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Tratado Coisliniano

O Tratado Coisliniano é um resumo do Livro II da Poética de Aristóteles sobre a comédia preservado em um manuscrito do século X. Ele define a comédia como uma imitação de ações risíveis que purga emoções por meio do prazer e do riso. O riso na comédia é gerado por homonímia, sinonímia, prolixidade e paronímia. A comédia difere da injúria por usar ênfase em vez de expor defeitos abertamente.

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Tratado Coisliniano

O Tratado Coisliniano é um resumo do Livro II da Poética de Aristóteles sobre a comédia preservado em um manuscrito do século X. Ele define a comédia como uma imitação de ações risíveis que purga emoções por meio do prazer e do riso. O riso na comédia é gerado por homonímia, sinonímia, prolixidade e paronímia. A comédia difere da injúria por usar ênfase em vez de expor defeitos abertamente.

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TRATADO COISLINIANO

O Tratado Coisliniano est na segunda parte do manuscrito n.120 da coleo


Coislin da Bibliothque Nationale de Paris, de onde provm seu nome. A redao deste
manuscrito assinalada por Devreesse (1945) e outras autoridades como datando do incio
do sc X, mas a anlise dos extratos, sumrios e comentrios aristotlicos nele
compreendidos fazem crer que o seu contedo remonta ao sc. VI, pois reflete o ensino
filosfico da poca, sobretudo nas partes comentando o Isagoge de Porfrio, que ocupam a
maioria das pginas do cdice. O Tratado Coisliniano ocupa as folhas 248v, 249r e 249v
do manuscrito, no possui ttulo nem autoria. provavelmente um eptome dos contedos
do Livro II da Potica de Aristteles, mas pode ter sofrido influncias dos ensinamentos
retricos posteriores ao Liceu (porm, como a influncia recproca, no h como
distinguir a provenincia com exatido). Segundo Cooper (1922):
Talvez possamos assegurar que o Tratado mostra diferentes estratos
de criao em seu desenvolvimento at o estado atual, que revela a mo,
primeiro de um estudante industrioso e fiel a Aristteles, e depois de um
imitador menos inteligente, que deseja a todo custo pr sua obra altura da
doutrina e dos termos da Potica, e que a definio de comedia parece
merecer a censura infligida por Bernays y Bywater.
Para esta traduo, servi-me principalmente dos materiais contidos no estudo de
Richard Janko, Aristotle On Comedy, Towards a reconstruction of Poetics II; o texto por
ele estabelecido, sua traduo e, sobretudo, as pranchas com reprodues fotogrficas das
trs pginas do manuscrito. Tambm me foi til a edio de J. Vahlen de 1885, reeditada
em 1964, que se atm mais estritamente a edio do manuscrito, sem a quantidade de
correes de Janko, e fiel disposio grfica do mesmo. Minha traduo aproxima-se
mais do texto grego deste ltimo, sendo bastante diferente da edio feita por Janko, por
dois motivos principais: primeiro, meu objetivo, diferente do dele, no reconstruir aqui o
texto original de Aristteles, de modo que me eximi da quantidade de correes e adendos
que Janko faz, usando manuscritos adjacentes (sobretudo os Prolegmenos dos manuscritos
das obras de Aristfanes, editados por Koster, 1975) minha traduo visa to s o
manuscrito do Tratado; segundo, a consulta s pranchas dos manuscritos permitiu-me
algumas construes diferentes, sobretudo na hora de interpretar em sintaxe dissertativa os
freqentes diagramas visuais. Fora esses dois motivos, as distncias decorrem apenas das
razes de sempre: lnguas e compreenses diferentes.
Apesar de visar to somente traduo do Manuscrito, aceitei, para a
compreensibilidade do texto, algumas poucas correes e adendos propostos pelo
estabelecimento de Janko e outros, os quais esto devidamente assinalados em notas de
rodap. Tomei a liberdade tambm de acrescentar subttulos s divises propostas por
Janko.
Rio de Janeiro, 23 de novembro de 2003.
Fernando Santoro

Conspectum siglorum
[ ] delenda
< > inserenda
( ) translatio ins.

<I e II. Gneros Literrios>


Da produo literria, uma parte no mimtica, outra parte mimtica.
A literatura no mimtica reparte-se em investigativa e educativa, e esta(s)1 em
didtica e especulativa.
J a literatura mimtica reparte-se, de um lado, em narrativa, de outro, em
dramtica, i.e. que se exprime por aes, a qual se divide ainda em comdia, tragdia,
mmica e stira.
<III. Catharsis>
A Tragdia afasta as afeces da alma relativas ao medo por meio de compaixo e
terror, e [que]2 almeja estabelecer uma proporo do medo; tem como me a dor.
<IV. Definio da Comdia>
Comdia uma imitao de uma ao risvel e desprovida de grandeza3, acabada,
separada em cada uma das partes no tocante aos formatos; representada por atores e
tambm4 por meio de narrativa, consumando pelo prazer e pelo riso a purgao de tais
afeces; tem como me o riso.

<V. Causas do Riso>


1)
2)
3)
4)

Mas o riso gerado seja pelas falas seja pelas aes.


Por homonmia
<Por> sinonmia
<Por> prolixidade
<Por> paronmia
4a) de prtese e afrese
4b) <de> diminutivo.
4c) <de> trocadilho com voz, e com coisas de gnero semelhante.

No manuscrito a diviso aparece em forma de diagrama: a subdiviso em didtica e especulativa vem


abaixo da diviso em investigativa e educativa; Bergk liga a subdiviso apenas ao gnero educativo.
Vahlen mantm a diagramao do manuscrito. Como Janko, adaptamos o diagrama para uma forma
discursiva, mas sem as suas correes.
2
Kai\ oti excerptoris vestigium
3
No sentido de nobreza.
4
Kaibel acrescenta a negao <ou)> (CGF)

5) <Pela> forma de falar5

<VI. Riso proveniente de aes>


O riso (surge) a partir das aes:
Desde a assimilao, que se usa para o pior ou melhor
Desde o engano
Desde o impossvel
Desde o possvel e incoerente
Desde a quebra de expectativa
Desde a caracterizao chula das personagens
Desde o uso de danas grosseiras
Quando algum, tendo a possibilidade, deixa de lado o que melhor e toma para si o
que pior
9) Quando o discurso desarticulado na medida em que tambm no tem coerncia
alguma.
1)
2)
3)
4)
5)
6)
7)
8)

<VII. nfase>
A comdia difere da injuria, porque, de um lado, a injuria expe abertamente os
defeitos salientes, enquanto aquela precisa da chamada nfase6.

<VIII. Bufo>
O bufo busca escarnecer7 das falhas da alma e do corpo.

<IX. Simetria>
Deve haver uma proporo do terror nas tragdias e do riso nas comdias.

Cf. Potica 19, 1456b 8-13.


No sentido original de sugesto significativa, i.e., como figura da elocutio. medida que esta figura, para
ser efetivamente significativa, muitas vezes demandava do ator uma fora expressiva maior, este aspecto da
pronuntiatio tendeu nas lnguas modernas a resignificar a nfase no domnio da elocutio. Cf. Lausberg,
Elemente der Literarischen Rhetorik, 209.
7
e)le/gxein originalmente quer dizer: envergonhar, donde tambm: censurar e, posteriormente, nas disputas
dialticas: refutar.
6

<X. Aspectos da Comdia>


Aspectos da comdia: enredo, carter (das personagens), pensamento, elocuo, canto,
espetculo.

<XI. Enredo>
Enredo cmico aquele que tem sua construo com aes em torno do risvel.

<XII. Personagens>
Personagens caractersticos da comdia: os iconoclastas e tambm os irnicos e os
fanfarres.

<XIII. Pensamento>
H duas partes do pensamento: opinio e prova. <H cinco provas>8: juras, pactos,
testemunhos, confisses, leis.

<XIV. Elocuo>
Elocuo cmica comum e vulgar.
O poeta cmico deve atribuir s personagens a lngua ptria das mesmas, mas na lngua
local dele.

<XV. Canto & Espetculo>


O canto uma particularidade da msica, desde a qual dever receber as bases
independentes.
O espetculo, com grande utilidade para as atuaes dramticas, sustenta a harmonia.

<XVI. Aspectos>
O enredo e a elocuo e o canto so observados em todas as comdias, mas
pensamentos e carter e espetculo em <no>9 poucas.

8
9

Ins. Kaibel (CGF)


Ins. Janko, conforme Potica 6, 1450a 12

<XVII. Partes da comdia>


H quatro partes da comdia: prlogo, interveno coral, episdio e xodo.
1) Prlogo uma parte da comdia que vai at a entrada do coro.
2) Interveno coral o canto cantado pelo coro, quando tem tamanho suficiente.
3) Episdio o que fica entre dois cantos corais.
4) xodo o que falado no fim pelo coro.

<XVIII. Fases da comdia>


Da comdia:
1) Antiga: que se excede no risvel;
2) Nova: que o dispensa e inclina-se para o srio;
3) Mdia: que uma mistura de ambas.

BIBLIOGRAFIA:
ARISTTELES, Opera, Berlin, Academia Regia Borussicae, 1831 (Ed. I. Bekker, reed. O.
Gigon, Bruxelles, W. De Gruyter, 1960-87)
De Arte Poetica Liber. Oxford: Clarendonian press, 1965, 1982 (Ed. Kassel)
De Arte Poetica Lber. ed. 3, Leipzig 1885 (ed. 1 = 1867, ed. 2 = 1874),
Hildesheim, 1964 (Ed. Vahlen)
Potica. So Paulo: Abril Cultural, 1973 (Ed. E. Souza)
On Comedy, London, Duckworth, 1984 (Ed. R. Janko)
Potica de Aristteles. Ed. trilnge. Madrid: Gredos, 1974 (Ed.Yebra, V.G.)
La Potique. [texto, tr., com.] Paris 1980 (Ed. Dupont-Roc, R.; Lallot, J.)
Ars Rhetorica. Oxford: Clarendonian press, 1989 (Ed. Ross)
Retrica. Lisboa, INCM, 1998 (Ed. M. A Junior, P.F.Alberto, A.N. Pena)
Fragmenta Selecta. Oxford: Clarendonian press, 1979 (Ed. Ross)
History of Animals (books I-III). Londres: Harvard Universitry Press, 1993
(Ed. Peck)
Poltica. Lisboa, Vega, 1998 (Ed. A.C. Amaral & C.C.Gomes)
BERNAYS, J. Zwei Abhandlungen ber die aristolische Theorie des Drama: I. Grundzge
der verlorenen Abhandlung des Aristoteles ber Wirkung der Tragdie; II.
Ergnzung zu Aristoteles Poetik, Berlin 1880 (Parte I pub. em Breslau
1857), Reed: Darmstadt 1968, trad. Ingl. Aristotle on the effect of tragedy,
Articles on Aristotle 4: Psychology and Aesthetics ed. J. Barnes, M.
Schofield, R. Sorabji.
BONITZ, Hermann, Aristotelis Opera, Immanuelis Bekkeri, Acad. Regia Borussica, reed. O.
Gigon, Bruxelles, W. De Gruyter, 1961, Vol. V. Index Aristotelicus

COOPER, Lane An Aristotelian Theory of Comedy, with an adaptation of the Poetics and a
translation of the Tractatus Coislinianus, Oxford 1922 [disponvel em:
http://www.ucm.es/info/per3/cic/Numero7/1Tractatus.pdf ]
JANKO, R., Aristotle On Comedy, towards a reconstruction of Poetics II, London,
Duckworth, 1984
LAUSBERG, H., Elemente der Literarischen Rhetorik, Mnchen , Max Hueber Verlag, 1967
[Ed.R. Fernandes, Lisboa, F.C.G., 1993]
Apud Janko :
Bergk, T., Aristophanes. Comoediae. Leipzig, 1861.
Devreesse, R., Bibliothque Nationale, Catalogue des manuscrits grecs. Paris, 1954
Kaibel, G., Comicorum Graecorum Fragmenta I, Berlin, 1899 (CGF)
Koster, W.J.W., Scholia in Aristophanem. Pars I Fasc. IA. Prolegomena de Comoedia.
Groningen, 1975

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