Toxidermias
Toxidermias
Dermatologia
Toxidermias: Reacções Cutâneas Adversas a Medicamentos
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A pele é o órgão mais frequentemente envolvido nas reacções adversas a medicamentos,
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o que corresponde a aproximadamente /3 dos casos. Estima-se que 3 a 6% das toxidermias
ocorram em contexto hospitalar, o que demonstra o impacto da polimedicação e da
medicação em doses elevadas, e que 0,1 a 0,3% das toxidermias apresentem critérios de
gravidade clínica.
O diagnóstico de uma toxidermia é essencialmente clínico. Uma anamnese adequada
deve incluir uma lista dos fármacos introduzidos nas últimas 2 a 3 semanas, particularmente
na última semana. Os fármacos mais associados às toxidermias são os antibacterianos, os
anti-inflamatórios não-esteroides, os anticonvulsivantes, os diuréticos e o alopurinol. O
próprio padrão cutâneo, identificado ao exame objectivo, pode ser indicativo dos fármacos
potencialmente envolvidos, orientando o diagnóstico e o tratamento. Deve excluir-se
toxidermia grave nos casos de eritrodermia, de manifestação de vesículas, de bolhas ou de
pústulas, de dor espontânea ou induzida à palpação, de envolvimento das mucosas, de
edema, de descolamento ou de necrose cutânea, de febre e de envolvimento sistémico.
Em relação aos exames complementares de diagnóstico, a biopsia cutânea pode ser útil,
mas não obrigatória, e realiza-se em casos graves ou de dúvida diagnóstica, tal como as
análises séricas. Os testes epicutâneos e os fototestes têm indicações especificas em
determinados padrões cutâneos. A realização dos testes de provocação é controversa, uma
vez que pode desencadear reacções cutâneas mais graves que as anteriores.
As toxidermias classificam-se em toxidermias não imunologicamente mediadas e em
toxidermias imunologicamente mediadas.
As primeiras surgem como um resultado expectável da acção farmacológica ou da
interacção entre fármacos e são as mais prevalentes, correspondendo a ¾ dos casos:
• Efeito adverso decorrente do efeito farmacológico, que se manifesta sempre e é dose
dependente. Um exemplo é a desidratação dos lábios e das mucosas com a
administração de retinoides. Os olhos podem também ser afectados, devendo alertar-
se os doentes para uma possível intolerância a lentes de contacto.
• Sobredosagem do fármaco, causando um efeito terapêutico excessivo. Um exemplo é
o surgimento de púrpuras com a administração de anticoagulantes. O efeito é difícil de
controlar e implica a monitorização do índice internacional normalizado/tempo de
protrombina.
• Toxicidade acumulada, como ocorre na administração de metotrexato. A dose
acumulada do fármaco não deve ser superior a 5 g porque aumenta o risco de
insuficiência hepática. As doses utilizadas de metotrexato em Dermatologia, em
média, não ultrapassam os 15 mg por semana.
• Fototoxicidade, por exemplo a causada por fluoroquinolonas, tetraciclinas e
psoralenos. Os psoralenos constituem um exemplo de como uma reacção adversa
cutânea de fototoxicidade pode ser utilizada para fins terapêuticos, na fototerapia.
• Interacção entre fármacos;
• Dermite de contacto irritativa;
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• Pseudoalergia, anafiloide, não mediada por imunoglobulina E;
• Deposição do fármaco, como ocorre com os sais de prata. A argiria é a condição
causada por exposição cutânea imprópria a compostos químicos de prata. O sintoma
mais relevante é a coloração azulada da pele.
• Efeito facilitador dos antibacterianos, suprimindo a flora comensal da pele e das
mucosas, permitindo, consequentemente, infecções oportunistas como a candidíase.
As reacções adversas imunologicamente mediadas correspondem às reacções de
hipersensibilidade. As mais comuns são as reacções tardias, de hipersensibilidade tipo IV,
enquanto que as reacções de hipersensibilidade tipo II são raras.
De seguida exploram-se alguns dos padrões cutâneos de toxidermia. Determinado
padrão cutâneo pode apresentar mais do que uma causa possível e não ser
necessariamente desencadeado por fármacos, o que dificulta o diagnóstico.
2. Urticária e Angioedema
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As manifestações relacionadas com a urticária e o angioedema são as segundas mais
frequentes, e resultam de reacções de hipersensibilidade tipo I, alérgicas, mediadas por
imunoglobulina E.
A urticária surge nas primeiras 24 horas depois da administração do fármaco.
Caracteriza-se por pápulas e placas eritematosas, e acompanha-se de prurido ou de ardor,
podendo ou não surgir em simultâneo com o angioedema. Uma das características da
urticária é a fugacidade das lesões. Quando em associação com o angioedema, o padrão
cursa com áreas de palidez cutânea, porque o edema da derme causa pressão sobre os
vasos sanguíneos cutâneos. Apenas aproximadamente 9% das reacções urticariformes
agudas correspondem a reacções a fármacos e os fármacos mais envolvidos são a
penicilina, as aminopenicilinas, as cefalosporinas, as sulfonamidas e as tetraciclinas.
Aproximadamente 50% das reacções urticariformes são idiopáticas, 40% decorrentes de
infecções respiratórias e 1% de origem alimentar.
O angioedema isolado traduz-se por um edema intenso, com expressão nas mucosas e
com dor. Os fármacos mais envolvidos são a penicilina, os anti-inflamatórios não esteroides,
o ácido acetilsalicílico, o infliximab e os inibidores da enzima conversora da angiotensina.
Aproximadamente 40% das causas do angioedema são também idiopáticas. O angioedema
pode surgir ainda por reacção alimentar ou a aeroalergénios ou por deficiência do inibidor da
C1 esterase.
As reacções adversas a fármacos podem ser também anafiláticas sem um padrão
cutâneo associado.
O tratamento das lesões incide na evicção do fármaco e na administração de anti-
histamínicos.
A biopsia das lesões apenas está indicada se tiverem uma duração superior a 24h, para o
diagnóstico diferencial com vasculite de padrão urticariforme.
3. Eritema Fixo
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As localizações mais frequentes são a acral, a orolabial e a genital, a última
principalmente em indivíduos do sexo masculino.
Diversos fármacos podem estar envolvidos: sulfonamidas, tetraciclinas, anti-inflamatórios
não esteroides e anticonvulsivantes. Habitualmente o eritema fixo é desencadeado por
fármacos de administração esporádica.
4. Erupções Acneiformes
5. Fotossensibilidade
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FOTOTOXICIDADE FOTOALERGIA
6. Vasculite
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Podem ser assintomáticas, na maior parte dos casos, ou surgir associadas a prurido ou a
dor.
Deve excluir-se envolvimento sistémico, através do exame objectivo e de exames
complementares de diagnóstico
Os fármacos mais envolvidos são a penicilina, as aminopenicilinas, as cefalosporinas, as
sulfonamidas, os anti-inflamatórios não esteroides, os anticonvulsivantes, os diuréticos, o
propiltiouracilo e os factores de crescimento.
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Trata-se de uma toxidermia grave, com afecção multissistémica. A sua manifestação
depende da susceptibilidade genética individual, que interfere com os processos de
metabolização dos fármacos, e de infecção viral concomitante.
Manifesta-se até 40 dias após a introdução do fármaco, com febre, erupção de máculas e
pápulas, podendo envolver as mucosas nos casos de maior gravidade, e edema.
O envolvimento sistémico pelo surgimento de linfadenopatia, de hepatite, de nefrite, de
miocardite e de pneumonia intersticial.
Determina alterações analíticas de eosinofilia, com linfócitos atípicos policlonais.
Os fármacos envolvidos na reacção são as sulfonamidas, a minociclina, o abacavir, o
alopurinol e os anticonvulsivantes.
São duas entidades distintas que indicam a presença de uma toxidermia grave e
potencialmente fatal. A primeira corresponde a um padrão cutâneo de eritema multiforme,
com envolvimento das mucosas, enquanto a segunda se trata de um padrão cutâneo de
eritema de extensão variável, associado a descolamento cutâneo. Uma situação frequente é
a ocorrência do primeiro padrão cutâneo, com evolução para o segundo.
A mucosa oral é a mais atingida, seguida da conjuntival, da faríngea e esofágica.
As lesões encontradas são máculas e manchas, lesões figuradas em alvo atípicas, que
evoluem para descolamento cutâneo, com sinal de Nikolsky positivo, e erosões.
Surgem até 7 a 21 dias depois da introdução do fármaco. Os fármacos mais envolvidos
são as sulfonamidas, os anti-inflamatórios não esteroides, os anticonvulsivantes e o
alopurinol.
Verifica-se a presença de pródromos como febre, astenia, ansiedade, disúria, dor
cutânea, odinofagia e conjuntivite.
A gravidade do quadro apresentado é equiparada à gravidade de um doente queimado.
Os doentes podem apresentar hipoproteinemia, hipovolemia, desequilíbrio hidro-eletrolítico e
sépsis.
A mortalidade é de aproximadamente 10% no síndrome de Steven-Johnson isolado, 10 a
30% em overlap e mais de 30% na necrólise epidérmica tóxica.
A biópsia pode ser necessária para o diagnóstico.
O fármaco deve ser suspendido. O tratamento deve ser efectuado numa unidade de
cuidados intensivos, com recurso a imunoglobulina endovenosa. Deve ser efectuada uma
terapia de suporte.
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penicilamina. O penfigoide bolhoso surge em reacção à penicilina e às aminopenicilinas, à
furosemida, ao captopril e à sulfasalazina.
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