Ciência: & Saúde Coletiva
Ciência: & Saúde Coletiva
Ciência: & Saúde Coletiva
A educação se antecipa a uma verdadeira política popular e lhe sugere novos horizontes.
(Freire, 1983, p. 26)
EDITORIAL
As obras de Paulo Freire têm inspirado diversas contribuições para os vários grupos e setores da Saúde Coletiva
brasileira, tendo como principal marca a provocação quanto à necessidade de constituição de trabalhos (seja na
pesquisa, na formação, na gestão, na ação política, nos movimentos sociais ou no cuidado em saúde) com inten-
cionalidade e compromisso crítico, político humanizador e emancipatório1.
Freire, seus escritos e as muitas produções com sua perspectiva teórica e metodológica vêm instigando os(as)
protagonistas da Saúde Coletiva a examinarem as metodologias de suas práticas e estudos, na perspectiva de
formas de condução e de organização que reconheçam, valorizem e potencializem a autonomia das pessoas e sua
participação ativa na construção da saúde em seu sentido mais amplo e como direito social. No plano histórico,
vale registrar que o ano de 2024, momento de publicação do presente Dossiê Temático, é marcado pela memória
de 60 anos do golpe civil-militar que prendeu e exilou Paulo Freire e tantos outros brasileiros que lutaram pela
democracia política no país. O livro Educação como prática de liberdade, onde Freire2 aborda o tema da democracia
como condição vivencial para a prática da educação de natureza crítica e emancipatória, pode ser considerado um
dos símbolos da resistência política e pedagógica na história da educação no Brasil.
Ao longo das últimas décadas, coletivos e movimentos têm se organizado para socializar, difundir e estudar
mais profundamente o legado freiriano e suas contribuições à Saúde Coletiva. Diferentes avanços foram registrados
historicamente como consequência, na medida em que a perspectiva freiriana pôde colaborar com a produção de
diversas políticas públicas no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e com a institucionalização de processos
educativos dialógicos e de participação social em saúde.
Na ocasião da comemoração do centenário natalício de Paulo Freire, no ano de 2021, bem como reforçando o am-
plo conjunto de iniciativas que, ao longo do referido ano, marcaram homenagens à Freire, sua obra, seu pensamento
e suas contribuições, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) desenvolveu, através de sua Diretoria
e de vários de seus Grupos Temáticos, Fóruns e Comissões, uma série de Ágoras intitulada Centenário Paulo Freire:
Ágoras da Saúde Coletiva (disponíveis no canal da TV Abrasco/Youtube: https://www.youtube.com/@TVAbrasco).
Cada Ágora teve um enfoque específico, de maneira que a primeira enfatizou a trajetória, o pensamento e as
contribuições de Paulo Freire à Saúde Coletiva. No segundo momento, foram enfocadas experiências de cuidado
desenvolvidas nos territórios. Finalmente, no terceiro momento discutiu-se experiências de formação e de pesquisa
em Saúde Coletiva. Como resultado desse processo, apresentamos à comunidade acadêmica o presente Dossiê
Temático na Revista Ciência & Saúde Coletiva, contemplando 5 manuscritos, dentre estudos, pesquisas e reflexões
em torno de algumas das questões tratadas nas Ágoras.
Paulo Freire provoca a Saúde Coletiva a (re)considerar a significante importância de uma ação profissional e
acadêmica que esteja permeada pela convivência com a realidade social e seus protagonistas, com os saberes, di-
nâmicas e diversidades inerente aos territórios. Para tanto, Freire ainda nos ensina a centralidade do diálogo como
metodologia capaz de potencializar a convivência solidária, respeitosa e fraterna entre as diferenças nos saberes e
fazeres em saúde. Centralmente, o diálogo como mediatizador de uma ação profissional que, também pedagógica
e política, conduza à crítica, autonomia e emancipação das pessoas3.
Esperamos que esse conjunto de elaborações possa mobilizar reflexões e provocar novas experiências, ideias,
produções, escritos e políticas públicas inovadoras.
Referências
1. Freire P. Pedagogia do oprimido. 50ª ed. São Paulo: Paz e Terra; 2014.
2. Freire P. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1983.
3. Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra; 1996.
CC BY Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons Cien Saude Colet 2024; 29:e03252024