmente quais são as atuais fontes de direito internacional ou as formas de
produzir a norma internacional.
11
transfronteiriços, os problemas ambientais são, na sua maioria, globais. Assim se
justifica a importância de se aprovar tratados multilaterais que sejam ratificados por um
maior número de Estados.
Os tratados não preveem somente direitos e obrigações para as partes. Eles dispõem
também sobre as estruturas administrativas próprias de auxílio às partes na sua missão
de cumprir o tratado e de o fazer evoluir, bem como mecanismos financeiros de ajuda
aos países em necessidade. Acresce ainda que o direito internacional dotou os Estados
de meios para contornar a morosidade do processo de vinculação a um texto de tratado e
da adoção de medidas nacionais para cumprir os tratados, e, por conseguinte, permitir
acompanhar os avanços científicos e o aparecimento repentino de novos problemas para
os quais é necessária uma resposta imediata. As obrigações de um tratado podem ser ou
não imediatamente exequíveis. As obrigações que não são imediatamente exequíveis
dependem da criação de medidas legislativas, políticas e administrativas a nível
nacional, sem as quais não é possível cumprir o tratado. As obrigações imediatamente
exequíveis podem ser aplicadas pelos poderes internos, sem que seja necessário a
adoção de medidas para as tornarem exequíveis.
12
respeito pela vida privada e familiar, os riscos e danos ambientais são uma ameaça e
prejuízo não só para o ambiente como para a vida e a saúde das pessoas e podem ainda
estar relacionados com a privação de outros direitos humanos, como a liberdade de
expressão ou a participação na vida pública.17
Assim, a norma internacional ambiental é uma norma que visa a proteção da natureza
por si mesma contra o desenvolvimento económico desregulado e irracional, mas
também é uma norma não desconectada do impacto que a degradação do planeta pode
ter sobre os seres humanos.
O direito de cada ser humano a um ambiente saudável tem sido reconhecido e invocado
internacionalmente, ajudando a prosseguir objetivos de proteção das pessoas e, ao
mesmo tempo, de preservação da natureza.18
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) tem invocado o direito ao ambiente
aquando da violação de vários artigos da Convenção Europeia dos Direitos do Homem
(CEDH), em especial o art. 8º, relativo ao direito de respeito pela vida privada e
familiar, no âmbito, v.g., da poluição cuja responsabilidade seja imputável aos Estados,
em virtude das ações das entidades públicas, porque ora não adotou: legislação; outras
medidas necessárias para evitar a poluição por parte de entidades privadas. Neste
17
Cf. Sobre a autonomia do ambiente na jurisprudência dos tribunais de direitos huma nos, Carla Amado Gomes, ao apreciar a decisão SERAP c.
Nigéria (ECW/CCJ/JUD/18/12) do Tribunal de Justiça da Comunidade Económica dos Estados do Sudoeste Africano, que opõe a organização não-
governamental SERAC à Nigéria quanto aos direitos do Povo Ogoni, chama atenção para o facto do Tribunal ter considerado que o artigo 24 da
Carta de Banjul sobre o direito ao meio ambiente, "congloba todos os direitos alegadamente violados: à vida, à dignidade, à informação, ao trabalho,
à propriedade, ao desenvolvi mento, à utilização dos recursos naturais e à repartição dos benefícios que deles advêm.
Cf. CARLA AMADO GOMES, Artigo 24. Comentário lusófono à Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. Coordenação Patrícia Jerónimo,
Rui Garrido e Maria Assunção Vale Pereira. Observatório Lusófono dos Direitos Humanos da Universidade do Minho (OLDHUM) Direitos Humanos
- Centro de Investigação Interdisciplinar (DH-CII), 2018, pp. 257 e 258.
18
Por exemplo, no artigo 24 da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos de 1981 (Carta de Banjul) e no artigo 11 do Protocolo Adicional
de 1988 à Convenção Americana dos Direitos Humanos (CADH).
13
contexto, o TEDH tem considerado que os Estados devem implementar medidas
legislativas e administrativas adequadas para prevenir os danos ao ambiente e proteger a
saúde, bem como tem identificado obrigações detalhadas sobre o procedimento de
autorização de projetos com impacto no meio ambiente, o acesso a um recurso eficaz, a
avaliação de forma antecipada dos riscos para a saúde e o ambiente, de acordo com o
princípio da precaução ou a importância da participação pública nas questões
ambientais.19
Estes atores têm contribuído para a evolução do direito internacional do ambiente, quer
através da pressão política e moral que exercem sobre os governos quer através da sua
participação nas delegações dos Estados nas COP – Conference of the parties – dos
tratados internacionais.
19
Cf. Ver por exemplo: TEDH, Lopez Ostra c. Espanha, n.º 16798/90, 9 de dezembro 1994; TEDH. Hatton-I c. n.º 36022/97, 2 de outubro 2001)
TEDH. Hatton II c., n.º 36022/97, 8 de julho 2003; TEDH, Öneryildiz, n.º 48939/99. 30 de novembro 2004; TEDH, Kyrtatos, n° 41666/9822 de agosto
2003, TEDH. Maria Guerra c., Itália n.º 116/1996/735/93219 de fevereiro 1998. Ver Questões, Casos e Materiais, doc. 254.
20
Como o consagra a nossa Constituição, no seu art. 66º
21
14
2. A responsabilidade internacional por factos ilícitos e lícitos no contexto da
As ameaças e ataques à natureza com origem num território soberano nem sempre se
detêm nas fronteiras desse território. Os ecossistemas são interdependentes e, em alguns
casos, a sua gestão é partilhada entre vários Estados, pelo que um problema que pode
inicialmente ser puramente interno, pode adquirir uma dimensão transfronteiriça. Neste
âmbito, e tal como anteriormente referido, o Estado tem o direito de explorar os seus
recursos naturais, mas deve zelar, pelos meios políticos, legislativos, administrativos,
judiciais, entre outros ao seu dispor, para que as atividades realizadas no seu território
não constituam uma ameaça ou provoquem um dano a outros Estados, ou em espaços
onde nenhuma soberania é exercida.
Para além das normas sobre a responsabilidade internacional dos Estados, as fontes do
direito internacional abrangem também normas relativas à responsabilidade civil
internacional de operadores públicos e privados por danos ambientais.
15
embora dependa de ações de proteção, contém em si a ideia de justiça intergeracional,
ou seja, tem por finalidade assegurar o direito das gerações presentes e futuras de
usufruírem do ambiente e dos recursos naturais.
Mesmo nos casos em que o dano não resulta da violação de uma obrigação internacional
de prevenção, as medidas adotadas, que face aos conhecimentos técnicos e científicos
da época são consideradas as mais adequadas, podem ser repensadas pelos Estados,
pelas organizações internacionais e pelos operadores.
16
2.1. A relevância da cooperação, prevenção e precaução na determinação da
Neste âmbito, no caso Mox, Irlanda c. Reino Unido, 2001, o tribunal internacional do
direito do mar (TIDM) considerou que "a obrigação de cooperação é (…) um princípio
fundamental em matéria de prevenção da poluição do meio marinho." (§ 82) [...] Desta
forma, a Irlanda e o Reino Unido deviam cooperar, de acordo com as exigências de
prudência e precaução, através do intercâmbio de informações sobre os riscos e efeitos
que poderão resultar das operações da fábrica Mox, bem como, no mesmo espírito de
cooperação, adotar os meios para fazer face a estes riscos (§ 84).
17
Tendo em conta os tratados e a jurisprudência, a cooperação preventiva engloba um
conjunto de procedimentos.
Os tratados que incidem sobre cooperação preventiva podem conter normas de conduta
e normas de resultado. As normas de conduta impõem aos Estados a obrigação de adotar
os meios para atingir o fim pretendido de prevenção de danos, de minimização do risco
de atividades perigosas, etc... Um Estado não cumpre a norma de conduta quando não
adota os meios fixados pelo direito internacional, mesmo se o resultado danoso se não
tiver produzido. Desta forma, o incumprimento da norma de conduta começa a partir do
momento em que o Estado deveria adotar os procedimentos por ela fixados. Tal
incumprimento dá origem a uma responsabilidade internacional por factos ilícitos.
18
As obrigações de conduta impelem o Estado a adotar o máximo de esforço para atingir
o objetivo da norma. Se um Estado adota o procedimento previsto para prevenir o
dano, não significa que o dano não irá ocorrer, mas evidencia o facto de que o Estado
adotou o máximo de esforço para evitar a ocorrência do dano. Sendo assim, as
obrigações de conduta são obrigações que têm como padrão a due diligence.
O dever de diligência é uma conduta de boa governança para proteger o meio ambiente.
É uma conduta que deve ser exercida de acordo com o princípio de boa-fé e impele os
Estados a regularem as atividades públicas e privadas sob a sua jurisdição.23
Não cumpre com as obrigações de cooperação preventiva o Estado que, através dos seus
órgãos ou através de pessoas que atuam por sua conta, não empreende o máximo de
esforços para monitorizar e minimizar o risco, de forma a prevenir o dano.
No que diz respeito à responsabilidade do Estado por factos ilícitos em virtude de ações
ou omissões cometidas por pessoas de direito privado que atuam por conta do Estado,
nomeadamente no exercício de serviços públicos, entende Guido Soares, em
conformidade com a Comissão de Direito Internacional que "os únicos vínculos
admissíveis entre a pessoa de direito privado e o Estado, que podem legitimar a
responsabilidade internacional deste, são [os] atos de jure ou de facto típicos do
exercício de uma função de órgão estadual, sendo irrelevantes as circunstâncias relativas
à nacionalidade das pessoas mencionadas, do Estado a quem se atribui o ilícito, ou ainda
irrelevante terem elas residência ou domicílio no território do mesmo. Em termos de
proteção internacional do meio ambiente, são evidentes as consequências benéficas de
tal princípio que o sistema de responsabilidade subjetiva do Estado engendra: não
havendo possibilidade de dissociar-se, no direito internacional, em termos de
responsabilidade do Estado, a conduta das pessoas de direito privado das pessoas do
próprio Estado, o efeito é dar causa para os Estados adotarem leis internas, que estejam
23
Cf. ALEXANDRE KISS E DINAH SHELTON, Guide To International Environmental Law, Leiden: Martinus Nijhoff, 2007, p. 91.
19
mais conformes com as suas obrigações internacionais, com a consequente
determinação de exigirem o cumprimento delas pelas pessoas que lhes são sujeitas.
No entanto, apesar da due diligence se referir a um padrão mínimo de conduta por parte
de um Estado, quanto maior for o risco de uma atividade, maior deverá ser a exigência
relativa à conduta do Estado, ou seja, maior será o empenho exigido, ao Estado, na
adoção de medidas preventivas.24
20
No que diz respeito à responsabilidade internacional por factos lícitos ou pelo risco,
apesar do Estado ter cumprido todas as normas referentes aos procedimentos de
cooperação preventiva, agido com a diligência devida e aplicado o princípio da
precaução, o dano com origem em atividades perigosas, mas não proibidas pelo direito
internacional, pode ocorrer.
Neste sentido, a nível internacional, os Estados devem adotar posições comuns que
favoreçam o desenvolvimento do direito internacional sobre a responsabilidade
internacional pelo risco, bem como sobre a responsabilidade internacional por factos
ilícitos, implementando programas conjuntos de cooperação preventiva ambiental.
Ademais, os Estados devem impor, através do seu poder judiciário e administrativo, aos
poluidores, no contexto da compensação de danos com impacto transfronteiriço,
medidas que respeitem a dimensão de prevenção e precaução do princípio do poluidor
pagador. O dever de prevenção é distinto do dever de reparação dos danos ao meio
21
ambiente. No entanto, o princípio do poluidor pagador é um princípio normativo de
carácter económico que imputa ao poluidor os custos decorrentes da atividade poluente.
O objetivo do princípio do poluidor pagador não é apenas fazer com que os custos das
medidas de proteção do meio ambiente sejam suportados pelos operadores, mas também
corrigir e eliminar as fontes potencialmente poluidoras. O princípio do poluidor pagador
obriga à reparação do dano ambiental, uma obrigação que deverá ser entendida como a
mais completa reposição do estado em que se encontrava o local antes da ocorrência do
dano, ou seja, uma reparação que tenha em conta os três níveis da biodiversidade: a
diversidade genética, a diversidade das espécies e a diversidade dos ecossistemas.
Mesmo sabendo que as indemnizações a pagar são avultadas e podem ser uma forma de
dissuasão de comportamentos nocivos para o ambiente, o fator de reparação do dano
ambiental não é por si só suficiente em termos de prevenção de danos transfronteiriços.
A irreparabilidade e a irreversibilidade da maior parte deste tipo de danos devem ser um
elemento indicativo do valor de prevenção ambiental. Tal valor deve estar subjacente à
aplicação do princípio do poluidor pagador, para que novos danos oriundos das
atividades potencialmente perigosas não aconteçam. Assim, o princípio do poluidor
pagador tem uma vocação preventiva na medida em que procura inibir a conduta lesiva
a ser praticada pelo potencial poluidor.25
Neste contexto, o poluidor não pode ser obrigado a adotar medidas para prevenir um
dano improvável ou imprevisível à luz dos conhecimentos científicos disponíveis. Já a
incerteza científica pode obrigar o poluidor a adotar medidas de precaução. Desta
forma, o princípio do poluidor pagador abrange: " a) a vertente de precaução que se
aplica quando apenas há suspeita de uma atividade poder provocar danos ao ambiente
(atividades potencialmente poluentes) e que se aplica, sobretudo, à poluição acidental
nas atividades perigosas, abrangendo, em qualquer caso, a adoção de precauções ou
25
Cf. LÍGIA CARVALHO ABREU, O princípio do poluidor pagador: um imperativo de segurança marítima, Direito e Ambiente, Revista do ILDA, n.º
2 e 3, 2011, pp. 195-205. No mesmo sentido, Alexandra Aragão entende que "a doutrina que se dedicou expressa- mente ao estudo do PPP (princípio
do poluidor pagador) é pacífica em considerar que o fim último deste princípio é a prevenção da poluição futura e não a reparação de danos passados.
Mais vale prevenir, primeiro, porque em muitos casos é impossível remover a poluição ou o dano real, tornando inconcebível a reconstituição natural
da situação anterior à poluição. Mais vale prevenir, em segundo lugar, porque mesmo nos casos em que seja possível a reconstituição in natura,
frequentemente ela é de tal modo onerosa, que não pode ser exigível um tal esforço ao poluidor. Com efeito, o custo das medidas necessárias a evitar a
ocorrência de poluição é, em geral, muito inferior ao custo das medidas de "despoluição" após a ocorrência do dano. Cf. ALEXANDRA ARAGÃO, O
princípio do poluidor pagador. Pedra angular da política comunitária do ambiente, p. 112.
Cf. ALEXANDRA ARAGÃO, O princípio do poluidor pagador. Pedra angular da política comunitária do ambiente, pp. 114 e 115.
22
cuidados excecionais no desenvolvimento da atividade (cuidados que vão mais além dos
cuidados normais que o exercício de atividades análogas requer), ou até a interdição de
produtos, processos ou atividades; b) a vertente preventiva em sentido estrito que se
aplica quando já há a certeza do dano provocado por uma certa atividade e que abrange
sobretudo o controlo da poluição "gradual" (ou crónica) que por um efeito de
acumulação se pode tornar aguda, conduzindo à rutura do equilíbrio ecológico. Ora, o
que até agora designámos como duas vertentes do PPP, são, na nossa opinião, dois
subprincípios concretizadores do PPP: respetivamente, o princípio da precaução e o
princípio da prevenção.". Assim, os Estados estarão em posição de cumprir as suas
obrigações inter- nacionais em matéria de cooperação preventiva.
3. Considerações Finais
Bibliografia
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