Engenho e Arquitetura - Geraldo Gomes

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GERALDO GOMES

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ARQUILAPIRA CM,
GERALDO GOMES

Fundação
Gilberto Freyre
Capa Agradecimentos Especiais
Engenho Poço Comprido, Vicência, iara,
tórico e Geográfico Pernam
Pernambuco Instituto Arqueológico, His Artístico Nact
Instituto do Patrimônio Histórico e
Rec
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Gravura em couro atribuída
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Abr aha m Ver hoe ven , Pç Nacional de Desenvol e Artístico i de Pernam
buco - F UNDAR
Histórico
Antuérpia, cerca de 1625 Fundação do Patrimônio

no eto
Coordenaçã o Editorial e Proj
Gisela Abad

Fotografias
do autor, Geraldo Gomes,
salvo referências em legendas
Revisão
Consultexto

l
Inserção da Revisão Textua
Joana Siqueira

Digitalização de Desenhos
Claudevane Pessoa
José Martins
Nohab Rocha

FUNDAÇÃO GILBERTO
FREYRE
CONSELHO DIRETOR
Presidente
Sonia Maria Freyre Pimentel
Vice-Presidente
Maria Cristina Suassuna de Mello Freyre
Conselheiros
Albano do Prado Pimentel Franco
Antônio Alves Pimentel Filho
Arthur Reynaldo Maia Alves
Fernando de Mello Freyre
João Pereira dos Santos
José Antônio Gonsalves de Mello
Josué Souto Maior Mussalém
Odilon Ribeiro Coutinho
Reinaldo da Rosa Borges de Oliveira

ADMINISTRAÇÃO Rua Dois Irmãos, 320


Apipucos . Recife . Pernambuco . Brasil
Presidente
Sonia Maria Freyre Pimentel 52071 440
o Fone 081 441 1733
Vice-Presidente
Maria Cristina Suassuna de Mello Frey Fax 081 441 2883
re
Superintendente Geral fefQfef.org.br
Gilberto de Mello Freyre Neto wwuw.fef.org.br
BAI CGBNEO 2),
ARQUITANURA O
Tipologia dos Edifícios
dos Antigos Engenhos de Açúcar
de Pernambuco
GERALDO GOMES

Editora

1
Fundação
Gilberto fores
Gomes, Geraldo
Engenho & Arquitetura/Geraldo Gomes
[da Silva).
2. edição revista - Recife: Fundação Gilb
erto Freyre, 1998.
136p. al.
Inclui bibliografia.
| ENGENHOS - ARQUITETURA - BRASIL
CDU 72:664.1(K1)
SUMÁRIO

Introdução 9
A Produção do Açúcar
A Economia 11
A Técnica 12
O Meio 18
O Homem
O Senhor de Engenho 19
O Escravo 20
Características Gerais do Conjunto Edificado
Fatores de Localização 23
Implantação 23
Sistemas Construtivos 26
A Fábrica
Tipologia 31
Origens 37
A Senzala
Tipologia 43
Origens 46
A Casa-Grande
Tipologia 49
Origens 84
A Capela
Tipologia 105
Origens 117
Conclusões 131
Referências Bibliográficas 133
Prefácio

Pernambuco é o açúcar, desde muito cedo. Certo documento


revelado por F. A. Varnhagen indica que a cana-de-açúcar, aqui,
estava instalada antes da chegada do primeiro donatário. Um autor
holandês informa que o Nordeste brasileiro tinha condições de
fornecer o produto a todo o ocidente europeu.
Do Recife partiam as caixas de açúcar, a princípio, nas pobres
caravelas que não tinham condições de defesa e, em consequência,
o produto era conquistado pelos piratas holandeses e ingleses.
Uma fonte jesuítica revela que, no ano de 1589, em nove meses
foram tomadas 73 caravelas carregadas de açúcar. A solução surgiu
em seguida, com a utilização de navios especiais de carga e com
boa defesa: eram chamados de urcas, procedentes sobretudo dos
Países Baixos e dos portos hanseáticos. Com isso, a produção
nordestina consegue introduzir ali quantidades crescentes de
açúcar, de tal modo que, na Holanda, havendo sido instalado
número crescente de refinarias, os consumidores europeus
puderam ser abastecidos com o produto refinado das duas regiões.
Amsterdam tornou-se, então, o centro principal de refinarias, com
o açúcar brasileiro sendo um produto essencial para suas fábricas.
A incorporação do Brasil à monarquia espanhola veio
impossibilitar o comércio direto entre os dois parceiros, até então
sem problemas. Um jesuíta, o padre Jácome Monteiro, na sua
Relação da Província do Brasil, em 1610, registra que Pernambuco
tinha 120 engenhos e deles carregava 130 a 140 navios por ano.
Os Países Baixos, Hamburgo e outras cidades hanseáticas não
podiam prescindir do produto nordestino. Em 1623, foi fundada
nos Países Baixos, a Companhia das Índias Ocidentais, sendo um
de seus objetivos a conquista do parque territorial brasileiro
produtor de açúcar. A primeira tentativa foi contra a Bahia,
reconquistada por poderosa armada Ibérica, nova tentativa dirigiu-
se a Pernambuco, esta bem sucedida.
Durante o período de dominação holandesa (1630-1654), o
açúcar e a indútria açucareira mereceram especial atenção, desde
o relatório de Adriano Verbonk (1630), que a propósito da Várzea
do Capibaribe registrou que havia ali muita e muito belas casas,
residindo ali muita gente de qualidade e várias pessoas ricas, que já
começavam a ser matéria do presente livro. Depois seguem-se
relatórios de grande valor para o tema. De 1636 é um inventário
dos engenhos de autoria de Willem Schott, onde, pela primeira
vez, se indicam aqueles que possuíam casa de moenda e de purgar
construídas umas de taipa e outras de alvenaria. A este inventário
segue-se o Breve Discurso de autoria não indicada, datado de 1638,
que é o primeiro levantamento dos engenhos das quatro capitanias
conquistadas. Logo do ano seguinte é O valioso relatório redigido
por Adriaen Van Der Dussen que é o melhor de todos quanto
foram escritos ao tempo da dominação holandesa.
Mas não somente a atividade açucareira ficava limitada a
esses valiosos relatórios. Particularmente importante é a obra de
um pintor holandês que veio ao Brasil por iniciativa e em companhia
do conde João Maurício de Nassau. Chamava-se Frans Post e a
sua obra pictórica está largamente utilizada pelo autor deste livro,
fundamental sobre os engenhos de açúcar do Nordeste e sobre a

Eres re
arquitetura de suas casas-grandes, capelas, casas de moend as,
de purgar e encaixar e as senzalas dos escravos.
A Geraldo Gomes da Silva devemos, pela primeira vez d
um ilustre e competente arquiteto, um estudo sobre a arquitetur,
o autor a
dos edificios dos engenhos de Pernambuco, para o qual
da velha região
baseou nos textos e desenhos do passado
açucareira, que ele próprio escrupulosamente visitou, fazendo às
observações referidas neste livro, essencial para a história
pernambucana.
A Geraldo Gomes da Silva quero agradecer o honroso convite
que me fez para escrever o presente prefácio, participando da edição
deste livro, tão valioso para a história desta região.

José Antonio Gonsalves de Mello


Introdução

Em 1976, chefiei a equipe técnica da Fundação de Desenvolvimento


da Região Metropolitana do Recife (FIDEM), que elaborou o Plano de
Preservação dos Sítios Históricos da citada região, quando foram
classificados 18 edifícios remanescentes de antigos engenhos de açúcar.
Em 1980, fui consultor geral da equipe técnica da Fundação de
Desenvolvimento do Interior de Pernambuco (FIAM), que elaborou o Plano
de Preservação dos Sítios Históricos de parte do interior desse estado,
contemplando, então, mais 43 edifícios remanescentes de antigos engenhos
de açúcar.
Em 1984, Gilberto Freyre, abrindo um seminário sobre Arquitetura
nos Trópicos, promovido e realizado no Recife pela Fundação Joaquim
Nabuco, referiu-se à casa-grande dos antigos engenhos de açúcar como
um clássico da arquitetura brasileira.
Nessas três oportunidades, ficou evidente que a arquitetura dos
edifícios dos antigos engenhos de açúcar de Pernambuco nunca fora objeto
de um estudo sistemático.
Foi este o tema da minha tese de Doutorado defendida, em 1990, na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo e
que agora apresento de forma resumida.
Este texto resultou de pesquisas bibliográficas, iconográficas e de
campo, quando visitei cerca de 150 antigos engenhos de açúcar em
Pernambuco.
Para a pesquisa bibliográfica de autores brasileiros, utilizei-me, entre
outros, e essencialmente, das obras de Francisco Augusto Pereira da Costa
e de Gilberto Freyre. O primeiro, autor da monumental história de
Pernambuco escrita em quase cinco mil páginas impressas sob o título de
Anais Pernambucanos, publicada em 1923, embora sem citar suas fontes,
contribuiu decisivamente para situar a economia açucareira na história
política e social de Pernambuco sem significativos subsídios para as
questões específicas da arquitetura. Por outro lado, a visão enciclopédica
de Gilberto Freyre foi extremamente útil na medida que estimulou o
desenvolvimento de estudos peculiares.
De grande valor foram os textos de estrangeiros viajantes e residentes
em Pernambuco no século XIX, como os franceses L. F. Tollenare, L. L.
Vauthier e o inglês H. Koster. Dentre estes, cabe destacar a extraordinária
contribuição do engenheiro francês Vauthier, cujos textos sobre a arquitetura
rural de Pernambuco são tão precisos e valiosos que, não raro,
e
pesquisadores de outras regiões brasileiras os utilizam, por extensão
analogia, para compensar lacunas na história da arquitetura das regiões
que estão estudando.
Uma outra fonte, também do século passado e de inestimável valor, foi
a coleção de escrituras de engenhos Juiz Orlando Cavalcanti, de
propriedade do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico
de Mello,
Pernambucano, cujo presidente, Dr. José Antônio Gonsalves
gentilmente me permitiu a consulta.
do trabalho, quando começei a aventar a
No desenvolvimento
que não a
possibilidade dos tipos aqui identificados terem outra origem
portuguesa ou brasileira, consultei, com resultados compensadores,
especificas nas bibliotecas: British Library de Londres,
bibliografias
Biblioteca José Marti de Havana e
Bibliothéque Nationale de Paris,
Biblioteca Nacional de Lisboa.
No que diz respeito à documentação iconográfica, mais uma vez
Pernambuco foi privilegiado graças à inigualável contribuição dos holandeses
que ocuparam o estado por 24 anos. Neste curto período de tempo (1630 -
1654), os flamengos produziram uma documentação artística sobre o
Nordeste brasileiro e, mais particularmente, sobre Pernambuco, que não
se pode comparar à tímida e insignificante iconografia legada pelos
portugueses em três séculos de colonização. Neste caso, também é frequente
atribuir características à desconhecida arquitetura seiscentista de outras
regiões brasileiras, valendo-se de informações dos holandeses referentes
especificamente a Pernambuco.
Como documentação iconográfica mais recente, foram muito úteis os
levantamentos métricos e fotográficos realizados pela FIDEM e pela FIAM
para a elaboração dos seus Planos de Preservação de Sítios Históricos, já
citados, bem como o acervo fotográfico da Fundação Joaquim Nabuco.
O livro se divide em seis capítulos.
O primeiro trata das questões econômicas, tecnológicas e sociais que
envolvem a produção de açúcar em Pernambuco. Dentre as questões
econômicas, destaca-se a dependência da produção pernambucana em
relação às oscilações do mercado internacional. A análise do meio fisico
indicará as circunstâncias de implantação de técnicas ao longo de quase
quatro séculos. Neste capítulo, ainda se tratará da natureza do trabalho
escravo, que vem a ser a marca mais profunda da sociedade colonial
brasileira e, mais particularmente, da pernambucana.
O segundo capítulo trata das características genéricas do complexo
conjunto de edificios que, por extensão, se chamou de engenho,
denominação especifica de um dos edificios. Para essa caracterização usou-
se, como universo de estudo, não somente os remanescentes de antigos
engenhos como também engenhos que não mais existem e sobre os quais
somente temos referências bibliográficas e iconográficas, numa tentativa
de definição de um quadro geral, nem sempre muito preciso devido às
lacunas de documentação.
Descreverei, neste capitulo, os fatores de localização dos engenhos, as
características físicas de implantação dos edifícios no terreno e os sistemas
construtivos mais frequentes.
Dedico um capitulo às origens e à tipologia de cada um dos quatro
principais edifícios do engenho; a fábrica, ou engenho propriamente dito,
a senzala, habitação dos escravos, a capela e a casa do proprietário,
conhecida como casa-grande.
A bibliografia e iconografia consultadas permitiram identificar as
caracteristicas morfológicas essenciais desses edifícios e especular sobre
as prováveis origens de seus partidos arquitetônicos. A classificação
tipológica resultou da análise dessas mesmas características.
Algumas das teses levantadas são apenas confirmação e
desenvolvimento de idéias já conhecidas, outras podem ser consideradas
inéditas, não somente pelos argumentos como também pela ênfase aqui
empregada.
A Produção do Açúcar

Hoje, o açúcar não tem a mesma importância que assumira há cinco


na mesma escala. A Economia
séculos atrás no mercado internacional. Nem é prod
e, devido ao seu
No século XV, o açúcar era considerado uma especiaria
alto preço, não estava ao alcance de muitos. Produzi do em pequena
de figurar, na Europa, como
quantidade, era tão raro e procurado a ponto
p.
dote altamente prezado em enxovais de rainhas (Prado Júnior, 1977,
28).
Sua obtenção, através de processo industrial, era mais complexa
do que a das demais especiarias contemporâneas, simples produtos
agrícolas.
A cana-de-açúcar, provavelmente originária das baixadas
indianas de Bengala ou do sudoeste asiático, logo chegou à Pérsia e daí
foi levada pelos conquistadores árabes para a costa oriental do
Mediterrâneo.
A cultura da cana e a produção do açúcar, sem demora, foram
dominadas pelos portugueses que as teriam assimilado na Sicilia e a
introduziram na ilha da Madeira, estimulados por comerciantes
genoveses. A produção de açúcar nessa ilha cresceu muito em pouco
tempo e já era a maior do Ocidente no final do século XVI. Contudo,
assim como cresceu, praticamente desapareceu do comércio
internacional com a competição do açúcar produzido igualmente por
colonizadores portugueses em terras do Brasil.
Os portugueses, no século XVI, encontravam-se em dificuldades
econômicas e as suas viagens, mais do que aventuras, pareciam
tentativas desesperadas de encontrar compensação para os seus prejuízos
comerciais. Frustrados por não terem encontrado, no Brasil, os metais
preciosos que os espanhóis saqueavam então dos povos maias, aztecas
e incas, restou aos portugueses fixar-se em terras brasileiras com espírito
de
empresarial, procurando tirar delas o maior proveito com a produção
uma mercadoria de alto valor no comércio internacional.
Esse foi o verdadeiro sentido da colonização européia nos trópicos,
no Brasil
de que o Brasil é um flagrante exemplo. A exploração do açúcar
Assim se
era um negócio da Coroa Portuguesa e o rei era um mercador.
explica o empirismo das leis portuguesas, modificando-se na colônia
particulares quando coincidentes com
brasileira ao sabor de interesses
o mais alto interesse do negócio real.
Os interesses comerciais eram tão superiores aos demais que o
por ocasião
próprio território do Brasil chegou a ser objeto de barganha
diplomacia portuguesa chegou
da ocupação holandesa. Neste período, a
ingleses, propondo ceder-lhes as
a entabular negociações junto aos ao
em troca da defesa das que ficavam
capitanias do Nordeste brasileiro
O negócio só não foi
sul do rio São Francisco (Melo, E. C., 1975, p. 96).
plena guerra civil.
fechado devido à situação interna da Inglaterra, em
integrou à comunidade
Por pouco, metade do Nordeste brasileiro não se
britânica.
melhores, de
Se a situação econômica de Portugal não era das
implantação da manufatura
onde vinha , no século XVI, o capital para a
da metrópole também.
de açúcar no Brasil? De italianos, flamengos e religiosas
com certeza na Bahia e no século XVIII, ordens
Na colônia,
para
empréstimos
auferiram rendas provenientes de juros sobre
financiamento da produção de açúcar.
portuguesa
O açúcar foi uma excelente mercadoria para a coroa
produto de exportação durante todo o período
e figurou como principal
colonial, situação esta que perdurou até meados do século XIX. Até
aurífero, o açúcar manteve sua posição de
mesmo no auge do período
liderança como produto de exportação.
Mas a posição privilegiada do açúcar em relação aos demais
produtos da colônia brasileira já não tinha o mesmo significado da situação

11
excepcional vivida no século XVI, quando era absoluto no mercado
internacional. No fim do século XVIII, o Brasil perdeu a colocação de
principal fornecedor de açúcar nesse mercado para o Haiti, que
desenvolvera técnicas de produção para compensar a escassez e pobreza
de suas terras. Daí caracterizar-se como estagnada a técnica que, de
fato, pouco ou quase nada se modificou nos três séculos da colônia
ortuguesa do Brasil.
: “os lucros compensavam os custos, por que mudar? Além disso,
havia sempre a possibilidade de gozar de certos privilégios concedidos
pela Coroa, a título de incentivo, para ressarcir os investimentos, via de
| as E
regra pouco vultosos.
Um exemplo desses incentivos foi resultado de uma provisão de
a qual os
Mem de Sá, datada de 16 de março de 1570, segundo
proprietários não pagariam tributos por engenhos que fossem erguidos
dentro de 10 anos (Azevedo, F., s.d. p. 45). Essa provisão foi se renovando
por mais de um século, embora fosse evidente que os senhores de
engenhos os reerguiam nos mesmos sítios como se tivessem sido
programados para não durar mais do que os 10 anos que lhes davam o
direito à isenção de impostos. Isso explicaria o aspecto de provisório
que possuem alguns edifícios dos engenhos retratados pelo pintor
holandês Frans Post no século XVII.
As medidas protecionistas persistiram até a primeira metade do
século XVIII, resguardando os senhores de engenho das oscilações de
preço do açúcar no mercado internacional. Nesse mesmo século, a
participação do Brasil no comércio internacional do açúcar se reduzira
a 10% devido à produção da mesma mercadoria nas Antilhas e na Ásia.
Com a revolução e consequente independência do Haiti, em 1804,
seguiu-se um período de instabilidade política que iria alterar a situação
privilegiada que esse país havia conquistado no mercado internacional
de açúcar. O Brasil e Pernambuco pouco lucraram com isso porque se
fortalecia um outro país produtor, caribenho, Cuba, para onde emigraram
os capitais franceses expulsos do Haiti.
No século passado, com muita resistência por parte dos senhores
de engenho, a manufatura do açúcar evoluiu para o emprego de novas
técnicas e da máquina a vapor, mas logo cedeu à industrialização que
chegou no fim desse mesmo século sob a forma de engenhos centrais e
de usinas.
A característica essencial da economia do açúcar em
Pernambuco, enquanto existiram engenhos, foi a sua inserção no
,
mercado internacional razão mesmo de sua criação.
A Técnica
O açúcar de cana é o produto de um processo de manufatura
simples mas que requer um trabalho intenso e contínuo. Sua produção
compreende várias tarefas que são, em resumo: plantar, colher e moer a
cana para extrair-lhe o caldo, que será cozido, decantado, purificado e
embalado.
. A fase agricola não requereu, em Pernambuco e durante três
séculos, o emprego de técnicas mais avançadas devido à excelência das
terras e à natureza da própria cultura. A cana, uma vez plantada pode
ser colhida por quatro vezes, uma por ano, sem necessidade de ser
replantada.
A tarefa mais penosa é a da colheita que, ainda hoje, se faz com
instrumentos rudimentares como o facão e a foice.
| Opreparo da terra foi feito com enxadas até o século passado. No
início do século XIX, com as notícias sobre as técnicas utilizadas nas
Antilhas, a não utilização do arado pelos agricultores pernambucanos
foi considerada, equivocadamente, como indício de atraso tecnológico.
Na realidade, o solo em que ainda se cultiva a cana em Pernambuco é
O
massapê, úmido, viscoso e que opõe uma considerável resistência ao
deslocamento de arados puxados por bois.
O isolamento imposto pela metrópole à colônia do Brasil explica
a ignor ância dos senhores de engenho em relação ao que se passava em
outros países. Deslumbrados e, ao mesmo tempo, desconfiados, 08

12
produtores pernambucanos tomaram conhecimento, no inicio do século
XIX, de novas técnicas de manufatura do açúcar.
Um outro parâmetro para avaliar a agricultura canavieira, em
pernambuco, diz respeito ao tipo de cana. Por todo o período colonial, a
chamada cana Crioula predominou em Pernambuco. Dois anos depois
da ocupação da Guiana Francesa, iniciada em 1808 como parte das
Guerras Napoleônicas, o governador português enviou para o jardim
botânico de Pernambuco mudas da cana Oitati ou Bourbon, nativa no
Taiti e cultivada naquela colônia francesa. As mudas foram depois
distribuídas para os senhores de engenho de Pernambuco que passaram
a cultivá-la e conhecê-la como caiana, corruptela de Caiena, capital da
Guiana francesa. Este tipo de cana, maior, mais resistente à estiagem e
com maior teor de açúcar, substituiu a cana Crioula e passou a ser a
variedade predominante por todo o século XIX (Eisenberg, 1977, p. 59).
Outros procedimentos técnicos que visam a otimização da
produção como a irrigação, a drenagem e a utilização de adubos não
têm registro na agricultura canavieira de Pernambuco até fins do século
passado. Esses procedimentos eram necessários nas Antilhas, maiores
concorrentes do Brasil no mercado internacional, devido às condições
meteorológicas e mesológicas daquelas regiões, mas eram dispensáveis
em Pernambuco, pelos mesmos motivos.
A racionalização da exploração dos recursos naturais em
Pernambuco poderia ter resultado em aumento da produção, redução
de custos e, consequentemente, melhores condições de concorrer no
mercado internacional, mas tudo indica que os produtores ali já haviam
definido os limites dos seus investimentos, apenas suficientes para
manter a manufatura.
O principal problema da produção de açúcar foi, no entanto, o da
moenda.
Há vagas notícias sobre a utilização de energia humana associada
a pedras de mó e até mesmo uma gravura holandesa que ilustra muito
bem esse processo de esmagar as canas. Moinhos de vento, em
Pernambuco, se chegaram a existir, o foram em quantidade desprezível.
Mesmo considerando as dificuldades técnicas a serem superadas
para fabricar um mecanismo de funcionamento razoável, o que
determinou o rendimento do engenho foi mesmo a força motriz da
moenda.
A água e os animais irracionais dividiram as preferências dos
senhores de engenho, mas a primeira era insuperável como fonte de
energia de melhor rendimento. A produção de um engenho a roda d'água
nem todos
chegava a dobrar em relação ao movido por animais. Mas
engenho num sítio onde houvesse água que se
podiam montar um
para uso no período da colheita e não tinham outra
pudesse represar
no
alternativa além da tração animal.
aram primeiro
No caso da tração animal, tudo indica que se utiliz
crônic as uma unanimidade
bois e depois cavalos, embora não haja nas
e menos velocidade
quanto a essa ordem. Enquanto os bois têm mais força
se inverte o que pode levar à conclusão do
com os cavalos a situação
engenho, conforme as exigências do
emprego de ambos, num mesmo o
processo de manufatura.
os eram movido s com rodas d'água ou com
Via de regra, os engenh
o caso do engenh o Novo de Santo Antônio ,
animais. É conhecido, no entanto,
município de Goiana
montado por Francisco de Vasconcelos no atual
moenda s, duas movida s a água e uma a
que, no século XVII possuía três
de um engenho de grandes
animais (Costa, F. A. P., 1983, p. 87). Tratava-se
para moer. Neste caso,
dimensões com uma grande quantidade de canas
água para mover as duas
existiria o risco de diminuir a quantidade de
omper, daí a utilidade da
rodas durante a moagem que não podia se interr
energia extraordinária
tração dos animais como uma garantia de fonte de
era freque nte ou excepcional.
ou complementar. Não se sabe se esse artifício
13
Roda d'água de um engenho de A preferência pelas rodas d'água era tão grande que muitas delas
açúcar, segundo gravura holandesa chegaram a ser utilizadas até no século atual. Introduzidas em Portugal
do século XVII.
pelos mouros e depois levadas para a Ilha da Madeira, chegaram ao Brasil
pelas mãos de fabricantes bastante habilidosos.
A roda d'água, com todas as suas engrenagens em madeira, era um
brilhante fruto da engenharia mecânica. Foi esse engenho que deu nome
ao edifício que o continha e ao complexo agrícola-industrial-residencial
onde se produzia o açúcar.
A roda d'água, sempre na vertical, tinha o diâmetro de
aproximadamente sete metros. Acoplada ao mesmo eixo da roda d'água
havia uma outra roda menor, dentada, chamada rodete, que transmitia o
movimento a uma roda maior, esta horizontal e com o mesmo diâmetro da
roda d'água e que se chamava de bolandeira. O número de dentes do rodete
era de um terço dos que tinha a bolandeira. Assim, enquanto o rodete
girava três vezes a bolandeira girava uma só. O eixo vertical da bolandeira,

Engenho da Torre, movido a animais,


no Recife, segundo James
Henderso n em seu livro À history of
Brazil, 1821.

14
revestido de um cilindro dentado e reforçado com aros de ferro
transmitia o movimento a outros dois cilindros paralelos, um de cada
lado, igualmente dentados e reforçados. Entre esses cilindros é que
assava a cana. Por três séculos, esse engenho manteve-se sem
significativas alterações, mas considerando-se a sua complexidade,
ode-se imaginar os cuidados que inspirava para que não fossem
interrompidas as operações de moagem.
Apesar de continuar satisfazendo os senhores de engenho, as
rodas d'água, na metade do século XIX, eram consideradas ultrapassadas
pelos viajantes estrangeiros. O engenheiro francês Vauthier, que residiu
em Pernambuco de 1840 a 1846, achava que elas não eram obras-primas
de mecânica (Vauthier, 1975, p. 89).
O fato é que, desde o século XVI até o atual, os dois tipos de
engenho, à água e a animais, existiram em Pernambuco obedecendo às
contingências de sua implantação no meio físico e também dependendo
das posses de seus proprietários. Em todos os documentos portugueses
do século XVI e holandeses do século seguinte, os engenhos movidos à
água aparecem em maioria.

As inovações na técnica de moagem da cana somente iriam surgir Engenho Aurora, em Vicência,
segundo levantamento de Manoel
no século XIX. A maior delas foi a máquina a vapor, já conhecida no Haiti Bandeira, datado de 1961.
em fins do século XVIII, mas a sua adoção no Brasil e, mais Fonte: Fundação Joaquim Nabuco
particularmente,
em Pernambuco, não foi massiva nas primeiras décadas do século passado.
A modernização da produção de açúcar nos países produtores
concorrentes adquiria um outro ritmo. Em Cuba, o primeiro engenho a
vapor foi instalado em 1796. Em 1860, 70% dos 1.350 engenhos cubanos
usavam máquinas a vapor (Eisenberg, 1977, p. 238).
Data de 1817 a instalação do primeiro engenho a vapor em
Pernambuco. Nesta mesma província, em 1854, existiam cinco engenhos
a vapor, 101 à água e 426 a animais (Diegues Júnior, 1952, p. 23).
Tudo indica que a escravidão tenha sido o maior entrave à Moenda a vapor instalada no
engenho Caraúna, Pernambuco,
modernização da produção em Pernambuco. No entanto, a relutância em segundo William Hadfield em seu
senhores de
adotar as máquinas a vapor não foi um postura exclusiva dos livro Brasil, the river Plate and
Agricultor Brasileiro, Falkland islands, 1854.
engenho de Pernambuco. Taunay, em seu Manual do
Janeiro em 1839, aconselhava os pequenos e médios
publicado no Rio de
alegando consumo
agricultores a não adotarem as máquinas a vapor,
excessivo de combustível, custos altos de reparações devido à participação
1839, p. 31).
de operários especializados e riscos de explosões (Taunay,
máquinas a vapor foram importadas da Inglaterra e,
As primeiras
logo surgiriam dificuldades com a manutenção de
naturalmente,
equipamentos tão avançados para a região. Por isso, começaram a surgir,
no Recife, fundições que se propunham a fabricar peças de reposição e
assim diminuir os custos de manutenção das máquinas. A mais famosa
dessas fundições, a Aurora, de Harrington & Starr, cidadãos ingleses ali
radicados, fundada em 1829, forneceria em 1836 para o engenho Caraúna,

15
situado na freguesia do Cabo, em Pernambuco, a primeira máquina a
vapor fabricada inteiramente na América do Sul. l
Logo surgiriam outras como a Bowman, em 1835, que não
fabricavam somente peças de reposição para máquinas a vapor, mas
também componentes arquiteturais como grades para varandas e
portões, escadas e colunas em ferro fundido. Essas pequenas
indústrias não tiveram incentivo algum por parte do poder público,
Pelo contrário, o governo brasileiro, submisso aos interesses dos
industriais europeus, ao mesmo tempo que isentava de impostos a
importação de maquinismos para a agricultura, taxava em até 30%
do valor o ferro bruto e outros metais importantes para as fundições
locais. .
A fase seguinte de manufatura do açúcar é a do cozimento do
caldo, que se fez, até o início do século XIX, em várias tachas de
cobre, cada uma delas aquecida por baixo por um fogo de lenha. O
melhoramento mais notável nessa fase da produção foi a adoção, com
um século de atraso em relação às Antilhas, da fornalha continua,
também chamada de trem jamaicano.
A fornalha continua tinha o mesmo número de bocas da
anterior, mas com fogo somente em baixo da primeira. O fogo passava
para as outras bocas através de um túnel que diminuía de diâmetro
gradativamente até chegar a uma chaminé, cuja altura era também
função das dimensões do túnel da fornalha. Com o mesmo
rendimento, poupava-se lenha, e entende-se que tenha sido logo
adotada pelas ilhas do Caribe, cujas reservas de matas logo se
esgotariam, se persistisse a utilização da fornalha tradicional. Não
foi o caso do Brasil, onde a abundância das matas induziu os senhores
de engenho a consumi-las até quando suportaram os custos de frete,
pois cada vez elas ficavam mais distantes.
Também provocou polêmica a proposta de introdução de um novo
combustível para as fornalhas: o bagaço da própria cana, já utilizado nas
Roda d'água do engenho Três Marias,
em Quipapá. Antilhas desde fins do século XVII. Mais uma vez a disponibilidade de matas,
isto é, lenha, foi a razão da reação dos senhores de engenho supostamente
f
lastreada em argumentos técnicos. Contudo, a maioria dos senhores Engenho pernambucano.
de engenho, compelidos a atualizar-se, adotaram todas essas inovações Foto, de Juvenito Gomes, do acervo da
no início do século XIX. Fundação Joaquim Nabuco.
Uma das fases mais importantes na produção do açúcar era a
purga ou purificação. Constava de acondicionar o caldo já cozido em
recipientes com forma de cones, que eram colocados invertidos em
andaimes de madeira com orifícios próprios para acomodá-los. Essas
fórmas tinham um furo por onde escorria o mel durante alguns dias.
Depois de submeter-se a alguns procedimentos corretivos, o açúcar se
formava em camadas de cores e valor comercial diferentes. O açúcar
branco, mais caro, ficava em cima, e o açúcar escuro, o mascavo, ficava
na parte inferior dos pães, como eram chamados os volumes depois de
retirados das fôrmas.
As fôrmas dos pães de açúcar eram fabricadas originalmente em
barro, o que explica a existência de olarias nos engenhos desde o século
XVI. No século XIX, existiam fôrmas em madeira e em chapas de ferro
galvanizado. Depois de separados os açúcares de cores e valores
diferentes, eram secos ao sol e embalados para serem transportados e
comercializados.
Desde os primórdios da colonização, os transportes preferidos
pelos senhores de engenho foram o fluvial e o maritimo. Fluvial até a
costa e marítimo até o porto do Recife. Daí a dupla vantagem de
localização dos engenhos nas margens dos rios; o aproveitamento da
energia hidráulica e o transporte fluvial.
Os senhores de engenhos, situados a uma maior distância dos
rios, transportavam seu açúcar em lombos de animais ou em carros de
boi. O açúcar era acondicionado em caixas de madeira até a metade do
século XIX e depois em sacos de algodão. A questão do transporte era
tão importante que, de certa forma, condicionou a própria localização
dos engenhos até a metade do século passado, quando os ingleses
construíram as primeiras ferrovias .
As estradas de ferro expandiram as áreas de cultura da cana e
contribuíram decisivamente para a sua interiorização ao introduzir um
novo meio de transporte, que deveria contribuir para diminuir o custo da
produção do açúcar. Mas os trens chegavam ao Recife sempre carregados,

17
o que não acontecia no sentido inverso, provocando um desequilibrio
nos custos das tarifas consideradas insuportáveis pelos pequenos
produtores. O preço dos fretes até as estações, somados aos fretes
ferroviários propriamente ditos, encareciam a produção dos
pequenos engenhos instalados nas áreas de expansão da cultura da
cana-de-açúcar.
As estradas de ferro prenunciaram a mudança de escala na
economia açucareira que logo se concretizaria com os Engenhos
Centrais e com as Usinas. O grande progresso técnico, representado
pelo transporte ferroviário, não era acessível aos pequenos
produtores de açúcar que, aos poucos e inexoravelmente, foram
sendo envolvidos pelas Usinas, às quais terminaram por se associar
já na condição de fornecedores de cana e abandonando a produção
de açúcar.
Desde o século XVI, a cultura da cana-de-açúcar se instalou
na então Capitania de Pernambuco, promovendo a devastação das
florestas da região por quase quatro séculos ininterruptos. A Zona
da Mata, onde se desenvolveu essa cultura, como diz seu próprio
nome, era coberta de densa vegetação. Dentre outras árvores, o pau-
brasil, já cobiçado antes da cultura da cana, abundava nessa região.
Para liberar áreas para o plantio da cana, arrasavam-se
extensas parcelas da floresta e a maior parte da madeira que daí
resultava ia para a fornalha dos engenhos. Quando acabava esse
combustível, os engenhos passavam a consumir lenha das matas
próximas, que também se extinguiam. Com isso, a mancha da cana-
de-açúcar se alastrava no sentido do interior da região.

O Meio Hoje, a paisagem da região é monótona e difere muito daquela


imagem paradisíaca captada pelos pintores holandeses no século
XVII.
' Mas a derrubada das matas da região não se fazia somente
visando a liberação de terras para a cultura da cana-de-acúcar.
Muita madeira de lei se exportou para Portugal. Em 1775, por ocasião
do terremoto de Lisboa e de sua reconstrução, ocorreram, no porto
do Recife, até duas vezes por mês, maciços embarques de jacarandá,
pau d'arco e sucupira para Portugal (Andrade, M. C., 1974, p. 27).
Nenhuma das madeiras citadas é encontrada hoje em
Pernambuco em quantidade que justifique a sua comercialização.
A utilização dessas nobres e duráveis madeiras não é
frequente na construção dos edifícios que constituíram os antigos
engenhos de açúcar de Pernambuco.
Por quatro séculos, essa região se caracterizou pela
monocultura da cana-de-açúcar. Mas essa cultura não se
desenvolveu em todo o território do estado, que possui três regiões
geográficas distintas e é cortado na direção norte-sul pelo planalto
da Borborema. A faixa de terreno mais próxima do litoral, portanto a
leste do planalto citado, tem largura que varia em torno de 60
quilômetros e é chamada de Região ou Zona da Mata. A faixa que
corresponde ao planalto tem largura de aproximadamente 120
quilômetros e é chamada de Agreste. A terceira região situa-se a oeste
do planalto e é conhecida como Sertão.
Na região da Mata, concentra-se metade da população do
estado.
As diferenças climáticas entre as regiões são qo
Quanto à precipitação pluviométrica, na região da Mata chove E
700 a 2.500 mm por ano, no Agreste de 500 a 1.000 mm e no Sertá
não chove mais do que 600 mm por ano.
te do
A maior parte dos rios do estado se concentra na bo
Atlântico do planalto da Borborema, isto é, na região am : Sé
Esses rios estimularam a instalação de engenhos de açúcar se da
aproveitaram tanto para a força motriz de suas moendas com
de transporte para o litoral.

18
Esses mesmos rios, que tanto facilitaram a vida dos senhores
de engenho até O século XIX, transformaram-se, neste século, em
vias de esgotamento dos resíduos industriais das usinas também
de açúcar, ali instaladas há um século. ,
Na realidade, a região da Mata não é uniforme e pode ser
dividida em duas, a Mata Umida e a Mata Seca. A primeira fica ao
sul do paralelo que passa pelo Recife e a segunda, ao norte. Em
ambas, o solo é constituído, essencialmente, de massapê e de barro
vermelho. .
Na Mata Umida, cujo relevo se caracteriza por morros baixos
e colinas
arredondadas, o solo predominante é o massapê, rico em humo e matéria
orgânica e encontradiço nas várzeas de aluvião e nos fundos dos vales
Devido à existência de grandes espaços favoráveis ao plantio da cana foi
na Mata Úmida que a produção do açúcar mais se desenvolveu e onde se
localizaram, no século XIX, a maioria das usinas.
Na Mata Seca, predominam as chãs de tabuleiros cristalinos e o
solo de barro vermelho, menos fértil do que o massapê para o cultivo da
cana-de-açúcar. Nesta região, cultivou-se também algodão e café, nos dois
últimos séculos. A instalação de usinas nessa região é mais recente e em
menor número do que na Mata Úmida, o que permitiu a sobrevida de
pequenos engenhos até o século atual.

A maioria dos colonos que se estabeleceu em Pernambuco, no século O Homem


XVI, provinha do norte de Portugal, onde predominava a pequena O Senhor de Engenho
colônia
propriedade rural. Isso provavelmente explica a ocorrência na
dos tradicion almente citados e
brasileira de outros níveis sociais além
representados pelos senhores de engenho e pelos escravos.
s variadas
As propriedades onde se cultivava a cana tinham dimensõe
Os altos custos de construç ão e
e nem sempre possuíam engenho. de
tornavam inacessíve is à grande maioria
manutenção de engenhos os
pequenos e médios agricultores. dos
relatório holandês de 1640, somente 40%
Segundo um
e os demais dependiam
engenhos de Pernambuco moíam canas próprias
oriunda de outras
exclusivamente de fornecimento da matéria-prima
dos engenhos representavam
propriedades. Assim mesmo as canas próprias
dos engenhos não possuía
somente 25% do total que eles moíam. Se 60%
ente sem preocupações
plantações de cana, os seus senhores, naturalm
residir a maior parte do tempo
com a fase agrícola da produção, poderiam
na fase industrial (Melo,
na cidade, deslocando-se para o campo somente
E.C., 1986, p. 246). social na zona
Essa divisão de trabalho motivou a fragmentação
e poderia explicar as pequenas
rural de Pernambuco no século XVII retratados
provisório dos edifícios
dimensões, e, em certos casos, O caráter
pelos pintores holandeses contemporâneos.
a importância no complexo de
A figura do plantador foi perdendo
atribuições ao senhor de engenho.
produção de açúcar e cedendo suas
rural e, ainda mais, senhor de
No Brasil colonial, ser proprietário certa de razoável
mais do que ter uma fonte
engenho, significava muito que, no
renda; significava um título quase nobiliárquico. É bem verdade que já
Brasil alguns colonos portugueses
primeiro século, vieram para O de um
na metrópole , mas eram uma minoria. A propriedade
eram nobres de nobreza.
engenho era fundamental para manter ou conseguir um título
sequestrado, o senhor de engenho
Quase se comportando como um
geográfica e social que em nada
improvisou-se nobre numa realidade como parte de uma classe
lembrava sua origem e não deve ser considerado
mesmo nas fases alternadas
social estável, uniforme e toda-poderosa, nem
preços no mercado internacional.
em que o açúcar alcançou os melhores
senhores de engenho foram
Algumas das prováveis residências dos XVII, como edifícios sólidos
retratadas pelos pintores holandeses, no século
essas casas distavam
e construídos com apuro. O que não se sabe é o quanto
das cidades. A distância que separava os engenhos das cidades pode ter

19
também determinado a dupla residência dos seus proprietários. Há noticias
da existência de residências habituais em engenhos mais próximos ao Recife
como a do morgado João Paes, na freguesia do Cabo.
Existem alguns indícios da fixação dos senhores de engenho no campo
já a partir do século XVII. A propósito, numa crônica de 1761, Frei Jaboatão,
referindo-se à freguesia de Ipojuca, mais distante do Recife do que a freguesia
do Cabo, afirma que os senhores de engenho nem casas próprias tem na
povoação para a sua residencia como as conservavam, para isso os seus ascendentes
e antepassados (Jaboatan, 1980, p. 471).
Conclusivamente, o que determinou a dupla residência dos senhores
de engenho foram as suas posses. Enfim, para perceber as limitações dos
senhores de engenho é essencial entender suas relações com os comerciantes.
No século XVII, todo o comércio estava nas mãos dos mascates, como
eram conhecidos os comerciantes, geralmente portugueses, que residiam no
Recife. Os senhores de engenhos só produziam açúcar e compravam todos os
demais gêneros aos mascates. Era muito frequente o endividamento dos
primeiros, que chegavam a comprometer antecipadamente parte ou toda a
sua produção de açúcar. Sem alternativas, os senhores de engenho se
submetiam às exigências dos masoates. Os senhores de engenho dominavam
o processo de produção, mas não tinham forças para influir na comercialização
internacional do açúcar. .
Essa situação de contínuo conflito, com aparentes e efêmeras vitórias,
ora dos senhores de engenho, os nobres da terra, ora dos mascates, perdurou
durante os séculos XVII e XIX e só terminou em fins do século passado com a
capitulação dos primeiros, dessa vez diante dos usineiros.

O Escravo Os primeiros portugueses que vieram para Pernambuco, em quantidade


insuficiente para cuidar de todas as fases de produção do açúcar, se valeram
da mão-de-obra escrava indígena e depois africana. No primeiro caso,
enfrentaram dois consideráveis obstáculos: a cultura do índio brasileiro e a
reação dos religiosos.
O índio homem caçava, pescava e guerreava. A agricultura era uma
aitividade exclusiva das mulheres índias. Além disso, não havia entre os índios
a compreensão da necessidade de produzir qualquer coisa para vender. Viviam
em função da satisfação imediata de suas necessidades e a natureza pródiga
lhes oferecia tudo sem necessidade de guardar qualquer coisa para consumir
em oportunidades posteriores. Por outro lado, os religiosos, especialmente os
jesuítas, queriam salvar as almas dos índios pela sua catequese e para isso
tinham a cobertura da Coroa Portuguesa. A proibição de apresamento dos
índios foi desrespeitada frequentemente pelo uso de estratagemas por parte
dos senhores de engenho.
As relações entre os senhores de engenho e os indígenas foi sempre de
antagonismo, a se julgar pelo depoimento do Padre Anchieta que, no século
XVI, afirmava que os portugueses não têm índios amigos que os ajudem porque
os destruiram todos (Anchieta, 1933, p. 306). .
A percentagem de escravos índios envolvidos na produção de açúcar
foi diminuindo à medida que os senhores de engenho enriqueciam e
importar escravos africanos, o que passou a acontecer à partir da segunda
metade do século XVI e não era novidade para os portugueses. De fato, à
escravidão negra já existia em Portugal desde o século XV.
eram enprane
Em 1551, dos 100 mil habitantes de Lisboa 9.950
africanos. A diferença entre a escravidão de africanos em a
Brasil é que lá a mão-de-obra escrava era empregada GE 1988,
domésticos e aqui nas tarefas de campo e da manufatura (Schwartz,
o iramentE
.23). ; s buco

p-28 A mão-de-obra que sustentou a produção de açúcar


foi a do escravo africano, cuja presença ali foi domisiénte, E,
e por quase todo o século XI.
nos três séculos de colonização
É o de trabalho P
O escravo negro foi tratado como um insum s de engenho lhes
esse período. Todos os cuidados que 08 senhi pelo capital que
devem ser entendidos como Zé
dispensavam
representavam.

20
A titulo de exemplo, convém citar o costume de se ter sempre ao lado
da moenda dos engenhos um facão bem afiado. Um pequeno descuido do escravo
ne alimentava a moenda com canas poderia custar-lhe a mão ou o braço, mas
o facão, manejado com precisão € rapidez por outro escravo ou pelo feitor,
evitava sua morte por esmagamento. Salvava-se a vida do escravo, isto é, salvava-
se o investimento. Não era raro encontrar-se nos engenhos escravos sem um
braço, até sem os dois. Durante a moagem os escravos quase não dormiam eos
seus aparentes descuidos podiam significar, de fato, cochilos em pé.
O escravo não usufruia, de forma alguma, do resultado do seu trabalho.
Daí o seu desinteresse, os acidentes e até mesmo os incidentes. Como o
mecanismo dos engenhos exigia atenção e conservação continuas, pequenos
deslizes, às vezes propositais, faziam parar a produção, o que significava repouso
os exaustos escravos ou castigos corporais, se os senhores de engenhos
desconfiassem de atos de sabotagem.
Mas tratar os escravos como coisas parecia ser consensual na
sociedade escravista colonial. Até mesmo a Igreja, que tanto lutou para
preservar a liberdade dos indígenas e, em seguida salvar-lhes as almas,
pouco ou nada fez em relação aos escravos africanos.
Na realidade, algumas ordens religiosas eram proprietárias de
engenhos de açúcar e usavam os escravos africanos como mão-de-
obra. Há indícios de que, nesses casos, o tratamento dispensado aos
escravos tenha sido bem diferente. Henry Koster, viajante inglês,
teria conhecido no princípio do século XIX, o engenho Camassari,
em Pernambuco, de propriedade dos carmelitas, onde as escravas,
mulatas bonitas e moças pondo as canas nas moendas, vestiam casacos
de algodão estampado, camisas de cambraia musselina e tinham no
pescoço e nas orelhas enfeites de ouro. Neste mesmo engenho, ainda
segundo o viajante inglês, os escravos participavam dos lucros
auferidos na produção do açúcar (Koster, 1978, p. 244).
A presença da capela nos engenhos de açúcar não deve ser
entendida somente como demonstração de fé dos senhores de
engenho e de seus familiares. A idéia de usar a religião católica como
aliada na sua relação com os escravos negros não parece ter sido
estranha aos senhores de engenho. Taunay, no seu Manual do
Agricultor publicado em 1829, dizia que a religião católica romana
era a mais apropriada ao gênio dos pretos, crédulos e supersticiosos
por natureza. No mesmo manual, o autor explicita a função da religião
quando, ainda em relação aos escravos, afirma que a religião rehabilita
a sua condição e consagra suas relações com os senhores que não
aparecem mais aos seus olhos como proprietários, ou como tiranos, mas
sim como pais, como retratos do mesmo Deus, aos quais devem amar e
servir com o sacrifício de todos os seus trabalhos e suores, para
merecerem a bênção do Céu e uma eternidade de benaventurança
(Taunay, 1839, p. 14).
O fato inconteste é que o negro não somente foi um fator
determinante na produção de açúcar em Pernambuco como também se
constituiu numa marca indelével na sociedade colonial e imperial, fosse
ela rural ou urbana.
A sociedade usava o negro e dependia dele. O escravo negro
chegou até a influir no modo de construir na medida que substituía certas
funções do edifício. A propósito, Lúcio Costa, em 1951, dizia que amáquina
brasileira de morar ao tempo da Colônia e do Império, dependia dessa mistura
de coisa, de bicho e de gente, que era o escravo. Se os casarões
remanescentes do tempo antigo parecem inabitáveis devido ao desconforto
é porque o negro está ausente. Era ele que fazia a casa funcionar /
..... /o
hegro era esgoto, era água corrente no quarta, quente e fria, era interruptor
de luz e botão de campainha; o negro tapava goteira e subia vidraça
quebrada,
era lavador automático, abanava que nem ventilador (Costa,
L., 1951).
A arquitetura que se realizou na zona rural de Pernambuco não é
consequência exclusiva e inevitável das relações sociais mas as reflete.

21
Características Gerais do Conjunto Edificado

O fator que mais influiu na localização dos primeiros engenhos Fatores de Localização
foi, sem dúvida, a proximidade de água corrente e perene. Em primeiro ç
lugar, porque a água era, de longe, a melhor fonte de energia e, em
segundo, porque poderia facilitar o transporte do produto.
Não eram muito grandes os primeiros engenhos pernambucanos.
Para se ter uma idéia de suas dimensões, basta lembrar que uma parte
dos bairros que formam a atual cidade do Recife tem seus nomes
derivados de antigos engenhos ali existentes.
O tipo de solo foi também um fator importante para escolha do
sítio onde se implantaria o engenho. Neste caso, a região da Mata Sul ou
Úmida, onde predominava o massapê, foi a preferida nos primeiros
séculos.
A proximidade de matas foi um terceiro fator determinante, pois
dali se extraiu o combustível das fornalhas dos engenhos por três
séculos.
Um último fator determinante na localização foi a distância dos
índios. Pelo menos, nos dois primeiros séculos, quanto mais longe
estivessem os índios melhor, porque os engenhos não dispunham de
eficientes meios de defesa.
Essas eram as condições ideais de localização somente acessíveis
aos primeiros senhores de engenho privilegiados pela possibilidade de
escolha dos seus sítios. Mais ao norte e mais ao sul, foram se instalando
outros engenhos, à medida que rareavam os sítios ideais mas sempre
próximos à costa para diminuir os custos de transporte do produto para
o porto do Recife.
Interiorizar os engenhos, inevitável devido à crescente escassez
das matas fornecedoras de lenha para as fornalhas, significou também,
quando se distanciavam das margens dos rios, a utilização da força
animal para mover as moendas.
Somente no século XIX, com a utilização do bagaço de cana como
combustível, da máquina a vapor, como fonte de energia, e das ferrovias,
como meio de transporte, esses fatores de localização dos engenhos
diminuíram de importância.

Engenho significava, até fins do século XIX, uma propriedade Implantação


rural com cultura de cana e uma sede constituída de edifícios que
serviam a fins diversos. O engenho propriamente dito, que dera nome a
toda a propriedade, ocupava um dos edifícios que era também chamado
de moita ou de fábrica. Sob o mesmo teto deste edifício, normalmente se
moia a cana e se cozinhava o seu caldo. Num edifício contiguo ou próximo,
conhecido como casa de purgar, se processava o branqueamento do
açúcar. Ligados à agricultura e à produção do açúcar poderiam existir
ainda edifícios destinados a depósitos, oficinas e estrebarias.
Para fins habitacionais, havia, a casa do proprietário, conhecida
como casa de vivenda e como casa grande, eventualmente a casa do
administrador e as casas dos escravos, ou senzalas.
Com raríssimas exceções, todos os engenhos tinham uma capela
para o culto da religião católica professada pelos proprietários e seus
familiares, pelos trabalhadores livres e pelos escravos.
Os edifícios mais importantes do engenho eram a fábrica, a
senzala, a capela e a casa-grande. Nos dois primeiros séculos, esses edifícios
distavam pouco entre si e não se percebia um padrão rigido para o seu
assentamento no terreno. Contudo, a observação dos quadros dos pintores
holandeses Post e Wagener indica, pela constância de algumas
características, a lógica de implantação dos edifícios. Assim, a fábrica está
sempre na parte mais baixa do terreno, o que se explica, em parte, pelo
aproveitamento da água como força motriz. Em nível mais elevado do que a

23
Reprodução de um quadro de Frans fábrica está a casa-grande, o que se deve, provavelmente, à necessidade
Post retratando um engenho de domínio visual das atividades manufatureiras por parte do senhor de
pernambucano no século XVII.
engenho. O caráter simbólico da capela se evidencia pela sua situação:
acima ou no mesmo nível da casa-grande.
Na iconografia holandesa, não aparece nenhum edifício que
lembre as características morfológicas das senzalas referidas pelos
cronistas estrangeiros no século XIX. Talvez ainda não existisse um
edificio específico para a habitação dos escravos.
Desses edifícios o único que parece ter sido protegido dos
eventuais ataques de índios ou holandeses foi a casa-grande. Existem
registros somente bibliográficos sobre a ocorrência, no século XVII, de
cercas de pau-a-pique em volta de casas-grandes de engenhos, como
faziam os indígenas em torno de suas ocas.
Nos três primeiros séculos, a relação entre os principais edifícios
de um mesmo engenho parece ter ocorrido somente no que diz respeito
Vista aérea do engenho Poço aos diferentes níveis de terreno. Pereira da Costa, já no nosso século,
Comprido, em Vicência.
refere-se a um pouco provável triângulo perfeito formado por casa-grande,
fábrica e capela do engenho Beberibe, instalado em Pernambuco no
século XVI (Costa, F. A. P., 1983, p. 157). .
A dispersão dos edifícios nesse período pode se dever à
coexistência de indivíduos de classes e raças diferentes e de interesses
conflitantes. No entanto, no século XIX, persistindo a mesma estrutura
social, observa-se um arranjo espacial que sugere uma nova ordem
para a disposição dos edifícios no terreno.
Em fins do século XVIII, o Frei José Mariano da Conceição Velloso
publicava O Fazendeiro do Brasil, que, na realidade, era uma coletânea
de traduções de textos de autores ingleses e franceses sobre as técnicas
de culturas agricolas e de manufaturas nas Antilhas. Dos onze livros

24
Plano Geral de um engenho, se
L. L. Vauthier. ' mo
a. capela
b. casa-grande
c. quarto para os hóspedes
d. senzalas
e. sobradinho, casa do administrador
f. alpendre para os cavalos da
moenda
h. telheiro acima da fornalha
i. casa do bagaço
j. estrebaria
. casa de purgar, destilaria,
armazém de açúcar, oficinas do
carpinteiro, do serralheiro, do
segeiro etc., pavilhão para o fabrico
da farinha de mandioca
1. alpendre servindo para olaria
m,n. portões de entrada e saida do
engenho
o. horta
p terreno plantado de mandioca
q. pasto
r. campos de cana-de-açúcar
Fonte: Des Maisons d'Habitation au Brésil
in Revue de l'Architecture et des Travaux
Publics, Paris, 1853.

publicados dois são dedicados à cultura da cana e produção do


açúcar e dois à cultura do café. Nesses verdadeiros manuais, há claras
e precisas referências à técnica construtiva dos edifícios e, no caso
da cultura do café, à disposição deles formando um pátio interno
retangular.
Não é possível avaliar até que ponto os senhores de engenho
se deixaram influenciar pelas idéias divulgadas por Velloso, mas é
certo que, pelo menos no que diz respeito às técnicas de produção
de açúcar, houve uma reticente adesão. O inglês Henry Koster,
relatando sua estada em Pernambuco em 1816, refere-se ao engenho
que adquirira na ilha de Itamaracá cuja entrada principal era um
espécie de praça formada por muitas construções pertencentes ao
engenho (Koster, 1978, p. 230).
Taunay, no seu Manual do Agricultor Brasileiro, já citado,
sugeria que os edifícios do engenho ou fazenda podem formar os tres
lados de hum grande rectangulo, cuja area formaria um curral para todos
OS usos e serviços (Taunay, 1839, p. 20).

25
Na década de 40 do século XIX, Vauthier registraria, com um
desenho preciso, e de maneira insofismável, essa disposição dos edifícios
formando um pátio retangular, chamando a atenção para o plano geral
que se repetia sempre em outros engenhos de Pernambuco, embora em
proporções diversas (Vauthier, 1975, p. 81).
O plano geral de Vauthier, além da regularidade da disposição
dos edificios, revela dois importantes dados. O primeiro e mais importante
é a destinação de cada um dos edificios, caracterizando assim a
complexidade funcional e social do engenho pernambucano. O segundo,
que pode não ser uma ocorrência típica, é a existência da capela no
meio da casa-grande, dividindo-a em duas zonas distintas. Em
Vista aérea do engenho Pintos, em Pernambuco, geralmente, cada edifício do engenho tinha uma função
Morenos. específica. Em outras regiões do país como, por exemplo, em São Paulo,
no Rio de Janeiro e na Bahia, são conhecidos casos de coexistência de
engenho e fábrica sob um mesmo teto.
Em Pernambuco, as ocorrências mais comuns de justaposição
de edifícios diferentes são as de casa-grande/capela e casa-grande/
ea,
senzala. Neste caso, a senzala contigua à casa-grande se destinava
exclusivamente aos escravos utilizados no serviço doméstico.
Por fim, e ainda com respeito à disposição dos edifícios no terreno,
convém lembrar as recomendações contidas no Manual de Taunay: O
oriente e o sul são as exposições mais favoráveis para a frente das casas
por haver menos sol e melhor viração. O local preferível he uma elevação
mediocre no centro da planície, com hum declive suave da parte da frente e
quase insensivel da banda dos fundos para colocação das dependencias
(Taunay, 1839, p. 20).
Vista aérea do engenho No levantamento efetuado em, aproximadamente, 150 engenhos
Novo-da-Conceição, em Morenos.
de Pernambuco, constatei que a grande maioria das casas-grandes é
implantada, de fato, em meias encostas, e a sua orientação obedece às
recomendações de Taunay.
Os sistemas construtivos foram adotados de acordo com a natureza
de cada um dos edifícios. Assim, é possível encontrar, em um mesmo
engenho, edifícios construídos com sistemas diferentes.
Todos os materiais de construção conhecidos na Europa do século
XVI estavam disponíveis em Pernambuco ou eram fabricados ali com
relativa facilidade. A fragilidade ou durabilidade dos edificios resultava, em
alguns casos do seu valor simbólico e, em outros, das condições econômicas
dos senhores de engenho.
A riqueza criada com a produção de açúcar em fins do século
XVI, em Pernambuco, não se refletiu na arquitetura rural, ora pelo
absenteísmo dos senhores de engenho que possuíam casas mais bem
equipadas nas cidades, ora pelas maiores atenções dedicadas aos
edifícios e equipamentos da fábrica. A iconografia holandesa retrata a
simplicidade e despojamento dos principais edifícios dos engenhos nas
primeiras décadas do século XVII. Essas características são confirmadas
num documento também holandês, datado de 1638, onde se lê que os
portugueses são, em geral pouco curiosos com relação às suas casas e q
direção doméstica, contentando-se com uma casa de barro, contanto que vá
bem o seu engenho ou a sua cultura (Breve Discurso..., 1981, p. 108).

Sistemas Construtivos De fato, a amenidade do clima da região da Mata de Pernambuco


não requer construções robustas e onerosas. Mas esse aparente descaso
em relação à residência senhorial não era uma regra geral, como também
revela a iconografia holandesa. irao dê Bol
A disponibilidade de materiais naturais, como madeiras de ão
qualidade, é também registrada pelos holandeses que se a
mesmo tempo à sua abundância e à escassez de mão-de-obra qua
ara beneficiá-la.
Ê As notícias sobre o uso das taipas são imprecisas porque rar Ei
é possível discriminá-las, isto é, saber quando se referem à e se
ou taipa de pau-a-pique. São simplesmente designadas como pa.

26
Pela própria natureza do sistema, a taipa de pilão não seria
indicada para a construção de fábricas devido ao elevado número de
vãos que este tipo de edifício requer. No entanto, segundo um inventário
holandês dos engenhos situados numa região da Mata Sul de
Pernambuco, havia ali 12 casas de caldeiras de alvenaria e outras
tantas de taipa (Schott, 1981, p. 51).
Os quadros de Frans Post mostram sempre a casa de caldeiras
sob um mesmo teto que abriga a moenda. Este edifício era sempre aberto,
com uma estrutura autônoma de esteios de madeira ou colunas de
alvenaria de tijolos. Resta a possibilidade de emprego de algum tipo de Tijolos com dimensões variadas,
destacando-se as pequenas dos
taipa nos intercolúnios que não se elevavam até o frechal. tijolos de Frisia.
Vauthier, em meados do século passado, informa com precisão a Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
frequência dos dois tipos de taipa em Pernambuco quando afirma que
enfim, encontraremos ainda, procurando bem, casas de taipa que
caracterizam a província de São Paulo, e construções de pau-a-pique de
grande diversidade de espécie. Vauthier chama de taipa o que se conhece
no Brasil como taipa-de-pilão e refere-se à taipa de pau-a-pique, excluindo
o primeiro termo (Vauthier, 1975, p. 47).
O Imperador D. Pedro II, no relato de sua viagem a Pernambuco
em 1859, registra a existência da ruína de uma casa de taipa próxima à
vila do Cabo. A casa era então conhecida como casa do holandês, já existia
em 1790 e sua taipa era muito bem feita (Pedro II, 1950/1951, p. 439).
O fato de uma ruína de uma casa de taipa ter chamado a atenção
do Imperador denota a raridade da ocorrência e devia ser, certamente,
de taipa de pilão porque a taipa de pau-a-pique era muito comum. A
fama que essa casa tinha de ter sido casa do holandês é discutível porque,
ainda hoje, em Pernambuco, quando se quer dizer que um edifício é
muito antigo diz-se que ele é do tempo dos holandeses.
A taipa de pau-a-pique foi o sistema construtivo mais usado nas
casas-grandes e nas senzalas por todo o período colonial e imperial.
Referências a esse sistema existem em documentos portugueses do,
século XVI, em documentos holandeses do século seguinte e em relatos
de viajantes ingleses e franceses do século XIX.
Em algumas casas-grandes retratadas pelos pintores holandeses,
pode-se perfeitamente perceber, sobressaindo do plano irregular das
paredes, os esteios de madeira que constituem a estrutura. Há inclusive
um desses quadros que mostra uma casa em construção, com três
pavimentos, onde se pode observar toda a estrutura recém levantada
em peças de madeira verticais, horizontais e em “ X ”, antes do
preenchimento dos vãos com barro. Tijolos semi-circulares, com raio
Como os edifícios do engenho eram isolados, embora organizados maior de 0,15 m, para construção
no terreno dentro de uma lógica social e funcional, não estavam sujeitos de colunas dos alpendres das
casas-grandes.
a um mesmo sistema construtivo.
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
A alvenaria de tijolos maciços, cujo uso em Pernambuco é
registrado desde o século XVI, foi o sistema construtivo preferido para
as fábricas e casas-grandes de senhores de engenho afortunados.
A rica iconografia holandesa documenta o uso adequado desse
tipo de alvenaria pois retrata algumas fábricas construídas com
arcadas que, naturalmente, conferem ao edifício uma considerável
rigidez estrutural,
As dimensões dos tijolos variavam muito, mas os produzidos
em Pernambuco eram sempre bem maiores do que os trazidos pelos
holandeses, Quando estes ocuparam o Recife, a necessidade urgente
de construção de habitações e a dificuldade de acesso ao produto
das olarias dos engenhos os levaram a importar tijolos de sua terra
como lastro de navio, como já faziam os portugueses com as pedras
de lioz. Eram os chamado tijolos de Frisia cujas dimensões eram de
Pe 0,17 m X 0,08m X 0,04 m e que são ainda
os eventualmente em escavações no Recife.

27
Nos engenhos, não havia um padrão único para as dimensões dos
tijolos que às vezes assumiam tamanhos incomuns como no caso do
engenho Tamataúpe, de Nazaré da Mata, onde mediam 0,40m X 0,20m
X 0,10m.
Eram também frequentes os tijolos semicirculares utilizados nas
colunas dos alpendres das capelas urbanas e rurais. Alguns, mais raros,
em forma de quarto de círculo chegavam a atingir grandes dimensões
com raio de 0,40 m. Quanto à sua qualidade não parece ter havido grandes
diferenças; sendo eles bem cozidos, a responsabilidade estrutural era
compartilhada com a natureza das argamassas. Para as paredes e pilares
utilizava-se a argamassa de cal, mas no caso das fornalhas, devido às
altas temperaturas, usava-se o barro.
Nas construções, onde se misturavam as alvenarias de pedra e de
tijolo, era à regularidade destes últimos que se recorria para a execução
de pilares e arcos plenos. Tijolos assentados em forma de cunha ou de
arcos abatidos eram também usados nas alvenarias mistas para aliviar as
cargas sobre as vergas retas de pedra.
Formas mais complexas como abóbadas e cúpulas nesse material
eram muito raras. O único exemplar conhecido é o da cúpula semi-esférica
com pendentes da capela-mor da ermida de São Gonçalo em terras do
engenho Jurissaca, no município do Cabo.
A alvenaria de pedra foi o sistema preferido para a construção de
capelas rurais, o que pode se explicar pelo caráter simbólico deste tipo de
edifício. Além de lugar do culto religioso acessível a todas as classes sociais
dos engenhos as capelas eram também usadas como cemitério dos
membros mais ilustres das famílias dos senhores de engenho.
Nas construções de alvenaria de pedra, utiliza-se elementos com
formas irregulares que se ligam a outros similares para formar maciços de
paredes e também outros que precisam ter formas definidas e regulares
para os arcos, as ombreiras, as vergas, os cunhais e cornijas que, por sua
natureza ao mesmo tempo estrutural e decorativa, exigem um acabamento
primoroso. Conseguir pedras para atender a esses últimos requisitos nem
sempre foi fácil em Pernambuco.
Vários trechos do litoral pernambucano são caracterizados pela
presença de arrecifes de arenito calcífero e fossilifero, de onde foram
retirados os blocos que os canteiros utilizavam nas construções. Essa
prática evidentemente nociva aos portos naturais de Pernambuco persistiu
por muito tempo considerando-se as reiteradas proibições das
autoridades.
Mas não foram os arrecifes a única fonte de matéria prima para as
construções em pedra. Afloramentos de rochas em terras dos engenhos
foram também aproveitados quando se tratava de obter pedras de formas
irregulares.
O geógrafo Gilberto Osório de Andrade afirma ter encontrado em
uma das capelas construídas em Pernambuco no século XVII grandes
pedaços de canga, fragmentos duma couraça ferruginosa típica dos solos
tropicais. Ainda referindo-se à mesma capela observa que além da canga e
da argamassa calcária feita com óleo de baleia, que une os blocos, o arenito
calcário do arco da capela-mor aparece também nas ombreiras das portas e
janelas (Andrade, G., 1982, p. 74).
O mesmo geógrafo registra na construção de uma outra capela
pernambucana rachões de riólito, uma das rochas efusivas regionais, de
composição química equivalente à dos granitos (Andrade,G., 1982, p. 63).
Vauthier, no século XIX afirma ter visto gnaisses e xistos grosseiros
frequentemente empregados como alvenaria de pedra nas paredes espessas
(Vauthier, 1975, p. 47).
A documentação conhecida não faz referência à utilização de
outros tipos de rochas nos edifícios dos engenhos. Contudo, como um
claro indício do apuro estético, mas não da fregiência de uso, a verga da
porta principal da capela do engenho Anjo era em pedra lioz portuguesa.

28
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Embora variassem os materiais das estruturas portantes dos Fábrica do engenho Sete Ranchos, em
edifícios, suas cobertas foram sempre executadas em madeira e recobertas Amarají. Os tijolos são utilizados
com telhas de barro tipo canal. para formar as colunas.
A iconografia holandesa mostra alguns casebres recobertos
com algum tipo de palha, mas as telhas de barro eram francamente
acessíveis, pois eram produzidas nas olarias dos engenhos, como as
fôrmas dos pães de açúcar e os tijolos. As telhas se apoiavam em ripas,
estas em caibros roliços e estes em terças ou linhas de madeira
falquejadas de secção quadrada com um palmo de lado. As tesouras de
madeira eram muito simples com duas linhas horizontais, uma ligando
os frechais e outra ligando os pontos médios das asnas.
Em madeira eram também os assoalhos das casas-grandes de dois
pavimentos, dos coros e os forros horizontais ou em abóbadas de berço
de algumas capelas e todas as portas e janelas de todos os edifícios do
engenho.
No fim do século XIX, registra-se o uso de ferro em algumas casas
grandes, principalmente em colunas e grades de alpendres e, com tímida
frequência, em grades de balcões. É deste mesmo período a ocorrência
de um único edifício onde o ferro comparece significativamente: a casa-
grande do engenho São Francisco da Várzea pré-fabricada na Bélgica
pela Cie. Centrale de Construction de Eaine St Pierre,
Assim, é possivel concluir que as características morfológicas dos
edifícios que compunham o engenho, devido à especificidade de cada
um deles e ao partido aberto adotado para organizá-los no terreno, podem
ser estudadas isoladamente. Os edifícios desse complexo que se
destacam pela maior frequência e importância na vida social e industrial
são a fábrica, a senzala, a casa-grande e a capela.

29
A Fábrica

A fábrica, como também é denominado o edifício ou conjunto Tipologia


à produção do açúcar, para diferenciar de engenho,
deles destinados
que, em Pernambuco, designa toda a propriedade rural onde se produzia
açúcar em pequena escala, não sofreu modificações essenciais em sua
construção, por mais de três séculos.
Num total de 150 engenhos visitados em Pernambuco, nenhum oe
funcionava mais como tal. Todos eram fazendas de cana que forneciam
matéria-prima para as usinas. Uma parte desses engenhos era
propriedade particular, uma outra pertencia a usinas que os exploravam
diretamente e uma terceira pertencia também a usinas que os
arrendavam a particulares.
Os edifícios, sempre térreos, que se destinavam à fábrica foram
convertidos em garagens de tratores, armazéns de fertilizantes, :
estrebarias, currais, oficinas etc. Para isso não se fizeram grandes
reformas, o que permitiu identificar que funções teria tido cada um dos
seus compartimentos.
O despojamento decorativo e a ausência de uma perceptível
intenção plástica são as características formais desses edificios, sem
exceção.
Os materiais de construção são os mesmos utilizados através de =
quatro séculos: tijolos para os pilares e para as paredes, madeira para a
estrutura de coberta e telhas tipo canal, de barro, para o recobrimento.
Às vezes, se encontra alvenaria de pedra nos trechos de paredes
compreendidos entre os pilares de tijolos. Os pisos, sempre em terra
batida, recebem algum reforço de pedra nas rampas que porventura
existam.
A estrutura de coberta encontrada na totalidade das fábricas se
constitui, essencialmente de tesouras de duas linhas horizontais pranta e vista da fábrica do engenho
ligando as extremidades inferiores e os meios das asnas. Os pendurais Cavalcanti da Mata, em Paudalho.
e escoras são raríssimos nessas tesouras. As asnas se cruzam em meia- Planta: FIAM.
madeira para receber a cumeeira. As tacaniças se apoiam nas asnas da
última tesoura. Os frechais de canto são ligados, no mesmo nível, por
uma travessa a 45º, para absorver os empuxos oblíquos das tacaniças.
Wu
A
WMM 1
nt HA
Estrutura da coberta da fábrica do
engenho Poço Comprido, em Vicência,
e planta da fábrica do
engenho Amparo, em Itamaracá.
Planta: FUNDARPE.

Na página anterior, acima,


fábrica do engenho Junco,
em Nazaré da Mata;
abaixo, fábrica do engenho
Sete Ranchos, em Amaraji,

33
Planta da fábrica O
do engenho Morenos,
em Morenos. ] 5 = nú
Levantamento do autor o
e de Sónia Calheiros.

Ao lado, planta da fábrica do engenho


Três Marias, em Quipapá; abaixo, planta
da fábrica do engenho Trapuá, em
Tracunhaém.
Fonte: FIAM.

Na página da direita, fábrica do enge


nho
Trapuá,
x
em Tracunhaém (acima); .
e fábrica do engenho
Tamataúpe de Flores,
em Buenos Aires, PE (abaixo). E

34
4/44

rd nva ara
LOS ALSO
(e md
s, muito
roliça sem cascas e as ripa
Os caibros são em madeira |
l
juntas, em embira.
são de barro, saibro e cal.
As argamassas das alvenarias
das, é em caiação branca.
O acabamento das paredes, sempre reboca
pintadas.
As madeiras nunca são em na
mais antigas conhecidas são as que aparec
As fábricas
século XVII. Todas elas abrigam a
iconografia holandesa do princípio do
há imagens de outros
moenda e as caldeiras sob um mesmo teto, mas não
l. Essas fábricas eram
edifícios que fizessem parte do processo industriade sec ção quadrada com
res de alvena
pila ria de tijo los
construídas sobre nhuma parede nos
poucas paredes intermediárias e quase ne
as com
intercolúnios. A iconografia holandesa revela algumas fábric
o
pilares e arcos em alvenaria de tijolos, mas esse tipo não foi localizad no
campo efetuado em Per nam buc o.
levantamento de
Uma ocorrência singular é a de pilares de secção circular, como
ro de 1,10 m.
foi constatado na fábrica do engenho Morenos, com diâmet
Moenda e estrutura de coberta da
fabrica do engenho Acêrto, em Vicência.
Na página da direita,
vista da mesma fábrica.
O que diferencia o tipo remanescente e o registrado pelos
holandeses são as paredes ligando os pilares até a altura de um homem.
Os tipos de planta das fábricas reduzem-se a dois; o primeiro,
linear, que supõe uma linha de produção continua, é um retângulo
coberto por um telhado em quatro águas e apoiado em tesouras de vãos
iguais recebendo telheiros como puxadas para funções subsidiárias. Os
edifícios são frequentemente assentados em meias encostas com pisos
em níveis diferentes para aproveitar a força da gravidade na condução do
mel.
O segundo tipo de planta é em forma de “L”. Neste caso, devido
aos desníveis do terreno e dos telhados, a cobertura é um pouco mais
complexa mas se resolve com os mesmos artifícios simples, porque não
parece ter havido nunca a preocupação com a vedação dos edifícios da
fábrica. O calor produzido pelas fornalhas, até mesmo depois da adoção
do trem jamaicano e da correspondente chaminé, sempre construída em
alvenaria de tijolos, ditou a necessidade de arejamento constante do
edifício. Até mesmo com a utilização da energia a vapor não se modificou
o partido arejado das fábricas.

Ao contrário de assentamentos congêneres de outras regiões do Origens


país, como São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro, onde funções distintas
como produzir açúcar e habitar foram abrigadas com pequena frequência
sob um mesmo teto, em Pernambuco as funções ligadas à produção
sempre estiveram sob cobertas concebidas e executadas com esse objetivo
exclusivo. a
E A prática de destinar a cada edifício uma única função ou funções
Similares, chamada de partido aberto, facilita as ampliações e modificações,
ao contrário do partido fechado, caracterizado pela multiplicidade fe
funções sob um mesmo teto. O primeiro seria de origem nórdica e o
Segundo de origem mediterrânea (Saia,1958, p. 51).
37
Tr25
TEAEe
Tra

rr
EE
Ao lado, planta da fábrica
do engenho Aurora, em Vicência.
Levantamento de
Manoel Bandeira, em 1961.
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
Abaixo, fábrica de engenho
pernambucano movido a água, segundo
quadro seiscentista de Frans Post
(detalhe).

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Fábrica sobre arcos, de alvenaria de
tijolos, de engenho pernambucano,
segundo quadro de Frans Post.

Por ocasião da ocupação holandesa em Pernambuco, não teria


havido modificações substanciais no partido aberto encontrado.
A adoção de um dos tipos de partido se explicaria pela
diversidade das condições financeiras dos senhores de engenho.
Assim, os pequenos proprietários teriam optado pelo partido fechado
e os grandes, pelo partido aberto (Gama, 1983, p. 248). Esta tese se
confirma quando se trata dos engenhos situados em São Paulo e no
Rio de Janeiro (Campos), mas não é válida para os engenhos baianos
do século XIX nem para os engenhos pernambucanos do século XVII.
No caso de Pernambuco, a explicação para a frequência do
partido aberto pode ter sido o absenteísmo dos senhores de engenho,
isto é, eles não tinham residência fixa nas suas propriedades rurais.
A prática predominante em Pernambuco até meados do século
XIX foi a de abrigar, sob um mesmo telhado, a moenda e as caldeiras.
A totalidade dos quadros e gravuras holandesas, sem exceção,
documenta esse arranjo. A purga e o encaixotamento geralmente
ocorriam em outro edifício próximo.
Domingos Loreto Couto, em 1757, descrevendo um engenho
pernambucano, refere-se também às suas dimensões;
para esta grande fabrica he necessaria huma casa que tenha ao
menos cem palmos em quadra; desses sessenta são para circular a
Bolandeyra; e os quarenta para se recolherem as canas. Contigua está
outra casa da mesma grandesa, chamada de caldeiras e oito taixas, ficando
outra parte para se assentarem as formas (Couto, 1981, p. 174). Casa
significa, neste caso, compartimento e não um edifício autônomo. O
mesmo Couto, referindo-se à casa de purgar a considera muito espaçosa
sem, no entanto, citar suas dimensões .
Era natural que as casas de purgar fossem maiores do que as
casas de moenda e caldeiras pois enquanto nestas a cana passava pouco
tempo; naquelas, o mel deveria permanecer por vários dias, submetendo-
se ao processo de clarificação para posterior encaixotamento.
A relação entre as dimensões da casa de purgar e a de moenda/
caldeiras pode ser ilustrada pela descrição que Antonil fez, em 1711,
do enorme engenho baiano de Sergipe do Conde. Segundo essa
descrição, a casa de
purgar tinha quatrocentos e quarenta e seis
palmos de comprimento, o que significa mais de duas vezes e meia
os cento e noventa e três palmos de comprimento das casas de
moenda/caldeiras. Ambos os edifícios tinham a mesma largura de
oitenta e seis palmos (Antonil, 1976, p. 127-8).

39
A prática de abrigar a moenda e as caldeiras num mesmo teto
persistiu em Pernambuco e foi registrada por um viajante francês, no
século XIX, referindo-se ao engenho Salgado (Tollenare,1978, p. 44).
Essa mesma disposição seria verificada trinta anos mais tarde
por outro francês, dessa vez um engenheiro, que efetuou um
levantamento da planta e de uma fachada de um desses edifícios e o
descreveu com minúcias, observando que
o telhado é sustentado por pilares cujos intervalos não são fechados
senão até dois metros de altura aproximadamente. Esses pilares de secção
quadrada são em geral de tijolos e nas dimensões transversais
correspondem a um tijolo colocado ao comprido. Quanto aos enchimentos,
são paredes de tijolos de 22 centímetros de espessura da espécie daquelas
que chamamos de paredes singelas ou simples paredes de barro, feita à
maneira de nossas construções de taipa e que resistem perfeitamente.

5
Fábrica de engenho pernambucano, no 020000
segundo L. L. Vauthier.
Fonte: Revue de L' Architecture et
mm
des Travaux Public, 1853.

O que chamou mais a atenção do engenheiro francês foi o


vigamento do telhado constituído de tesouras reduzidas à sua
expressão mais simples, isto é, duas pernas ligadas à meia altura por
um tirante. Ainda segundo Vauthier, o pendural falta e as duas
pernas se cruzam ligeiramente na parte superior para sustentar à
cumeeira. A cada uma das tesouras corresponde um pilar e as
extremidades das pernas repousam em um frechal contínuo. As
tesouras dos rincões por sua vez não .são complicadas. São a
presas por amarrações às tesouras mais próximas e a única aaa !
que se toma é amarrar os frechais de ângulo por uma estao ais
para que resistam melhor ao empuxo (Vauthier, 1975, Pp. sa aa
segundo o mesmo autor, esse tipo de estrutura seria muito freq
na região. o. ão
E única modificação introduzida nesse sistema foi a e
de uma segunda linha horizontal ao nível dos frechais par registrado
integralmente os empuxos oblíquos, corrigindo o sistema
por Vauthier.

40
A fábrica, levantada por Vauthier, mede aproximadamente 20 m
de comprimento por 7 m de largura e, tendo uma moenda movida a
animais, é semelhante ao engenho pernambucano da Torre, cujo
desenho foi registrado por Henderson em 1821.
Fábricas com moendas movidas a animais chegaram até nosso
século, como documentou Manoel Bandeira em 1961, levantando o
engenho Aurora, em Vicência, município da Região da Mata Norte de
Pernambuco. Neste caso, a planta da fábrica é em “L” e incorpora a casa
de purgar.
O tipo linear para as plantas das fábricas foi muito frequente no
século XIX, a ponto de ser especificado numa escritura de contrato
para construção do engenho Utinga de Baixo, em Pernambuco, em 1849.
Segundo este contrato, o comprador se obrigava a
levantar um engenho de moer Cannas em pilares, sendo o mesmo
obrigado a fazer as obras seguintes: Caza de Engenho com secenta palmos
de frente e cincoenta de fundo.Caza de Caldeiras com quarenta palmos de
frente e cincoenta de fundo, Caza de Purgar com cento e quarenta palmos
ecincoenta de fundo, telheiro para cobrir a Roda, com seis palmos de frente
ea largura que for preciso (...) sendo o encaixamento incluído no fim da
Caza de Purgar, tendo os pilares quatro palmos de largura e altura de
dezeceis palmos craveiros... (Cavalcanti, Orlando Juiz).
O fato de todas as cazas terem a mesma largura de cinquenta
palmos sugere a continuidade desses compartimentos, o que seria
confirmado num outro contrato semelhante, datado de 1860, para
construção do engenho Cidade de Paris, em terras desmembradas do
engenho Arariba do Pimentel, em Pernambuco. De acordo com o contrato,
o engenho deveria conter as seguintes obras:
Casa para engenho, caldeira e purgar, levantadas numa só cumieira,
e sob pilares de tijolo corrido, toda rebocada, tendo 50 palmos de largura e
212 de comprimento, coberta de telha e madeira corrida toda esta obra
“com 9 tesouras e 2 tacaniças [...). Casa para bagaço coberta de telha
levantada como o mesmo material sobre pilares rebocados e madeira lavrada
tendo 100 palmos de comprimento e trinta de fundo, roda d'água de madeira
de amarelo ou sapucaia bem construída... (Cavalcanti, O. J.). As grandes
dimensões da casa para bagaço indicam o uso deste como combustível
e a diferença das larguras sugere a construção de dois edifícios isolados.
De uma maneira geral, a arquitetura da fábrica pouco se
modificou através dos séculos, constituindo-se num despretensioso
abrigo para os equipamentos de produção do açúcar. O lay-out da fábrica
e as limitações da técnica construtiva definiram o partido do edifício.
Devido a esse realismo funcionalista, no dizer de Ruy Gama, o
interesse pela arquitetura desses edifícios se restringe aos sistemas
construtivos ali empregados.
Provavelmente, a partir do início do século XIX, algumas
modificações se processaram nos tipos de planta, em função da
divulgação dos progressos técnicos alcançados nas Antilhas.
Em 1801, Frei Mariano da Conceição Veloso traduz o livro de
Dutrôme de La Couture e publica no Brasil o seu manual, onde
recomenda novas plantas de fábrica em forma de “T”, visando adaptação
às inovações no fabrico de açúcar e da disciplina de trabalho (Gama, 1983,
P. 256).
O estágio de desenvolvimento da manufatura do açúcar nas
Antilhas havia se adiantado de tal forma em relação ao Brasil que o
francês Tollenare, estando em Pernambuco em 1816, sugeria, para O
estabelecimento de um engenho a conveniência de fazer vir das Antilhas
alguns bons operários (Tollenare, 1978, p.186). o
"Coma emergência das máquinas a vapor, no século XIX, os partidos
nu fábricas foram condicionados pelos manuais técnicos dos produtores
ânceses e ingleses de moendas. Contudo, esses manuais se

41
à
caracterizavam or uma certa liberalidade
É aos senhores de em rela ção às planta
abri deixando engenho ess a defi s das
a e a fun . ni çã o, em bora
cionalidade dessa eua pl anta, cont
É ização eficaz de toda emplando,
,
s as fase s da
produção. temente,
o tipo linear
Evidente Eods proprietário oué o que menos Se presta para a
supervisão, por par do seu administrador,
ed na fábrica devido de todas
as tarefas prima às grandes distância
s que
E a : Algumas fábric as de planta mais com
po puri
: anaçe O ram providas de um pacta,
no século XIX, e destin lugar, si RE S e ay
ado ao acompanhamento
piso mais elevado, de visual
engenhos centrais, no feme i de ado efas.
i ação a qua Ê ns
passado,E pue, Ri 5 depde
ois, das usinas,
terminar
exos industriais de
enormes o iní
amcio oda dec
Ea a asN. ata dosm
O ERR peq
a uenos
um lento e pg
inte :
raali
racion iozaç ão do uso dos espaços internos de suas fá E

42
A Senzala

nam! uco,
Nas propriedade s rurais que foram engenhos)s emen Pernamb
Tipologia
existem somente seis e dificios que foram senzalas, isto é, habitações de
; º
escravos.
A escassez de edifícios desse tipo se deve à fundação da grande
e à
maioria dos engenhos remanescentes após a abolição da escravatura
fragilidade do material com que foram construídos.
Por outro lado, o tipo de edifício registrado no século XIX sobreviveu
à abolição da escravatura e foi reproduzido como habitação de homens
livres em engenhos mais recentes e em conjuntos de habitação de
operários das modernas usinas, com modificações que se restringem a
pequenos acréscimos no número e nas dimensões dos compartimentos.
Não há variedade de tipos de senzala. O que difere umas das outras
é a distância que as separa da casa-grande. Algumas são muito próximas,
quase contíguas, e outras mais distantes, confirmando a hipótese de terem
existido, em alguns engenhos pernambucanos, duas senzalas, como
registrou Cícero Dias ao desenhar a planta de situação do engenho
Noruega, ilustrando Casa-Grande e Senzala, de Gilberto Freyre.
O único tipo encontrado se constitui de uma série de cubículos
contíguos em linha com um alpendre comum ao longo de todo o edificio
e cobertos com um mesmo telhado de duas águas.
A técnica construtiva é a de taipa de pau-a-pique ou alvenaria de
tijolos maciços.
Os vãos entre as paredes são de aproximadamente três metros. A
estrutura de coberta resume-se a terças de madeira apoiadas nas paredes,
caibros roliços e ripas de embira. O seu recobrimento é sempre em telhas
de barro tipo canal.
Essa mesma estrutura de coberta se estende ao alpendre suportado
por colunas de alvenaria de secção circular.
Em alguns casos, os cubículos são subdivididos em dois ou três
compartimentos, mas o partido de planta se mantém.
Nenhuma das prováveis antigas senzalas remanescentes é dotada Senzala do engenho Jurissaca,
de compartimento sanitário ou de cozinha. no Cabo de Santo Agostinho.

43
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Planta da senzala do engenho Jurissaca. ] :
Fonte: FIDEM. | + 4 | f

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Planta da senzala do engenho Matas. -:


Fonte: FIDEM. :
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Planta da senzala do engenho Urugê. == o $

|
Fonte: FIAM. - Í

À
Senzala do engenho Tinoco,
em Rio Formoso. í
De cima para baixo, senzalas dos
engenhos Santa Cruz, no Rio
Formoso;
Uruae, Condado; Matas,
no Cabo de Santo Agostinho.
- Sa)
taré
E + : :
Eesd
VD PA NT
dei DURE

ae “ sa

DM oca

Origens As fontes bibliográficas e iconográficas da ocupação holandesa


de Pernambuco, no século XVII, não revelam a existência de qualque
r
tipo de edifício que se destinasse especificamente à habitaç
ão dos
escravos.
Senzala do engenho Coimbras, No entanto, os holandeses, que conheceram o quilombo dos
no Cabo de Santo Agostinho. Palmares, fazem referências às casas dos escravos fugidos, descrevendo-
as como choças numerosas mas de construção ligeira, feitas de ramos de
capim (Barlaeus,1980, p. 253). Neste caso, naturalmente, os ex-escravos
não viviam em condições ideais, apreensivos com a iminência do ataque
de seus antigos senhores; fora de seu habitat de origem e sem recursos,
não estavam obrigatoriamente reproduzindo as suas formas de morar
na África ou nos engenhos de onde haviam escapado.
E
Algumas décadas mais tarde, em 1663, o regimento do feitor-
mor do engenho de João Fernandes Vieira, em Pernambuco, continha
algumas recomendações específicas tais como irtodas as manhãs pelas
casas dos negros (...) fazer-lhes ter suas casas barridas, com seus jraus

esteiras de agasalho para dormirem. Esse mesmo documento contém
expressões como senzalas dos negros, sem esclarecer se era rs
referência às suas casas isoladas ou a um edifício que as reunisse (Vieira,
1981, p. 259).
à xvill
Não há registros de senzalas em Pernambuco no século ; in
Na Bahia, no mesmo período, os escravos, em diferentes pie a des
habitavam casas isoladas ou edifícios reunindo várias um
(Schwartz, 1988, p.1 25).
E residiu €
.4t m

Somente em 1812, com o inglês Henry Koster, a escravos-


Pernambuco, reaparecem registros da habitação da casa de
Descrevendo um engenho, Koster afirma que, por detr ás

46
s de barro
vivenda do proprietário, os negros haviam feito suco cabana
p. 2H 1).
e palha de coqueiros (Koster, 1978,
Tudo indica que essas cabanas eram isoladas, A técnioen
construtiva provavelmente era a de taipa de pausa pique, introduzida
p. 45).
no Brasil pelos africanos (Ribeiro, sd,
A questão da técnica constru tiva utilizada nas sengalas está
ligada à própria função desses edifícios. Se ny sengzalas eram concebidas
como casas, depósitos ou prisões, sua construção deveria se adequar a
de ter
essas funções. Assim, para que fossem consideradas casas teriam
um mínimo de conforto, o que poderia se traduzir em dimensões maiores
para os seus compartimentos; se eram prisões, a segurança deveria ditar
a técnica construtiva a ser empregada,
Por toda a história da produção de açúcar em Pernambuco, não
há evidência de normas rígidas de segurança aplicadas à construção
de senzalas. Todavia, o francês Tollenare, em 1816, referindo-se ao
engenho Salgado, em Pernambuco, afirma que sua senzala de pedra e
cal, com um bonito alpendre é a única no gênero em toda a capitania, De
ordinário os negros habitam as cabanas de taipa, O mesmo Tollenare, em
outra nota datada do mesmo ano, aparentemente se contradiz com suas
generalizações, quando afirma só ter visto boas senzalas no engenho
Salgado, mas que por toda a parte são em pedra e cal e bem cobertas
(Tollenare,1978, p. 44 e 63).
A imprecisão das generalizações de Tollenare é compensada pela
minuciosa descrição que faz das senzalas do engenho Salgado, onde se
percebe que o termo designa cada uma das habitações conjugadas e
que
tém dez pés de largura sobre quinze de fundo com uma divisão
interior, o que forma quase dois quartos. Têm uma porta, fechando à chave
sobre o alpendre e um óculo que deita para o campo a fim de haver
ventilação. O ladrilho está a dois pés acima do nível do solo adjacente, o
que as tona mais salubres do que as habitações dos camponeses franceses,
Em linhas gerais, a descrição de Tollenare é semelhante à de um
outro francês, o engenheiro Vauthier, que se refere à senzala de um
engenho pernambucano como um comprido telheiro que se prende à casa-
grande, com uma multiplicidade de portas baixas e estreitas, as paredes
de barro desmoronando aquí e acolá, trapos dependurados nos esteios
que sustentam o telhado e formam, na frente da construção, uma pequena
galeria coberta.
Vauthier não generaliza quanto aos tipos de senzala, mas
descreve o sistema construtivo da que viu com o rigor técnico natural
de um engenheiro, como é possível constatar:
o
A terra nua constitui o seu piso. As dimensões de cada cubícul
nunca ultrapassam 3 metros e meio. A porta, que abre para a galeria externa,
éa única abetura que foi prevista. As paredes são de pau-a pique; pequenas
m
estacas de madeira com casca, de 5 a 6 centímetros de diâmetro suporta
centímetros
uma série de peças horizontais formando quadrados de 20 a 25
de lado, cheios de barro grosseiramente alisado pela parte de fora. Nenhum
reboco protege esse enchimento por isso a ação das chuva e do calor logo
o deteriora e provoca ali aberturas suplementares por onde entra no cubículo
os estreitos
um pouco de ar e frescura. Cada um desses compartiment
celibatários
contém, quer uma família inteira, quer dois ou três
(Vauthier,1975, p. 91).
08
Tudo indica que os edifícios das senzalas eram prec ários sob
ai evita de conforto, durabilidade e segu Faça ap pa a
ciigenho nu como está claro na escritura de ar es lavrada em
1863, onde eo no município pernambucano de dep da que já Planta típica de senzala de um engenho
merge O Una existentes na pera na Efeteiaaçd E + que
existe com es e e “e f tar rc n 4
Senzala velha portas, cujas te quai portas 3 as s Rami pi
que será demolid a (Cavalc anti, O. J.). Publies,

47
Uma outra característica frequente nas senzalas dos engenhos
pernambucanos é a sua proximidade da casa-grande. No plano geral de
um engenho apresentado por Vauthier, a senzala se desenvolve em forma
de “L” com sua perna menor ligada à casa-grande. A disposição da senzala
contigua à casa-grande pode ter sido muito comum em Pernambuco
pois algumas chegaram a nossos dias .
possivel que tenham existido duas senzalas em engenhos
pernambucanos, uma para os escravos encarregados pelas tarefas da
casa-grande e outra para os escravos envolvidos na agricultura e na
produção do açúcar, como no engenho Noruega, já citado.
Há duas hipóteses sobre a origem desse tipo de edifício.
A primeira, sem qualquer indício bibliográfico, é a de que tenha
sido criado pelos proprietários rurais no Brasil colonial ou pelos donos
de culturas agrícolas congêneres e contemporâneas em outras colônias
na América. A propósito, é sabido que em Cuba os escravos moravam
originalmente em choças, isoladas, de palha, mas, no século XIX,
sua
habitação típica eram os barracones, enormes construções térreas,
em
quadra e com pátio interno descoberto. Cada um dos edifícios que
formava a quadra tinha o mesmo partido identificado por
Vauthier em
Pernambuco, com seus alpendres voltados para o pátio
interno. Os
engenhos cubanos que possuíam os citados barracones eram
de grandes
dimensões, às vezes com 600 escravos e os naturais
problemas de
segurança, o que pode justificar o partido em quadra fechada
(Fraginals,
1989, p. 87-89).
A segunda seria a origem do edifício da senzala em uma
das
culturas africanas. Os escravos vendidos para os senhores
de engenho
pernambucanos e brasileiros provinham de várias regiões
da África, com
costumes, línguas e forma de habitar diferentes.
Uma dessas culturas, a
iorubá, possuía um tipo de casa com uma singular estrutura;
o corpo
do edifício compreendia uma série de pequenas casas de
2,6 a 3,3 metros
de comprimento por 1,3 a 1,6 metros de largura. Estas casas
estavam ligadas
por uma varanda, por pilares de terra ou de madeira ou ainda
por um muro
entrecortado por intervalos, para dar passagem ao ar
e à luz. As casas
estavam alinhadas formando mais ou menos um retângulo;
o pátio ficava no
meio. Uma única porta de entrada, nenhuma janela para o exterior
por medo
dos ladrões (Cunha, M., 1985, p. 57).
Segundo esse mesmo autor, as casas poderiam se dispor em
retângulos, com pátio interno, formando um “L” ou em unidades
isoladas. Esta última ocorrência viria a ser o tipo encontrado por
todo o
Brasil no período colonial e imperial.
Nessa segunda hipótese, também não existe qualquer documento
que comprove a intencionalidade de reprodução de um fragmento
da
cultura africana em terras pernambucanas,

48
A Casa-Grande

r de Pernambuco nunca Tipologia


As casas-grandes dos engenhos de açúca
as sistematicamente. .
ão pesqu isado r norte amer ican o Rober t Smith , a casa
Fa
do senhor de engenho, no período colonial, era mal construída, tinha
s
pouca originalidade e se confundia com outras casas rurais das outra
1940, p. 37). Na realidade, são raríssimas as
regiões do país (Smith,R.,
seu registro
casas desse período que chegaram ao nosso século e o
aos holan deses que ocup aram
iconográfico mais significativo se deve
maior ia de casas refer idas em
Pernambuco no século XVII. A expressiva
estudos conhecidos foi construída no sécul o passa do.
Gilberto Freyre, sem caracterizar uma tipologia arquitetônica, refere-
se à casa-grande brasileira como uma interpretação sociológica de surtos
arquitetônicos cujo aparecimento não está ligado a nenhuma tradição
ilustre de arquitetura (Freyre,1984, p. 19).
A diversidade morfológica dos exemplares ainda existentes em
Pernambuco e das casas cuja imagem ficou registrada ou descrita sugere a
sua tipologia.
A classificação tipológica das casas-grandes foi definida tomando
como marco inicial a iconografia holandesa do século XVII, sem dúvida a
mais antiga documentação sobre as casas de vivenda dos senhores de
engenho pernambucanos. Assim, o universo de casas classificadas é
composto também de exemplares que não mais existem. Essa classificação
é eminentemente morfológica e, em segundo lugar, cronológica, ressalvando-
se a persistência de alguns tipos através de séculos, com ligeiras
modificações.
A preocupação fundamental foi com a identificação de tipos e não
com ocorrências excepcionais. Para cada conjunto de características
essenciais morfológicas de um tipo, admite-se variantes que, em geral, são
respostas temporais às exigências funcionais. Por isso os tipos, como tais,
comportam uma limitada metamorfose dentro de um conjunto de linhas
mestras de concepção e composição arquitetônicas.
Assim foi possível classificar os tipos em 9 grupos.

O grupo I, chamado de casas nortenhas, devido à sua semelhança


com as casas rurais do norte de Portugal, tem as seguintes características
básicas: dois pavimentos; pavimento superior sustentado por esteios de
madeira ou por colunas de alvenaria de tijolos; paredes em taipa de pau-
a-pique, alvenaria de tijolos ou adobe; planta retangular; coberta em telha
de barro, em quatro águas, sobre estrutura de madeira; prolongamentos
eventuais de uma ou mais dessas águas para abrigar cômodos salientes e
pisos do pavimento superior em pranchas de madeira sobre vigas do mesmo
material.
Este grupo comporta três subdivisões:

IA - É provavelmente o mais antigo dos tipos identificados. O edifício


parece provisório, e pode tê-lo sido, considerando-se as circunstâncias do
seu surgimento. Os primeiros engenhos, na várzea do Rio Capibaribe,
próxima ao Recife, não precisavam possuir casas sólidas nem grandes
pois seus proprietários residiam na cidade. Daí as observações dos
holandeses sobre o pouco caso que os portugueses faziam de suas vivendas,
privilegiando as fábricas.
Além das características básicas do grupo, as casas teriam: varandas
entaladas no meio da fachada principal do pavimento superior ou em uma
de suas extremidades; pavimento térreo total ou parcialmente vazado e
escada interna.

49
Não existe remanescente algum deste tipo. Sua existência é apenas
sugerida pela documentação iconográfica holandesa do século XVII.

IB - Este tipo só difere do anterior pelo aparecimento de uma torre


justaposta à casa. A torre era mais alta do que a casa, tinha planta quadrada
e éra coberta com o mesmo material da casa, isto é, telhas de barro em
quatro águas. Sua estrutura portante era constituída de esteios de madeira
e suas paredes em tijolos ou em taipa de pau-a-pique.
Não existe remanescente algum deste tipo. Sua existência é sugerida
pela iconografia holandesa do século XVII.

Casa-grande, balaústre e plantas do


engenho Passassunga, em Bom Jardim.
Fonte, fotos: Fundação Joaquim Nabuco.
Plantas: IPHAN.

Pavimento térreo Pavimento superior


e med

mm
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.——— mam mm rm
T —-

!
ai |
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|

[ nd
ee
sr
Casa-grande do engenho Passassunga,
segundo desenho do arquiteto
Augusto Reynaldo, em 1956.
Fonte: IPHAN.

IC - Este tipo tem como marca a escada externa dando acesso a


é parcial
uma pequena varanda ao longo da fachada principal. Essa escada
das águas do telhado
ou totalmente coberta pelo prolongamento de uma
um viajante estrange iro
da casa. Essa característica foi notada por mais de
período e no
no século XIX, o que pode sugerir a sua frequência neste
remanes centes, o engenho
século anterior, de quando datam os exemplares
em Vicência.
Passassunga, em Bom Jardim, e o engenho Poço Comprido,
Ambos têm seus pavimentos térreos fechados , mas é possível que
tenham sido abertos originalmente e sejam de construç ão recente as paredes
que ligam os pilares de tijolos que sustent am o pavimen to superior . Assim,
usado com muita versatil idade, o que
o espaço do rés-do-chão teria sido
vem a ser uma característica desse grupo de tipos.

Capela e casa-grande do engenho Poço


Comprido, em Vicência.
Abaixo, plantas do mesmo engenho.
Planta: IPHAN,

qt O eme
orem mr UE Am
um PER = Sb mico

Pavimento térreo
Pavimenta superior

91
Ca,
Alpendre da casa-grande (acima) e pátio
interno que separa a capela da casa- As casas que formam o grupo II são as Casas de Torres.
Diferentes
grande (acima, à direita) das casas do tipo IB, essas casas tinham duas torres
incorporadas a cada
do engenho Poço Comprido. uma das extremidades da fachada principal, dois
pavimentos, eram
construídas em alvenaria de tijolos ou de pedra
e os seus telhados se
Casa-grande do engenho Megaípe, desenvolviam em mais de um volume piramidal. Fazem
parte deste diminuto
em Muribeca. grupo as casas retratadas por Frans Post em dois
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco. quadros seiscentistas e
a casa-grande do engenho Megaípe.
Fachada principal e plantas da
casa-grande do engenho Megaípe.
Foto: Fundação Joaquim Nabuco.
Plantas: Saia, L. 1958.

Pavimento superior Pavimento térreo

O grupo III constitui-se de solares, por sua semelhança com as casas


rurais e urbanas de Portugal, que se reproduziram sem modificações
substanciais desde o século XVII ao XIX.
As suas características básicas são: dois pavimentos; sistema
construtivo dos elementos portantes em alvenaria de tijolos ou de pedra;
planta retangular; , estrutura deá coberta em madeira
- e recobrimento em telhas Flantas
do da
engenho cnprsiratdo
Morenos, em Morenos.
de barro; telhado em quatro águas e eventuais prolongamentos para cobrir Levantamento do autor e
cômodos salientes e pisos do pavimento superior em tábuas apoiadas em de Sônia Calheiros.
vigamento de madeira.
Pavimento superior Pavimento térreo

na ico
HA - Os edifícios do primeiro tipo deste grupo aparecem também
nografia holandesa do século XVII e têm, além das básicas, as
Seguin tes características: escada interna; raros e pequenos alpendres, mais
Parec na acréscimos, e pavimento térreo menor que o superior quando
Situ Os em meias encostas.

53
Fachada principal e plantas da
casa-grande do engenho Megaiípe.
Foto: Fundação Joaquim Nabuco.
Plantas: Saia, L. 1958.

MI

Pavimento superior Pavimento térreo

O grupo HI constitui-se de solares, por sua semelhança com as casas


rurais e urbanas de Portugal, que se reproduziram sem modificações
substanciais desde o século XVII ao XIX.
As suas características básicas são: dois pavimentos; sistema
construtivo dos elementos portantes em alvenaria de tijolos ou de pedra; Plantas da casa-grande
planta retangular; estrutura de coberta em madeira e recobrimento em telhas do engenho Morenos, em Morenos.
de barro; telhado em quatro águas e eventuais prolongamentos para cobrir Levantamento do autor e

cômodos salientes e pisos do pavimento superior em tábuas apoiadas em de Sônia Calheiros.

vigamento de madeira.
Pavimento térreo
Pavimento superior

gia lá IA - Os edifícios do primeiro tipo deste grup o aparecem também


básicas, as
Sad nografia holandesa do século XVII e tem, a lém das
Buintes características: escada interna; raros e pequenos alpendr es, mais
Parecendo acréscimos, e pavimento térreo menor que O superior quando
si tuados em meia:
s encostas.

53
Casa-grande do engenho Morenos,
em Morenos.

Casa-grande e plantas
do engenho Matapiruna, em
Escada,
Planta: FIAM.

Pavimento superior
-——— E
Pavimento térreo

54
o a
Autênticas casas-fortes, tiveram seu pavimento térreo destinad
como
depósitos, a se julgar pelo pequeno número de aberturas, às vezes
na defesa.
seteiras que podem também ter desempenhado importante papel | Acima, à esquerda, casa-grande do
que pode
O grande número de seteiras no pavimento térreo de uma casa, engenho Megaó-de-Baixo, em Goiana;
trador holandês , reforça essa hipótese (Terwen, 1979). à direita, casa-grande do
ter sido de um adminis
posses dos engenho Riqueza, em Amaraji;
A função desse pavimento mudou com o tempo e com as Fonte: Fundação Joaquim Nabuco,
da casa era zona
senhores de engenho. Assim, no século XIX, essa parte Abaixo, à esquerda, casa-grande
social como atestam as casas-grandes dos engenhos Morenos e Limoeiro do engenho Jurissaca,
Velho. no Cabo de Santo Agostinho,
por Frans Post,
Desse tipo seriam, além das casas documentadas
com alpendre mais recente;
Cabo; Riqueza, em
as casas dos engenhos Jurissaca, no município do
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
em À direita, abaixo, casa-grande do
Amarají; Juá, em Tracun haém: Tabatinga, em Vicência; Morojó, engenho Tabatinga, em Vicência.
(demolido), em Escada;
Nazaré da Mata; Limoeiro Velho e Matapiruna
e São Salvador
Megaó de Baixo, em Goiana; Moreno, em Moreno;
Jurissa ca e São
(demolido), em Jaboatão. À exceção do engenho XVIII, os
séculos XVII ou
Salvador, que podem ter sido erigidos nos
demais são do século passado.

cas específicas:
NIB - Os edifícios deste tipo têm duas característi
entos térreo s são sempre
implantados em meias encostas, seus pavim
s são extern as, levando a
menores do que os superiores e suas escada
ao longo de uma ou duas fachad as.
alpendres que podem se desenvolver
em alvena rias são impla ntada s em
Somente as casas construídas
e neste caso os seus pavimentos parciais térreos
meias encostas
invariavelmente se destinam a depósitos.

55
A este tipo pertencem as casas-grandes dos engenhos Santa Cruz,
no município de Bom Jardim; Tracunhaém, em Itaquitinga; Caraúba, em
Paudalho; Timorante, em Amaraji; e Limeira, em Aliança, todas construidas
no século XIX.

Ao lado, casa-grande do
engenho Tracunhaém, em Itaquitinga;
abaixo, casa-grande do
engenho Limeira, em Aliança;
na outra página, acima, casa-grande do
engenho Caraúbas, em Paudalho;e
abaixo, casa-grande do
engenho Santa Cruz, em Bom Jardim.
CALA 7 ! ; Dad y , , o

AMAR 1% : / Ao
A dead CO a

nn pn HIC - Caracteristicas: planta em “L”; implantação em meias encostas;


Planta: FIAM. dois pavimentos somente em uma das pernas do “L” e ausência de alpendres.
Na perna do “L”que fica na parte posterior da casa, onde só existe o
pavimento superior, localizam-sé a cozinha e demais dependências de
serviço,
Neste caso, encontram-se as casas-grandes do engenho Gaipió,
construída no século XIX, no município de Ipojuca, e do engenho Noruega
(demolida), erigida no século XVIII.

Pavimento térreo Pavimento superior

58
Fachada principal e trecho de fachada da
casa-grande do engenho Gaipió, em
Ipojuca.

Plantas da casa-grande e capela do


engenho Noruega.
(Freyre, Gilberto, 1964).

FS CASCAS
AK
CAE?

PAZ ZONA SAE

Pavimento térreo Pavimento supenor

59
As casas que compõem o grupo IV, designadas como sobrados sobre
arcadas, são pouco numerosas e têm, como características básicas: dois
pavimentos; construção em alvenaria de pedra, tijolos, ou mista dos dois
materiais; telhado em quatro águas ; piso do pavimento superior em tábuas
apoiadas em vigas de madeira e as paredes do térreo vazadas, parcial ou
integralmente, por arcos plenos.

IVA - Este é o mais antigo tipo de casas dentre as remanescentes,


Sua característica, além das básicas, é ter um núcleo central retangular, em
alvenaria de pedra, cercado por arcadas em três dos seus lados. A casa-
grande do engenho Gurjaú de Cima, no municipio do Cabo, é o único
exemplar existente deste tipo. Um engenho com essa denominação já existia
ao tempo da invasão dos holandeses. Antes dos acréscimos que o
desfiguraram, tinha o ar senhorial de um solar minhoto (Leão Filho, 1946,
p. 91).
À exceção de dois, todos os arcos mencionados estão entaipados.
Plantas da casa-grande do
engenho Gurjaú-de-Cima, Uma outra casa que tinha alguns elementos em comum com esta
no Cabo de Santo Agostinho. era a do engenho Megaípe, situado no vizinho município de Jaboatão.
Levantamento do autor,

Pavimento superior

Vista da casa-grande e capela e, abaixo,


arco entaipado no pavimento térreo da
casa-grande do mesmo engenho.
vista e planta do pavimento térreo da
casa-grande
do engenho Madalena, no Recife.
Planta: IPHAN.

e a na,
o

to das as paredes periféricas e interiores


IVB - As casas deste tipo têm alvenaria de tijolos. O
do pavimento térreo apoiadas em arcos plenos de
Madalena, no
único exemplar remanescente, à casa-grande do engenho
de um sobrado
Recife, foi reformado no século passado, assumindo ares
urbano. Os seus arcos foram todos entaipados e as paredes tiveram suas
faces externas revestidas com azulejos. Na década de 60 deste século, por
ocasião das obras de restauração da casa para sediar o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), foram removidos os
rebocos e descobertos os arcos. Naquela oportunidade, optou-se por
manter a fase oitocentista da casa deixando aparentes alguns arcos.

61
Arcos do pavimento térreo
da casa-grande do engenho Madalena.

mn
TA

Arcos do pavimento térreo e casa do


al a]
sítio do Barbalho, no Recife. e É Es
l e = fl eme | o

Tt a Ti
E : f | é

E | k É

A casa do engenho Madalena situa-se não muito longe das margens


do rio Capibaribe, cujas cheias fizeram parte da história do Recife. Talvez
esse partido signifique uma atitude preventiva em relação a essas eventuais
cheias porque todas as paredes do pavimento térreo são em arcos. No Recife,
também nas margens do mesmo rio, nas terras do antigo sítio do Barbalho,
existe uma outra casa oitocentista com as mesmas características, o que
pode sugerir a frequência desse tipo.

62
Planta do pavimento térreo da casa do
sítio do Barbalho.
Levantamento de Arnaldo Gedanken.

IVC - As casas deste tipo têm arcadas somente na fachada principal


e no pavimento térreo, formando uma galeria que lembra as Casas de
Câmara e Cadeia do período colonial. O único exemplar deste tipo que
ainda existe é a casa-grande do engenho Monjope, no município de Igarassu.
Nesta casa, a galeria citada se liga a um pequeno vestíbulo que dá acesso
de
à escada interna. É possível que estas galerias tenham tido a função
à casa poderia
espaços intermediários e públicos, isto é, até onde o estranho
e, hoje inteiramente Casa-grande do engenho Monjope, em
chegar. A casa-grande do engenho Camaragib
fotografia Igarassú, com arcos na fachada
reformada pode ter sido deste tipo a se julgar por uma sua antiga principal.

63
por onde se pode perceber que a grande maioria dos arcos foi entaipada,
Mais duas casas, das quais só restam registros iconográficos,
pertencem a este tipo: a casa-grande do engenho da Torre, que deu o nome
Casa-grande com arcos a um bairro do Recife, e a antiga casa do engenho São Braz, no municipio
entaipados em uma das fachadas. do Cabo.
Engenho Camaragibe, em Camaragibe.
A fotografia do engenho São Braz mostra a ruína de sua antiga casa-
Fonte: Museu da Cidade do Recife.
Casa-grande sobre arcos grande, restando de pé somente a parede da fachada principal no mesmo
em uma das fachadas. plano da fachada da capela, que ainda existe. Como a casa e a capela foram
Engenho da Torre, no Recife. construídos, no século XVIII, em um terreno em aclive é provável que
(Henderson, J. 1821) tenha existido somente uma fachada com arcadas limitando a galeria.
Ruinas de casa-pgrande com fachada
principal sobre arcos. Engenho São Braz,
no Cabo de Santo Agostinho.
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.

Planta, vista do interior do alpendre e


O grupo V constitui-se de casas aqui denominadas Bungalows com da casa-grande do engenho Santa Helena,
as seguintes características básicas: um pavimento; cobertura com estrutura em Água Preta.
Planta: FIAM.
em tesouras de madeira e recobrimento com telhas de barro; telhado em
quatro águas, continuo, cobrindo o corpo principal e os alpendres; planta
retangular com alpendre em “U”ou em “L”e paredes periféricas, em tijolos,
mais grossas que as internas, que nunca vão até o teto.
Tendo sido todas construídas no século XIX e com pequenas
dimensões, essas casas pouco se modificaram, a não ser nas divisões internas,
devido à irresponsabilidade estrutural destas. O alpendres laterais sempre
terminam em cômodos aparentemente destinados a barrar a curiosidade do
estranho para as tarefas domésticas que estariam se executando na zona
posterior da casa onde, eventualmente, existe um alpendre de serviço.
Das 31 casas remanescentes deste tipo sete têm porão parcial por
estarem implantadas em meias encostas. Outras oito, apesar de implantadas
em meias encostas, não possuem porão e se elevam acima de patamares planos
aos quais se tem acesso através de escadas construídas com semicírculos
concêntricos sobrepostos de alvenaria de tijolos.
dy ee | ui N

Fachada frontal e interior do alpendre da


casa-grande do engenho Camarão, em
Água Preta.

A grande maioria das casas t


em sua fachada principal voltada para
os quadrantes entre norte, leste e
sul.
Os pilares dos alpendres são
+ em sua grande maioria, em tijolos,
com fustes cilíndricos ou tronco-côn
icos e toscos capitéis. Poucos desses
pilares são em madeira e em ferro.

66
As casas deste tipo são as do engenho Coimbras, Matas e São
Ferreiros, em Salgado; Araticuns, Iguape,
Braz, no município do Cabo; Sirijt em
a, em Vicência; Criméia, em Buenos Aires;
Pombal e Teitandub
aliança; Tamataúpe-de-Baixo e Diamante, em Nazaré da Mata; Refresco
e Mussu, em Escada: Camarão, Poço d'Antas, Guarani, Santa Helena,
ourives e Ilha Grande, em Água Preta; Verde, em Palmares; e Bombarda,
.
Carassu e Muitas Cabras, em Barreiros
A casa-grande do engenho Verde, em Palmares, apesar de ter seu
are os de alvenaria e uma platibanda que indica a sua
alpendre em
suas caracteristicas gerais, se enquadra nesse
inspiração neoclássica, pelas
tipo.

Tr
mm
pa

1
'

— mm
|
-=--—— .u. 2

1
e

&

Acima, vista do alpendre da casa-grande
e nave da capela do engenho Coimbras,
no Cabo de Santo Agostinho. |
Plantas da casa-grande, capela e
senzala. Fonte: FIDEM.
Abaixo, vista da senzala e casa-grande
do mesmo engenho.

67
Vista da fachada, interior do alpendre e
planta da casa-grande do engenho
Carassu, em Barreiros.
Planta: FIAM.

Casa-grande do engenho Poço d'Anta,


em Água Preta,
E
>
=
E
E

E
|| Acima, alpendre da casa-grande do
É él engenho Sinjí, em Aliança,beiral,
capitéis e planta da mesma casa.
Planta: FIAM.

Ao lado, da esquerda para direita,


plantas das casa-grandes dos engenhos
Poço d'Anta, em Água Preta, e Bombarda,
em Barreiros.
Fonte: FIAM.

Casa-grande e planta do engenho


Refresco, em Escada.
Planta: FIAM.
ida da DAS DE A PT

a ai SritE RS «SS

Acima, casa-grande O grupo VI se constitui de casas construídas no século passado,


do engenho Novo da Conceição,
POA com pequenas dimensões, classificadas como Falsos Bungalows e com as
em Morenos; abaixo, à esquerda, - copo : ato E j
casa-grande do engenho São Sebastião, seguintes caracteristicas: um único pavimento; cobertura com estrutura
em Itambé; de madeira e recobrimento em telhas de barro; telhado em quatro águas,
à direita, casa-grande mais alto e independente do telhado dos alpendres; plantas retangulares;
do engenho Cancela, em Tracunhaém. — alpendres em “U”; paredes periféricas, em alvenaria de tijolos mais grossas
do que as internas que nunca vão até o teto. A designação de falso se explica
pela probabilidade de adaptação de casas preexistentes e sem alpendres à
nova moda de alpendres em, pelo menos, três lados do edifício.
Poucas casas, das que teriam antecedido os falsos bungalows, ainda
existem com a sua forma original, isto é, sem alpendres. Duas delas, a do
engenho São Sebastião, em Itambé, e a do engenho Lagoa-Seca-de-Baixo,
em Aliança, assentadas sobre um patamar, cuja área é bem maior do que
a ocupada pela casa, receberiam perfeitamente a adaptação de um alpendre.
A casa-grande do engenho Cancela, em Tracunhaém, estaria também neste
caso, pois chegou a receber um alpendre, cujos vestígios ainda se
encontravam lá e se perdeu devido à precariedade e má qualidade do
material usado em sua construção.
A casa do engenho Novo da Conceição, no município de Moreno,
ilustra bem essa tese. Esta casa tinha um porão sob a metade longitudinal

70
[a se a qe

Planta da casa-grande do engenho


Novo da Conceição (acima) e
planta da casa-grande do engenho
Pereira, em Morenos (direita).
Fonte: FIDEM.

fronteira do pavimento térreo. Havia portas de acesso a esse porão a partir


do exterior. Posteriormente, foi executado um aterro em forma de “U”,
envolvendo a casa e suportando o alpendre. A comunicação com o porão
passou a se fazer através de pequenos túneis abertos no novo aterro
conduzindo às antigas portas, o que evidencia a posterioridade do aterro.
parece ter
O núcleo original da casa, construída em meados do século XIX,
conservado cubículos interiores como se fossem alcovas.

Casa-grande do engenho Pereira .


Planta e fachada da casa-grande
do engenho Pintos, em Morenos.
Planta: FIDEM.

Uma outra característica dos falsos bungalows é o acabamento dos


beirais dos telhados do corpo principal da casa em cornijas de alvenaria ou
em beira-sobeira, que não se justificariam escondidos pelos telhados dos
alpendres, evidentemente posteriores. Na realidade, o tipo original dessas
casas não tinha alpendres mas foi classificado pela forma com que ficou
conhecido, porque esses elementos passaram a ser considerados,
equivocadamente, como a marca da antiguidade das casas-grandes dos
engenhos pernambucanos.
As fachadas principais dessas casas são orientadas para os
quadrantes situados entre norte, leste e sul. As suas maiores dimensões,
incluindo os alpendres, variam de 17,5m a 33,5m.
A maioria das estruturas de coberta é em tesouras de duas linhas
horizontais, uma à altura dos meios das asnas e a outra ao nível dos frechais.
Os materiais com que são construídos os pilares dos alpendres variam,
com predomínio do tijolo, menores ocorrências em madeira e raras em ferro.
Os fustes das colunas têm geralmente seções cilíndricas ou tronco-cônicas
com toscos capitéis, ocorrendo também seções quadradas.
Deste grupo são as casas-grandes dos engenhos Massauassu (1833),
no município de Escada; Novo da Conceição, Pintos e Pereira, em Moreno;
Gameleira, em Aliança; e Sete Ranchos, em Amaraji.

Planta e fachada da casa-grande do


engenho Sete Ranchos, em Amarají.
Planta: FIAM,
O grupo VII é composto de algumas casas notáveis por suas grandes
Casa-grande do engenho Sapucajl,
Poderiam em Escada.
dimensões, construídas na segunda metade do século passado.
dos bungalo ws do grupo V, se lhes fossem
ser consideradas uma evolução
mas podem ser anterio res ou
comprovadamente posteriores,
uírem exemplo s de um modelo acabado .
contemporâneas e, assim, constit
daquela s do grupo V, são: dois paviment os,
Suas características, além
sob os alpendres por
podendo o térreo ser parcial e utilização dos espaços
porões ou galerias.

Plantas da casa-grande
do engenho Sapucajl.
Fonte: FIAM,
Pavimento térreo
Pavimento superior

73
Sa
esES O Ne
NESSA

Fachada e plantas O exemplar mais elegante deste grupo é a casa do engenho


da casa-grande do engenho Morin, Sapucají,
no município de Escada, construída em 1862. Com uma
em São José da Coroa Grande. planta em “L” no
pavimento superior e retangular no térreo, alpendre em “U” apoiad
ira canos de ferro e guarnecido por uma grade do mesmo
o em
material, é uma das
raras casas de engenho de Pernambuco em que se nota,
com muita clareza,
uma intenção plástica determinando a composição
arquitetônica. A baixa
altura do pé-direito do pavimento térreo indica
a sua função de depósito.
Uma outra casa em que se vê o aproveitamento do pavime
nto térreo
para depósito é a do engenho Morin, no municí
mc mem — pio de São José da Coroa
Grande. A sua planta original era retangular;
A Fama T sua forma em “L” atual resulta
1 de um acréscimo perfeitamente identificável.
— B Ss Duas outras casas desse grupo, as dos
Ea
engenhos Contendas e
Bosqu e, pertenceram, junto com mais
e seis engenhos,
= que se originou do engenho de mesmo nome, no munic à usina Frecheiras,
enge nho Bosque não mais existe, mas suas
ípio de Escada. A do
casi les fotografias nos informam que
ela tinha: dois pavimentos; alpendre
E s em três lados do pavimento superior
apoiados em colunas de ferro e guarneci
dos por grades no mesmo material;
galer
ia no pavimento térreo com pilares de alve
naria
e escada interna. Tanto
o pavimento superior como o inferior
têm o mesmo pé-direito, o que suge
a utilização social de ambos, re
A casa-grande do engenho Contendas, do
barão de mesmo nome,
ainda existe embora semi-arruinada. Implantada à meia
encosta, tem um
pavimento térreo, cuja área corresponde à meta
Pavimento térreo de da área do pavimento
superior, para onde se sobe por uma escada interna. Os pês-
direitos e
dimensões dos cômodos do pavimento térreo
indicam sua função social.
74
Interior do alpendre da casa-grande
do engenho Morin

Pavimento superior

Pavimento térreo

Fachada e planta da casa-grande


do engenho São José, em Sirinhaém.
Planta: FIAM.

Casa-grande do engenho Bosque,


O alpendre se apoia em delgados canos de ferro e é guarnecido por uma | em Escada.
grade no mesmo material. As colunas da galeria do pavimento térreo têm Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.
fustes cilindricos em alvenaria de tijolos.
A última casa deste grupo é a do engenho São José, no município
de Sirinhaém. Implantada à meia encosta, possui um pavimento térreo,
cuja área corresponde a um terço da área do pavimento superior. O
pavimento térreo é precedido de uma galeria em arcadas de tijolo que
suportam um dos lados do alpendre em “U”do pavimento superior, apoiado
em colunas de alvenaria com fustes tronco-cônicos. O pavimento térreo
destina-se a depósito e o seu acesso ao pavimento superior se faz através
de escada externa assentada sobre o terreno em aclive.

75
Pavimento superior
Casa-grande e plantas
do engenho Contendas, em Escada,
na página 20 lado, pormenor do alpendre
da mesma casa.
Plantas: FIAM.

Pavimento térreo

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76
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o $

Planta e vista da casa-grande


do engenho Amoroso, em Água Preta. O grupo VIII é composto de casas construídas em fins do século
Planta: FIAM. passado e início do atual, classificadas como chalés. Devido à proliferação
de usinas, é possível que algumas dessas casas tenham sido construídas
para a residência de proprietários de fazendas de cana e não mais de
engenhos, mas esta última denominação sobreviveu à função. Este é o
grupo mais numeroso, provavelmente devido à construção recente de seus
componentes.
. A frequente utilização de bandeira em arcos ogivais nas portas e
janelas, indicam a divulgação, no meio rural, do gosto estético urbano
Planta e vista da casa-grande contemporâneo.
dis Rage Encaito, engua ao As características das casas deste grupo são: um pavimento e,
, “* eventualmente, um pequeno porão aproveitando o desnível do terreno;
paredes periféricas e internas em alvenaria de tijolos; paredes internas não
atingem o teto e sustentam pontaletes de madeira, que, por sua vez,
suportam as terças de madeira da estrutura do telhado; recobrimento em
telhas de barro tipo canal apoiadas em ripas de embira e em caibros de
madeira roliça; telhado em duas águas e cumeeira perpendicular ao plano
da fachada principal; alpendres com telhados independentes da coberta
do corpo da casa, paralelos a duas fachadas opostas ou em “U” e plantas
retangulares.
De um total de 22 casas inventariadas, 11 tinham canos de ferro, 7
tinham colunas de alvenaria de tijolos e 4 tinham colunas de madeira
suportando seus alpendres.

78
rea
ELES
TE

os pontos
As casas têm suas fachadas principais voltadas para todos
cardeais e colaterais.
e desenhos em
Como elementos decorativos, além de inscrições
baixo-relevo nas fachadas, algumas casas ostentam lambrequins de
madeira nas extremidades dos telhados.
te, Camurim,
Pertencem a este grupo as casas dos engenhos Gabine
no município de Água
Apody, Amoroso, Galo, Gravatá, Cumbe e Alegrete,
Xixá, em Timbaúba, Verdum,

a
Preta; Tapacurá, em São Lourenço da Mata;
Conceição e Cotegi-de-Cima, em Escada; Capibaribe, em
em Ferreiros;
Nova, em Aliança; Abreus,
São Vicente Ferrer; Jundiá, em Vicência; Terra
em Quipapá; Carassu, em Barreiros,
em Tracunhaém; Três Marias, Acima, na foto maior, casa-grande do
ão.
Preferência, em Primavera; e Retiro, em Ribeir engenho Terra Nova, em Aliança;
de possuir
A casa do engenho Santo Antônio, em Camutanga, apesar na menor, casa-grande do engenho
varian te singul ar deste Preferência, em Primavera.
dois pavimentos, pode ser considerada como uma
tipo.

Ao lado, casa-grande do engenho Santo


Antônio, em Camutanga; e abaixo,
casa-grande do engenho Cumbe,
em Água Preta.

79
tão
O grupo IX se constitui de quatro exemplares de construção
ca básica,
as do grupo precedente e tem, como característi
recente quanto
mbuca na. A
o pátio interno, elemento raríssimo na arquitetura perna
tipos não invali da
presença, nessas casas, de elementos formais de outros
al,
a classificação, pois o pátio interno determina a reorganização espaci
Ribeir ão, por
A casa-grande do engenho Bastiões, no municipio de
re extern o
exemplo, lembra um chalé, mas tem, além do característico alpend
em “U” deste tipo, mais dois alpendres.
Firmeza, em Escada, conserva algumas
A casa do engenho
o |
características do bungalow.
Por outro lado, as casas dos engenh o Jundiá , també m em Escada
com seu alpendre periférico posterior , € do engenho Massang ana, no Cabo,
lembram tipos urbanos.

Ao lado, planta da casa-grande do


engenho Bastiões, em Ribeirão.
Fonte: FIAM.
À direita, planta da casa-grande
do engenho Massangana,
no Cabo de Santo Agostinho.
Fonte: FIDEM.
Abaixo, planta da casa-grande
do engenho Firmeza, em Escada.
Fonte: FIAM.

Na página seguinte, casa-grande


do engenho Bastiões (acima) e casa-
—=d)
grande do engenho Massangana (abaixo). mo FA

80
TN
SER dio PR ata SUaa
Vista e planta da casa-grande do
engenho Jundiá Grande, em Escada.
Planta: FIAM.

A classificação tipológica proposta abrange somente as casas que,


com uma razoável frequência, existem ainda e aquelas sobre as quais se
tem um respeitável registro iconográfico ou bibliográfico. Alguns exemplares
interessantes em si, pelas soluções formais e /ou por sua excepcionalidade,
não puderam se integrar nos tipos identificados.
E
A casa-grande do engenho Limoeiro Velho, no município de Escada,
por exemplo, é um sobrado neogótico que poderia estar situado em qualquer
subúrbio do Recife
A casa-grande do antigo engenho São João, no Recife, é um exemplar
atípico até pelo material empregado em sua construção-ferro. Importada
da Bélgica em fins do século passado, provavelmente via Estados Unidos
da América do Norte, com seus alpendres periféricos e internos, é o exemplo
mais refinado de habitação concebida por europeus para sua vida nos
trópicos.

82
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narasineRips RE
E tao 2 PRETA send
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E Cao PST GugaUÉ A a PASTA E ia E :


"o. o iii Casa-grande do engenho Limoeiro Velho,
em Escada.
Casa-grande do engenho São João,
no Recife.
No dir sanánio de
O termo casa nem sempre designou um edificio
ORIGENS edificio € aposento
Bluteau, casa aparece com duplo significado
odo da cama epur
(Bluteau,1712, p.172). Ainda hoje, em Portugal, o com o de caca
contém os aparelhos sanitários, banheira e chuveiro, é chamad
de banhos. e
que, depois do livro Casa Grande
Já o termo casa-grande
quer casa de proprietário
Senzala, de Gilberto Freyre passou a designar qual
tem origem incerta O termo
de engenho de açúcar do Nordeste brasileiro,
ão ou fazendeiro
teria designado o grande aposento onde permanecia o patr
Lemos, 1972, p. 1 15).
e, por extensão, toda a sua casa (Corona;
expressão € 0
O documento mais antigo em que aparece essa
o ou reparado
Inventário dos prédios que os holandeses haviam edificad
ias à edificios
até o ano de 1654. Nesse documento, onde só existem referênc
urbanos, encontram-se frequentemente expressões como casas grandes
de sobrado, casas grandes de dois sobrados e, no mesmo documento
o que
surgem também casas de sobrado e, casas pequenas de sobrado,
indica que grandes eram as casas, quer fossem térreas ou com sobrados.
No mesmo documento, há um único registro de uma grande casa, que é,
com certeza e devido à sua descrição, o palácio da Boa Vista, construído
por Maurício de Nassau, no Recife (Inventário dos prédios..., 1839, p. 5-
63 e 93).

O termo casa-grande, na acepção de residência do senhor de


engenho, aparece pela primeira vez em 1811, nos relatos do inglés Koster
que residira em Pernambuco. Note-se que a expressão great house já era
usada no século XVIII, na Jamaica, para designar a casa do proprietário de
um engenho de açucar (Ragatz, 1928, p. 5).
Um outro estrangeiro, residente em Pernambuco na segunda década
do século passado, o francês Tollenare, usa somente a expressão casa de
vivenda em suas narrativas. Nas colônias francesas das Antilhas e do
Caribe, no século XVIII, usavam-se as expressões grand'case e maison
du máitre para designar a residência do senhor de engenho (Mousnier,;
Bégot, 1987, p. 35A).
Em meados do século XIX, Vauthier registra o fato de os escravos e
assalariados chamarem respeitosamente de casa-grande a casa do
proprietário do engenho de açúcar.
O imperador Pedro Il, descrevendo sua visita a Pernambuco em
1859, usa a expressão casa de vivenda para referir-se à casa dos senhores
de engenho de açúcar.
A designação mais antiga desse tipo de casa data de 1548, segundo
indica o regimento do primeiro Governador Geral do Brasil, Tomé de Souza,
onde se determinou que os senhores de engenho se obrigarão a fazer
cada um em sua terra uma torre ou casa forte... que abastarão para
segurança do dito engenho e povoadores do seu límite.
A expressão torre não significava, obrigatoriamente uma construção
alta. Na Idade Média, em Portugal, ela designava a casa senhorial que podia
ser também uma casa fortificada ou casa-forte para abrigar os camponeses
e suas famílias em caso de ataque. Nas primeiras décadas de colonização
de Pernambuco, os portugueses tiveram de se defender dos índios eo fizeram
construindo casas fortificadas. Um dos engenhos pernambucanos, o de
Casa Forte, cujo nome hoje designa um dos bairros do Recife, com certeza
teve uma dessas casas.
| No Recife, há uma bairro chamado da Torre, oriundo do engenho
homônimo cuja existência foi registrada pelo viajante inglês James Henderson,
em 1819. A gravura do engenho que ilustra as crónicas desse viajante mostra
a planta baixa
e fachada da sua fábrica, a vista em perspectiva
da senzala€
da casa-grande com capela anexa mas nenhuma torre. A torre desse
pode
ter existido e não ter chegado ao século XIX ou pode nunca
ter existido
e, neste caso, teria sobrevivido a designação portuguesa de casa senhorial.

84
As casas dos tipos IA e IC foram designadas como nortenhas devido
ao seu provável parentesco com as casas rurais do norte de Portugal, Robert
Smith, propositadamente, as chama de portuguesas, certamente aludindo
a um tipo de casa de Portugal que teria resistido, sem significativas
alterações, a séculos de transformações sociais e tecnológicas, mais
evidentes em outros páises europeus:
Em geral de um só andar, é de pedra acumulada sem cimento
recordando o rude aparelho polygonal das idades primitivas ou em
fieiras regulares de pequena espessura collocadas de cutelo, e Casa de lavoura em Balazar, Guimarães,
constituindo o perpianho tão vulgar nas áreas transmontana e minhota. norte de Portugal, in Arquitetura Popular
Ao rês-do-chão cavam-se as lojas para a alfaia agricola, o gado e, às em Portugal, 1988.
vezes o lagar e o celleiro; a escada, exterior encosta a uma das fachadas
ou cae sobre ela perpendicularmente; é desguarnecida e rude, ou cobre-
se no patim do alto com um alpendre elementar. Para a rua pública,
frequentemente para o quinteiro deita a varanda de madeira, forrada
de ripas mal esquadradas, as mais das vezes desguarnecida de
balaustres; nas regiões onde a pedra abunda veda-se até o peitoril com
lagens retangulares e o seu beiral saliente firma-se em colunas delgadas
de fuste monolítico. Aos cantos, dois aposentos furados por janelinhas
tímidas, quase sempre de taipa, quando este elemento se associa à
pedra, completam a physionomia da habitação (Barreira, 1909, p.150). Casa bandeirista do Padre Inácio, em
Se os pintores holandeses Post e Eckhout foram fiéis à realidade ao Cotia, São Paulo.

retratar as casas dos senhores de engenho, Pernambuco possuiu, no século


XVII, uma razoável quantidade de habitações que se enquadram nessa
minuciosa descrição de Barreira.
O alpendre nesse tipo de casa, devido à natureza da cultura da cana,
não teve a mesma função que desempenhava na casa portuguesa, isto é,
sequeiro para os grãos colhidos. A ausência da escada exterior também
pode ser explicada por razões de segurança.
Desaparecida a função de serviço da varanda, restava a do lazer
que, no país tropical assumia um novo valor e se associava à necessária
vigilância dos trabalhos a partir de um local de observação a cavaleiro do
conjunto edificado do engenho.
Robert Smith levanta a hipótese da origem dessas casas ser a mesma
das casas bandeiristas dos séculos XVII e XVII, estudadas por Luis Saia (Smith,
R., 1969, p. 64). Uma ou duas casas das retratadas por Frans Post têm
alpendres entalados no meio da fachada principal e é só nisso que lembram
as casas paulistas que são térreas e construídas em taipa de pilão enquanto
de pau-
que as pernambucanas têm dois pavimentos e construídas em taipa
a-pique.

Sítio do Chacon,
mais tarde de Eduardo Fenton,
segundo litografia de F.H, Carls, 1878.

85
Sitio do Chacon.
Fotografia de Juventino Gomes.
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco,

Não existe remanescente algum das casas do tipo IB. Sua existência
foi avalizada por três quadros holandeses do século XVII. Contudo, existe
uma gravura de Carls de 1878 que registra, nos arredores do Recife, uma
casa térrea com torre sem conexão comprovada com o tipo documentado
por Post. No início deste século, o pintor Mário Nunes retratou uma Casa
de chácara em Casa Forte, subúrbio do Recife, provavelmente construída
no século passado e com características morfológicas semelhantes à
retratada por Carls.
As casas do grupo II são as mais imponentes de todas as registradas
pelos holandeses. Os conjuntos edificados de dois dos engenhos retratados
são muito semelhantes, diferindo apenas nas respectivas casas-grandes.
Existe um terceiro quadro em que aparecem somente a fábrica e a capela
semelhantes aos edifícios homônimos dos dois quadros citados e
implantados no terreno também da mesma maneira. É lícito imaginar que
os três quadros referem-se a um mesmo engenho, registrando três
momentos sucessivos de sua existência; o primeiro sem a casa-grande, o
segundo com a casa-grande já construída e o terceiro mostrando a casa-
grande com o telhado aumentado no seu corpo central.
A casa, portanto, teria sido construída e reformada no periodo de
ocupação dos holandeses (1630-1654).

Mesmo (?) engenho pernambucano


retratado por Frans Post com uma
casa-grande de telhado em três volumes.
Comparar com ilustrações da página 127,

86
Não se conhece a denominação do engenho nem a nacionalidade
do seu proprietário. No entanto, é sabido que os holandeses procuraram
não interferir no processo de produção do açúcar garantindo a integridade
e a propriedade dos engenhos que não foram destruídos pelos seus
proprietários.
Diferente de todas as outras casas documentadas pelos holandeses,
em Pernambuco, esta tem o telhado decomposto em três volumes de quatro
águas cada. Duas torres laterais e uma galeria central com balaustrada e
arcadas no pavimento superior atestam um apuro estético raro em
edificações contemporâneas desse tipo. Em um dos quadros, o telhado
central está ao mesmo nível dos telhados das torres que o ladeiam. No
outro quadro, que pode ter sido posterior, o telhado central foi aumentado
e recebeu uma fiada de janelas sobre as arcadas da galeria. Essas novas
janelas, do ponto de vista funcional, não contribuíram muito para ventilar
o espaço interior do pavilhão central porque a galeria em arcadas já era
aberta e assim continuou. É provável que o crescimento do pé-direito do
pavilhão central tenha se constituído num artifício para a abertura de altas
janelas laterais que o iluminassem e ventilassem.
Foi localizado na Holanda, junto com alguns documentos de
Maurício de Nassau, o projeto de uma casa holandesa para os trópicos
(Terwen,1979). Não há comprovação alguma que essa casa tenha sido
construida mas era destinada a uma autoridade da adminstração holandesa.
Teria dois pavimentos, sendo o térreo destinado a depósitos e 0 superior, à
residência.
Pavimento térreo Pavimento supenor

Hr
ne E”

mm
“Eoaoso frrrceerrea
Casa holandesa nos trópicos.
(J. J. Terwen,1979)

ndre ao longo da fachada


No pavim ento superior, haveria um alpe
cômo dos centrais que eram
principal e quart os ladeando dois grandes
s devi do ao crescimento dos seus
iluminados por janelas altas, possívei em vári os volumes. Terwen
dos telhados
pés-direitos e à decomposição concebidos
e as altas janelas foram
acredita que os cômodos periféricos O pavilhão central.
para tornar maisis fresco o apose nto principal da casa,
E
té 1928, a casa-grande do engenho
Pernambuco, à
Existiu em
Megaípe, cujojo P partido lemb ra as casas do grupo II. Como as casas
Post, ela tem duas torres na na fachada
documentadas por Frans
da por Terwen, tem um pavilhão central
principal e, como a casa estuda
mais alto. = Fo:
saber que ela havia sido
Dinamitada por seu proprietário, ao
de Pernambuco como um bem cultural
considerada pelo Governo do Esta: do das mais
digno de ser preservado, a casa de Megaípe era tida como uma
fóra levantada no século XVI, segundo o jornal A Provincia,
antigas pois
ao noticiar e lamentar a sua demolição em 14 de setembro de 1928.

87
'
comsane
e reis
A E
PSD UN

asc
Casa-grande do engenho Megaiípe. De fato, num documento holandês de 1638, (Costa,
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco. F.A.P., 1983, p.
378), aparece um engenho com esse nome nas proximidad
es do local onde
existiu a casa, o que não é suficiente para se afirmar que
ela date do mesmo
período. Não há documento algum que comprove
a data de sua construção.
Embora estivesse abandonada, sem uso e semi-arrui
nada mereceu,
pela imprensa recifense, quando ainda estava
de pé, uma brilhante descrição:
Levantada sobre duro gneiss, ainda
hoje com as suas
paredes pensas e o seu abalcoado meio
pôdre dá à paysagem uma
como nota feudal. Advinha-se na sua argamass
a o óleo de baleia
das casas fortes; e o conjunto dos seus torreões de telhado
pirâmide e beiral aguçado em azas de pombo ou cornos
em
de lua, de
Suas arcarias e dos seus balcões dá uma idéia de fixidez e
aconchego verdadeiramente patriarchaes. Si ahi, como
em toda a
parte, a architectura antiga do engenho, o horizontal domina sobre
O vertical, não vae ao extremo do acachapado; nem do terrivelmente
chato de que fala Euclydes da Cunha. Sente-se nesta construção de
engenho pernambucano certa verticalidade feudal, Mas sem fazer
88
nolencia ao clima e à paysagem que pedem tão claramente a doçura e o
repouso das linhas horizontaes (Freyre,1925, p. 86).
Embora esta casa tenha tido arcadas no pavimento térreo e em duas
de suas fachadas, o que a situaria no grupo IV, as suas duas torres e a
multiplicidade de telhados são marcas exclusivas do grupo II.
Com respeito às origens das torres desse tipo, se é que ele surgiu
durante a ocupação holandesa de Pernambuco, bem que poderiam ser os
palácios que Nassau construiu no Recife; tanto o de Friburgo, por sinal
conhecido como Palácio das Torres, como o da Boa Vista, tinham torres.
Mas a origem das torres pode estar mais longe no tempo e no espaço.
José Mariano Filho, insurgindo-se contra aqueles que pregavam a
existência de estilo Megaípe, afirmou, em 1944, que a famosa casa-grande
nada tinha de pernambucano, nem tinha parentesco algum com as casas
alentejanas, suas contemporâneas que se construiram nos engenhos de
cana. Para o polêmico líder brasileiro do Movimento Tradicionalista,
como ele mesmo intitulava a corrente de pensamento que implantou o
estilo conhecido posteriormente como neo-colonial, o tipo arquitetônico
de Megaípe podia ser encontrado na Lombardia, na Toscana, em Luca
ou Anticoli (Itália Cunha Filho, J. M., 1943, p. 35-43).
Teriam sido os mesmos tipos desenvolvidos por Palladio nos séculos
XV e início de XVI que, por sua vez podiam ter suas raizes nas vilas da
nobreza rural romana (Ackerman, 1988, p. 58).
Convém lembrar que em Portugal também se fez sentir a influência
de tipos arquitetônicos vindos da Itália e de outros países europeus. Em
outras palavras, Os tipos que os portugueses trouxeram para o Brasil podem
não ter surgido em Portugal. A propósito, existem no norte de Portugal, de
onde veio a maior parte dos colonizadores portugueses no período colonial,
casas rurais que lembram a volumetria da casa de Megaípe, como o Solar
de Bertiandos, em Ponte de Lima,

Solar dos Bertiandos, em Ponte de Lima,


norte de Portugal.

Por outro lado, a origem dos telhados múltiplos bem pode ter sido
região do
uma prática similar comum nas cidades portu árias do Algarve,
sul de Portugal. Os telhados, sempre piramidais, e ram cham ados de tesouro
(Ribeiro, s.d. p. 97). |
Embora a iconografia holandesa sobre os engenhos de açúcar seja
um privilégio exclusivo de Pernambuco, não se constitui numa fonte
incontestável para a identificação de todos os tipos arquitetônicos que
tenham surgido ali. Primeiro, porque não existe outra fonte iconográfica

89
contemporânea, portuguesa por exemplo, que possa ser usada como
elemento de comparação; segundo, porque alguns dos quadros foram
pintados na Holanda a partir de esboços feitos no Brasil com os naturais
riscos de representação convencional a partir de tipos europeus. Todavia,
três quadros holandeses que registram casas com características
excepcionais merecem comentarios. .
Um deles, de Frans Post, retrata uma enorme casa de três
pavimentos em fase de construção, percebendo-se toda a estrutura portante
de pilares e vigas em madeira. Os painéis retangulares das fachadas são
providos de peças de madeira em “X”, como nas construções medievais ta
Europa central. Não se conhece a localização dessa casa, quem a construiu
e nem se sabe se ela chegou a ser concluida. O que hã de notável nessa
casa é o surgimento de um terceiro pavimento que, com área menor do que
o segundo, se superporia à parte central dele. Quanto à técnica construtiva,
o interessante é que o pintor captou o momento anterior ao enchimento
dos vãos com barro ou tijolos. Paredes já concluídas e construidas com
esse mesmo sistema podem ser observadas em outros quadros holandeses
retratando casas de senhores de engenhos pernambucanos.
Um outro quadro, também de Frans Post, contém uma casa-grande
com alpendres justapostos a duas de suas fachadas, nos dois pavimentos,
parecendo acréscimos posteriores para ganhar áreas úteis para o lazer ou
proteções para atenuar os rigores do clima. Os telhados dos alpendres, em
planos diferentes das águas do telhado do corpo central da casa, não se
encontram no ângulo das duas fachadas continuas, isto é, não se forma o
tradicional espigão, o que sugere a execução dos mesmos em oportunidades
distintas. Essa justaposição de alpendres é um caso único no conjunto de
quadros holandeses que retratam casas-grandes de engenhos pois a regra
geral é a ocorrência de alpendres cobertos com uma ou duas águas do
telhado da casa, contidos no volume da casa como se assim tivessem sido
concebidos originalmente.
Um detalhe curioso que aparece claramente nesse exemplar e, com
maior discrição, em outros dois casos, são as aberturas no telhado do
corpo principal da casa. O telhado diminui de inclinação em dois pequeninos
trechos com o mesmo artifício que se pode observar em seis fábricas
retratadas por Frans Post. Nessas fábricas, as aberturas correspondem
sempre às caldeiras e se destinavam, obviamente, à exaustão da fumaça
proveniente da fornalha, pois ainda não havia chaminé. Por analogia,
essas
aberturas nos telhados das casas teriam função similar, constituindo-se
num forte indício de localização da cozinha no interior da residência.
Um terceiro quadro é de autoria de Zacharias Wagener e deve ser
observado com reservas quanto ao seu valor documental devido às
evidentes deficiências de representação. Dos três pintores holandeses
que
estiveram em Pernambuco, Wagener era o menos competente
profissionalmente. Na realidade, sendo soldado, ele improvisou-se em pintor.
No quadro que retrata o engenho Maciape, Wagener
comete erros como
distorções de perspectiva na representação de edifícios, de sua implantação
no terreno e de desproporção da figura humana em relação
às dimensões
das construções. A representação é muito sumária e chega a parecer infantil
se comparada com a qualidade dos quadros de Post e Eckhout.
A casa-grande (? ) representada no quadro está sobre esteios que,
e Dão pm em madeira, apoiam-se em sapatas como os demais
casa teria algendires ie que liga a casa a um edifício de menor paia
largura doa telhado
centrál-d casa C oa qualsa
se tem uma contgu SANAnão pe.existiria
visão aérea, la oh eva
um corpo
escuros, não se: SE a são representados por paralelogramo”
diúvidosa pel percebe a profundidade dos alpendres, cuja existênciaé
- - MOOSa POIS O edifício pode também ser imaginado como um galpão
inteiramente a
berto, sem divisões internas. Com esta hipótese, é lícito
contestar a função residencial do edifício.

90
A documentação iconográfica sobre os engenhos de açúcar
pernambucanos referente aos três séculos do período colonial resume-se
a três décadas do século XVII e se deve aos invasores holandeses. Não há
registros iconográficos sobre o mesmo tema nos séculos XVI e XVIII. Neste
fato, reside a maior dificuldade em atribuir tipicidade às três casas-grandes
construídas no período colonial e que chegaram até os nosso dias: dos
engenhos Megaípe, Gurjaú de Cima (XVII) e Poço Comprido (XVIII). As
primeiras notícias sobre as casas-grandes de engenhos só viriam a surgir
no século XIX, através de depoimentos de viajantes e residentes estrangeiros.
Considerando-se o lentíssimo ritmo de transformações por que
passaram os engenhos de açúcar de Pernambuco, no período colonial, é
possível que as descrições feitas pelos referidos viajantes, no início do século
XIX, se refiram a casas-grandes construídas no século XVIII. Em alguns
casos essas descrições chegam a coincidir com as características registradas
pelos holandeses em seus quadros.
A descrição mais antiga data de 1811 e refere-se ao engenho do
Aguiar cujo proprietário era o Capitão-mor, escolhido entre os agricultores
mais abastados do distrito.
A residência do Capitão-mor é um vasto edifício assobradado. A
parte baixa serve para armazém de açúcar e outros artigos que sua
propriedade produz. Subimos por uma escada de madeira, construida
no exterior do prédio, entrando para uma pequena ante-sala onde fomos
recebidos pelo nosso hospedeiro e um dos seus filhos que nos conduziu a
um espaçoso alojamento do outro lado (Koster, 1978, p. 209).
Nenhuma referência ao sistema construtivo, à exceção da escada
externa, em madeira, que parece ter sido uma característica das casas
do século XVIII, como em Poço Comprido. Quanto ao programa, uma
alusão a um espaçoso alojamento que poderia ser o quarto de hóspedes.
Uma outra descrição, de 1816, da casa-grande do engenho Salgado,
é mais precisa e específica;
serve
Em geral a casa de vivenda é elevada sobre pilares: o porão
uma grande escada com patamar
de estrebaria ou de morada de negros;
se toma o fresco.
dá acesso ao pavimento habitado e é nesse patamar que
e entre
Os aposentos não tem forro; o travejamento do teto está exposto
há um espaço livre
as suas extremidades e as paredes que o sustentam
de ar. As divisões
de cinco polegadas para multiplicar as correntes
sorte que todos
interiores são feitas de simples tabiques de 9 a 10 pés, de
p. 68).
os quartos tem por forro comum o teto (Tollenare, 1978,
coberto de chegada
O lugar onde se toma o fresco deve ser o patamar
porão servindo para a
da escada que vem a ser um pequeno alpendre. O
costume que pode ter existido
morada de negros sugere a persistência de um
ao tempo da ocupação holandesa porque não se vê nos quadros pintados uma
ser considerado
pelos artistas flamengos qualquer edifício que possa
mas os pilares sobre os
senzala. A técnica construtiva não é explicitada, em alvenaria de tijolos,
foi levantada a casa bem que poderiam ser
quais
como no engenho Poço Comprido.
De 1840 a 1846, residiria no Recife o
engenheiro francês Louis Léger
textos sobre a
Vauthier que legaria ao país os mais densos € € lucidativos
arquitetura urbana e rural de Pernambuco.à casa-grande do engenho
Descrevendo, provavelmente,
Sobre a face sul fica a escada nar
Camaragibe, Vauthier escreveu: facha
se projeta além das paredes da
coberta por uma parte do teto que caract erísti cas
(Vauthier, 1940, p. 91). As
e é sustentada por três colunas tas por Koster € Tollen are para
da escada externa são as mesmas descri |
outras casas-grandes. Vauthi er compara-a com as
Referindo-se a uma outra casa-grande, |
casas da ci e ele também conhecia bem: das habitações
Já ãopn mais a monótona disposição
em uma
lá, não podemos penetrar senão
da cidade. Somente aqui, como
91
pequena parte da casa. E só o primeiro andar que é usualmente reservado
ao dono. A parte de baixo é ocupada pelos armazéns e pelo pessoal de
serviço. Vamos ser recebidos em um salão ou parlatório de paredes nuas,
comunicando se diretamente com a escada externa.
Vauthier já havia comentado a hospitalidade de que havia sido objeto,
mas ilustra a privacidade da parte intima e de serviços da casa quando
explica que o salão de visitas se comunica diretamente com a escada externa.
A persistência do uso do pavimento térreo como depósito ou moradia do
pessoal de serviço (seriam os escravos?) já havia sido assinalada por
Tollenare no princípio do século XIX (Vauthier, 1975, p. 81).
Mas a contribuição de Vauthier para o estudo sistemático dessa
arquitetura extrapola a curiosidade dos outros residentes estrangeiros pelo
pitoresco. As generalizações que ele faz parecem ser fruto de uma observação
de vários exemplares de casas, quando afirma que a habitação de um
proprietário de engenho traz, muito mais do que as casas da cidade, a
marca de gostos individuais. Registra os casos excepcionais e, ao mesmo
tempo, manifesta seu maior interesse pelo tipico quando escreve que;
Existem atualmente no Brasil casas de engenho erguidas sobre
uma fileira de arcos elegantes, com sacada provida de balaustrada de
ferro e tendo nove ou dez janelas na fachada, cujo aspecto não destoaria
na mais graciosa das paisagens. As salas no interior são guamecidas
com lambris de madeira e forradas de papéis suntuosos. Mas não é isso
que procuramos. Falta aí a côr local e é sobretudo esta que pretendemos
descrever (Vauthier, 1975, p. 87).
Vauthier considera as arcadas que suportam o pavimento superior,
bem como as balaustradas em ferro como novidades às quais faltaria a cór
local. Confirmada essa hipótese, a casa-grande do engenho da Torre, nas
vizinhanças do Recife, como foi mostrada por Henderson em seu livro A
History of Brazil, de 1821, apresenta-se externamente com caracteristicas
similares às descritas por Vauthier e, como tal, seria um exemplo estranho
ao meio.
Vauthier descreve uma casa que classifica como do tipo médio,
haveria melhores e piores. Considera-a um tanto rústica embora pareça
esplêndida aos olhos dos proprietários vizinhos. Em sua descrição, está
sempre presente a comparação com outras casas que certamente conheceu,
o que valoriza sobremaneira as suas crônicas.
Notemos rapidamente as principais diferenças: em muitos
Engenhos a sala de jantar não é separada do salão ou parlatório e esta
peça é a única franqueada aos estranhos.Os quartos de hóspedes que se
comunicam com a casa, são algumas vezes isolados. Ocupam nesse caso
um local inteiramente diverso ou são situados na outra extremidade do
correr de senzalas.
A capela que vemos aqui encravada na habitação é algumas
vezes deslocada, sem nunca, entretanto, sair do conjunto geral de
edificios.
O modo de construção também nem sempre é o mesmo. Embora
o tijolo tenha sempre preferencia, muitas vezes encontram-se paredes
de pedra argamassada com barro, até a altura do primeiro andar, e
frequentemente também paredes de pau-a-pique. Outras vezes a escada
extemna em lugar de ser de pedra, como aqui, é de madeira, bem como à
galeria mais ou menos espaçosa à qual conduz e que é sempre coberta
por um prolongamento do telhado (Vauthier, 1975, p. 87). .
A coexistência de mais de um sistema construtivo parece ter sido
uma prática comum também no século XVIII. A setecentista casa-grande
do engenho Poço Comprido tem o seu pavimento superior com paredes de
pau-a-pique e o térreo em pilares de tijolos. assisto pouco
Trecho de planta de uma casa-grande de Acapieia encravada na CASA PARECE Ler nldo he pe setecentistas
um engenho pernambucano. Comum, porque, na totalidade de casos conhecidos ecasas. sn dt
L. L. Vauthier, 1853. € Oitocentistas, a capela, quando é conjugada com a casa, justapo

92
r apresenta
“ma de suas extremidades. A planta de casa-grande que Vauthie
da capela que descreve.
“ão deixa margens a dúvidas sobre a localização
vo centro se encrava a capela, que não se disting ue do resto da fachada
senão por uma porta um pouco maior e com verga em arco abatido, por
alguns ornatos no frontão e pela cruz de madeira que a encima (Vauthier,
1975, p. 77).
A locação da capela no centro da casa pode ter sido fruto de uma
concepção original ou resultado de uma arranjo posterior, pois o próprio
Vauthier observa que tudo é construído sem ordem, que as plantas dos
os
dois pavimentos não se correspondem, que há janelas de todos os tamanh
o engenheiro
e formatos e que os rincões e cumeeiras se emaranham. Para |
o, tudo tendo sido construído
francês, nada indica um plano de conjunt |
tários sucessi vos.
por partes e ao sabor dos gostos dos proprie |
u e
Vauthier apresenta dois desenhos dessa casa que levanto |
de coberta, esta contida
descreveu; uma planta baixa parcial e uma planta
dois desenhos deixa
no que ele chamou de plano geral. A comparação dos
da casa-grande. Assim,
claro que a planta baixa representa somente metade
os quartos de hóspedes, a
o trecho desse edifício mostrado é o que contém
os, a saber, o parlatório
capela e os cômodos acessíveis também aos estranh
não teve acesso ao resto da
ea sala de refeições. Provavelmente, Vauthier
casa o que explicaria sua omissão.
características,
Contudo, a planta parcial revela duas interessantes
os através do coro da capela e um
o acesso dos hóspedes a seus aposent |
a dona da casa, com acesso direto
cômodo na zona íntima, reservado para exposta
terceira caracteristica
à nave da capela através de uma tribuna. Uma
por Koster, Tollenare e o próprio
nessa planta já havia sido percebida terraço coberto
s: um pequeno
Vauthier em outras casas-grandes de engenho parlatór io e à sala
dá acesso ao
ao qual se chega pela escada externa e que
de jantar.
do engenho Noruega, cujas
Outra casa notável e desapareci da é a
“Grande & Senzala, de Gilberto
plantas baixas ilustram O livro Casa
Freyre.
uma planta linear no pavimento
Implantada à meia encosta, tem
O comprimento de suas fachadas, de
térreo e em forma de “L” no superior. de
com à maioria das casas-grandes
35 metros, é grande se comparado ao século XVIII
construção é atribuída
engenhos pernambucanos. Sua são
mas os usos dos seus aposentos não
(Mello, J.A.G., 1971, p. 3), es situ am-s e no
Os cômodos dos hósped
habituais nesse período. Assim, maioria dos viaj ante s
ndo o depoimento da
pavimento térreo, destinado, segu içais.
a depósito ou alojamento de serv
da primeira metade do século XIX, com uni ca-se
no pavimento superior,
A zona social da casa, toda imento superior
com as tribunas e coro do pav
direta e independentemente original e já registrada
da capela, o que sugere ter sido essa a sua concepção
por Vauthier na casa que desenhou. , a adega, à
preende as duas cozinhas
A área de serviço, que com ndo a
de 75% da área social, confirma ,
dispensa e o engomado é realizadas.
intensividade das atividades, ali, pelo pintor Cicero
casa foi representada
No mesmo livro citado, essa descoberta, para mostrar
Dias, com uma perspectiva aérea e parcialmente
utilizava cada aposento.
o mobiliário e o tipo de gente que I e do tipo IB possuem um elemento
As casas-grandes do variadas,
id as:
drttid
ç s controver O alpendre. De dimensões
de origens e funçõe uma escada externa, ora se estend
e
ora reduz-se ao patamar superior de raras e,
uma extensão desÍ se patamar
ao longo da fachada como se fosse
duas paredes cont ígua s. |
de
vezes, desenvolve-se ao longo ndre s: sequ eiro
s a esses alpe
Pelo menos três funções são atrib uídação com os cômodos da casa €
de produtos agricolas, corr edor de comu nica
de
a tropical (Lemos, 1989, p. 27). A
proteção contra os excessos do clim se repr oduz iu
norte de Portugal, não
sequeiro, cuja origem se localizou no
93
em Pernambuco devido à própria natureza da cultura da cana-de- açucar
É provável que tenha surgido no Brasil como uma forma de persistência
do partido original nortenho, mas com outra função, a de supervisão das
tarefas de produção.
Não se constatou em Pernambuco a existência de alpendres com a
função de comunicação entre cômodos, à exceção de exemplos mais
recentes de alpendres que se desenvolvem em torno de pátios internos. Nas
regiões do Minho, Douro-Litoral e Beira-Alta, em Portugal, essa função
sobrevive na arquitetura popular e sua origem se perde no tempo. No Brasil,
alpendres com essa função aparecem à partir do século XVII em Minas
Gerais (Menezes, 1969, p. 218 e 1983, p. 218).

Casa de fazenda dos Martins, em


Brumadinho, Minas Gerais.
Foto de Ivo Porto de Menezes.

Casa de Fazenda de São Nicolau, em


Nova Era, Minas Gerais.
Foto de Ivo Porto de Menezes.

Quanto à proteção contra os excessos do clima tropical, convem


observar que, se o alpendre se desenvolve ao longo de uma única fachada,
somente os cômodos voltados para ela seriam beneficiados. Haveria uma
real proteção para todos os cômodos se o alpendre se estendesse a todas
as fachadas, o que não ocorreu até o século XVIII, em Pernambuco. E
oportuno distinguir entre o procedimento sistemático de dotar um edificio
de alpendres, visando a sua proteção dos rigores climáticos, e a acidental

94
Engenho d'Água, em Ilhabela,
São Paulo.
Foto: CONDEPHAAT.

Fazenda Sant'Ana, em São Paulo, com


engenho e morada sob o mesmo telhado.
D SR Tee Er 7 so Foto: CONDEPHAAT.
go Y A Dr CRS

e involuntária defesa que se consegue quando os alpendres foram


concebidos com outros fins. O norte de Portugal, onde se alastrou o uso
os excessos
de alpendres na arquitetura rural e urbana, não sofre
tropicais, tão pouco as terras altas de Minas Gerais e de São Paulo, onde,
es lineares .
no século XVIII, existiram casas rurais com alpendr
na arquitetura
Na realidade, os alpendres, ou varandas, existiram
origem provável é O
portuguesa antes de se manifestarem no Brasil. Sua
sequeiro mas podem ter evoluído para um espaço de circulação, proteção
associada à
e até ter encontrado sua vocação de lazer contemplativo tão
modorra tropical.

Alpendre em "L" na Quinta do Pomarchão,


em Ponte de Lima, norte de Portugal.
Quinta do Sabadão, em Ponte de Lima,
norte de Portugal.

Quinta do Fervença, em Barcelos,


norte de Portugal.

Quinta do Carbido, em Ponte de Lima,


norte de Portugal,
A casa portuguesa teria passado por um processo de tranformação
que se iniciara no Renascimento e tivera seu período áureo no século XVIII
A mais importante inovação desse processo teria sido a adoção da varanda
(Azevedo, C., 1969, p- 53). As varandas portuguesas, assim como as
brasileiras, eram lineares até o século XVIII. Um único remanescente
português, a Casa do Pomarchão, em Ponte de Lima, tem varanda em “L” e
pode datar do século XVIII. Outros exemplos notáveis são a Quinta do
Sabadão e a Casa da Fervença, ambos no norte de Portugal.
A comparação entre esses exemplares e as casas que têm o mesmo
partido arquitetônico no Brasil expõe as diferenças de fatura e de materiais,
com evidente vantagem para as casas portuguesas.
Ainda segundo Azevedo, o segundo tipo de casa que se desenvolve
durante o século do setecentos e que adquire expressão muito
viria a se
característica é a casa que integra a capela na fachada e que
(Azevedo, C., 1969,
constituir num padrão de casa tipicamente portuguesa
p. 81).
e
Até mesmo as capelas centrais, como uma levantada por Vauthier
a Pernambuco,
outra (?) observada pelo Imperador Pedro II em sua viagem
em Portugal no século
que parecem ter sido raras nessa região, eram comuns
XVII.
deve ter sido
As casas do tipo IA do grupo constituído de solares
Brasil, pois chego u a ser
muito frequente em Pernambuco e no resto do assim O
a. Aqueles que
considerado um tipo brasileiro de arquitetur na Bahia , e
s, principalmente
consideravam eram os escravos alforriado como
aram a ser conhecidos
retornados à África no século XIX, onde pass
a arqui tetur a que levaram e introduziram
brasileiros, como brasileira era
na pátria-mãe (Cunha, M.C., 1985, p. 99).
brasileira, provavelmente
O que os africanos chamavam de casa
era o tipo designado neste trabalho
por ser muito frequente no Brasil,
com os homônimos portugueses.
como solar devido à sua semelhança
caracteriza por ter dois pavimentos,
Importa lembrar que o tipo HA se
águas, € pela ausência de alpendres.
escada interna, coberta em quatro parte
ia, onde se concentrou a maior
Nas casas brasileiras da atual Nigér ecem limitam-se a
de brasileiros, os alpendres são raros € quando apar
io.
uma fachada e nunca envolvem o edifíc
sobre arca das do grupo IV, com seus pavimentos
Os sobrados
ralmente, por arcos plenos lembram a
térreos vasados, parcial ou integ as Casas de
l do perío do colon ial, mais especificamente
arquitetura oficia quatro águas €
de Câmara com telhados em
Câmara e Cadeia. Essas Casas século XvI ao XIX
são comuns em Portugal do
arcaria no pavimento térreo, p. 112). A adoção desse
R., 1969,
e derivam de tipos medievais (Smith, ietário, porque às casas assim
tipo indica as grandes posse s do propr
etência acima do
urso de profissionais de comp
construidas exigiram o conc no meio rural. Em Pernambuco,de
nível médio do período colonial de um número elevado
considerando-se a locação às margens de rios
vasar em arcos de
a ainda justificar a prática de
hos, poder -se-i nção con a
térreo das casas como preve
engen
alvenaria todo o pavimento
eventuais inundações fluviais.
s na segunda
€ VIH foram todas construída
As casas dos grupos V, VI alows € Falsos
metade do século XIX. Sua denomina ção de Bung ] anos,
-indi
ga lows anglo
dev e à sua semelhança com 0S bun col oni zadores
ows se o pel os
olvido no século passad Índia. Esse cu foi
Bun gal
um tipo de cas a des env
isto é, gala,
padrão da região de Ben
ingleses a partir de umleses € assimilado pelos outros europeus em todas
disseminado pelos ing o
as suas colônias de clima tropical. de bungalows ou
j evistros de vários tipos
N i Jo
obson- E bson, 1886), o
houses in Benga
id li style, desde o sécu lo XVII . (Htenha exist ido antes.
tipo de casa não
que não significa dizer que esse
97
Essencialmente, se constituia de um edificio térreo, assentado
sobre um embasamento plano e horizontal que se elevava cerca de um
metro em relação ao solo natural e com telhado em quatro águas que se
estendiam para cobrir os alpendres periféricos. À técnica construtiva
variava de acordo com os meios disponíveis sem mudar o seu partido
arquitetônico básico. Assim, há bungalows com paredes de pau-a-
pique, estruturas de coberta em madeira e recobrimento em palha; com
paredes de tijolos, estrutura de coberta em madeira e recobrimento em
telhas de barro e, até mesmo, montados em estruturas em ferro com
vedações e recobrimento em chapas de ferro onduladas ou estampadas,
como foi o caso dos pré-fabricados na Europa, no fim do século XIX ,e
Bungalow em Milnath, Índia, construído exportados para a África, Ásia e América do Sul.
com mão-de-obra e materiais locais e Esse tipo recebeu aprovação geral dos seus usuários e
adaptado ao uso europeu.
reconhecimento oficial quando suas características, estudadas pelo
(G. Grant, 1860).
Royal Institute of British Architects, foram consideradas ideais para a
habitação dos europeus nos trópicos e recomendadas como
procedimentos normativos (Smith, T.R., 1868). O uso sistemático da
varanda com o objetivo de amenizar as condições ambientais do espaço
interno das casas é, como diziam os arquitetos ingleses, a caracteristica
principal do bungalow.
Muitas casas-grandes de engenhos, de Pernambuco e de outras
regiões no Brasil, têm ou tiveram dessas varandas e o seu aparecimento
pode ter resultado da evolução das primitivas varandas entaladas
nortenhas ou da importação, em fins do século XVIII ou início do XIX, do
tipo anglo-indiano do bungalow. Não resta dúvida quanto à evolução da
varanda nortenha até aquela utilizada no século XVIII e que ocupava
parcial ou totalmente uma fachada, processo este constatado em Portugal.
Por outro lado, considerando a lenta dinâmica da colonização portuguesa,
custa a crer que a varanda linear tenha evoluído para a periférica ao longo
de três e, até mesmo, quatro fachadas da casa.
Os portugueses poderiam ter conhecido algum tipo de bungalow
indiano no século XVI, pois Goa, posto avançado do mercantilismo luso,
situa-se na mesma região de Bengala. No entanto, a casa típica de Goa
tem as características do falso bungalow, isto é, os telhados dos seus
alpendres periféricos encontram as paredes do núcleo central o que sugere
a sua execução posterior (Hutt, 1988, p. 116). A arquitetura dos
portugueses
em Goa foi essencialmente urbana, o que dificulta a comparação dos
tipos
arquitetônicos ali encontrados com os tipos rurais brasileiros.
No Brasil, só há registros consistentes de casas rurais térreas,
com
varandas em três lados, a partir do século
XIX.
Na Bahia, casas-grandes de engenhos com essas características
entraram em voga no Recôncavo na segunda metade do século XIX
(Pinho, 1946, p. 273). Em estudos mais recentes, Esterzilda Azevedo,
embora reconhecendo não dispor de documentação confiável, estima
que essas mesmas casas datem do final do século XVIII (Azevedo, E.B.,
1990, p. 50).
Em 1825, Alexander Caldleugh, descrevendo sua viagem à América
do Sul de 1819 a 1821, observou que as casas da vizinhança do Rio de
Janeiro eram, em sua grande maioria, cercadas
por varandas.
; Em 1834, o pintor francês Jean Baptiste Debret, em seu livro Voyage
pittoresque et historique au Brésil, descreveu e desenhou
o que viu no Rio
de Janeiro de 1816a 1831, chamando de varandas brasileiras as que
viu ao longo de três fachadas das casas dos arredores da cidade
e lhes
atribuiu a função de atenuar o calor nos cômodos interiores.
Em 1835, foi a vez de outro pintor, o alemão Rugendas, narrar
sua viagem ao Brasil e, ainda com referência às casas de colono, que
viu no Rio de Janeiro, notar curiosamente que em torno delas se estende
uma varanda que lembra as casas dos camponeses de alguns cantões
suiços.

98
Casa de Grandjean de Montigny, na cidade
do Rio de Janeiro, construída na segunda
década do século XIX

Essas casas avarandadas, segundo o depoimento dos viajantes


citados, eram casas de chácara e foram todas construídas nos arredores
da cidade portuária do Rio de Janeiro, onde era possível se exercer a
influência de gostos e costumes estrangeiros, principalmente após a
Abertura dos Portos, em 1808. Essas varandas teriam sua origem nas
casas-grandes dos engenhos (Santos, 1981. p. 35), no entanto, na vizinha
região de Campos, que concentrava, no século XIX, a grande maioria dos
engenhos de açúcar, não há registro de casa-grande alguma com varanda
em três dos seus lados.
Das casas de fazenda, remanescentes na vizinhança da cidade do
Rio de Janeiro, somente uma tem varanda em três lados, a de Colubandeê,
em São Gonçalo. Esta casa, segundo Paulo Santos, tem uma dignidade e
nobreza que a situam como dos pontos mais altos dos quatro séculos de
arquitetura no Brasil e ademais disso, o prestígio de ser uma das casas
mais autenticamente brasileiras. O mesmo pesquisador conclui que, não Casa de fazenda Colubande, em São
existindo tipo similar em Portugal, a casa de Colubandê só pode ser uma Gonçalo, Rio de Janeiro, construida na
segunda década do século XIX.
invenção brasileira.
o

-
-
I

Lt

Acima, planta de uma casa rural cubana


É (F.P. de La Riva, 1952); i Eos
Mas esta casa, cuja construção é provavelmente de cerca de 1800
ao lado, planta da fazenda Colubande (Smith, R., 1969, p. 160) tem, como uma característica que a diferencia da
( Joaquim Cardoso, 1962). grande maioria de casas avarandadas, o pátio interno provido também de
alpendres. A comparação da planta baixa desta casa com a de uma casa
rural cubana do século passado (Riva,1952) sugere um cruzamento mais
complexo e amplo de influências que teria sofrido a arquitetura realizada
no Brasil e que contempla outras fontes além da antiga matriz portuguesa.

Casa de chácara nos arredores de


Havana
(F.P. de La Riva, 1952).

É lícito imaginar que


avarandadas tenha sur
ess
e tipo arquitetônico
gido, no Brasil, nas das casas
difundido na zona rural, inv zonas suburbanas e
ertendo o sentido de influê se
por Paulo Santos. ncias suposto
O primeiro registro de casas
Pernambuco, data de 1824, avarandadas desse tipo, em
quando Maria Graham pub
intitulado Journal ofa voy licou o seu livro
age to Brazil and reside
1821, 1822 and 1823 (Graham, nce during the years
1824, p. 129). Graham descre
oportunidade um passeio pelos
arredores da cidade do Recifeveu naquela
e a visita
a uma casa de campo que ela acredita ser
vizinhança. Essa casa térrea do mesmo tipo
e com varandas periféricas de outras A
com um bungalow orient
al pela aut foi comparada
na Índia e publicado, em 1812, ora que já havia residido anteriormen e
um outro livro sob o título Journa
residence in India. l ofa
;
quintas Ess a casa est
ou chácaras ava localizada num síti
que começaram a sur o, como eram ch amadas 1
no início do século XIX gir nos arredores do
, resultantes de nd
lot
de açúcar. Dentre os primeiros ocupantes eamentos de antigos cnpnoA
desses sítios, havia muitos
100
Recife, e aos quais se Casa-grande e capela
cidadãos ingleses, já em grande quantidade no na praça Chora Menino, no Recife.
bios dessa cidade
credita a introdução do hábito de residir nos subúr (W. Hadfield, 1854).
(Freyre, 1977, p. 138).
do Recife e que
A casa que Maria Graham visitou nos arredores
ão inglês que pode
comparou a um bungalow oriental pertencia a um cidad
pode tê-la adaptado
tê-la adquirido de um brasileiro e não tê-la reformado,
uma nova a seu
aos seus padrões de conforto ou ainda ter construído
do anteriormente
gosto. A propósito, dois estrangeiros que haviam residi
no Recife, o inglês Koster (1809 - 1815) e o francês Tollenare (1816 -
a cidade e seus
1817) demonstraram, em suas crônicas, conhecer bem
casas de cháca ra as descrevem
arredores mas quando se referem às
idas varan das.
sumariamente, sem notar a existência das discut
Recife, adaptar
Teria sido fácil para o inglês, visitado por Graham, no
conhecer pela
a simples casa de chácara ao tipo que, se não vira, poderia
com uma varanda e,
experiência dos compatriotas na Índia, cercando-a
l.
portanto, fazê-la parecer com um bungalow orienta
XIX. Em 1818,
A presença inglesa no Recife foi significativa no século
1838, uma
tiveram ali um cemitério exclusivo; em 1818, um hospital; e em
tação, às fundições de
igreja. Ligados ao comércio de exportação e impor às
hos de açúcar,
peças de reposição para os maquinismos dos engen
eiras,
estradas de ferro, às empresas de comunicação e às instituições financ
s
foram responsáveis pela introdução de hábito e costu mes adota dos pelos
nativos como símbolo de status social. Na realidade, no século passad o, os
ingleses estavam espalhados por todo O mundo subdesenvolvido,
de
comprando matéria prima e vendendo produtos manufaturados. Tendo s
residir em países de clima inóspi to, tivera m de se adapta r, criand o norma
de procedimento, como as definidas pelo Royal Institute of British
Architects para habitação de europeus nos trópicos.
As maiores e mais complexas das empresas inglesas eram as de
construção e exploração das estradas de ferro que, não raro, construíam

101
Acima, casa de funcionário da estrada
de ferro inglesa,
no município pernambucano
de Cabo de Santo Agostinho.
Pormenor da litografia de Emil Bauch,
1852.

Ao lado, locomotiva e casa da estrada de


ferro explorada pelos ingleses
em Pernambuco.
Foto de Augusto Stahl, 1858.

residências para seus altos funcionamnos nos padrões de conforto


ambiental considerados ideais segundo suas normas. Os tipos
arquitetônicos dessas casas, por certo, eram modelares para os nativos,
naturalmente. A casa-grande do engenho Novo da Conceição, classificada
neste trabalho como falso bungalow, lembrava, com as linhas de sua
arquitetura... com o seu telhado em quatro águas, as casas em que os
ingleses da Great Westem e da Westem Telegraph, moravam nos subúrbios
do Poço da Panela, e de Apipucos, no Recife (Rabelo, 1967).
É provável que o tipo do bungalow tenha sido introduzido nas
colônias produtoras de açúcar nas Antilhas e no Caribe e, a partir daí,
chegado ao Brasil. Desde fins do século XVIII até meados do século
passado, os produtores de açúcar no Brasil importaram técnicas daquelas
regiões. Junto com essas técnicas e com os profissionais ingleses e
franceses que as introduziram, provavelmente chegaram também
notícias sobre novas formas de habitar nos trópicos que não os
tradicionais solares lusitanos.
A propósito, Edward Long, em sua History of Jamaica, publicada
em 1774, afirmava que as casas feitas pelos espanhóis, antigos
colonizadores da ilha, eram muito pequenas mas que podiam ser
facilmente aumentadas construindo varandas em três dos seus lados
à
maneira oriental, e isto teria sido, segundo Long, um mérito dos ingleses.
O mesmo autor informa que as casas espanholas tinham
varandas
somente ao lon go da fachada principal e, às vezes também,
fachada posterior e que os ingleses as cercavam inteirámente ao longo da
para torná-las
de varand as
mais frescas e agradáveis.
Casa do Superintendente da Marinha em Na realidade, em todas as ilhas do mar do Caribe e do mar
das
Port-of-Spain, Trinidad. Antilhas, cruzaram-se influências de tipos de arquitetura exógen
os. Em
(A.C.Acworth). 1899, Margherita Arlina Hamm, em seu livro, Porto
Rico and the West
Indies, notava que a maioria das casas da cidade de Ponce eram
construídas à moda de bungalows orienta
is (Hamm, 1899, p. 29).
Na ilha de Trinidad, a arquitetura teria sido espanhola no século
XVII,
francesa na primeira metade do século XIX e poster
iormente inglesa (Acworth,
1949, p. 26). A residência do administrador da ilha, construida ali no
período
de influência inglesa, assemelha-se à casa-grande
do engenho Sapucají, em
Pernam buco, erigida em 1862,
Tipo semelhante ao bungalow também foi encontrado em ilhas de
colonização francesa, como é o caso da Martinica, onde, no século XVIII, as

102
casas crioulas, um estudo
Evolução das
vernacular francesa,
da arquitetura
(J. Edwards. 1988).

1 - Primitivo Colonial Frances

w Y + Francés
MM
2 - Colonial

NE us
É
3 - Colonial Franco-Espanhol

4 - Pós-Colonial

UMA ia uia A - Alpendre

+
7171
A y
=

/UU:
A
3 +
MMA

A Vdc

ferra / ZU
INSS

ENS

»
AS

a 2a
galerias ao longo de três
casas dos senhores de engenho de açúcar tinham
Bégot,
lados inteiramente integradas ao corpo principal da casa (Mousnier;
existiram também no Haiti,
1987, p. 354). Casas com essas características
no mesmo período.
éricas já existiam desd e o
Grandes casas rurais com varan das perif
nge, na Luisiana
século XVIII, no sul dos Estados Unidos, como a casa Parla
francesa, construída em 1750, um clássico exemplo do estilo
colonial francês
Esta dos Unidos
(Morrison, 1953, p. 263-4). A arquitetura coloni al do sul dos
todas as disposições
está repleta de exemplares de cas as com varandas em
e de influ ências recebidas.
conhecidas, também como resultado da diversidad
1988 sobre a arquitetura
Jay D. Edwards, em seu estudo publicado em
vernacular francesa da Louisiana, chegou a classifica
r as casas por suas
casas com varandas ao
plantas baixas e identificar-lhes a origem. Assim, as
e posterior) teriam se originado do
longo de uma ou duas fachadas (principal e uma posterior
primitivo colonial francês; as que tinham trê s varandas
corres pon dente ao designado neste
entalada entre dois cômodos fechados, tipo
trabalho como bungalow, se identifi cariam com O estilo colonial franco-
espanhol (Edwards, J., 1988, p. 1 3).
Casas rurais com plantas retangu lares e varandas periféricas foram
típicas também nos engenhos de açúcar de Cuba, no século passado
(Sanchez, 1936, p. 36).
pai Na realidade, casas rurais com varandas periféricas existiram na
lômbia, no Chile e na Argentina, no século XVIII, o que pode indicar uma

103
matriz espanhola. Contudo, as prováveis influências recebidas pelas casas-
grandes dos engenhos pernambucanos têm suas origens em outras regiões
produtoras de açúcar.
Voltando à realidade de Pernambuco, convém lembrar que casas-
grandes com varandas periféricas não foram notadas por viajantes argutos
como Koster e Tollenare, na segunda década do século XIX, nem por
Vauthier, na metade desse mesmo século. Se elas fossem frequentes e
comuns por certo teriam sido percebidas. Comprovadamente, elas só
começam a surgir em Pernambuco na segunda metade do século passado,
por coincidência ou não, com a intensificação das atividades de empresas
de cidadãos ingleses.
Os chalets do grupo VIII começam a surgir na zona rural de
Pernambuco, em fins do século passado. Tendo como característica o
telhado do corpo principal da casa em duas águas, foram construídos
primeiramente nos subúrbios do Recife. Este tipo, oriundo da Europa
Central, aparece simultanemente em todo o Brasil. No entanto Pereira da
Costa, em seu Estudo Histórico-retrospectivo sobre as Artes em
Pernambuco, publicado em 1900, atribui à chegada ao Recife, em 1839,
da Companhia de Construção, formada por 195 operários, sob a direção
do engenheiro e arquiteto Augusto Koersting, a divulgação de novos
conhecimentos sobre as artes da construção.
É bem verdade que esses operários foram utilizados principalmente
na construção do teatro Santa Isabel, da Alfândega e do porto
do Recife e,
no interior da antiga província, na construção de pontes e
estradas. Contudo,
a participação desses operários foi episódica porque, ao
fim de três anos
somente, onze deles permaneciam em Pernambuco. Por
outro lado, desde
meados do século passado, cidadãos pernambucanos
faziam seus estudos
de engenharia na Europa e de lá traziam novas técnicas.
Pereira da Costa, no mesmo Estudo referido, afirmava
que a nossa
arquitetura não se recomendava pela sua originalidade
nem pela sua
elegância, defeito este que viria dos tempos da colônia
quando se inspirava
nos modelos da metrópole, construídos com muita
solidez. No mesmo
Estudo, notou que as construções rurais, como
as urbanas, passaram a
ter um aspecto elegante, quando escreveu:
As casa baixas, geralmente de quatro águas, com
alpendres sobre
pilares, deram lugar aos prédios elegantes
construídos com os seus
frontões e columnatas de formas e architectura differentes,
no meio de
jardins e pomares, fechados por gradil e
portão de ferro, e por fim, os
novos generos de construção , ao elegante
chalet, com toda a leveza de
seu typo original e às luxuosas habitações
com sua frontaria de mármore
bellamente architectadas, desde o modesto
estylo toscano até o imponente
góthico e o bello mourisco que dão às
nossas estradas suburbanas e aos
arrabaldes da cidade um aspecto imponente
e agradável (Costa, F.A.P.,
1900, p. 37).
O elegante chalet fazia parte do extenso
vocabulário eclético que se manifestava, rol de novidades do
essencialmente, na arquitetura

: prares, não é clara quanto à disposição dos alpendres, se


lineares ou periféricos. Apesar de referir-se às construcções do campo,
Perei
ra da Costa, de fato, alude às casas de
chácaras nos sítios suburbanos

Pernambucanos, não há referências consider


áveis às características formais
de quaisquer dos edifícios dos
engenhos de açúcar.

104
A Capela

A classificação tipológica das capelas não se condiciona pelos Tipologia


seus elementos de decoração, embora estes sejam úteis para estimar a
época de sua construção ou reforma. Uma vez construídas, as capelas
foram os edificios que menos se modificaram através do tempo. Raramente,
nota-se tentativas de adaptação ao gosto contemporâneo e, quando isso
ocorre, se manifesta no arranjo do frontão ou nos altares.
As capelas foram sempre construídas com materiais mais duráveis
que os utilizados nos demais edifícios do engenho. As alvenarias, de
pedra ou de tijolo, foram as técnicas preferidas, não se constatando
caso algum de construção em taipa de qualquer tipo.
As coberturas sempre foram executadas com estruturas de
madeira, utilizando-se tesouras de uma ou duas linhas, caibros e ripas.
Enquanto as tesouras são em madeira lavrada, os caibros são, via de
regra, roliços e as ripas frequentemente se resumem a cascas de embira.
O recobrimento é sempre em telhas de barro tipo canal. Contudo, no
antigo morgado do Cabo, região onde se situaram alguns dos primeiros
engenhos da capitania, encontra-se ainda as ruínas da ermida de São
Gonçalo, com sua capela-mor coberta por uma cúpula esférica em
alvenaria de tijolos.
Considerando-se somente as capelas remanescentes, pode-se
afirmar que os forros, quando existiam, limitavam-se à capela-mor, eram
executados em madeira e tinham a forma de abóbadas de berço. No
entanto, sabe-se que algumas dessas capelas foram suntuosas e teriam
Bonito,
tido seus interiores profusamente decorados, como a do engenho
famosa por sua capela-mor forrada com abóbadas de arestas revestidas
de talhas e por sua nave com um forro plano horizontal artisticamente
pintado.
As capelas raramente tin ham torres sineiras. Os seus sinos eram
e ao lado da
assentados em vãos abertos nas paredes no mes mo plano
fachada do corpo principal.
à riqueza dos
As referências bibliográficas são unânimes quanto
e a venda de altares,
interiores das capelas, mas o seu saque organizado
tipológica. Resta, como
imagens, pinturas e talhas impede uma classificação

Cúpula da ermida de São Gonçalo, no


Cabo de Santo Agostinho.

105
Planta das ruínas da ermida
de São Gonçalo.
Levantamento do autor,

Ao lado, paredes que sustenta


m a
cúpula da ermida de São Gonç
alo, no
Cabo de Santo Agostinho.

Fachada eclética da capela setecentista


do engenho Bonito, em Nazaré
da Mata.

Planta da capela do Engenho


Bonito.
Fonte: FIAM.
engenho Bonito, com Altar-mor, púlpito e tribuna da
testemunho dessa opulência, a já referida capela do capela do engenho Bonito.
nas e púlpit o revest idos com talha
seu altar-mor, arco-cruzeiro, tribu
dourada. :
era também muito simples, constituindo-se,
O programa
Os alpendres e galerias
basicamente, de nave, capela-mor, sacristia e coro.
atividades se realizam
laterais aparecem somente em alguns tipos. Todas as se no
do coro que, invariavelmente, situa-
no pavimento térreo, à exceção a entra da
terço da nave, sobre
pavimento superior e ocupa o primeiro
principal.
erais, sempre em dois
Algumas capelas possuem galerias lat grande para garantir a
pavimentos quando a capela é contígua nho.à casa-
privacidade da família do senh or do enge
s em três grupos de partidos
As capelas foram classificada
bém cron ológica, embora tipos de grupos
arquitetônicos e sua ordem é tam o que os mais recentes.
mais antigos possam emergir ao mesmo temp
o programa mais reduzido, esse ncialmente a
O Grupo I possui isti a contidos em três volu mes dist intos, sendo
nave, a capela-mor e a sacr
à capela-mor € O maior para
o menor para a sacristia, o intermediário para
s na iconografia
a nave. Os exemplares deste grupo estão presente
holandesa do século XVII.
à nave e à capela-mor,
IA - Este tipo, com seu pro grama limitado lares remanescentes
não tem regist ros iconográficos. Um dos dois exemp
pertenceu a um engenho
€a ruína de uma capela que, embora rural, não
da ermida de São Gonçalo, em terras
de açúcar propriamente dito. Trata-se ia capela.
do antigo engenho Jurissaca, que possuía sua própr
107
A ermida possui ainda uma capela-mor de planta quadrada
coberta por uma cúpula sobre pendentes esféricos. Tanto o intradorso
da cúpula como as faces internas das paredes que a sustentam eram
revestidas com azulejos tipo tapete. Esta capela, originalmente não
possuía sacristia. Os restos das paredes que ainda lá se encontram e
que poderiam ter formado a sacristia de construção posterior não têm
amarração com as paredes da capela-mor. Na frente desta capela, existe
uma saliência de terreno que pode encobrir o que teria sido um adro
ou a base de um alpendre. A construção da ermida é anterior à invasão
e: holandesa. Ru
Capela do engenho Mundo Novo, É possível que este tenha sido o modelo das primeiras capelas
em Itaquitinga. rurais no Brasil Colônia.
O outro exemplar remanescente, a capela do Engenho Novo,
no município de Itaquitinga, não tem cúpula na capela-mor e data do
século XVIII.
O tipo IB distingue-se do anterior somente pelo aparecimento
da sacristia, sempre ao lado da capela-mor, e do coro, ao qual, às vezes,
se tem acesso por escadas externas sem coberta. As dimensões das
capelas variam muito, mas é constante a relação de superioridade do
volume da nave em relação ao da capela-mor.
A composição básica dos vãos da fachada é o triângulo formado
pela única porta central e as duas janelas do coro. Um óculo, no eixo
vertical de simetria e um pouco acima do nível das janelas, aparece
com razoável frequência. Os elementos decorativos da fachada
limitam-se ao frontão, cuja cornija se encurva de várias maneiras.
A este tipo pertencem as capelas dos engenhos Patrimônio, no
município de Condado; Terra Nova, em Aliança; Conceição e
Tamataúpe de Flores, em Buenos Aires; Araticuns, em Vicência; São
Sebastião, em Itambé; Monte Alegre, em Macaparana; Pindoba, em
Timbaúba; Canavieira, em Chã de Alegria; Jurissaca, no Cabo; Murin,
em São José da Coroa Grande; Penedo Velho e Primavera, em
Tracunhaém; Bujarí, em Goiana; Guabiraba, em Limoeiro; Pagy, em
Nazaré da Mata; e Tabairé, em Iaquitinga.

Vista e planta da capela


do engenho Tabairé, em Itaquitinga.
Planta: FIAM.

108
Capela do engenho São Sebastião,
em Itambé.

Capela do engenho Terra nova,


em Aliança.

109
Capela do engenho Penedo Velho,
em Tracunhaém.

Planta e vista da Capela do engenho


Jurissaca, no Cabo de Santo Agostinho.
Planta: FIDEM.
|

a al
o o
e
e
q
o
o e
O tipo IC, além das características básicas, possui um alpendre Acima, à esquerda, vista da capela do
com coberta em três águas na fachada principal. engenho Garapu, no Cabo de Santo
A iconografia setecentista holandesa registra este tipo de capela Agostinho. .
Acima, vista da mesma capela.
com alpendres cobertos com uma, duas e três águas, mas os exemplares
Foto de Juventino Gomes, acervo da
remanescentes em Pernambuco e na Paraíba têm três águas. Esses Fundação Joaquim Nabuco.
alpendres têm sempre a estrutura de coberta em madeira , recobrimento Planta: FIDEM.
em telhas cerâmicas e se apoiam em colunas de alvenaria de tijolos.
No vizinho Estado da Paraíba, encontra-se o exemplar mais erudito
desse tipo. Trata-se da capela do engenho de N. Sra. do Socorro, no
município de Santa Rita. Os capitéis toscanos das colunas tronco-cônicas
dessa capela setecentista atestam a importância do seu alpendre no
Programa do edifício.
Os exemplares pernambucanos desse tipo são as capelas do
engenho Garapu, no município do Cabo, e do engenho Caraúbas, em Capela do engenho N. Sra. do Socorro,
Paudalho. em Santa Rita, Paraíba.
Capela do engenho Caraúbas,
em Paudalho.

O grupo II, dividido em dois tipos, constitui-se de capelas com


os mesmos espaços do grupo anterior e mais galerias laterais contíguas
e paralelas à nave.
O tipo IIA se caracteriza por uma única galeria que serve,
essencialmente, para cobrir a escada de acesso ao coro e,
eventualmente, ao púlpito. Os exemplares deste tipo são as capelas
do engenho Massangana e Matas, no município do Cabo; Miranda, em
Goiana; e Patos, em São Vicente Férrer. Nesta última capela, a escada
de acesso ao coro não é externa, mas pode tê-lo sido, pois ainda
existe na galeria lateral o que pode ter sido o patamar de acesso para
o coro ao nível do seu piso.

Vista e planta da capela do engenho


Miranda, em Goiana.
Planta; FIAM.

112
0 5
Vista frontal e planta da capela do
engenho Massangana,
no Cabo de Santo Agostinho.
Planta: FIDEM.

Planta, vista frontal e posterior da


capela do engenho Patos,
em São Vicente Ferrer.
Planta: FIAM.

113
Cc apela
Pp la d do engenho Boa Vista ' O tipo IIB é constituíd
i í o de capelas com duas gal en ias fechad
em Timbaúba. as ,
uma d e cada lado da nave. Como nas capelas
do tipo
i nina ior, :é nessas
RA
galerias que se localizam as escadas
de acesso ao coro E a ao is
capelas contíguas às casas-grandes
sempre têm essas galeri
pavimentos.

Capela do engenh
o Angústias,
em Carpina.

114
Os exemplares deste tipo são as capelas do engenho Bonito, no
municipio de Nazaré da Mata; Poço Comprido, em Vicência; Boa Vista,
em Timbauba, e Angústia, em Carpina, todos do século XVIII.
Construidas no século passado e pertencentes a esse mesmo tipo, são
Mata, e São
as capelas do engenho Morojó, no município de Nazaré da
João Novo, em Pombos.
Cabe destacar, dentre essas, a capela do engenho Bonito, que
ainda conserva um rico interior com obras de talha em madeira no altar-
mor, no forro da capela-mor, no arco-cruzeiro, nos púlpitos e na mesa
de comunhão. A nave tem um forro plano e horizontal, policromado,
com a representação de São Francisco Xavier pregando aos índios.
No mesmo lugar desta capela, os jesuítas haviam construido uma
outra em 1606. A atual foi erigida em 1747 e sua fachada foi reformada
em 1862.
A riqueza, o apuro e o capricho do interior dessa capela são um Planta e vista da capela do
raro e eloquente testemunho do que pode ter sido um procedimento engenho Limoeiro Velho, em Escada.
muito frequente nas capelas dos engenhos de açúcar em Pernambuco. Eneas REA:

um mesmo
O grupo III é constituído de capelas de três naves sob
telhad o contín uo. Os exemp lares conhec idos são do século XIX e têm
suas fachad as e interi ores realiz ados no estilo neoclá ssico. A este grupo
do engenho Gaipió, no município de Ipojuca, e
pertencem as capelas
Limoeiro Velho, em Escada.

| Vista e planta da capela do


engenho Freixeiras Velha, em Escada.
a a am Planta: FIAM.

115
Capela do engenho Gaipió,
em Ipojuca.

cos .. + Ea Es cimo é

Cpo MMA PRAMMAGANDADADO ANANAA


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Vista da portada e da capela do engenho


N. Sra. do Patrocínio, em Santa Rita,
na Paraiba.

Portada da igreja do Espírito Santo,


no Recife.
ua
SE
q
em

HE
Em fins do século passado, surgem algumas capelas no estilo eclético
que, devido à diversidade e dispersão dos exemplares, não chegam a se
caracterizar como um tipo arquitetônico. E o caso da capela do engenho
Frecheiras Velha, no município de Escada, com sua inusitada planta em
cruz e seus vãos com bandeiras em ogivas neogóticas e também da capela
do engenho Matapiruna, no mesmo município, em estilo neo-românico.
No vizinho estado da Paraíba, encontra-se uma capela cuja
singularidade não se pode atribuir ao gosto eclético, porque sua construção
data do período colonial. Trata-se da capela do engenho de N. Sra. do
Patrocínio, no município de Santa Rita. A planta hexagonal de sua nave e 0
apuro estético de sua portada (semelhante à portada setecentista da igreja
jesuíta do Espírito Santo, no Recife) atestam a erudição do exemplar.

Origens
A vida social do engenho de açúcar em parte se realizava nas
capelas, que tanto se prestavam para demonstrar a fé católica do senhor
de engenho como também as suas posses. Algumas delas devem ter
sido verdadeiramente primorosas a ponto de despertar a admiração dos
franciscanos, exímios artífices da opulenta arquitetura religiosa do
Nordeste brasileiro. O Frei Jaboatão, em seu Novo Orbe Seráfico,
publicado em 1764, referia-se à capela do engenho de S. Franciso da
Varge, no distrito de Olinda, como muy avantajada em fábrica e uma
das muy perfeitas e bem ornadas que se achão por fora, acrescentando
que o senhor de engenho mandou vir do Reyno as imagens do Seráfico
Padre e Santo Antônio pelos annos de 1725 (Jaboatan, 1980, p. 364).
Capelas tão avantajadas, por certo, não se destinavam somente aos
oficios religiosos, embora estes, em certas datas, fossem realizados com
pompa singular. Ao referir-se à música que se executava em Pernambuco,
Pereira da Costa em seus Anais Pernambucano, menciona algumas capelas
de engenhos eventualmente dotadas de orquestras. Cita João Fernandes
Vieira que tinha para o serviço religioso da igreja de seu engenho de S. João
da Várzea os melhores músicos que havia, formando uma capela composta de
vários instrumentos e diversos ternos de charamelas. Com relação a uma
missa que teria sido celebrada em 1646, na capela de um dos engenhos
situados na paróquia da Várzea, Pereira da Costa afirma que ela foi cantada
Capela de engenho com galilé fechada.
a três coros, com extremada música (Costa, F. A. P., 1983, p. 157). Pormenor de quadro de Frans Post.

117
s brasileiras do
Mas não era somente missa que se dizia nas igreja
menos nas igrejas das ordens religiosas,
Brasil Colonial. Pelo
peças teatrais e, até mesmo, se dançava. Não há
representavam-se
capelas rurais, mas não
informações sobre essa diversidade funcional nas
papel das capelas na vida
resta dúvida alguma sobre a importância do
social dos engenhos (Freyre, 1961, P- 343). hos em
As informações mais antigas sobre as capelas de engen essa
do século XVII. Segundo
Pernambuco são a iconografia holandesa
demais e, como eles,
fonte, todas as capelas eram edifícios separados dos as
decorativos. É possível que as capel
eram desprovidos de elementos
tão e Pereira da
avantajadas e bem omadas a que se referem o Frei Jaboa
são dos holandeses e
Costa só tenham começado a surgir após a expul ão
restauração integral da liberdade de culto da religi
consequente
católica.
e pouco
A bibliografia e iconografia sobre as capelas é muito sumária
te em 1821, com a publi cação
significativa por todo o século XVIII. Somen
a surgir , como uma de
da History of Brazil, por James Henderson, volta
a de engen ho
suas ilustrações, uma gravura com a imagem de uma capel
.
de Pernambuco. Trata-se do engenho da Torre, próximo à cidade do Recife
Pode-se notar que a capela, com sua fachada dividida pelas pilastras
em três partes, já é um edifício bem maior do que os seus similares
o
representados na iconografia holandesa. O corpo central, com seu frontã
o
encimado por volutas sugere uma construção do século XVIII, o mesm
ocorrendo com o coroamento bulboso da torre sineira, sem dúvida um
elemento raro na arquitetura rural religiosa de Pernambuco. Henderson
apresenta a capela simplesmente junto com a casa, como uma
representação do exterior, sem comentários no texto. Apesar de contíguos,
capela e casa-grande têm cobertas independentes.

Capela e casa-grande
do engenho Macujê.
Fonte: Fundação Joaquim Nabuco.

Só resta uma fotografia da capela de fachada mais erudita, a do


engenho Macujê. Como a do engenho da Torre, ela é conjugada com j
casa-grande e tem sua fachada dividida por pilastras em três partes,
ostentando, a central, uma composição primorosa com duas janelas
rasgadas no coro, formando um triângulo com a única porta no pavimento
térreo. Sua cornija encurvada, as volutas do seu frontão e seus coruchéus

compõem-se exatamente como na fachada da capela do sítio da Jaqueird,


construída nos arredores do Recife em 1766, cujo projeto € pe
são atribuídos por Ayrton Carvalho ao Mestre Pedreiro F rancisco Nunes
Soares. Este mesmo artista, segundo D. Clemente da Silva-Nigra
construiu a fachada da igreja do mosteiro de São Bento, de Olinda,
1761 a 1763 (Mello, J. A. G., 1959).

118
Capela do sítio da Jaqueira, no Recife
As semelhanças entre os corpos centrais das fachadas da capela do (esquerda); e capela do engenho São
engenho Macujé e do sítio da Jaqueira são muito evidentes para serem Braz, no Cabo de Santo Agostinho
ignoradas ou classificadas como coincidência. Podem ter sido concebidas (direita).
e executadas por um mesmo artista ou por artistas diferentes seguindo um
Papa modelo. A analogia entre as duas capelas permite datá-las do século
HI,
Uma outra capela também desaparecida é a do engenho Noruega,
fartamente documentada por Gilberto Freyre, que atribui sua construção
ao século XVIII, Como as capelas dos engenhos da Torre e Macujê, a do
engenho Noruega era também conjugada com a casa-grande, o que parece
ter sido típico no século XVIII, de quando data a remanescente e similar
capela do engenho Poço Comprido.
Tanto as capelas dispostas em uma das extremidades como na parte
central da fachada principal da casas rurais foram construídas no século
XVIII, no norte de Portugal, provável origem do partido que surgiu em
relativo às
Pernambuco no mesmo século, como já foi sugerido no capítulo
casas-pgrandes.
Os tipos de capela identificados nos antigos engenhos
pernambucanos não diferem muito dos existentes nas zonas rurais e
urbanas do resto do Brasil e são oriundos, sem dúvida, de Portugal. Contudo
existem discordâncias quanto à função e ao edifício de origem dos
alpendres erigidos na fachada principal das capelas -
XVI
Alpendres em capelas já existiam em Portugal desde o século
peregrinos
e, segundo Paulo Ormindo Azevedo, se destinavam a abrigar
por ocasião de festas religiosas com maior afluência de fiéis (Azevedo, P.
num dos pilares
O., 1983, p. 82). Em alguns casos, o púlpito delas se localiza
do alpendre, como na capela do Calvário, em Fundão, Portugal.
Outro autor, Luiz Saia, reforça a tese da origem portuguesa dos
alpendres nas fachadas das capelas rurais brasileiras, estendend o o
s
universo de sua pesquisa além dos límites da regiões produtora de açúcar.

119
uguesa do alpendre:
Embora concordando quanto à origem port
al desses espaços
os dois autores citados discordam quanto à função ongin
, cepa o sele tivo
Para Saia, o alpendre teria sua função mais ligada ao nártex
p 24 7
das antigas basílicas reservados para os catecúmenos (Saia, 1939,
Por outro lado, Azevedo considera o alpendre muito mais um filtro
social do que religioso, excluindo, portanto, a hipótese de ligação de sua
origem com o nártex. Segundo Azevedo, ,
nas capelas dos engenhos do Recôncavo, por exemplo, ao lado da
capela-mor, e ligada a ela por uma janela com treliças, existe sempre uma sa la
onde os membros mais elevados da hierarquia patriarcal assistiam à missa; a
nave era reservada, provavelmente, para os convidados assalariados e forros,
assim como o alpendre e o adro para o exército de escravos (Azevedo, P. O.,
1983, p. 83).

Capela do Senhor dos Perdidos, em


Ponte do Lima, Portugal.

Capela do Calvário,
em Fundão, Portugal.

As capelas dos engenhos de Pernambuco, no século XVII, segundo


os quadros holandeses contemporâneos, não possuíam esse cômodo para
uso exclusivo dos membros da família dos seus proprietários.
Construídos provavelmente no século XVIII, os engenhos Noruega
(demol
ido) e Poço
dois p avimento Comprid possuíam capelas com galerias laterais mei
s, sendo oo,superior ligado ao pavimento do mesmo nº
das
iso] casas-prara
andes co ntíguas. Dessa forma, garantia-se o privilégio do
150 amento para os familiares dos senhores de engenho
a i Esso
que tinham epi am
exclusivo a cômodos situados no pavimento superior, nos quais assis
120
Capela urbana do São Roque,
em Sirinhaém.

aos ofícios religiosos através de tribunas na nave e na capela-mor. Essas


capelas não possuíam alpendre como também não o possuía a capela do
engenho da Torre, representada por Henderson em 1821, e que tinha o
mesmo partido arquitetônico das capelas referidas anteriormente.

Igreja urbana com alpendre fronteiro,


em Pernambuco, segundo quadro de
Frans Post.

de
Nesses casos, garantido o isolamento dos familiares do senhor
iados, forros e
engenho, a nave da capela sem alpendre abrigaria assalar
contraria a tese de Azevedo sobre a
escravos, o que, de certa forma,
social dos fiéis. Na
compartimentação do templo em função da posição
realidade, por todo o período colonial e no século XIX, foram construídas
s.
capelas sem alpendre, conjugadas ou não com casas-grande
Freyre, quando afirma
A segunda tese polêmica é a de Gilberto
casa-g rande; o copiar, por exemplo
que as igrejas assimilaram caracteres da
.
(Freyre, 1944, p. XXXVI)recorr
Mais uma vez endo aos quadros do holandês Frans Post,
convém lembrar que o pintor retrata alpendres tanto em capelas rurais
notável apuro
como nas urbanas. Nestas, o alpendre apresenta-se com um
de fatura e se constitui num importante elemento de composição plástica
do edifício. Nas cenas de engenhos, num mesmo quadro, capelas
alpendradas coexistem com casas de vivenda com alpendres entalados,
como nas casas congêneres do norte de Portugal .

121
O excelente acabamento das colunas, arquitrave e timpano do
alpendre de uma das igrejas urbanas retratadas por Frans Post, expressa
o requinte desse espaço e dá sentido aos argumentos que Luiz Saia
usa para refutar os argumentos de Freyre.
Saia assevera que a solução capela com alpendre não é
exclusivamente rural e vizinha das casas-grandes alpendradas mas também
urbana e que, além disso, não se deve esquecer que o edificio religioso
alpendrado é uma tradição arquitetônica ocidental que data dos primeiros
tempos do cristianismo (Saia, 1939, p. 237).
Em Pernambuco, somente a partir do século XIX, os alpendres
das casas-grandes passaram a ser um dos espaços arquitetônicos mais
importantes do edifício, notando-se ali colunas toscanas de alvenaria
de tijolos com capitéis bem cuidados, mas, nessa época, já rareavam as
capelas alpendradas.
Uma outra hipótese, derivada da formulada por Gilberto Freyre,
foi lançada por Joaquim Cardoso. Segundo este famoso engenheiro e
poeta pernambucano,
a capela, na sua passagem do interior da casa-grande para o exterior,
fica instalada num recanto da varanda que é então utilizada como nártex e
não é absurdo admitir-se que, ao descer da varanda para se colocar ao
largo da casa tenha levado consigo a necessidade de um alpendre (Cardoso,
1962, p. 10).
Em Pernambuco, o que se nota é a inversão do sentido desse
suposto movimento da capela do interior da casa-grande para o seu
exterior. Desde o século XVII, as capelas rurais pernambucanas eram
isoladas das casas- grandes e com estas só viriam se juntar no século
XVIII, para rarearem no século XIX e até desaparecerem, sendo
substituídas por simples oratórios.
A propósito, é oportuno lembrar o caso muito singular de um
engenho pernambucano, o Coimbras, no município do Cabo, cuja casa-
grande, um autêntico bungalow de fins do século XIX, acolhe, de um
lado uma senzala doméstica e do outro uma capela. Casa-grande e capela
se juntam como se tivessem sido pré-fabricados isoladamente e
Justapostos posteriormente. Os seus alpendres conservam sua forma e
funções originais, apesar de vizinhos, como que chamando a atenção
para as suas diferentes origens.
Em Pernambuco, os alpendres das casas-grandes e das capelas
tiveram origens e desenvolvimento distintos e independentes. Senão,
como explicar o desaparecimento dos alpendres nas capelas, se
Persistiram, até fins do século XIX, as funções discriminatórias que
lhes foram atribuídas? Por outro lado, nota-se que eram muito reduzidas
as dimensões das naves das capelas alpendradas. Os alpendres
significaram também a dilatação dos espaços destinados aos fiéis porque
as reformas eram muito raras nas capelas rurais de Pernambuco. Capelas
novas foram construídas com espaços internos mais generosos €
corredores laterais, dispensando os alpendres fronteiriços. São
Justamente as capelas identificadas como sendo do tipo IB que, segundo
Paulo Ormindo Azevedo, teriam surgido no Brasil na segunda metade
do século XVII e se constituíam numa criação autenticamente brasileira
(Azevedo, P. O., 1983, p. 82).
A partir da metade do século passado, diminui muito o número
de capelas rurais em Pernambuco. Vários engenhos foram remembrados
e dezenas de engenhos menores foram erigidos sem as respectivas
capelas que tanto marcaram a paisagem rural pernambucana

122
Quadro seiscentista, de Frans Post, +
ilustra a hierarquia dos edificio de
engenho pernammbicant leletaltoo)

Ao lado, Engenho Caraúbas, em


Paudalho, com os edifícios dispersos,
abaixo, pequeno, Frans Post retrata a
construção de um edificio em tres
pavimentos e em taipa, como indica
arcabouço em madeira;
grande, Engenho Morenos, em Morenos.
dpi
quadro de Frans
e » Pos

Pormenor de um ns tr ui da
engenho co
Casa de vivenda de en co nt ra di ço
o tipo
em taipa e do mesm de Por tug al.
no nor te

Casa de vivenda de engenho com


alpendre em um dos lados da fachada,
construida em alvenaria de pedra.
Pormenor de um quadro de Frans Post.

io Casa- gran
de em Tai
Taipa com torre
Eno Bada, construida em alve
naria
nor de um quadro de Fran
s Post.

124
“ass

1 CASA-GRANTE
7 MNTAA dica Oca ba CANA
ANTIGO a 4 ENCARAMINTO

ENGº DOS BOIS


4 camnnpas O CM Mm PALRA
+ cenouras mo USTAIAMA
€ Mntaa o rANguE E Ms
, eua 1 burimação
É cuam nm cs

rir PERNAMBUCO 7
o
MATRA
auvasa

mm cimo
BoA DO iuqmes
11.19 CASA (4 Muagaa

Planta em perspectiva da casa-grande e


capela do engenho Noruega, segundo
Cicero Dias, ilustrando Casa-Grande &
Senzala, de Gilberto Freyre.
Acervo da Fundação Gilberto Freyre.

125
É Ba -- sé:
Casa -grande do engenho by
Noruega,
Ww PEL

E o
tetalhe de quadro de Cicero Dias no
Museu do Estado de Pernambuco. mes

Casa com torre, provavelmente


o sitio do Chacon,
segundo quadro de Mario Nunes.
Acervo do Museu do Estado de
Pernambuco.

126
Acima, engenho pernambucano
retratado por Frans Post, com uma
casa-grande de telhado em três volumes.
Ao lado, mesmo (?) engenho
ainda sem a casa-grande, segundo
quadro do mesmo pintor.

127
Acima, casa-grande de engenho
pernambucano com alpendres
posteriores. Pormenor de quadro de
Frans Post. Ao lado , engenho
pernambucano segundo quadro
sciscentista de Wagener.

|
Acim 1 Cas
as a Pitot, construida em 1796
em
New Orleans,
aaAo lado , Casa Far EUA |
lange constr
uiddi
a em
ri t
4, pelo Marquês A
Vincent Ternant
ia nua
Louisiana, EUA
Lee e Paul Malone,
| tm Losisiana
Plartation | e .
N a página
z ao jad

do, imeror daRA
engenho capM O do
ela
Bonito, em Nazaré da mat
ala
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ENC. —e
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ADO Rota ÇA

= er Trad
a
CR
eeg ra
eee G
RR ta La
es
er
=

Ds erT

Éao
E
Acima,a, forro da nave da capela do
engenh o Bonito em Nazaré da Mata.
Ca pela urbana, em Olinda, com alpendre
fronteiro, segundo pormenor de quadr
o
O

ça
o

S
Pp
-

130
Conclusões

O isolamento a que foi submetido o Brasil, no periodo colonial,


inibiu de tal forma os registros portugueses de significativas realizações
no campo da arquitetura que a memória iconográfica mais fidedigna
desse periodo restringe-se ao século XVII e se deve aos holandeses
que ocuparam Pernambuco por vinte e quatro anos. No século XIX,
credita-se aos viajantes e residentes franceses e ingleses as melhores
à arquitetura dos
fontes iconográficas e bibliográficas relativas
engenhos de Pernambuco. Os registros dos colonizadores no periodo
colonial e dos brasileiros no Brasil Imperial são tímidos, o que pode
significar a subestimação desse tipo de arquitetura. O maior historiador
Pereira da Costa, na longa e detalhada história que
de Pernambuco,
escreveu sobre o estado em fins do século passado, não se deteve na
descrição de qualquer edificio dos situados nos engenhos.
Considerando a dispersão e imprecisão das informações, é licito
foram
afirmar que a indigência tecnológica e a mão-de-obra escrava
até fins do
as caracteristicas essenciais da sociedade pernambucana
com
século XIX. Mas o senhor de engenho, tradicionalmente retratado
sua aura de poder, de fato, em muitos casos, foi presa fácil dos
dos
comerciantes da cidade, donos do capital e açambarcadores
do açúcar. Por isso, a arquitetura rural se
negócios de exportação
a e descontinu a e a diversidade de
manifesta de maneira heterogêne
dos senhores de
seus tipos se deve mais às posses do que aos gostos
engenho.
€, mais tarde,
A principio, dispostos organicamente no terreno
de forma retangular, os
racionalmente delimitando um pátio interno
às suas formas e
edifícios foram sempre independentes entre si quanto
aos sistemas construtivos utilizados.
e dos
Desses edificios, a capela destacou-se pela durabilidad
apuro estético na execução
materiais utilizados na sua construção e pelo
edifícios poderiam
de suas fachadas e de seus ricos interiores. Os demais
ser provisórios e isto se evidenciava pelos materiais com que eram
e casas-fortes que, por
construidos. Portanto, a imagem de fortalezas
esteve associada às casas-grandes dos engenhos
muito tempo,
dade em poucos casos.
pernambucanos só corresponde à reali
ra funcional realizada
Nessa conjuntura de uma arqui tetu
econômicas dos senhores
estritamente nos limites das possibilidades se diferenciaram
tipos arquitetônicos não
de engenho, os
substancialmente.
plo, manteve-se praticamente
A arquitetura das fábricas, por exem
quando enfim se adaptou para
a mesma até meados do século XIX,
tação dos escravos é um outro
receber novos equipamentos. A habi sociais
abilidade porque as relações
exemplo de permanência € imut fins do século passado.
somente viriam a se modificar em t o que atende a ; alguma
efa
A rigor, a arquitetura, enquanto art de, conforto ambiental e
satisfação estéti ca além da funcionalida
grandes e nas capelas
estabilidade estrutural, só se realizou nas casas-

dos engenhos pernambucanos. s


dos dados bibliográficos e iconográfico
Assim, É) manipulação de mais
somada à análise morfológica
sobre os edifícios desaparecidos, ori zou a cla ssi ficação
cen ten a de edif ício s rem anescentes, aut
de uma nambucanos, privilegiando,
tipológica dos edifícios dos engenhos per
ndes e, em segundo, as capelas.
em primeiro lugar, as casas-gragrandes se modificaram continuamente
Os interiores das casas- reservavam às paredes
devido à natureza dos sistemdad as construtivos, que
periféricas as res pon sab ili es estruturais. As frequentes variações

131
nos numerosos arranjos das paredes divisórias internas impediram a
sificação tipológica.
Sua a vez omTTovada a acidentalidade dos valores estéticos dos
edifícios, a sua funcionalidade prevaleceu na caracterização final, Essa
funcionalidade não diz respeito somente ao atendimento satisfatório
das necessidades de um programa, mas contempla também a adaptação
de modelos arquitetônicos oriundos da Europa a uma região de clima
tropical. lo.
Apesar da devastação da Mata Atlântica para a cultura da cana-
de-açúcar, a região da Mata de Pernambuco, devido à proximidade do
mar, à existência de alguns rios perenes e ao seu relevo levemente
acidentado, ainda possui um clima ameno, principalmente se
comparado com as regiões interiores do agreste e do sertão
pernambucanos, passados mais de quatro séculos.
Esse clima era ainda mais agradável quando não se agredia
sistematicamente o ecossistema. Daí os primeiros colonizadores
não
terem tido muita dificuldade para adaptar-se, porque, apesar de europeus,
provinham de regiões de climas pouco rigorosos mas traziam com eles
os preconceitos culturais que viriam a se refletir na arquitetura
realizada
na colônia.
Somente no século XIX, com a presença no Brasil
de outros
povos, notadamente ingleses e franceses, para os quais os
trópicos se
constituíam um incômodo, se vulgarizariam outras formas
de construir
visando, sistematicamente, a melhoria das condições de conforto
ambiental.
A tipologia da arquitetura rural de Pernambuco tem,
portanto,
como parâmetro significativo, as sucessivas mudanças
de procedimento
de adaptação climática dos modelos importados. Os
tipos que não são
de origem portuguesa não se constituem, por exclusão,
uma criação
brasileira. O que seria, supostamente, brasileiro
surge ao mesmo tempo,
e até antes, em outras regiões fora do país, desautorizand
o senão a tese,
da originalidade, com certeza, da exclusividade
brasileira da matriz.
A propósito, o avarandado periférico sistematicamente construído
ao longo de, pelo menos, três lados do núcleo retangular da
casa, tem
sido equivocadamente considerado como uma criação brasileira. Na
realidade, esse tipo só existiu, comprovadamente, em
Pernambuco, a
partir do século XIX, quando já se faziam sentir no país
outras influências
que não a portuguesa.
-. À casa do senhor de engenho de Pernambuco foi o edífício
mais que
se modificouno complexo agroindustrial edificado e a
diversidade tipológica restringe a poucos tipos sua
a classificação que
Gilberto Freyre lhe atribuiu de clássico da arquitetura
rural. .
Os tipos arquitetônicos se adaptaram de modo diferente às
condições mesológicas e sociológicas. Assim, por
conforto ambiental,
exemplo, quanto ao
uma parede espessa de alvenaria de pedra
a ser um isolante térmico tão eficiente quanto um avarandado pode vir
periférico.
No entanto, a parede de pedra tinha, primordialmente, uma ostensiva
responsabilidade estrutural, representava também segurança contra
agressões externas e o isolamento térmico resultante era quase acidental
num clima quente, o que não ocorria com o
sistematicamente avarandado periférico,
utilizado para criação de um espaço intermediário
atenuante dos rigores do clima tropical.
Embora tiva
a tipologia tenha sido amparada pela análise compara ss
de exemplares e respectivas referências bibliográficas de me qui Ade
do Brasil e de outros países, refere-se exclusivamente à rear
pernambucana,
Como ão
produto subsidiário, estão relacionados, para a
legal, dezenas de edifícios
remanescentes de antigos
açúcar em Pernambuco. A tipologia desses edifícios é uma e ceiuição
para consequente
a definição de critérios
mais precisos de valorização e
preservação desses testemunhos da história da arquitetura€ rural e da
economia açucareira em Pernambuco.

132

P a mma
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135
Fotolitos e impressão
foram realizados por
Fac Form Impressos Ltda,
Recife. Pernambuco.
O papel utilizado foi
couché mate de 120g.

Esta edição conta com uma tiragem


de 2000 exemplares, e acabou-se de
imprimir em fevereiro de 1998.
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