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QUALIDADE EDUCACIONAL PARA QUÊ E PARA QUEM?

UM ESTUDO A
PARTIR DO ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
(IDEB).

Angela Maria de Oliveira Koch.

Pedagogia: Docência e Gestão educacional


Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná, UNICENTRO,
Campus Avançado de Laranjeiras do Sul

Orientador: Saulo Rodrigues Carvalho


Resumo:
O trabalho traz uma análise sobre o conceito de educação de qualidade, para isso nos baseamos em
aspectos do IDEB, que norteia a promoção das ações e reformas educacionais no país. Na tentativa de
contemplar, o que define esse modelo educacional buscado, e para quem ele se destina? No sentido de
contribuir com a compreensão do tema, o estudo foi elaborado por meio de análise documental das fichas
técnicas do Inep, e análise bibliográfica de artigos e livros que contemplam o tema da pesquisa.
Demonstrando que essa padronização da educação põe em operação um modelo educacional que foi
colocado a serviço do mercado de trabalho e da voraz concorrência do setor. Com o lema de capacitar
em vez de emancipar, serve de ferramenta para manter os princípios e a estabilidade do formato
econômico e político hegemônicos. Uma educação que não é voltada ao desenvolvimento humano e não
anseia a equidade perpetua a segregação das classes e intensifica a discriminação de quem está às
margens da sociedade.

Palavras-chave: Educação de Qualidade; Padronização IDEB; Avaliação em larga escala.

INTRODUÇÃO
Este trabalho traz uma pesquisa sobre determinados aspectos da qualidade da
educação brasileira, em uma análise feita a partir do IDEB, o Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica, o mais importante indicador de qualidade
educacional no país. Estuda a relação dos indicadores com o conceito de qualidade
educacional, instituído pelos padrões sociopolíticos da sociedade contemporânea.
Para cumprir com os objetivos da pesquisa realizamos análise documental das
fichas técnicas do Inep assim como da sua parte histórica para identificar a metodologia
utilizada para a obtenção das metas intermediárias e projeções do IDEB. E por meio da
análise bibliográfica de artigos e livros publicados por autores que contemplam o tema
da educação. Escritos de Carlos Rodrigues Brandão (1989), Paulo Freire (2001) e
Pedro Demo (2000) compõem as principais referências usadas na construção do
trabalho.
Assim, buscamos neste estudo entender o que definirá de fato a educação qual
seria o pivô para a formação desta revolução nas últimas décadas no setor, e o fator ou
fatores determinantes na definição desse próprio modelo. Tendo como objeto de
pesquisa a concepção de qualidade educacional a partir do IDEB, questiona: para quê
e para quem se destina essa qualidade educacional?
O trabalho está estruturado em três tópicos que são seus pontos centrais,
interligados entre si: O “Conceito de Educação de Qualidade”, discorre uma breve
análise sobre o padrão de qualidade que é buscado, bem como a motivação deste
modelo de educação ter sido escolhido para implementação e a quem poderá
favorecer. “Avaliação em larga escala” é o tópico que abrange a instauração de intensas
discussões em torno da educação, que teve seu estopim na década de 1990 gerando
muitas mudanças na área da educação, revelando um forte interesse com a qualidade,
na tentativa de compreender as reformas educacionais e as avaliações em larga
escala. E o último deles, “Padrão de Educação do IDEB” que irá se concentrar na
educação estabelecida nas escolas contemporâneas, tendo como eixo o interesse na
implementação e desenvolvimento de um modelo educacional de qualidade e unificado.
Esboçando o que é valorizado neste modelo de ensino, no que ele foca e a
funcionalidade deste sistema de educação.

1. QUALIDADE EDUCACIONAL PARA QUÊ E PARA QUEM? UM ESTUDO A PARTIR


DO IDEB.

1.1. Educação de Qualidade

A educação no seu sentido mais genuíno pode existir em qualquer lugar desde
que se possibilite, como aponta Carlos Brandão, (...) “haver redes e estruturas sociais
de transferência de saber de uma geração a outra’’(BRANDÃO, 1989, p.11), sem que
obrigatoriamente se faça necessário o uso de processos formalizados de ensino. Isso
porque a educação em sua essência é um fenômeno complexo e abrangente que existe
desde que os primeiros homens decidiram andar em grupos. Não se tratando de um
objeto, com formato e metodologia individual.
Desde seu surgimento na sua organização mais simplista e rudimentar, a
educação percorre um processo de desenvolvimento em que sofreu, e sofre mudanças
ao longo do tempo e da formação da humanidade. Sem dúvidas a alta formalização do
ensino na atualidade é uma de suas características mais marcantes:

A educação aparece sempre que surgem formas sociais de condução e controle


da aventura de ensinar e aprender. O ensino formal é o momento em que a
educação se sujeita à pedagogia (a teoria da educação), cria situações próprias
para o seu exercício, produz os seus métodos, estabelece suas regras e
tempos, e constitui executores especializados. É quando aparecem a escola, o
aluno e o professor (BRANDÃO, 1989, p. 11).

Nesta conjuntura ela teve seu desenvolvimento de forma lenta e gradual,


assumindo o papel que tem atualmente em reflexo aos desdobramentos que fez ao
longo dos séculos, apropriando-se de características e tendências de diferentes lugares
em diferentes momentos históricos, passando por inovações e rupturas. Trazendo na
bagagem sinais marcantes de civilizações antigas como a greco-romana. Que difundiu
poderosamente por todo o ocidente fortes traços culturais, e a educação por sua vez
também foi afetada, como nos descreve Brandão nesse trecho sobre o modelo
educacional do período:

Quando uma nobreza romana enriquecida com a agricultura e o saque


abandona o trabalho da terra pelo da política, e cria as regras do Império de que
se serve, aquele primitivo saber comunitário divide-se e força a separação de
tipos, níveis e agências de educação. Quando há livres e escravos, senhores e
servos, começa a haver um modelo de educação para cada um, e limites entre
um modelo e outro. (BRANDÃO,1989, p.23).

Numa sociedade em que as classes se dividiram dentro de uma ordem social em


que tudo é previamente determinado segregando até mesmo direitos, deveres e
funções. Seria impossível estabelecer um único modelo de ensino. A partir disso pode
se afirmar que a educação formalizada passa a existir perante essa necessidade
arcaica, de separar e classificar quem poderia aprender e o que aprender.
Mas afinal como especificar a educação se ela pode se dividir? Tem diferentes
modelos e formas de aplicá-la, isso poderia ser o bastante para dizermos que ela tem
mais de um significado, mas tratando-se de uma criação humana tão antiga, que nunca
pôde ser abandonada, torna incontestável sua relevância como necessidade real para
cada indivíduo que compunha qualquer grupo ou sociedade:

De acordo com as idéias de alguns filósofos e educadores, a educação é um


meio pelo qual o homem (a pessoa, o ser humano, o indivíduo, a criança, etc.)
desenvolve potencialidades biopsíquicas inatas, mas que não atingiriam a sua
perfeição (o seu amadurecimento, o seu desenvolvimento, etc.) sem a
aprendizagem realizada através da educação. Pode até ser que haja formas
próprias de auto-educação, mas é de suas práticas interativas (interpessoais),
coletivas, que se está falando quando se escreve um livro sobre "Filosofia da
Educação" por exemplo. Assim como a própria sociedade é um corpo coletivo
formado da individualidade das pessoas que a compõem, e assim como o seu
fim é a felicidade de seus membros a quem todas as suas instituições devem
servir, assim também a educação, como idéia (a definição, a "filosofia"), deve
ser pensada em nome da pessoa e, como instituição (a escola, o sistema
pedagógico) ou como prática (o ato de educar), deve ser realizada como um
serviço coletivo que se presta a cada indivíduo, para que ele obtenha dela tudo
o que precisa para se desenvolver individualmente. (BRANDÃO,1989,p.28).

A educação constituiu-se como matéria essencial justamente por ser


responsável pela formação humana e prezar pelo desenvolvimento pessoal dos
indivíduos, como dito por Pedro Demo:

Educação passa a ser o espaço e o indicador crucial de qualidade, porque


representa a estratégia básica de formação humana. Educação não será, em
hipótese nenhuma, apenas ensino, treinamento, instrução, mas especificamente
formação, aprender a aprender, saber pensar, para poder melhor intervir, inovar.
(DEMO,2000, p.21).

Definitivamente não se resumirá a preparação para o mercado de trabalho ou


execução de determinada profissão, isso porque extrapola essa função. Educação é a
formação humana, conscientização social, cultural e autodefinição. Pedro Demo ainda
aponta que ‘‘O processo educativo é composto propriamente da capacidade
construtiva/participativa, ultrapassando a situação de objeto para consolidar a de sujeito
histórico crítico e criativo’’. (DEMO, 2000, p.21).
Como documentado constitucionalmente, a educação é um dever do Estado, e
este prega por um ensino que beneficie a todos que fazem uso dele. Trazendo no
discurso com muita ênfase e sob as letras da lei que para isso uma educação de
qualidade é o único caminho para garantir o pleno desenvolvimento dos indivíduos e
diminuir as desigualdades como previsto nestes trechos da Constituição da República
Federativa do Brasil:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho (BRASIL,1988).

Art. 211 [...]§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os


Estados, o Distrito Federal e os Municípios definirão formas de colaboração, de
forma a assegurar a universalização, a qualidade e a equidade do ensino
obrigatório (BRASIL,1988).

Apesar de teoricamente todas essas atribuições serem elucidadas como parte de


um todo, pertencentes à educação. Na prática não podemos afirmar que ela se aplique
dentro desse segmento, por ser redirecionada para outros caminhos, como quando o
ensino foca no formar e capacitar profissionais aptos para atender demandas do
mercado, se fixando neste intuito, negligenciando a tarefa de viabilizar aos alunos
tornarem-se adultos socialmente ativos, capazes de refletir sua própria posição na
sociedade e cidadãos que executem e contemplem com clareza sua liberdade e
cidadania. Produções de autores como Pedro Demo caminham em conformidade com
essa concepção:
(...) O papel da escola torna- se ainda mais específico, ultrapassando a figura da
complementação da família ou da sociedade de normas e valores, para assumir
a condição de lugar da formação de um tipo essencial de competência frente a
formação da cidadania e frente às mudanças na sociedade e na economia. A
escola tenderia tornar-se instância estratégica em termo de qualificação das
mudanças estruturais qualitativas e universais, para assegurar a todos a mesma
oportunidade de desenvolvimento (DEMO, 2000, p.64).

Formular uma educação que assegure a todos a mesma oportunidade de


desenvolvimento, seria a realização de um plano utópico. Essa ideia de unificar a
educação é antiga, o intuito de atender a todos definindo um sistema único que possa
formar sem diferenciar, exibe ao menos em aparência uma causa muito nobre:

A ascensão da concepção da cidadania universal proclamada pela burguesia na


idade moderna em contraposição aos privilégios feudais da Idade Média
representam também a ascensão da ideia da educação universal. A burguesia,
enquanto classe revolucionária vai defender a igualdade dos homens como um
todo, assim que assume o poder, em meados do século XIX passa a advogar a
escolarização para todos e a estruturar os sistemas de ensino (SAVIANI, 2000,
p.38).
Pode parecer desleal e infundado para alguns levantar questionamentos em
torno dessa heroica atitude da burguesia, que recém se erguia apoderando-se de uma
posição de liderança destacada na sociedade. Apesar disso a história não se resume
apenas nas linhas escritas pelos denominados heróis, e com critérios pouco mais
rigorosos é possível identificar outros significados atrelados a esse discurso:

[...]não foi a educação burguesa que criou a burguesia, mas a burguesia que,
emergindo, conquistou sua hegemonia e, derrocando a aristocracia,
sistematizou ou começou a sistematizar sua educação que, na verdade, vinha
se gerando na luta da burguesia pelo poder. A escola burguesa teria de ter,
necessariamente, como tarefa precípua dar sustentação ao poder burguês
(FREIRE, 1981,p.28).

Não se pode negar que o projeto de sistematizar um modelo de educação neste


caso trazia também outra intenção, a de impor o domínio ideológico e político da
burguesia. Nossa realidade atual nos descreve que estamos expostos a um projeto que
ainda está a se propagar, que prevê estabelecer um modelo de ensino padronizado que
deve atender a todos, ou seja, um modelo universal está em construção. Seria também,
neste momento, visto como pretensão e infundado, levantar questionamentos acerca
desta revolucionária e histórica difusão de reformas educacionais? Para melhor
compreender como, e as motivações que levaram a ordem de se fixar um modelo de
educação temos que fazer conexão com o nascimento desse movimento:

A reforma educacional tem uma de suas raízes fincada na Conferência Mundial


de Educação para Todos, realizada em Jomtien – Tailândia, em março de 1990,
da qual resultou, no país, o Plano Decenal de Educação para Todos
(1993-2003). Essa Conferência, convocada pela Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), pelo Fundo das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF), pelo Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento (PNUD) e pelo Banco Mundial, contou com a presença
de 155 países e traçou os rumos que deveria tomar a educação nos países
classificados como E-9 – os nove países com os piores indicadores
educacionais do mundo, dentre os quais, ao lado do Brasil, figuravam
Bangladesh, China, Egito, Índia, Indonésia, México, Nigéria e Paquistão (SILVA
e ABREU, 2008,p. 254).

Este evento marca o momento em que muitos países, inclusive entidades que
não são ligadas à educação demonstraram uma aguçada preocupação com ela, se
unindo em prol de um modelo padronizado e entrelaçado ao termo qualidade, estendido
para atender toda a demanda dos diferentes países.
Educação de qualidade é um termo frequentemente citado em discursos
políticos, o que é natural visto que é imprescindível para o crescimento socioeconômico
de qualquer país. O que se precisa frisar, no entanto, é como poderia ser imprimido em
um determinado modelo de ensino as bases, a qualidade e a metodologia de maneira
que se esteja suprindo realmente a todos? Pois sendo ele unificado não tem como ser
próximo nem da realidade, nem das necessidades dos diferentes grupos que o modelo
contempla.
Unificar o conceito de qualidade, ou seja, estabelecer um padrão que possa
servir a todos deve ser uma missão quase improvável, segundo Davok: “qualidade em
educação, no marco dos sistemas educacionais, admite uma variedade de
interpretações dependendo da concepção que se tenha sobre o que esses sistemas
devem proporcionar à sociedade’’ (DAVOK,2007,p.506). Concretizar esta definição
complica-se, pois, o processo de qualificação envolverá comparação e quase sempre
as características consideradas as ideais para um determinado grupo podem não ser as
mesmas para outro, por admitir essa variação e não ser uma ciência exata, podemos
aspirar que o que pesa na tomada de decisões pode ter a ver com influências que
inculcam na educação interesses totalmente alheios a sua propriedade:

Não há apenas idéias opostas ou idéias diferentes a respeito da Educação, sua


essência e seus fins. Há interesses econômicos, políticos que se projetam
também sobre a Educação. Não é raro que aqui, como em toda parte, a fala
que idealiza a educação esconda, no silêncio do que não diz, os interesses que
pessoas e grupos têm para os seus usos. Pois, do ponto de vista de quem a
controla, muitas vezes definir a educação e legislar sobre ela implica justamente
ocultar a parcialidade destes interesses, ou seja, a realidade de que eles
servem a grupos, a classes sociais determinadas, e não tanto "a todos", "à
Nação", "aos brasileiros". Do ponto de vista de quem responde por fazer a
educação funcionar, parte do trabalho de pensá-la implica justamente em
desvendar o que faz com que a educação, na realidade, negue e renegue o que
oficialmente se afirma dela na lei e na teoria (BRANDÃO, 1989 ,p.27).

A educação em seu modo natural sem intercursos e influências, culmina na


conscientização ela prepara para o ofício das profissões também, isso nunca será
desagregado dela, mas só quando é verdadeiramente explorada traz consciência e
discernimento. A educação é sinônimo de liberdade como em Freire (2005, p.12), [...] ‘‘a
conscientização, que lhe possibilita inserir-se no processo histórico, como sujeito, evita
os fanatismos e o inscreve na busca de sua afirmação’’.

As concepções de qualidade educacional estão expostas a visão sobre o que se


espera que a educação origine como produto, ou seja, o que será entregue a
sociedade, e a oscilação aumenta porque nem todos esperam as mesmas coisas da
educação, no entanto já existe um ''padrão'' definido, e o sistema educacional tem sido
operado e avaliado visando colocá-lo em pleno funcionamento.

1.2 Contexto das Avaliações em Larga Escala


O INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira), uma
entidade pública indireta vinculada ao MEC, cria o IDEB em 2007 para verificar o
crescimento da qualidade da educação. Desde sua origem em 1937 o INEP foi criado
com o intuito central de realizar estudos para identificar os problemas do ensino
nacional. Mas, somente nas últimas décadas, com a intensa implantação das reformas
educacionais e avaliações em larga escala para analisar a situação do ensino e
elaborar políticas públicas para promover melhorias na área, a aplicação dessas
avaliações (Saeb,Prova Brasil, Enem, etc) vem influindo na educação.
A instituição que tem como prioridade realizar estudos para identificar os
problemas do ensino nacional, o INEP, foi criado em 1937 durante o governo Vargas
sobre recomendação do ministro Gustavo Capanema, época que coincide com o
processo de industrialização do país o que demandava trabalhadores mais preparados,
cenário que acarretou o despertar de um interesse repentino e bastante significativo
com a educação:

O processo de industrialização do país demandava trabalhadores mais


preparados. Com o objetivo de realizar estudos para identificar os problemas do
ensino nacional e propor políticas públicas, o Instituto Nacional de Pedagogia
(Inep) foi criado por lei. A fundação do Inep ocorre no contexto de renovação do
Estado brasileiro, quando é criado o Ministério da Educação e Saúde, e, no
plano mais amplo, do movimento de reformas educacionais realizadas por
educadores e da mobilização deles, ao lado de outros atores sociais, em favor
da educação pública (BRASIL, História INEP1, 2020, s.p).

1
Os dados e citações utilizados no trabalho, de documentos contidos no Portal do INEP relacionados a
parte histórica da instituição, sofreram alterações no seu conteúdo na última atualização feita na página.
Ocorrendo a retirada de algumas informações que continha anteriormente.
O INEP, já na sua fundação, mostrou que a educação ganha atenção de forma
substancial a partir da percepção de uma nova necessidade que surgia; a de suprir a
demanda do mercado de trabalho. Criado num momento em que o país passava pelo
advento da indústria, era lógico e indispensável que os trabalhadores dessa indústria
que acabava de se iniciar precisariam de preparo e capacitação, algo que até então as
classes que seriam mão de obra industrial nunca haviam experimentado.
Conferindo-nos um primeiro indício de que as motivações das reformas educacionais
podem estar intimamente ligadas ao âmbito econômico.
Em 1939 já realizaram- se as primeiras publicações dos chamados Estudos
Educacionais do INEP, que tratava- se do registro da situação do ensino primário que
levou em conta o período de 1932-1936:
Com uma estrutura austera de apenas quatro funcionários, incluindo o
diretor-geral, o Inep realiza seu primeiro concurso para contratar técnicos. Neste
mesmo ano, o instituto publica o Boletim n.º 1, com o registro da situação do
ensino primário de 1932 a 1936 no Brasil. 70% da população do país era
analfabeta. (BRASIL, História Inep,2020, s.p).

A realidade que o Brasil dispunha naquele momento não era nada positiva, com
quase três quartos da população analfabeta a maioria dos brasileiros não tinha acesso
ao ensino básico, e é custoso crer que um setor que esteve estagnado por tanto tempo
migrou para o status de assunto central do governo, e que este dirigiu um forte e
repentino interesse pela educação puramente movido pela preocupação com a taxa de
analfabetismo.
Então em 1941, será atribuída ao INEP oficialmente a função de elaborar
políticas públicas para a educação e organizar cursos para capacitação dos
professores. A instituição que atualmente é uma autarquia, sofreu muitas mudanças ao
longo da sua história, diretamente ligada ao Estado acompanhou e foi afetada por
também todas as trajetórias dos diferentes governos que estiveram em vigor.
A instituição teve seus ápices e um ponto marcante que sinalizou grandes
avanços na área da educação foi o momento em que foi presidido por Anísio Teixeira,
ele que decididamente foi um apoiador e incentivador da pesquisa:
Além de implantar o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE), no
Rio de Janeiro, e centros regionais em Recife, Salvador, Belo Horizonte, São
Paulo e Porto Alegre todos os centros regionais continham uma biblioteca de
educação, um serviço de documentação e informação pedagógica, um museu
pedagógico e os serviços de pesquisa e inquérito. Não parando por aí ele foi o
autor do Plano de Construções Escolares que foi implantado no Sistema
Educacional de Brasília (Caseb), o qual concebeu a rede de jardins de infância,
escolas classe e escolas parque. (BRASIL, História Inep, 2020, s.p).

Por ter sido uma figura de grande inspiração e de inegável devoção à educação,
anos mais tarde em 2001 como uma forma de homenagear o ex-diretor, o Senado
aprovou a inclusão do seu nome no instituto que assim passou a chamar-se Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.
Ao longo da história entre avanços, perdas e ganhos grandes marcos do instituto
foram se concretizando, como em 1982 o INEP assume o serviço das estatísticas
educacionais. O Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) é elaborado em
1990 e em 2000 é realizado pela primeira vez o Programa Internacional de Avaliação de
Alunos (Pisa) sob a coordenação do instituto, até a criação do IDEB:

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) foi criado em 2007 e


reúne, em um só indicador, os resultados de dois conceitos igualmente
importantes para a qualidade da educação: o fluxo escolar e as médias de
desempenho nas avaliações. O Ideb é calculado a partir dos dados sobre
aprovação escolar, obtidos no Censo Escolar, e das médias de desempenho no
Sistema de avaliação da educação básica-Saeb. (BRASIL, Nota Técnica
12,2020, sp).

Assim as escolas e o ensino são avaliados, recebem uma nota e integram a um


ranking, e a partir dessa dupla análise que é a do desempenho com a realização de
exames padronizados, e a do fluxo que seria a taxa de aprovação, e assim temos o que
corresponde ao sistema de avaliação da qualidade educacional do nosso país:

O índice também é importante condutor de política pública em prol da qualidade


da educação. É a ferramenta para acompanhamento das metas de qualidade
para a educação básica, que tem estabelecido, como meta para 2022, alcançar
média 6 – valor que corresponde a um sistema educacional de qualidade
comparável ao dos países desenvolvidos (BRASIL, Nota Técnica 1, 2020 s.p).

2
Nota Técnica 1;Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.
É uma avaliação objetiva e os números obtidos são o que fazem a classificação
da educação básica brasileira, também com esses números se definem os problemas
das escolas e se projetam as possíveis soluções. Com o objetivo de atingir a média dos
países desenvolvidos, e este continua sendo um dos mais fortes propósitos mesmo
quando em 2000 com a realização do primeiro (Pisa) Programa Internacional de
Avaliação de Estudantes o país teve uma colocação no ranking que refletia uma
situação nada positiva no setor.

A tabela a seguir mostra a média obtida pelos alunos brasileiros em Leitura no


ano de 2000, mas a avaliação inclui Matemática e ciências, nas quais o Brasil também
não conseguiu boas médias.

Habilidades de Leitura alunos com 15 anos (Ranqueamento Pisa 2000) Tabela 1

Países Média Geral Intervalo de


confiança de
95%

Finlândia 546 542 a 551

Canadá 534 531 a 537

Holanda* 532 -

Nova Zelândia 529 521 a 537

Austrália 528 521 a 536

Irlanda 527 520 a 534

Coréia do Sul 525 518 a 532

Reino Unido 523 515 a 532

Japão 522 512 a 533

Suécia 516 511 a 521

Áustria 507 499 a 516

Bélgica 507 496 a 518

Islândia 507 500 a 514

Noruega 505 500 a 511

França 505 496 a 514


Estados Unidos 504 494 a 515

Dinamarca 497 491 a 503

Suíça 494 484 a 505

Espanha 493 486 a 499

República Checa 492 482 a 501

Itália 487 478 a 497

Alemanha 484 471 a 497

Liechtenstein 483 426 a 539

Hungria 480 468 a 492

Polônia 479 465 a 494

Grécia 474 462 a 485

Portugal 470 460 a 481

Federação Russa 462 454 a 470

Letônia 458 448 a 469

Luxemburgo 441 416 a 466

México 422 412 a 432

Brasil 396 389 a 404

Fonte: OCDE (2000)

Esse tipo de avaliação, em larga escala, ranqueia a educação dos países


colocando sob constante comparação, o desempenho das nações desenvolvidas e das
subdesenvolvidas, de forma totalmente indiferente ao desnível socioeconômico e
cultural existente entre elas. Com o IDEB não é diferente, como nos diz Soares (2011):

[...] o Ideb tem alta correlação com o nível socioeconômico do alunado. Assim,
ao atribuir a esse indicador o status de síntese da qualidade da educação,
assume-se que a escola pode superar toda a exclusão promovida pela
sociedade. Há uma farta literatura que mostra que isso é impossível. Todos os
alunos têm direito de aprender, e os conhecimentos e habilidades especificados
para educação básica devem ser os mesmos para todos. No entanto, obter este
aprendizado em escolas que atendem alunos que trazem menos de suas
famílias é muito mais difícil, fato que deve ser considerado quando se usa o
indicador de aprendizagem para comparar escolas e identificar sucessos
(SOARES, 2011, p.24).

Apesar desta comparação esboçar diferenças grotescas a impulsão para difusão


desse sistema foi generalizada sendo, especialmente, fortificada na década de 1990
quando ocorreu a Conferência de Jomtien na Tailândia (Conferência Mundial sobre a
Educação, UNESCO), que antecedeu vários eventos importantes na educação
brasileira como a aplicação do Pisa e a criação do Saeb.
Na ocasião da Conferência se reuniram delegados de 155 países que aprovaram
a Declaração Mundial de Educação para Todos (UNESCO, 1990) que ocorreu de 5 a 9
de março de 1990 que teve como pauta e definiu:
[...] a educação é um direito fundamental de todos, mulheres e homens, de
todas as idades, no mundo inteiro;[...] Entendendo que a educação pode
contribuir para conquistar um mundo mais seguro, mais sadio, mais próspero e
ambientalmente mais puro, e que, ao mesmo tempo, favoreça o progresso
social, econômico e cultural, a tolerância e a cooperação internacional.
(UNESCO, 1990).
Um momento que foi decisivo para iniciar um novo grande processo de
mudanças e reformas na educação, sendo assumida em um evento de tal porte como
fator indispensável não apenas para o crescimento pessoal dos indivíduos como para o
desenvolvimento de qualquer país. Onde reafirmou-se também que a educação é um
direito universal.
Para os especialistas e estudiosos da área, que a educação desempenha um
importante papel na sociedade não se tratava de novidade, no entanto ser reconhecida
e apontada nas circunstâncias em que foi na Conferência demonstrou solenemente que
ela ganhou o interesse dos Estados e de seus governantes de um modo ainda sem
precedentes, além de ser bem expressivo o número de países que assumiam o
compromisso coletivo, que se estabeleceu na data em prol de uma educação de
qualidade para todos, ambos estavam pertinentemente envolvidos em colocar em
prática planos e reformas que estenderia um determinado padrão de qualidade para
todos.
O setor que historicamente não teve as necessidades bem supridas talvez
pudesse finalmente contar com um salto em seu aprimoramento. A área da educação
que em nosso país tem uma trajetória difícil e cheia de obstáculos ganharia vida nova
ao menos documentalmente, já que se firmavam ali grandiosos objetivos para ela:
‘‘Admitindo que, em termos gerais, a educação que hoje é ministrada apresenta graves
deficiências, que se faz necessário torná-la mais relevante e melhorar sua qualidade, e
que ela deve estar universalmente disponível’’. (UNESCO,1990).
Estava instaurada uma unanimidade em juntar esforços voltados para reformular
a educação e que esta fosse de qualidade e que atendesse a todos igualmente. Afinal,
é o único meio de se diminuir as desigualdades e equalizar oportunidades, logo isso
deveria exprimir o maior anseio de todos os Estados. Como vimos pouco tempo após
os objetivos estabelecidos, no Brasil já ocorreram movimentos que alteravam a
educação e com as reformas vieram as avaliações em larga escala e ambas se fizeram
interligadas e permanecem até os dias de hoje com este elo.
Embora seja totalmente compreensível a necessidade de se analisar a educação
e buscar cada vez mais sua ascensão, é de grande importância não permitir que se
perca a característica humanizadora, para que esta possa se expandir em sua
totalidade. A educação não pode deixar de ser o meio de desenvolvimento individual,
porque ela é o único meio de desenvolvimento individual. A implantação deste padrão
beneficia a quem? Ela trata da formação humana ou limita-se a formar mão de obra?
Como já vimos anteriormente o governo já promoveu mudanças na educação de
forma conciliada ao suprimento de necessidades da indústria, como mostrou a criação
do próprio INEP que ocorre num momento em que a parcela de analfabetos era grande,
mas as novas funções nas indústrias pediam por uma mão de obra que fosse
qualificada o suficiente para operar os postos de produção do ramo industrial.
Neste sentido, uma análise mais profunda da intenção das reformas
educacionais visadas pelos governos, especialmente nesta conjuntura, em que tantos
países compactuam com o intuito de estabelecer um padrão, unificar a educação dos
diferentes países, com diferentes realidades socioeconômicas e culturais, com um
sistema de avaliação também padronizado, classificando-os usando dos mesmos
critérios. Acreditar que as motivações se formam meramente pela preocupação com a
educação e sua qualidade seria muita ingenuidade. Como diz Freire (1981, p.73): “Seria
uma atitude muito ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma
forma de educação que permitisse às classes dominadas perceberem as injustiças
sociais de forma crítica”.
2. O padrão IDEB da educação

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) tem um sistema que


combina as informações de rendimento escolar (aprovação) e desempenho
(proficiências) com base nos resultados de exames padronizados, a Prova Brasil e o
Saeb que são repetidos a cada dois anos. São feitos para verificar se está ocorrendo
evolução quanto ao alcance das metas estipuladas para a educação dentro do tempo
visado:
O Ideb é um indicador de qualidade educacional que combina informações de
desempenho em exames padronizados (Prova Brasil ou Saeb) – obtido pelos
estudantes ao final das etapas de ensino (4ª e 8ª séries do ensino fundamental
e 3ª série do ensino médio) – com informações sobre rendimento escolar
(aprovação). (BRASIL, Nota Técnica 2,3 2020, s.p )

O cálculo usado para obter a média de qualidade da educação combina dois


números, de duas médias em que são provenientes do desempenho (nota nos exames)
e rendimento (fluxo), e que a média de desempenho também une dois números em
uma proficiência pois a avaliação confere em questionários de Língua Portuguesa e
Matemática, originando duas médias que se fundem para formar o seguinte cálculo:

IDEBᵢ= Nᵢ Pᵢ

i = ano do exame (Saeb e Prova Brasil) e do Censo Escolar; N = média da


proficiência em Língua Portuguesa e Matemática, padronizada para um
indicador entre 0 e 10, dos alunos da unidade j, obtida em determinada edição
do exame realizado ao final da etapa de ensino; P = indicador de rendimento
baseado na taxa de aprovação da etapa de ensino dos alunos da unidade j;
(BRASIL,Nota Técnica 2,2020, s.p)

O cálculo é feito com uma equação que pode não ser compreendida por muitas
pessoas, e a complicação pode ter início justamente pela dupla combinação de dados.
Visto que o índice leva em conta o desempenho dos alunos nas provas e a taxa de
aprovações, um único número demonstra dois aspectos que se relacionam, mas que
não deixam de ser diferentes. As provas focam em língua portuguesa e matemática,

3
Nota Técnica 2; Metodologia utilizada para o estabelecimento das metas intermediárias para a trajetória
do Ideb no Brasil, Estados, Municípios e Escolas
sendo que a avaliação é feita a cada dois anos, é aplicada a todos os alunos e cada um
obtém uma nota individual que ao final é somada e origina como produto a média da
escola. E a média das escolas juntas atribuem a nota do município inteiro, e dessa
forma generalizada se produzem as médias dos estados e assim vai até o nível
nacional.
Como no cálculo se considera a média de desempenho do aluno em língua
portuguesa e matemática, são geradas duas notas que precisam formar apenas um
proficiente que só depois fará parte do cálculo final juntamente com o número do
indicador da taxa de fluxo (aprovação). Segundo Soares e Xavier (2013, s.p), ‘‘A
metodologia do Ideb assume que, para tornar comparáveis as proficiências de Leitura e
Matemática, basta fazer com que variem no mesmo intervalo’’.

(Proficiência da Escola na Prova Brasil-Limite Inferior das Proficiências)


(Limite Superior das Proficiências - Limite Inferior das Proficiências)
(Fonte: Soares e Xavier, 2013)

Os limites inferiores e superiores utilizados no algoritmo são os valores situados


a três desvios-padrão acima e abaixo da média dos alunos que fizeram o Saeb de
1997, ano em que a escala foi definida. Como mostra a tabela 2:

Tabela 2
Limites Superiores e Inferiores usados para a padronização das notas de Leitura
e Matemática no Ideb

Matemática Leitura
Série

Inferior Superior Inferior Superior

4° 60 322 49 324

8° 100 400 100 400


Fonte: Nota Técnica do Inep sobre a Concepção do Ideb( Inep 2009).

Assim num exemplo simplificado uma escola que ofereça apenas as primeiras séries
do ensino fundamental em que alunos da 4ª série (5º ano) que realizaram a Prova
Brasil com as proficiências médias de 206,92 em matemática e 184,52 em leitura.
Tendo então dois números a partir das notas de desempenho, para se padronizar a
proficiência dessa escola é necessário submetê-las a outro cálculo:

Proficiência Padronizada em Matemática= 206,92-60 =0,56


322-60

Proficiência Padronizada em Leitura= 184,52-49


324-49

Proficiência Padronizada= 10X(0,561+0,492)


2

Fonte:(Soares e Xavier,2013).

Ainda segundo Soares e Xavier:


Como as médias variam muito menos do que observações individuais, embora
as proficiências padronizadas dos alunos assumam valores entre 0 e 10, as
proficiências padronizadas das escolas estão concentradas em um intervalo
mais restrito. Assim, do ponto de vista empírico, é incorreto dizer que o Ideb
varia de 0 a 10 (SOARES e XAVIER, 2013, s.p) .

A média das proficiências padronizadas das escolas varia muito menos do que
as notas individuais, enquanto as proficiências padronizadas dos alunos assumem
valores de 0 a 10, o que se consegue pela multiplicação por dez que ocorre no cálculo.
Já as proficiências padronizadas das escolas se concentram em um intervalo de
variação mais restrito porque são estipuladas pelos valores de limite inferior e superior
definidos para a padronização das notas.
Uma escola só pode atingir a nota 10 se todos os alunos tiverem média igual ao
limite superior (Tabela 2). E uma escola só obtém nota 0 se todos os seus alunos
tiverem como nota a proficiência igual ao limite inferior.
Lembrando que após a obtenção do número da proficiência padronizada da
escola como o sistema do Ideb sintetiza dois indicadores; o de rendimento e o de
desempenho em um único número pelo produto dos dois indicadores. Como Soares e
Xavier (2013, s.p) diz ‘‘cria-se, implicitamente, uma equivalência entre diferentes
combinações dos indicadores de desempenho e rendimento’’. Desta maneira:
IDEB= Desempenho X Rendimento = D X R
O chamado rendimento trata-se do fluxo (aprovação), e conforme Soares e
Xavier (2013) o indicador de rendimento ‘‘[...] é um número menor que 1, o IDEB é
sempre menor que o indicador de desempenho. Ou seja, o IDEB penaliza a escola que
usa a reprovação como estratégia pedagógica, atribuindo-lhe valores mais baixos’’
(SOARES e XAVIER, 2013, s.p).
Visto que acontece a combinação de dois indicadores diferentes a soma pode
resultar uma média final não tão confiável, pois o sistema permite que um número
compense outro. Dentro da logística do IDEB uma escola com média de desempenho
baixa pode ter ao final dos cálculos um proficiente padrão mais alto por ter uma média
de aprovação também alta. Assim é possível equilibrar a nota do IDEB diminuindo a
reprovação. E assim, vice-versa, uma escola com a média de desempenho mais alta se
estiver reprovando muito, seu fluxo mais baixo vai baixar o seu proficiente padrão.
O sistema parece ser favorável às instituições que formam alunos dentro do
tempo estipulado, sem atrasos, sem reprovações, e denota até mesmo uma
despreocupação com o próprio desempenho do alunado. O aprendizado parece sair do
foco, afinal como esse tipo de intervenção pode melhorar a qualidade da educação?
Para Davok:

Por outro lado, a expressão “qualidade educacional” tem sido utilizada para
referenciar a eficiência, a eficácia, a efetividade e a relevância do setor
educacional, e, na maioria das vezes, dos sistemas educacionais e de suas
instituições (DAVOK, 2007, p.506).

Estes termos pertencem, e são comumente usados na dinâmica do setor


empresarial, o que nos remete a ideia de que o sistema educacional e este padrão de
qualidade está associado com o segmento econômico.
O sistema de avaliação do IDEB condicionou a qualidade educacional ao número
de aprovações dos alunos e o desempenho médio das instituições em exames
padronizados que cobram especificamente língua portuguesa e matemática. Não se
leva em consideração o desempenho nas outras áreas e disciplinas do ensino, a
relevância dentro deste sistema se limita a um conhecimento muito básico.
Para Sander (1995, p.43) eficiência “[...] é o critério econômico que revela a
capacidade administrativa de produzir o máximo de resultados com o mínimo de
recursos, energia e tempo”. Exatamente o que o posicionamento contra reprovações do
padrão IDEB nos sugere, pois, levando em conta o critério econômico, uma reprovação
encarece a formação de um aluno, portanto, o ideal e mais compensador é que se
otimizem os custos, o que apenas um alto índice de aprovações proporciona.
Como já vimos no início deste trabalho, a educação pode sofrer influências
totalmente alheias ao seu real papel e a formação humana é inteiramente excluída,
sendo atribuída a ela funções que não condizem com o discurso ou justificativa usados
ao realizarem mudanças, reformas e outras ações feitas no meio educacional.
O momento de maior impulsão a reformas e ao estabelecimento do ‘‘padrão de
qualidade’’ foi sem dúvida na década de 1990, um movimento generalizado visto que
tantos outros países se envolveram com o mesmo projeto. Movimento que
inegavelmente é divergente com o cenário de globalização que também no mesmo
período tornava-se a maior e mais nova tendência mundial, ela que tem o poder de
interferir em todas as esferas econômicas, políticas e sociais, possivelmente veio a
afetar a educação.
Como Davies e Guppy apontam a globalização da economia como fator decisivo
para: ‘‘[...]dar forma às reformas educacionais. A mudança social é alimentada pela
atividade de mercado, que está além do controle dos governos nacionais’’(DAVIES E
GUPPY, 1997, 402). A qualidade em educação que a partir de então é buscada pleiteia
uma qualificação que possa atender o mercado amplamente, que está em constante
mudança e carece de mão de obra farta para garantir a aptidão para concorrência.
Dessa forma, tanto o emprego de termos empresariais como a urgência e
coletiva preocupação com a padronização dos sistemas educacionais, evidenciam uma
concepção que não visa o bem comum, que tem fins econômicos e talvez até lucrativos.
Claramente esses critérios do padrão de educação implantado pelo IDEB almeja mais
que elevar as notas dos alunos em língua portuguesa e matemática, para Marcela
Gajardo a educação dentro desta perspectiva assume função para:

[...]a geração de capacidades e competências indispensáveis à competitividade


internacional, o aumento do potencial científico-tecnológico da região, bem
como o desenvolvimento de estratégias que propiciem a formação de uma
moderna cidadania vinculada à competitividade dos países (GAJARDO, 2000,
p.04).

Como já visto o sistema de avaliação em larga escala é realizado periodicamente


para verificação, constatar se o processo está em evolução se os objetivos desejados
foram alcançados. Assim ela atesta a eficácia, a qual segundo Sander:

[...] é o critério institucional que revela a capacidade administrativa para


alcançar as metas estabelecidas ou os resultados propostos”. O sistema de
produção é global, assim é de suma importância para o mercado de trabalho
que a educação forme um padrão de indivíduos com os predicados necessários
para serem uma boa mão de obra (SANDER,1995,p.46).

Uma educação a serviço do mercado de trabalho e da voraz concorrência neste


setor, não é voltada ao desenvolvimento humano e não anseia a equidade. É um
sistema que almeja converter a educação e alinhá-la a necessidades de fins puramente
econômicos, vai perpetuar a segregação das classes e intensificar a discriminação de
quem está às margens da sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Um pouco de estudo e observações pode mostrar que nem sempre reformas e


sistemas colocados em prática são pensados para beneficiar a população em si,
podendo até mesmo um padrão educacional apontado como excelente em qualidade,
ser contestável e divergir do interesse comum da sociedade. Se o conhecimento
produzido pelo ensino reflete fins e objetivos para o povo e em prol do povo, ele é
benéfico, tem significado e grande valia para este.
Assim como em outros setores, a educação muitas vezes mostra-se sendo
forjada a servir outros intuitos e a cumprir outro papel, passando direto pelo
desenvolvimento individual e a formação do sujeito histórico. Seria incoerência aceitar a
ideia de que o sistema educacional brasileiro é regido pela função mais nobre da
educação que é o desenvolvimento humano, como dito por Pedro Demo: “educação é
vista como um gasto. E não equaliza oportunidades. O país não tem condições
mínimas para o desenvolvimento que aspira, é pobre materialmente, miserável
politicamente. Educação nunca fez tanta falta’’ (DEMO, 2000, p 32).
Os investimentos e recursos dirigidos à educação tendem a ser aplicados
visando formação e especialização de trabalhadores para atender ao mercado,
enquanto este sofre constantes mudanças exigindo que os profissionais acompanhem o
ritmo dessas modificações para poder suprir este exacerbado movimento. Mostrando a
real preocupação do Estado que ao formular as reformas educacionais guia-se pelo
âmbito econômico.
Se colocam em ação planos de ensino que divergem do bem comum, eles
sempre veem maquiados com justificativas eloquentes. Projetos pré-determinados
como os melhores, e assim são aceitos com condescendência pela população, muitas
das vezes passam despercebidos e acabam colaborando com este intrincado sistema
que monopoliza os objetivos a determinados grupos.
O modelo educacional é projetado visando formar alunos em um período de
tempo mais hábil e com o menor insumo de recursos possível, com um sistema de
avaliação que se mostra limitado e ignora todos os critérios extra escolares do vasto
público das escolas brasileiras que pertencem a classes mais baixas e estão expostas
aos mais diferentes tipos de dificuldades econômicas e sociais. Um sistema que
assume a necessidade da universalização do ensino sem levar em conta a própria
realidade pode ter muitas pretensões menos o da equidade de direitos e oportunidades.
Nesse viés, a educação foi colocada a serviço do mercado de trabalho e de um
dos mandamentos do capitalismo, que é a livre concorrência. Com o lema de capacitar
em vez de emancipar, serve de ferramenta para manter os princípios e a estabilidade
do formato econômico e político hegemônicos.
Admitindo que a concorrência do mercado de trabalho é algo que se estabeleceu
e está imposto a nós pelo nosso sistema econômico, a preparação profissional não é e
nunca foi um artigo dispensável, mas a autonomia do indivíduo e a capacidade de ser
sujeito ativo inteirado das questões da sociedade, integrado a ela e não as às suas
margens, deve sempre permanecer sendo o ofício educacional:
Caso predominasse o conhecimento interessado das corporações, dificilmente
as potencialidades emancipatórias da ciência e da tecnologia poderiam ser
fomentadas. Sendo refuncionalizadas como organizações utilitaristas incapazes
de tornar pensáveis os problemas dos povos (LEHER, p.43, 2019).

Por fim, este trabalho destaca que o conceito de qualidade educacional supera
esse modelo de educação padronizado eleito parcialmente como superior. Porque a
educação é maior do que isso, ela não pode ser totalmente controlada pelos grupos
dominantes que impuseram este protótipo, o estudo mostra que o sistema de ensino
sofre influências negativas quando executam-se reformas e adaptações na educação
para que esta sirva de apoio para estabelecer e manter a dominância econômica e
social daqueles que concentram o poder. E não desistir da educação é a única forma
de se contrapor a este manejo indiscriminado de indivíduos.

REFERÊNCIAS

ABREU. Cláudia Barcelos de Moura e Silva. Monica Ribeiro da. Reformas para
que? As políticas educacionais nos anos de 1990, o ‘‘novo projeto de formação’’ e
os resultados das avaliações nacionais. Perspectiva, Florianópolis, v.26, n° 2,
523-550, jul.dez/2008.

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0. Acesso em set/2020.

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Teixeira. História Inep. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/ Acesso em jun.
2020.

Nota Técnica 1;Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.

Nota Técnica 2;Metodologia utilizada para o estabelecimento das metas


intermediárias para a trajetória do Ideb no Brasil, Estados, Municípios e Escolas.

DAVOK, Delsi Fries. Qualidade em educação. Avaliação, Campinas, Sorocaba,


SP, v.12, n. 3, p.505-513, 2007.

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democracias Anglo-americanas. Universidade de Chicago. Comparative Education
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FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra.
1981.

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GAJARDO, Marcela. Reformas Educacionais na América Latina. Balanço de uma


Década. Documento PREAL, n 15, Março/2000.

LEHER, Roberto. Autoritarismo Contra a Universidade: O Desafio de Popularizar


a Educação Pública. Expressão Popular, 2019.

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SAVIANI, Dermeval. Pedagogia Histórico-crítica: primeiras aproximações.7 ed.


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