Acp Acordao Dano
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
APELADO: ANILSON APARECIDO CLAUDINO, DEBORA APARECIDA BATISTA CLAUDINO, CESP COMPANHIA
ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SANTA FE DO SUL, RIO PARANÁ ENERGIA S.A
Advogados do(a) APELADO: GUILHERME SONCINI DA COSTA - SP106326-A, RODRIGO SONCINI DE OLIVEIRA GUENA -
SP259605-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogados do(a) APELADO: CARINA SANTANIELI - SP213374-A, GIOVANI RODRYGO ROSSI - SP209091-A, MARIANI
PAPASSIDERO AMADEU - SP270827-A, MILTON RICARDO BATISTA DE CARVALHO - SP139546-A, PAULO ROGERIO
GONCALVES DA SILVA - SP294562-A, RODOLFO QUEIROZ MACHADO - SP499982, SEIJI KURODA - SP119370-N
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E LAT Ó R I O
Trata-se de ação civil pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF em face de
ANILSON APARECIDO CLAUDINO e DÉBORA APARECIDA BATISTA CLAUDINO, da CESP -
COMPANHIA ENERGÉTICA DE SÃO PAULO, da UNIÃO FEDERAL, do INSTITUTO
BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA e
do MUNICÍPIO DE SANTA FÉ DO SUL/SP.
Narra o Parquet em sua inicial, em síntese, que os corréus pessoas físicas (“rancheiros”) são
proprietários de construção erguida na área de preservação permanente do reservatório da Usina
Hidrelétrica de Ilha Solteira e que foram instados administrativamente a repararem o dano
ambiental, mas permaneceram inertes.
Argumenta que a concessionária também deu causa ao dano ambiental ao descumprir obrigações
legais e contratuais e que, além de não ter adotado medidas para preservar e recuperar a área de
preservação permanente no entorno do reservatório, ainda firmou contratos de concessão de uso
com particulares para que utilizassem a faixa de segurança da represa.
Sustenta que o IBAMA é parte legítima para o feito porque descumpriu seus deveres de
fiscalização, inclusive aduzindo que questionou a autarquia sobre 594 (quinhentos e noventa e
quatro) procedimentos administrativos e apenas 6 (seis) haviam sido concluídos.
Alega que o município não só deixou de exercer seu poder de polícia como incentivou a ocupação
pelos “rancheiros”, “criando normas legais para burlar a legislação ambiental federal” e perpetuar
o dano ambiental.
“(...)
a.
b.
Seja compelida a União Federal a proceder apuração de eventuais
responsabilidades dos gestores públicos, especialmente do fiscal/gestor do contrato
administrativo, em razão da não fiscalização da execução do contrato;
c.
Seja condenada a União Federal a, em conjunto com os demais réus, recompor
integralmente os danos ambientais perpetrados nas APPs, consistente na adoção de
todas as medidas necessárias para tal recomposição; e
d.
Seja arbitrada multa pecuniária, levando-se em conta o período em que a ré União
Federal foi omissa na fiscalização do contrato, devendo ser criteriosamente arbitrado
por este r. Juízo e revertido ao fundo previsto na Lei 7.347/85.
a.
b.
e Seja(m) condenado(s) o(s) Senhor(es) ANILSON APARECIDO CLAUDINO e
DÉBORA APARECIDA BATISTA CLAUDINO, nos termos do artigo 311 e seguintes
da Lei n° 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) à obrigação de coibir toda e qualquer
atividade que possa causar lesão à área de preservação permanente objeto da ação
civil pública ou nela promover ou permitir que se promovam atividades danosas,
ainda que parcialmente.
a.
b.
Seja determinado ao IBAMA, a Municipalidade e a Concessionária, mediante a
remoção das edificações existentes no local, caso não cumprida a obrigação pelos
réus rancheiros, e a adoção de práticas de adequação ambiental, utilizando-se
técnicas de plantio e de manutenção da área e produtos não lesivos ao meio
ambiente; ou
c.
Alternativamente, mediante o auxílio na remoção das edificações existentes no local
e da adoção de práticas de adequação ambiental, utilizando-se técnicas de plantio e
de manutenção da área e produtos não lesivos ao meio ambiente;
d.
Seja condenado o IBAMA na obrigação de fazer consistente na fiscalização e
acompanhamento técnico ambiental até completa recuperação da área de
preservação permanente; e
e.
Seja condenado o IBAMA e a Municipalidade, na obrigação de fazer consistente no
exercício de seu poder de Polícia Ambiental, para realizarem fiscalização diuturna,
ostensiva e ininterrupta em toda a APP, no sentido de:
a.
b.
Sejam condenados os réus no pagamento de indenização quantificada em perícia ou
por arbitramento deste Juízo Federal, correspondente aos danos ambientais que, no
curso do processo, mostrarem-se técnica e absolutamente irrecuperáveis nas áreas
de preservação permanente irregularmente utilizadas pelos réus, acrescidas de juros
e correção monetária, a ser recolhida ao Fundo a que se refere o artigo 13 da Lei n.
7.347/85 (Ação Civil Pública);
c.
Seja imposta multa diária não inferior a R$ 3.000,00 (três mil reais) com fundamento
no artigo 461, § 4º, do Código de Processo Civil, para a hipótese de descumprimento
das obrigações impostas nos itens acima; e
d.
Seja reconhecida e declarada a rescisão do contrato de concessão entre a
concessionária de energia e o infrator por quebra de cláusula contratual
(preservação do meio ambiente).
“(...)
a.
b.
que o IBAMA e a Prefeitura de Santa Fé do Sul, em conjunto, realizem, no prazo
máximo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da citação, vistoria no imóvel objeto
dos autos, e elaborem um laudo preliminar onde constem todos os elementos
necessários para garantir a eficácia do provimento constante do item "a" deste
dispositivo, cabendo ao instituto ambiental e à Municipalidade, ainda, a fiscalização
das atividades exercidas pelo(s) o(s) réu(s) rancheiro(s), visando coibir qualquer ato
tendente a alterar a situação atual do imóvel, verificada e atestada quando da
vistoria e da apresentação do laudo. Deverá o IBAMA, ainda, verificadas novas
atividades na área de preservação, proceder à imediata autuação do infrator,
comunicando ao Juízo o ocorrido, através de ofício encaminhado aos autos deste
processo;
c.
que a União Federal, regularmente citada, e ciente de que poderá vir a integrar o
pólo ativo da ação, em aplicação analógica do dispositivo inserto na Lei n.° 4.717/65,
caso entenda por bem contestar a ação, que realize a fiscalização efetiva da
execução do contrato de concessão firmado com a CESP, sob pena de
responsabilidade do administrador público, especialmente do fiscal/gestor do
contrato administrativo e que, em caso de inexistência de cláusula nesse sentido,
que proceda à imediata revisão do acordado com a CESP, fazendo nele constar
expressamente a previsão da imposição de sanção e eventual dissolução do
acordado por descumprimento dos seus termos, notadamente em virtude do uso
nocivo/abusivo da propriedade/posse por parte da concessionária.
Tendo em vista que o objeto desta demanda e, em especial, esta decisão, limita
parcialmente o uso e gozo - faculdades inerentes ao domínio - do imóvel em questão,
determino que, realizada a citação do(s) réu(s) rancheiro(s), seja imediatamente expedido
ofício ao Cartório de Registro de Imóveis competente, para que se faça a averbação da
citação na matrícula respectiva, nos termos do artigo 167, inciso i, n°21, da Lei n.°
6.015/73.
Indefiro, por ora, o pedido de cominação de multa diária à União Federal, haja vista que
este pedido está condicionado a sua decisão em figurar ou não no pólo ativo da ação.
(...)” (ID 281053665 - pág. 14/20).
Manifestação da União Federal pelo seu ingresso no polo ativo da demanda, o que foi deferido
pelo Juízo, que consignou que ficaram inteiramente prejudicados os pedidos deduzidos em face
do ente público (ID 281053665 - pág. 27/32 e ID 281053667 - pág. 01/10 e 18).
Manifestação do IBAMA pela sua inclusão no polo ativo da lide, o que também foi deferido,
consignando o Juízo que ficaram inteiramente prejudicados os pedidos deduzidos em face da
autarquia (ID 281053667 - pág. 21/23 e 24).
Contestação pelo Município de Santa Fé do Sul/SP (ID 281053669 - pág. 07/30 e ID 281053670 -
pág. 01/06).
Contestação pela CESP (ID 281053670 - pág. 17/22 e ID 281053672 - pág. 01/11).
Contestação conjunta pelos réus pessoas físicas (ID 281053800 - pág. 04/24, ID 281053801 -
pág. 01/23, ID 281053805 - pág. 01/24, ID 281053809 - pág. 01/22 e ID 281053818 - pág. 01/12).
Em razão do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, das cinco ações que discutiam
dispositivos do Código Florestal, foi determinada a intimação do MPF, que manifestou pela
inclusão da Rio Paraná no polo passivo da demanda e pelo seu regular prosseguimento (ID
281053936 - pág. 21 e 24/28 e ID 281053937 - pág. 01).
“concedo à concessionária (RIO PARANÁ) o prazo de 20 dias úteis para contestar, a partir
da intimação (deste) ato ordinatório (...) Em concentração de atos processuais, já na
contestação, a concessionária (RIO PARANÁ) deverá se manifestar, concretamente, a
respeito das provas que pretenda produzir, seu custeio e ônus, bem como sobre pontos
fulcrais dos processos, a exemplo dos eventuais impactos das alterações do Novo Código
Florestal nos feitos, interesse processual dos autores, definição e normas aplicáveis à Área
de Preservação Permanente (esclarecendo inclusive a respeito do licenciamento/Pacuera),
e inserção ou não do imóvel sindicado judicialmente na APP (...)” (ID 281054098).
Manifestações pela União Federal, pelo MPF, pelos réus pessoas físicas, pela CESP, pelo
Município de Santa Fé do Sul/SP e pelo IBAMA (ID 281054146, 281054148, 281054151,
281054155, 281054169 e 281054171).
“III – CONCLUSÃO
j) NOMEIO como perito o Dr. Artur Pantoja Marques, professor da UNESP – Ilha Solteira,
que realizará a perícia nos termos de projeto firmado entre esta instituição de ensino e a
Justiça Federal (Processo SEI 0015936-98.2020.4.03.8001). Ficam as partes cientes de
que já houve aceite do encargo e que currículo do expert está disponível na plataforma
Lattes (http://lattes.cnpq.br/7547159209899887);
k) FIXO o valor dos honorários periciais no patamar de R$ 1.157,00 (um mil, cento e
cinquenta e sete reais), nos termos do projeto citado. Intime-se o proprietário do imóvel
para adiantar, em 15 (quinze) dias, o valor integral dos honorários periciais, mediante
depósito judicial na Caixa Econômica Federal, vinculado a estes autos, sob pena de
preclusão da prova pericial e julgamento do processo no estado em que se encontrar;
n) Realizado o exame pericial, o laudo deverá ser elaborado na forma do CPC, 473, I a IV,
com respostas aos quesitos das partes e aos seguintes quesitos fixados pelo Juízo:
1 – Considerando que a APP – Área de Proteção Permanente do imóvel fora fixada nesta
decisão nos termos da Lei 12.651/2012, artigo 62 (distância entre o nível máximo operativo
normal e a cota máxima maximorum), INDICAR e ESTABELECER fisicamente o limite no
imóvel objeto da perícia;
2 – Nos limites da APP, existe alguma intervenção humana que impede a regeneração da
vegetação nativa? Em caso positivo, ESPECIFICAR qual a natureza da intervenção e a que
se destina, preferencialmente através de imagens.
Com a apresentação final de esclarecimentos pelo perito; ou não os tendo sido requeridos;
ou não tendo havido o adiantamento dos honorários periciais; venham os autos conclusos
para sentença.
Intimem-se as partes para os fins do art. 357, § 1º, do CPC/15” (ID 281054172).
A Rio Paraná, a CESP, o IBAMA e os corréus pessoas físicas indicaram assistentes técnicos e
apresentaram quesitos (ID 281054181, 281054237, 281054238 e 281054243).
“a) acolhimento da preliminar formulada nos termos do art. 1.009, § 1º, do CPC,
reformando-se a r. decisão interlocutória saneadora do feito para a aplicação da Lei
4.771/65, artigo 2º, alínea “b”, e Resolução CONAMA nº 302/2002 como marco normativo
para instrução do feito , a fim de que a APP seja delimitada em 100 metros, medida a partir
do nível máximo normal, afastando-se a incidência do art. 62 da Lei 12.651/2012;
A União apela pleiteando a reforma da sentença para que seja afastada a sua condenação ao
ressarcimento das despesas correspondentes à perícia requerida pelo réu, como prevê o art. 18
da Lei nº 7.347/85. Subsidiariamente, requer que a condenação seja rateada entre os
litisconsortes ativos (ID 281054307).
“1. Seja declarada a nulidade da sentença e o consequente retorno dos autos à 1ª instância
a fim de que os quesitos formulados pela Autarquia possam ser integralmente respondidos
pelo Sr. perito judicial; ou, subsidiariamente,
2. Seja acolhida a preliminar formulada nos termos do art. 1.009, § 1º, do Código de
Processo Civil, reformando-se a r. decisão interlocutória saneadora do feito; e, por via de
consequência,
Contrarrazões pela CESP, pela Rio Paraná, pelo Município de Santa Fé do Sul/SP e pelos corréus
pessoas físicas (ID 281054321, 281054361, 281054363 e 281054368).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
APELADO: ANILSON APARECIDO CLAUDINO, DEBORA APARECIDA BATISTA CLAUDINO, CESP COMPANHIA
ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE SANTA FE DO SUL, RIO PARANÁ ENERGIA S.A
Advogados do(a) APELADO: GUILHERME SONCINI DA COSTA - SP106326-A, RODRIGO SONCINI DE OLIVEIRA GUENA -
SP259605-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogados do(a) APELADO: CARINA SANTANIELI - SP213374-A, GIOVANI RODRYGO ROSSI - SP209091-A, MARIANI
PAPASSIDERO AMADEU - SP270827-A, MILTON RICARDO BATISTA DE CARVALHO - SP139546-A, PAULO ROGERIO
GONCALVES DA SILVA - SP294562-A, RODOLFO QUEIROZ MACHADO - SP499982, SEIJI KURODA - SP119370-N
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO
Do reexame necessário
Conheço do reexame necessário por força do art. 19 da Lei n° 4.717/1965 (Lei da Ação Popular),
de aplicação analógica às ações civis públicas (STJ, AgInt no REsp 1547569/RJ, Rel. Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 17/06/2019, DJe 27/06/2019).
Alega o MPF que teria havido nulidade na decisão saneadora e, por conseguinte, no laudo pericial
em razão da adoção do parâmetro fixado pelo art. 62 do Novo Código Florestal para determinar a
extensão da área de preservação permanente.
Pleiteia que seja considerada, para esse fim, faixa de 100 (cem) metros, medida a partir do nível
máximo normal.
Em sentido semelhante, o IBAMA sustenta que a aplicação do art. 62 do Código Florestal deve
observar determinadas balizas, que serão apreciadas oportunamente, além de argumentar que
houve nulidade no laudo porque os quesitos por ela formulados não foram integralmente
respondidos.
As preliminares de nulidade da decisão saneadora e do laudo pericial têm relação direta com a
delimitação da extensão da área de preservação permanente e, portanto, confundem-se com o
mérito da causa e com ele serão analisadas.
§ 3º (VETADO).
(...)
(...)” (destaquei)
No julgamento conjunto da ADC 42/DF e das ADI 4901/DF, ADI 4902/DF, ADI 4903/DF e ADI
4937/DF, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade do art. 62 do Código
Florestal, ocasião em que firmou a seguinte tese:
“h) Artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62 (Redução da largura mínima da APP no entorno de
reservatórios d’água artificiais implantados para abastecimento público e geração de
energia): O estabelecimento legal de metragem máxima para áreas de proteção
permanente no entorno de reservatórios d’água artificiais constitui legítima opção de
política pública ante a necessidade de compatibilizar a proteção ambiental com a
produtividade das propriedades contíguas, em atenção a imperativos de desenvolvimento
nacional e eventualmente da própria prestação do serviço público de abastecimento ou
geração de energia (art. 175 da CF). Por sua vez, a definição de dimensões
diferenciadas da APP em relação a reservatórios registrados ou contratados no
período anterior à MP nº 2166-67/2001 se enquadra na liberdade do legislador para
adaptar a necessidade de proteção ambiental às particularidades de cada situação,
em atenção ao poder que lhe confere a Constituição para alterar ou suprimir espaços
territoriais especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III). Trata-se da fixação de uma
referência cronológica básica que serve de parâmetro para estabilizar expectativas quanto
ao cumprimento das obrigações ambientais exigíveis em consonância com o tempo de
implantação do empreendimento; CONCLUSÃO: Declaração de constitucionalidade dos
artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62, do novo Código Florestal;” (destaquei).
Dito de outro modo, a extensão da área de preservação permanente varia de acordo com a data
do registro ou do contrato de concessão e autorização. Mas, uma vez definida a extensão da área
de preservação permanente, ela é válida tanto para intervenções pretéritas quanto para
intervenções futuras, uma vez que não há fundamento legal para essa pretensa distinção.
Tampouco o fato de o art. 62 do atual Código Florestal estar inserto em capítulo intitulado
“Disposições Transitórias” permite chegar a tal conclusão.
E, diga-se uma vez mais, a adoção dos critérios constantes do art. 62 é constitucional, conforme
decidido pelo Supremo Tribunal Federal.
Desta forma, e com as devidas vênias a quem adota entendimento diverso, tenho que não é
possível aplicar uma regra para intervenções pretéritas e outra para intervenções futuras em área
de preservação permanente, por ausência de previsão legal.
Portanto, fica rejeitado o pedido recursal subsidiário de adoção das datas de 22/07/2008 ou de
28/05/2012 como marcos temporais para fins de determinação de regularização de intervenções
antrópicas consolidadas e de proibição de intervenções futuras.
No caso concreto, não consta dos autos a data exata da concessão da Usina Hidrelétrica de Ilha
Solteira, mas é certo que ela é anterior à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001.
Art. 1º Prorrogar, pelo prazo de vinte anos, contado a partir de 8 de julho de 1995, as
concessões para exploração das Usinas Hidrelétricas – UHE, a seguir especificadas,
de que é titular a Companhia Energética de São Paulo – CESP:
I – UHE Ilha Solteira, nos Municípios de Ilha Solteira e Selvíria, Estado de São Paulo.
(...)
Art. 3º A prorrogação dos prazos das concessões de que trata esta Portaria somente terá
eficácia com a assinatura do respectivo contrato de concessão entre a Companhia
Energética de São Paulo – CESP e o Poder Concedente, que será efetuado por intermédio
da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, nos termos da delegação de
competência constante do Decreto nº 4.932, de 23 de dezembro de 2003” (destaquei).
Aplicável ao caso, portanto, a regra do art. 62 do atual Código Florestal, de sorte que a faixa da
Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota
máxima maximorum.
No caso dos autos, foi realizada prova pericial que constatou que não houve intervenção na área
de preservação permanente, cuja extensão foi definida na forma do art. 62 do atual Código
Florestal.
Confira-se:
“Quesito: 2 – Nos limites da APP, existe alguma intervenção humana que impede a
regeneração da vegetação nativa? Em caso positivo, ESPECIFICAR qual a natureza da
intervenção e a que se destina, preferencialmente através de imagens.
De rigor a rejeição das teses de nulidade do laudo pericial aventadas pelo MPF e pelo IBAMA,
porquanto todas dizem com a extensão da área de preservação permanente a ser considerada no
caso concreto.
Do mesmo modo, os quesitos apontados pelo IBAMA como não respondidos no laudo pericial só
seriam relevantes se sua tese de direito tivesse sido adotada, mas foi ela fundamentadamente
rejeitada em sentença, que ora mantenho.
E o tão só fato desses quesitos não terem sido formalmente rejeitados pelo juízo a quo não obriga
o perito a respondê-los, dada sua irrelevância para o deslinde da causa.
Desta forma, demonstrado por prova pericial que não houve intervenções na área de preservação
permanente, correta a sentença de improcedência do pedido.
Cumpre registrar que o art. 18 da Lei n° 7.347/1985 exige a comprovação de má-fé da parte
autora para sua condenação em honorários de advogado, custas e despesas processuais, mas
não para a condenação ao ressarcimento de honorários periciais adiantados pela parte adversa.
No mais, a sentença está de acordo com tese repetitiva firmada pelo Superior Tribunal de Justiça,
in verbis (Tema n° 510/STJ):
Neste sentido:
(...)
II. Trata-se, na origem, de Mandado de Segurança, impetrado pelo Estado de São Paulo,
em razão da decisão judicial proferida nos autos de ação civil pública ajuizada pelo
Ministério Público do Estado de São Paulo, que determinara que o impetrante – por meio
do Fundo Estadual de Defesa dos Interesses Difusos - FID, órgão vinculado à Secretaria da
Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo – efetuasse o adiantamento da
verba honorária do perito, em processo do qual não é parte. O Tribunal de origem denegou
a ordem, concluindo que "o art. 18, da Lei n. 7.347/85 proíbe o adiantamento de custas,
emolumentos ou despesas com perícia por parte do Ministério Público, salvo se
comprovada eventual má-fé", ressaltando, ainda, a inaplicabilidade, no caso, do art. 91 do
CPC/2015.
(...)
V. Cabe destacar que "não se sustenta a tese de aplicação das disposições contidas
no art. 91 do Novo CPC, as quais alteraram a responsabilidade pelo adiantamento
dos honorários periciais; isto porque a Lei 7.347/1985 dispõe de regime especial de
custas e despesas processuais, e, por conta de sua especialidade, a referida norma
se aplica à Ação Civil Pública, derrogadas, no caso concreto, as normas gerais do
Código de Processo Civil" (STJ, RMS 55.476/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2017). Em igual sentido: STJ, AgInt no RMS 60.339/SP,
Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 26/08/2020; AgInt no RMS
61.818/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de
13/04/2020; AgInt no RMS 59.106/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA
TURMA, DJe de 21/03/2019; AgInt no RMS 56.454/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 20/06/2018.
(STJ, RMS n° 65.086/SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe:
19/04/2021).
Por fim, deixo de condenar o IBAMA ao ressarcimento de honorários porque, muito embora tenha
sido admitido no polo ativo da demanda, a regra aplicável ao Ministério Público Federal aplica-se
igualmente à autarquia coautora.
Dispositivo
É como voto.
EMENTA
1. Trata-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal fundada na possível
ocorrência de dano ambiental na área de preservação permanente do entorno do reservatório
d’água da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira. As preliminares de nulidade da decisão saneadora e
do laudo pericial têm relação direta com a delimitação da extensão da área de preservação
permanente e, portanto, confundem-se com o mérito da causa e com ele serão analisadas.
2. Há no atual Código Florestal dois regramentos distintos para fixação da área de preservação
permanente no entorno dos reservatórios d’água artificiais de usinas hidrelétricas, a saber: (i)
aplica-se a regra do art. 62 àqueles que “foram registrados ou tiveram seus contratos de
concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de
agosto de 2001” e (ii) aplica-se a regra do art. 5°, caput, às demais hipóteses.
5. Demonstrado por prova pericial que não houve intervenções na área de preservação
permanente, correta a sentença de improcedência do pedido.
6. O art. 18 da Lei n° 7.347/1985 exige a comprovação de má-fé da parte autora para sua
condenação em honorários de advogado, custas e despesas processuais, mas não para a
condenação ao ressarcimento de honorários periciais adiantados pela parte adversa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à
unanimidade, decidiu negar provimento às apelações e ao reexame necessário, nos termos do
voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MARLI FERREIRA
e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE. Ausente, justificadamente, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE ,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.