A Imago Materna Transformações Na
A Imago Materna Transformações Na
A Imago Materna Transformações Na
2008
Instituto Superior de Psicologia Aplicada
2008
Dissertação de Mestrado realizada sob a orientação de
Prof. Doutora Ângela Vila-Real, apresentada no Instituto
Superior de Psicologia Aplicada para obtenção de grau de
Mestre na especialidade de Psicologia Clínica conforme o
despacho da DGES, nº 19673 / 2006 publicado em Diário
da Republica 2ª série de 26 de Setembro, 2006.
Agradeço, em primeiro lugar, à professora Ângela Vila-Real a disponibilidade e o apoio
dispensados ao longo destes dois anos.
Aos meus amigos, agradeço o apoio e a motivação nos momentos mais difíceis. Agradeço ao
Clã Maputxe por transformar cada momento em magia e em diversão, e por estar sempre
presente ao longo destes anos, nomeadamente, à Ana Cristina agradeço o companheirismo, a
amizade e também a alegria partilhada, à Cristina agradeço a amizade e a solidariedade, à Rita
agradeço por me ter apoiado incondicionalmente nas alturas certas, à Liliana agradeço a
amizade e a boa disposição, e ao Alexandre a camaradagem.
Agradeço ao Filipe por me ter acompanhado e apoiado ao longo desta viagem, alegrando-me
e dando-me força sempre que necessitei, assim como, por fazer parte da minha vida.
Um obrigado muito especial, aos meus pais por terem apoiado a minha escolha profissional,
bem como, todo o apoio dado ao longo do curso.
Resumo
Este estudo, de natureza exploratória e comparativa, pretende contribuir para uma melhor
compreensão da representação interna da mãe, no contexto da pré-adolescência e da
adolescência, de modo a diminuir algumas lacunas existentes na literatura. Assim, este
trabalho pretende: a) compreender como se desenvolvem os processos de transformação na
imago materna e b) compreender como se desenvolvem os processos de identificação à imago
materna, durante a pré-adolescência e a adolescência. Constituiu-se uma amostra de 42
raparigas, as quais foram divididas em três grupos consoante a idade, i.e., 12 anos (n=14), 13
anos (n=14) e 14 anos (n=14). Foi aplicado o Teste de Apercepção Temática (T.A.T),
especificamente o cartão 7GF.
This exploratory and comparative study intends to contribute to a better comprehension of the
internal representation of the mother, in the context of early adolescence and adolescence, in a
way to decrease some of the existing gap on the literature. Thus, the goals of the study are: a)
understand how the transformation process develops in maternal imago and b) understand
how the identification process develops during early adolescence and adolescence. For that it
was formed a sample with 42 adolescents, which were divided in three groups according to
the age, i.e., 12 years old (n=14), 13 years old (n=14) and 14 years old (n=14). It was applied
the Thematic Apperception Test (T.A.T.) specifically the 7GF card.
As main results of the present study we can say that there were differences between early
adolescents and adolescents, relatively to the transformations in the maternal imago and in the
identification to her. Namely the hesitation between dependency and autonomy at the age of
twelve, the ambivalence in the relationship with the mother at the age of thirteen, and the
antagonistic identification to the mother at the age of fourteen.
Introdução....................................................................................................................1
Revisão da Literatura...................................................................................................3
Questões de Investigação..............................................................................................28
Método..........................................................................................................................29
1) Participantes
2) Instrumentos
3) Procedimento
«Adolescere» significa, em latim crescer, passar da infância para a idade adulta, sendo um
processo do desenvolvimento (Laplanche & Pontalis, 1985). Do ponto de vista psicológico, a
adolescência pode ser descrita enquanto a passagem da infância à adultícia, como um período
preparatório contudo, tal definição seria uma caracterização genérica.
Por outro lado, Blos (1962, 1966) considera que a adolescência tem como tarefa fundamental
o segundo processo de individuação, que tem o seu início na pré-adolescência. O primeiro
processo ocorreu no fim do terceiro ano de vida, quando a criança experiencia a distinção
entre Self e Não-Self. Experiência similar, porém mais complexa, ocorre durante a
adolescência o que irá conduzir ao sentido de identidade.
Verifica-se também, nesta fase do desenvolvimento, transformações ao nível da imago
materna, ou seja, ao nível da representação interna da mãe. A imago materna é formada ao
longo da infância, sendo concebida como um resíduo de experiências precoces, i.e., o objecto
externo é percebido segundo as suas características reais, depois sofre uma “distorção”,
transformando-se em imago, voltando depois a aproximar-se dos objectos exteriores reais
(Klein, 1927). Na pré-adolescência, a estrutura interna do indivíduo permanece a mesma da
latência, ou seja, as instâncias são preenchidas pelas imagos que se formaram na infância,
sendo inflexíveis, rígidas e punitivas (Blos, 1962, 1966).
No sentido do que foi referido, pretende-se compreender quais as transformações que ocorrem
na imago materna nesta fase crucial do desenvolvimento, uma vez que na adolescência as
raparigas, passam por várias mudanças, em alguns casos de forma radical e num curto espaço
de tempo, sendo uma dessas modificações, o modo como passam a representar internamente a
mãe, como lidam e expressam os seus sentimentos, a forma como essa representação vai
influenciar o relacionamento com a mãe “real”, e o modo como através da identificação a
esta, se conseguem imaginar enquanto mães.
Capítulo I: A imago Materna
O conceito de imago é atribuído a Jung que, no seu livro Metamorfoses e Símbolos da Libido,
descreve a imago materna, paterna e fraterna (1911 cit. por Laplanche & Pontalis, 1985). Jung
(1950 cit. por Pereira, 1997) define a imago enquanto um conceito diferente de «complexo».
De acordo com o autor, a imago surge quando uma impressão reprimida pela consciência se
modela a si própria na figura materna ou paterna, e enquanto figura autónoma, baseada numa
relação precoce do sujeito com os seus pais. Na primeira definição de imago, Jung inclui dois
tipos de representações: (1) «as mais pessoais»; (2) «e as que são mais impessoais, arcaicas e
colectivas».
Lacan (1938 cit. por Pereira, 1997) descreve o estádio-espelho enquanto momento em que a
criança antecipa a unidade funcional do seu corpo. O autor descreve três passos em relação ao
desenvolvimento da criança: (1) «complexo de desmame»; (2) «complexo de intrusão»; (3)
«complexo de Édipo». Relativamente ao segundo passo, o «complexo de intrusão», a criança
toma em consideração a presença do irmão, tendo como afecto preponderante a inveja. A
criança é de algum modo cativada pela sua própria imagem reflectida no espelho. Ela
identifica-se com o seu reflexo, confunde-se a si própria com essa imagem que proporciona a
sua unidade, mas que, simultaneamente o aliena. Esta experiência evoca a imago dupla,
enquanto Gestalt, que aparece como um modelo ideal, sendo impossível para o sujeito,
separar-se da sua própria imagem.
Esta interferência confusa é interpretada pelo autor, como uma «intrusão narcísica», sendo
uma fase necessária para a construção do Ego. Para o autor, a criança percepciona
precocemente a figura dos seres humanos, enquanto membros do fazer. O sujeito é, de certo
modo, capturado por essa imagem geral, e pela sua própria imagem individual. A criança deve
distinguir a sua imagem do seu reflexo, e experiencia uma invasão de afectos agressivos.
Assim, ela constrói o seu Ego, para além do modelo geral do fazer. O sujeito deve diferenciar-
se a si próprio da imagem do outro, tendo de fazer uma escolha radical entre «eu ou o outro»
(Lacan, 1938 cit. por Pereira, 1997).
Segundo Laplanche e Pontalis (1985), imago e complexo são conceitos relacionados, uma vez
que ambos lidam com a mesma área, ou seja, as relações entre a criança e o seu meio familiar
e social. Porém, os autores fazem uma distinção: a noção de complexo refere-se ao efeito da
situação interpessoal no seu todo sobre o indivíduo, enquanto a de imago resulta de um
resíduo imaginário de um ou de outro participante naquela situação. A imago é diversas vezes
definida enquanto representação inconsciente, todavia deve ser considerada como esquema
imaginário adquirido, através do qual o sujeito visa a outra pessoa, em vez de uma imagem.
Porém, a imago não deve ser compreendida enquanto um reflexo do mundo real, mesmo que
seja de forma mais ou menos distorcida, porque a imago não corresponde à pessoa real, mas
sim, ao modo como essa mesma pessoa foi experienciada numa relação precoce.
Freud (1912/1961), utilizou a palavra imago citando Jung, pela primeira vez em The
Dynamics of Transference, definindo o conceito, o qual deve ser compreendido que cada
indivíduo, através das operações combinadas das suas disposições inatas, e das influências
que lhe são fornecidas durante os seus primeiros anos de vida, adquire um método específico
para conduzir a sua vida erótica. Neste texto, Freud (1912/1961), ao contrário de Jung (1950
cit. por Pereira, 1997) e de Lacan (1938 cit. por Pereira, 1997), não limita o campo da imago a
uma imagem fixa arcaica. Considera a imago como, placas estereotipadas que são
constantemente reimpressas ao longo da vida do indivíduo, através das circunstâncias
externas e da natureza dos objectos de amor que lhe são acessíveis, que permitem algumas
mudanças face a experiências recentes.
Posteriormente, tal conceito deu lugar a uma importante cisão na teoria psicanalítica, tendo
por um lado Anna Freud, para quem a relação entre a criança e os seus pais é real, tal como a
relação com o analista, que reproduz a relação anterior sendo esta igualmente real, e, por
outro, Klein, em que a atitude da criança face aos seus pais é determinada pela imago interna,
representação imaginária e distorcida dos pais. Desta forma, a imago torna-se uma peça
fundamental da nova teoria psicanalítica (Houzel et al., 2004). Para Klein (1935), a
introjecção e a projecção regem o desenvolvimento do bebé, i.e., as imagos, que são quadros
fantasticamente deformados dos objectos reais para os quais remetem, instalam-se não só no
mundo exterior, mas também no interior do Ego, através do processo de incorporação.
O conceito de imago permite construir uma articulação entre o sujeito e o contexto social, a
partir de uma representação que liga a imagem à narrativa. Jung (s.d. cit. por Houzel et al.,
2004) apresenta, nos seus trabalhos, a imago como uma representação inconsciente e pré-
consciente que faz a articulação entre o sujeito e o mito, entre o individual e o colectivo. A
pertinência desta ligação verifica-se entre as representações icónicas e simbólicas – a língua –
tendo em consideração a clínica projectiva como a de expressão. Imago pode ser também
definida como o que emerge no desenho, mas também o que é evocado numa situação
projectiva como a do TAT ou do Rorschach, não deixando de lembrar a formação de imagens
cuja expressão é organizadora ou desorganizadora do psiquismo. Deste modo, a expressão é
uma construção de representações que integram o cinético, o icónico e a palavra. Esta
complexa mensagem está na génese dos fenómenos de auto-organização do psiquismo
(Houzel et al., 2004).
Para Klein (1945), o complexo de Édipo tem início no primeiro ano de vida, em estreita
ligação com uma relação com o seio materno, no qual o bebé procura gratificação, sendo
determinante no desenvolvimento emocional e sexual. Tanto o seio da mãe como o pénis do
pai são os objectos primários dos desejos da fase oral, através dos quais o bebé procura uma
gratificação ilimitada, ilusão que é retirada pela sensação de frustração. A agressividade é um
factor que está directamente relacionado com a frustração, uma vez que, na relação do bebé
com o seio bom e o seio mau, assiste-se à idealização de um, e ao ódio e medo do outro, na
origem de objectos persecutórios.
A frustração face ao seio faz com que o bebé se direccione para o pénis enquanto objecto de
amor, cuja decepção promove a instabilidade e direccionamento de objectos e emoções. A
agressividade proveniente da frustração é projectada nos objectos primários e representadas
em fantasias agressivas e punitivas, donde advém a necessidade de um objecto ideal, possível
de ser amado e que o proteja, em suma, um bom objecto. Nestes estádios, dá-se conta de uma
instabilidade entre a imagem boa e má do objecto, entre diferentes imagos primárias, imagos
que se formam no Ego do bebé e vão formando o Superego (Klein, 1945).
Essa mudança permite que o Ego se coloque numa nova posição, na qual se consegue
identificar com o seu objecto. Enquanto anteriormente as ansiedades do bebé eram do tipo
paranóide, agora possui um conjunto mais complexo de sentimentos ambivalentes e
ansiedades depressivas relativas ao seu objecto. A partir de agora, ele passa a ter receio de
perder o objecto amado bom e, para além de sentir ansiedades persecutórias, começa a sentir
culpa devido à sua agressividade contra o objecto, tendo a necessidade de repará-lo por amor.
Observa-se também a uma mudança nas suas defesas, i.e., passa a dispor das defesas
maníacas para aniquilar os perseguidores para lidar com a nova experiência de culpa. Klein
(1935) denominou este grupo de relações de objecto, ansiedades e defesas «posição
depressiva». Para a autora, o resultado normal da posição depressiva é a firme internalização
do objecto bom. Caso tal não ocorra, entra-se na esfera da doença depressiva.
Freud (1905), um ano após a obra de Hall, através da teoria psicossexual, desenvolveu a
compreensão da personalidade e da adolescência, dando ênfase à sexualidade infantil. Os
cinco primeiros anos são fundamentais para a formulação e o desenvolvimento da
personalidade, a criança passa por três fases distintas nos primeiros cinco ou seis anos,
enquanto o período de latência abrange a etapa mais longa, entre os cinco e os dez anos.
Durante a fase genital, surge a puberdade e a adolescência, entre os onze e os vinte e um anos.
A diferença mais notória entre Hall (1904, cit. por Carretero, 1985) e Freud (1905), acerca da
adolescência, está no facto de, o primeiro autor, considerar a adolescência enquanto a etapa
mais decisiva do desenvolvimento humano, visto que nela poderiam produzir mais
transformações que nas etapas anteriores, enquanto Freud, considerava que os primeiros anos
de vida influenciam decisivamente as etapas posteriores. Ambos os autores partilham a
influência do evolucionismo, do determinismo biológico e as posições maturacionistas, bem
como, a consideração da adolescência enquanto etapa de «storm and stress». No caso de Hall,
o adolescente recapitula as mudanças na evolução da sociedade, enquanto para Freud, o
adolescente revive um conflito infantil (Carretero, 1985).
Nas concepções pós-freudianas existem vários autores que se devem destacar, uma vez que,
desenvolveram várias teorias em relação à adolescência, que vieram de algum modo expandir
os conhecimentos desta fase crucial do desenvolvimento.
Para Schave e Schave (1989), a pré-adolescência é uma fase distinta, caracterizada por
mudanças psicológicas únicas em intensidade e reactividade face às experiências e situações
de vida. A pré-adolescência começa por volta dos onze anos nas raparigas e algum tempo
depois nos rapazes e termina cerca dos catorze anos nas raparigas e um pouco mais tarde nos
rapazes. Cordeiro (1988), também considera a pré-adolescência como uma fase importante,
que se inicia com o desenvolvimento pubertário, situado em dois sistemas de referência: o
corpo e a família. Ao longo da adolescência, pode-se verificar uma desarmonia evolutiva,
havendo uma discrepância entre a maturidade sexual e a maturidade psico-afectiva.
Blos (1962) distingue a adolescência em subfases, sendo as mais relevantes para este estudo a
pré-adolescência e a adolescência inicial, a saber, a pré-adolescência caracteriza-se pelo ao
aumento quantitativo de pressão pulsional e pelo reaparecimento da pré-genitalidade,
ocorrendo entre os 9 e os 10 anos; e a adolescência inicial, é definida pela preeminência
genital e a rejeição dos objectos parentais internos, iniciando verdadeiramente o processo de
ruptura dos vínculos com o primeiro objecto, e pelo estabelecimento de relações
extrafamiliares, substituindo as identificações familiares por outras (amigos, idealizações).
Permanecendo ainda uma forte tendência bissexual, tendo a escolha de objecto características
narcísicas muito acentuadas, esta subfase surge entre os 11 e os 14 anos.
Blos (1962, 1967) retoma as ideias de Anna Freud, considerando que a adolescência é uma
reedição dos conflitos infantis, com alguma ambivalência entre a autonomia e a dependência,
e adapta o processo de separação-individuação de Mahler para a adolescência, de modo a
apoiar esta comparação. O autor, utiliza o termo adolescência, de modo a definir os processos
psicológicos de adaptação à puberdade e insiste em quatro aspectos essenciais: (1) considera a
adolescência em geral como tendo uma tarefa fundamental, o segundo processo de
individuação, que se inicia na pré-adolescência, processo este similar ao que ocorre no final
do terceiro ano de vida. O adolescente começa a estabelecer uma vida afectiva, independente
da sua família e procura um novo objecto de amor;
Por sua vez, Houzel et al. (2004) referem que a adolescência pode ser distinguida através de
três processos: (1) reestruturações psíquicas relacionadas com o surgimento da puberdade. As
pulsões infantis encontram o seu fim, e consequentemente, há uma revivescência edipiana
assimétrica, focada na heterossexualidade incestuosa e parricida, a elaboração ou sublimação
da homossexualidade infantil, uma crise das organizações do Ego e do Superego; (2) os
processos que devem garantir a continuidade psíquica e as reestruturações têm como
objectivo a manutenção e reconstituição das instâncias da 2ª tópica, partilham da procura de
apoios nos objectos exteriores de modo a assegurar as funções de manutenção da ligação à
realidade, a censura e as referências ideais no contexto da mudança. Esta estratégia ocorre
relativamente às pessoas (objecto parental idealizado), e às ideias (religiões, ideologias, etc.).
Os pares vão ocupando um espaço cada vez mais importante, enquanto os objectos parentais
vão sendo desidealizados;
(3) com a puberdade, é possível haver alterações das pulsões sexuais infantis, que até agora
encontraram apenas objectos de satisfação inadequados (interdito do incesto), nas figuras e
realidades parentais. O recalcamento das representações parentais é assegurado pelos
processos psíquicos, e a sua rejeição para o inconsciente. Verifica-se um desinvestimento dos
objectos parentais, o investimento nos novos objectos de amor, com os quais a sexualidade se
possa desenvolver fora do interdito incestuoso, emergindo o regresso do recalcado e os
fantasmas de criança.
Knobel (1981), define a adolescência enquanto «(…) a etapa da vida durante a qual o
indivíduo procura estabelecer sua identidade adulta, apoiando-se nas primeiras relações
objecto-parentais internalizadas e verificando a realidade que o meio social lhe oferece,
mediante o uso dos elementos biofísicos em desenvolvimento à sua disposição e que por sua
vez tendem à estabilidade da personalidade num plano genital, o que só é possível quando
consegue o luto pela identidade infantil» (pp. 26 ). O autor denominou «síndrome normal da
adolescência» os desequilíbrios e instabilidades extremas pelas quais os adolescentes passam,
sendo a sua maior ou menor anormalidade devida aos processos de identificação e de luto que
o adolescente tenha conseguido realizar. Quando o adolescente elaborar os lutos, sendo em
ultima instância os que conduzem à identificação, este observará o seu mundo interno
fortificado, e essa normal anormalidade será menos conflituosa e menos perturbadora.
Segundo Schave e Schave (1989), verifica-se, nesta fase, uma diminuição da capacidade de
tolerar, assimilar e acomodar mudanças devido ao desequilíbrio cognitivo causado pela
entrada no pensamento formal. O desenvolvimento desta capacidade cognitiva, juntamente
com a estrutura psíquica que se encontra mais delicada, pode levar os pré-adolescentes a
sentirem-se mais fragilizados, com medo da fragmentação. Por outro lado, com a entrada no
pensamento formal, o adolescente é muito centrado em si próprio, o que conduz ao intenso
egocentrismo e fomenta um grande medo de exposição e vergonha em frente aos pais, adultos
e sobretudo ao grupo de pares. Observa-se, assim, um paradoxo, os pré-adolescentes sentem
necessidade das funções de objecto que os pais lhes proporcionavam quando eram mais
novos, contudo, procuram o aumento da independência e separação psicológica dos mesmos,
ou seja, precisam que os pais continuem a funcionar como porto de abrigo ao qual regressam
quando precisam de se sentir seguros e, simultaneamente, vivenciam o conflito da
individuação experienciando, por vezes, a perda de suporte psicológico das suas famílias
Porém, Coimbra de Matos (2003) rejeita a ideia de adolescência enquanto crise, excepto nos
casos de patologia, considerando ser um período fecundo, repleto de promessas e de
realização, de pensamento e acção que leva o adolescente a lidar com quatro problemas
importantes. Primeiramente, tem de conseguir adaptar-se e usufruir do corpo erótico; se, por
um lado, o adolescente fica fascinado e deseja explorar o seu corpo desfrutando das novas
capacidades, por outro, pode sentir receio, vergonha ou culpa, o que poderá conduzir ou para
o desenvolvimento saudável ou para a regressão na doença. Em seguida, deve passar do
predomínio do amor pelos pais, para o amor do par sexual e, por consequência, da ligação de
apoio e protecção para a ligação amorosa. Além de ser uma mudança de objecto, é também
uma mudança de objectivo, ao passar da ternura da ligação infantil para a exaltação da ligação
sexual. Não obstante, os objectos parentais continuam a ser investidos, mas perderam valor e
significado como objectos de necessidade, sendo que o objecto sexual aparece como mais
importante. Surge aqui o problema de separação-individuação.
A palavra puberdade deriva do latim «pubertas» que significa apresentar pêlos no corpo. A
puberdade é referida enquanto conjunto de características biológicas, cujas alterações são
predeterminadas geneticamente, desencadeando a maturação sexual.
Freud (1905) para além de dar a descobrir a sexualidade infantil, refere também a importância
das várias fases ao longo do desenvolvimento psicossexual, de modo a integrar na puberdade
as zonas erógenas parciais sob o primado da genitalidade. Para Freud, a partir desta altura, a
libido do Eu apossa-se dos objectos sexuais transformando-se em libido do objecto, i.e.,
descobrirá no outro o objecto sexual, impondo um novo equilíbrio entre o investimento
narcísico e o investimento objectal.
Malpique (2003) faz também essa distinção, considerando a crise puberal como um
acontecimento disruptivo que, devido a factores genéticos, desencadeia mudanças
psicofisiológicas que acompanham a maturação sexual, sendo também durante esta altura que
se geram vectores de integração organizativos que guiam o processo adolescens. Esta crise
provoca uma descontinuidade que abala o equilíbrio do narcisismo infantil e o sistema
defensivo da latência, ameaçando o Eu de perda do sentido de realidade. O aparecimento da
maturação sexual movimenta organizadores, ou seja, impulsiona a integração de aquisições
prévias em novas estruturas que incitam o desenvolvimento. Para a autora, as principais
tarefas organizativas da puberdade são: (1) a genitalização das representações incestuosas, ou
seja, a dessexualização das figuras parentais e a integração da imagem do corpo sexuado; (2)
o início do luto das imagos parentais; (3) e o início da escolha do objecto sexual.
A mudança da imagem corporal e a reavaliação do Self face aos novos poderes físicos e
sensações são duas consequências psicológicas de mudança no status físico. Devido ao facto
de as mudanças físicas serem tão visíveis durante a puberdade, o adolescente tende
inevitavelmente a comparar o seu desenvolvimento com o do seu grupo de pares (Blos, 1962).
Segundo Ritvo (1976), com a transformação corporal, há a intensificação das pulsões sexuais
e agressivas, que reemergem, ligando-se desta forma aos objectos infantis e incestuosos. Tem
de haver uma mudança de objecto, dos pais da infância para alguém da sua geração, i.e., do
grupo de pares. Quando a rapariga adolescente elabora a perda dos objectos infantis, perde
também o apoio e a organização que tinha na infância, por ter o Ego, o Ego Ideal e o
Superego dos pais enquanto auxiliares. O modo como as raparigas adolescentes se sentem e se
comportam é fortemente influenciado pela resposta do Ego às forças instintivas pré-genitais e
fálicas, e pelas qualidades da relação objectal aos pais. O modo como a adolescente resolve as
questões da imagem corporal e as atitudes face ao seu corpo é crucial para a sua sexualidade
enquanto mulher.
Para além das transformações fisiológicas e pulsionais, verifica-se uma mudança intrapsíquica
relacionada com o processo de separação das pessoas significativas na infância, há uma
modificação nos modelos relacionais, nos projectos e prazeres elaborados em conjunto, que se
pode, segundo vários autores, denominar luto.
A situação do adolescente face à sua realização evolutiva, baseada nas relações interpessoais
da infância, que terá de abandonar, condu-lo à instabilidade pela qual é definido, levando a
constituir o que Knobel (1981) denominou «síndrome da adolescência normal». As mudanças
psicológicas, que se produzem neste período, que são interdependentes das mudanças
corporais, conduzem a uma nova relação com os pais e também com o mundo. Sendo isto
apenas possível, se houver uma elaboração do luto pelo corpo da criança, pela identidade
infantil e pela relação com os pais da infância. Neste período, verifica-se uma oscilação
extrema entre a independência e a dependência, entre o impulso à separação e a defesa contra
o receio da perda do conhecido (Knobel, 1981).
Malpique (2003) refere que o afastamento das figuras parentais possibilita a repressão e
projecção de representações incestuosas, o corpo do adolescente torna-se o “teatro” do actual
conflito, do corpo sexuado sobreinvestido narcisicamente. Ao longo da puberdade a
omnipotência infantil é perdida, assim como, o auto-erotismo infantil e a bissexualidade
psíquica, i.e., instala-se um sentimento de incompletude, de falta e de necessidade de
encontrar um objecto complementar, o que, por um lado, acentua a fragilidade narcísica e, por
outro, devido ao impulso heterossexual, leva à procura de um objecto sexual complementar. A
dessexualização das figuras parentais realiza-se neste deslocamento para novas figuras de
identificação, aumentando a valorização dos pares e a progressiva integração da genitalidade.
Os pais tornam-se os reguladores narcísicos.
O processo de luto necessita de tempo para poder ser realmente elaborado, explicando o
motivo pelo qual o processo de entrar e sair da adolescência seja extenso, e nem sempre,
totalmente alcançado. Um bom mundo interior surge através de uma relação satisfatória com
os pais introjectados, e da capacidade criativa que estes propiciam. A presença interna de boas
figuras parentais, tendo papéis bem definidos, uma cena primária amorosa e criativa, permitirá
uma boa separação dos pais, facilitando a passagem à maturidade, e ao desempenho da
genitalidade no plano adulto. Contudo, as figuras parentais que não são bem definidas nem
estáveis nos seus papéis, podem surgir face ao adolescente como desvalorizadas, levando-o a
procurar identificações com personalidades mais firmes, pelos menos, no sentido
compensatório ou idealizado (Knobel, 1981).
a) Desenvolvimento da feminilidade
Stoller (1976) define o núcleo de identidade de género como a percepção que os indivíduos
têm do seu sexo, i.e., de feminilidade nas mulheres e de masculinidade nos homens, sendo
estabelecida durante o primeiro ano de vida. Por sua vez, a identidade de género é um
conceito mais vasto que representa a mistura de feminilidade e de masculinidade, que se pode
encontrar em todas as pessoas. Deste modo, o feminino refere-se ao sexo ou ao estado
biológico, e a feminilidade refere-se à identidade de género, uma convicção do self e do papel
do indivíduo. Primeiro desenvolve-se o núcleo de identidade de género, sendo a ligação em
torno da qual, se desenvolve, de forma gradual a feminilidade, que constitui uma parte do
“narcisismo”. O núcleo de identidade de género é o resultado de: (1) uma força biológica, ou
seja, o efeito de hormonas sexuais fetais circulantes no cérebro do feto; (2) a designação do
sexo, i.e., a atribuição do sexo no momento do nascimento; (3) atitudes paternas, ou seja, os
efeitos da designação do sexo sobre os pais, a reflectir-se na criança; (4) fenómenos
“biopsíquicos”, i.e., os primeiros efeitos pós-natais que são causados por certos padrões
habituais de lidar com a criança; (5) o desenvolvimento do ego corporal, as sensações,
particularmente dos órgãos genitais, que definem as dimensões da criança.
Leal (2001) também faz uma diferenciação entre o feminino e o materno. O feminino é o
conceito enquanto significante da capacidade de auto-afirmação e de defesa do próprio. Este
conceito acarreta há muito tempo, a desconfiança sistemática enquanto figura de malignidade
e de sexualidade destrutiva, que é oposta à imagem idealizada do materno. Por sua vez, o
materno aparece como significante de afecto, ternura e cuidados, de defesa e de protecção do
outro. O feminino constitui-se na relação com um outro que, constantemente lhe atribui um
género. Leal (2001), indo no mesmo sentido de Stoller (1976), considera que o núcleo da
identidade de género se vai estabelecendo desde o nascimento, utilizando, por um lado, a
características inatas e idiossincráticas, e por outro, as atribuições externas, interagindo com
vínculos e relações precoces que produzem um conjunto de estímulos fantasmaticamente
vividos.
b) Desenvolvimento da Maternidade
Para Levisky (1997, cit. por Pais, 2000), os pais são considerados modelos identificatórios
para os filhos e a família é a principal responsável pela transmissão social de um sentido de
valores que induz os jovens a desenvolver as capacidades cognitivas e morais. A família
desempenha, assim, um papel fulcral durante todo o desenvolvimento da criança e do
adolescente, porque garante a sua sobrevivência, e porque é no seu seio que ele realiza as
aprendizagens básicas que irão ser necessárias ao desenvolvimento autónomo no interior da
sociedade.
Dahl (1995) salienta ainda, que essas fantasias são construídas sob a pressão da exigência
intrapsíquica da adolescência e representam transformações de memórias e de fantasias
precoces, à luz da experiência corrente. Essas fantasias são criadas, de modo a resolver
conflitos internos gerados pela exigência do corpo sexual maduro, o reacordar do desejo
incestuoso, a restrição do Superego e a adaptação à realidade externa. Essas fantasias contêm
representações de vinculação à mãe, a qual é utilizada ao serviço da representação do corpo,
das pulsões, do desejado corpo do objecto e dos medos específicos de retaliação e punição.
Desse modo, é importante elaborar essas complexas fantasias enquanto formações de
compromisso, que podem ser empregadas ao serviço de múltiplas funções intrapsíquicas.
A adolescente descobre o seu corpo através da sua longa dependência do cuidado materno.
Dessa forma, ela também aprende a distinguir sensações internas de estímulos externos e
consolida capacidades auto-reguladoras e auto-tranquilizadoras. Através da experiência do
cuidado do corpo pela mãe, a relação da rapariga com o seu corpo é estabelecida, sendo neste
contexto que o Ego corporal é formado. As experiências infantis com a mãe, e as fantasias
associadas são retrabalhadas e transformadas a cada nova época desenvolvimental, tornando-
se altamente complexas. O processo de integração psíquico de vinculação à mãe, enquanto
aspecto do Self, nunca está totalmente completo. A marca da organização psíquica da mulher
adulta recai na capacidade de a filha continuar a permitir repercussões no interior de si
própria, das representações da vinculação à mãe, no seu constante diálogo intrapsíquico com
esta (Dahl, 1995).
Por sua vez, Klocars e Sirola (2001) referem que, o amor materno e a relação de amor que se
estabelece entre mãe e filha são simultaneamente reais e sujeitos a fantasia, uma vez que, a
sua origem é no interior da mãe, na sua função materna, quer física como mentalmente. O
amor que existe nesta relação, surge na fantasia da mãe muito antes da filha nascer, porque, a
mesma tinha previamente imaginado ter uma filha e tem recordações e fantasias da sua
relação com a sua própria mãe, e talvez com a sua avó. Desse modo, a maternidade e a
gravidez são constituintes de uma crise de desenvolvimento normal na vida uma mulher. No
início, a criança será um objecto narcísico para os pais, e não um indivíduo separado, e esta
fase não termina totalmente, embora a diferenciação da criança e a sua personalidade se vão
progressivamente individuando. A mãe, quando dá à luz, partilha experiências e tem um
entendimento empático, que se desenvolve naturalmente, há uma satisfação de todas as
expectativas maternas, fantasias de feminilidade e maternidade.
Durante a fase edipiana, observa-se a passagem da relação dual para uma relação triangular.
Tähkä (1993 cit. por Klocars & Sirola, 2001) divide o desenvolvimento da relação triangular
em três fases: na primeira fase, a rapariga reconhece que o pai ocupa o lugar de um objecto de
amor na mente da mãe. Dessa forma, ela tenta ser semelhante à mãe e mais adorável que o pai
rival. Durante esta fase, a mãe é simultaneamente objecto de amor e de identificação; na
segunda fase, a rapariga apercebe-se de que a mãe ama o pai, precisamente devido à sua
dissimilaridade. Nesta altura, ela tenta gratificar a mãe do mesmo modo que o pai, tentando
superá-lo em todos os aspectos; durante a terceira fase, a rapariga transfere o seu amor para o
pai. Enquanto anteriormente idealizou a mãe, agora o objecto de desejo da mãe, torna-se o
objecto idealizado do desejo da rapariga, i.e., o falo. Nesta fase do desenvolvimento, o pai
torna-se idealizado enquanto objecto de amor e a mãe permanece enquanto objecto idealizado
de identificação.
Com a entrada no período de latência, a rapariga sente-se enganada quer pela mãe, na relação
dual (porque a mesma tinha como primeiro objecto de amor o pai), quer pelo pai, na relação
triangular (que tem como primeiro objecto de amor e desejo a mãe). A partir deste momento,
ela tem de encontrar os seus objectos no exterior da família. A latência é o período de
reparação e construção, a rapariga aprende a tolerar a perda, e adquire mecanismos de defesa
psiquicamente mais desenvolvidos. A sua relação com os pais, especialmente com mãe,
melhora e torna-se mais íntima. A presença dos pais é crucial para o desenvolvimento da
identidade. O prévio desenvolvimento de identificação vai dar origem ao desenvolvimento da
identidade. Para a rapariga, a latência representa o período de clarificação interna, de
consolidação da sua força e de descoberta das suas capacidades. A sua personalidade tem
vindo a transparecer, preparando-se para irromper numa mudança poderosa com a chegada da
puberdade e do seu desenvolvimento sexual (Klocars & Sirola, 2001).
Klocars e Sirola (2001) referem que após o calmo período de latência, a rapariga transforma-
se externa e internamente, sente necessidade de abandonar a relação próxima com a mãe de
modo repentino, assim como, o desejo de lhe ser regressivamente íntima. Na adolescência, a
situação edipiana é reactivada, a rapariga tem de ser capaz de abandonar o objecto do seu
amor pré-edipiano (a mãe interna) e voltar-se para o pai-homem interno. A mudança de
objecto é novamente delicada, se a rapariga não tiver sido capaz de se identificar com a mãe,
ela regressa a uma fase prévia na sua relação (mãe-filha) e a mãe-mulher volta a ser o objecto
de amor. De um modo gradual, a rapariga percepciona que a personalidade da mãe e o seu
estilo de vida diferem do seu.
Por outro lado, Blos (1962) refere que na adolescência feminina, se observa um impasse entre
uma tentativa de regressão que exerce a sua influência em direcção a um retorno à mãe pré-
edipiana, que resultaria numa dependência excessiva e passiva com uma sobrevalorização da
mãe, e por outro lado, o afastamento face à mãe e direcção ao sexo oposto e à pseudo-
heterossexualidade. A rapariga tem de estabelecer uma repressão massiva da pré-genitalidade,
sendo um pré-requisito para o desenvolvimento normal da feminilidade, para depois se dirigir
à fase edipiana. A rapariga ao afastar-se da mãe reprime as pulsões que estavam intimamente
relacionadas com o seu cuidado, nomeadamente na pré-genitalidade, sendo que o regresso a
estes modos de gratificação, na puberdade constitui a base para correlacionar a delinquência
feminina com perversão.
A adolescente que não consiga manter a repressão da sua pré-genitalidade irá encontrar várias
dificuldades no seu desenvolvimento. A fixação à mãe pré-edipiana e o regresso às
gratificações desse período geralmente resultam em comportamento de acting-out, cujo tema
central é “o bebé e a mãe” e a recriação de uma união, na relação dual. Há dois tipos de
delinquência feminina: um é a regressão à mãe pré-edipiana, e o outro é manter-se na fase
edipiana, sendo que em ambos os casos o problema central é a mãe. A delinquência feminina
é muitas vezes precipitada pela forte tentativa de regressão à mãe pré-edipiana, e ao pânico
que tal regressão implica.
Klocars e Sirola (2001) afirmam que ao longo da adolescência, a filha redescobre a mãe,
agora de um modo mais realista, a mãe é, no mínimo, parcialmente diferenciada da
representação interna da mãe da infância. A rapariga já conheceu outras mulheres, as suas
fantasias de mulher, feminilidade e maternidade tornam-se variadas, permitindo novos
objectos de admiração e identificação. Já não é tão dependente da mãe e constrói a sua própria
identidade feminina. Mãe e filha tornam-se diferenciadas, embora a identificação com a
feminilidade lhes dê a oportunidade para continuarem o seu compromisso recíproco e amor
mútuo. Não obstante, embora exista uma diferenciação, mãe e filha nunca se tornam
completamente diferenciadas.
Erikson (1953, cit. por Kestenberg 1982) refere que a gravidez representa o culminar de
desejos que começam na infância e variam de intensidade, ressurgindo na sua total força
quando a realização desta se torna possível, ou seja, ao longo do período generativo do
desenvolvimento adulto.
Kestenberg (1982) refere que a tarefa integradora da menina na fase interno-genital consiste
em estabelecer uma prioridade do interior feminino gerador sobre os órgãos alimentares e
excretores e as suas funções, sendo que os impulsos interno-genitais originam fantasias.
Através da externalização de impulsos interno-genitais, a menina de três ou quatro anos,
aprende a salientar os desejos sexuais através da realização maternal. A identificação à mãe,
ajuda a estabelecer a menina como uma mãe de brinquedo, intuitiva e compreensiva, sendo o
bebé no seu interior, criado à imagem de si própria e da sua mãe. Quer a mãe quer o pai,
diminuem na fantasia, enquanto a menina cresce interna e externamente. Quando a menina
não consegue manter o duplo papel de criança e mãe, e tem de reconhecer a sua condição de
criança, a menina fica irritada e deprimida, como se o seu bebé imaginário morresse.
A menina, zangada com a mãe por ser armazenadora de bebés, e cheia de impulsos homicidas
contra o bebé irreal no seu interior, constrói formações reactivas que originam desejos de
oferecer à mãe um bebé real. Alternando desde desejo edípicos negativos até aos positivos, a
criança realiza a identificação a ambos os pais. A identificação interno-genital pré-edípica
com a mãe estimulou um comportamento maternal, sendo que durante o desenvolvimento
edípico positivo, a criança se identifica à mãe como rival, pelo amor do pai, estando no centro
das fantasias a penetração e a fecundação por um pénis muito valorizado. A aprovação
paterna do interior produtivo da menina, por ele “criada” ao longo da fase fálico-edípica,
ajuda a menina a adiar os seus desejos de gravidez, numa transição benéfica para a latência
(Kestenberg, 1982).
A fase interno-genital adolescente acaba com uma reintegração na qual o ciclo menstrual se
torna coordenado com ideais de fecundação, gravidez e parto, i.e., ganham uma representação
significativa pela identificação à mãe. No fim da adolescência a rapariga torna-se consciente
do seu genital interno, como centro dinâmico do espaço feminino interno. O complexo de
Édipo é revivido e há uma necessidade crescente de fantasiar com a fecundação do pai.
Entrando na adultícia, a jovem mulher procura intimidade com um novo objecto permanente,
e não está preparada para um novo relacionamento triangular. Após a descoberta de que os
parceiros não podem ser pai e mãe um do outro, há uma desilusão parcial e uma renovação da
procura de intimidade ideal, fazendo planos para ter um filho (Kestenberg, 1982).
Estudos recentes
No decorrer da pesquisa bibliográfica para o presente trabalho, não foram encontrados estudos
recentes em número significativo sobre a temática abordada, porém, serão apresentados dois
trabalhos que se considera importantes, uma vez que as suas conclusões vão ao encontro das
conclusões encontradas nesta investigação.
A monografia de Moreira (1989), tem por objectivo a análise de imagos parentais em crianças
do período de latência, consideradas agressivas, tendo utilizado como técnica a versão animal
do CAT. A sua amostra é constituída por 10 sujeitos agressivos (4 rapazes e 6 raparigas) e 9
sujeitos não agressivos (5 rapazes e 4 raparigas). A autora chegou à conclusão de que se as
imagos parentais são consideradas ameaçadoras, estas crianças tendem a viver relações com
os outros como sendo igualmente ameaçadoras, uma vez que as imagos determinam a forma
como é apreendida a realidade, o que desencadeia a agressividade. Logo, as crianças
consideradas “agressivas” contêm um tipo de imagos parentais, próprio de fases prévias do
desenvolvimento, o que vem realçar as dificuldades destas crianças, tanto ao nível do
processo de socialização, como ao nível das suas relações com o mundo exterior.
O adolescente com o seu corpo sexuado liberta-se da dependência narcísica das imagos
idealizadas da infância, desinveste libidinalmente as imagos parentais e passa a investir em
novos objectos, deparando-se com uma dialéctica entre a autonomia e a dependência. Por um
lado, deseja libertar-se das figuras parentais mas, por outro, depende ainda delas, uma vez que
estas se oferecem como modelos com quem se deseja identificar, para a consolidação dos seus
processos de identificação e de aquisição de uma identidade estável. Quer a adolescência,
como a situação Rorschach, são caracterizadas pela necessidade de integrar a bissexualidade
psíquica, identificar-se projectivamente às imagos parentais face ao casal parental combinado,
tornando possível a identificação ao pai que se encontra no interior da mãe. A integração da
ideia de que no interior da mãe, existe um pénis (bebé) que é detentor do conhecimento e do
saber, possibilita ao adolescente identificar-se ora à mãe na posição feminina, ora ao falo
paterno na posição masculina.
QUESTÕES DE INVESTIGAÇÃO
De acordo com Klein (1927), a imago materna é formada durante a infância, através da
relação entre a mãe e o bebé. O objecto externo, neste caso a mãe, é apreendido de acordo
com as suas características reais, sofrendo depois uma alteração, e sendo transformado em
imago, voltando posteriormente a aproximar-se dos objectos exteriores reais. Durante o
período de latência e na pré-adolescência, há uma regressão às imagos da infância, ou seja,
imagos rígidas e inflexíveis (Blos 1962 e 1966). Segundo Blos (1967) a representação do
objecto parental deriva da mesma pessoa, mas é modificada consoante as diferentes fases do
desenvolvimento. Este facto tende a confundir a relação da adolescente com a sua mãe, que é
experienciada parcialmente ou completamente como a imago materna da infância.
Por outro lado, Knobel (1981) refere que a identidade adolescente é caracterizada pela
transformação da relação do indivíduo com os seus pais, quer externos e reais, quer com os
pais internalizados. Quando as figuras parentais estão internalizadas, o adolescente pode
começar o seu processo de individuação. Pode-se observar, que segundo os processos de
mudança, que ocorrem na pré-adolescência e na adolescência, especificamente a
reemergência das pulsões, a maturação sexual e psico-afectiva, e a desvinculação da imago
materna, o que poderá conduzir a um sentimento de perda e à procura de novos objectos de
amor em relações extrafamiliares, há uma remodelação das estruturas internas.
1. Participantes
Foi utilizada uma amostra de quarenta e duas (42) pré-adolescentes e adolescentes, com
idades compreendidas entre os doze (12) e os catorze (14) anos, que frequentavam o ensino
básico entre o 7º e o 9º ano de escolaridade, em duas escolas públicas da área da grande
Lisboa. A amostra foi obtida através de uma amostragem por conveniência que decorreu no
fim do ano lectivo 2006/2007 e início do ano lectivo 2007/2008.
Foram constituídos três grupos de raparigas de 12 anos (n=14), 13 anos (n=14), 14 anos
(n=14).
2. Instrumento
Este estudo tem como instrumento o Teste de Apercepção Temática (T.A.T.)., tendo sido
apenas utilizado o cartão 7GF (Anexo A). O objectivo, foi explorar as transformações que
ocorrem na imago materna, como esta é percepcionada, se há a fantasia de serem mães no
futuro e se se identificam com o modelo materno, aos doze, treze e catorze anos.
De modo, especifico pode-se definir o T.A.T. enquanto Teste de Apercepção, i.e., o sentido
que o sujeito vai dar a estas percepções das imagens é função sobretudo da memória afectiva
de situações anteriores semelhantes passadas por ele, Temática, ou seja, o material é
figurativo, representa seres sós ou em relação ou paisagens pouco estruturadas, cada uma
destas imagens reenvia para um tema (Shentoub, 1999).
O processo T.A.T. implica um conjunto de mecanismos mentais envolvidos nessa situação
única em que é pedido ao sujeito para imaginar uma história a partir de um dado cartão. A
situação T.A.T. concebe três parâmetros (Shentoub, 1999):
O material (constituído pelos cartões)
A instrução («imagine uma história a partir do cartão»)
A presença do clínico (a dualidade do seu papel: por um lado, a neutralidade deste e
simultaneamente, por outro lado, é ele que impõe o material e instrução e transcreve as
respostas do sujeito).
O cartão que será utilizado para avaliar como é percepcionada a imago materna é o 7GF. Este
cartão apresenta, como material manifesto uma mulher, com um livro na mão, debruçada para
uma menina que segura um boneco/bebé nos braços. Verifica-se uma diferença de gerações
que é acentuada pela presença do boneco. A posição da menina é caracterizada pela
imaturidade funcional (Shentoub, 1999).
No que se refere às solicitações latentes, segundo Shentoub (1999), este cartão pode reactivar
a problemática das relações mãe-filha na sua dimensão dupla: quer de rivalidade e de
identificação, quer de interacções precoces mãe-criança. Inserida num contexto edipiano, esta
imagem pode levar a temas de iniciação que direccionam para a identificação feminina. Uma
outra dimensão, para além da prova identificatória, é a presença de um boneco nos braços da
menina, esse boneco pode ser investido como “representante do bebé edipiano”. Contudo, é a
qualidade dos laços entre mãe-filha que é solicitada e que se traduz pelo modo como a criança
agarra o boneco. Esta reactivação das relações precoces mãe-filha compele a movimentos de
projecção e deslocamento sobre a relação entre a menina e o bebé/boneco.
A utilização do cartão 7GF, deve-se ao facto de, ser possível reactivar através da projecção,
três movimentos interligados: o modo como o sujeito percepciona a sua imago materna, a
possível identificação a esta, e a fantasia de ser mãe. A cotação foi efectuada através da
análise das respostas dadas no cartão 7 GF (Anexo D), da codificação dos procedimentos
empregues pelo sujeito, e da problemática e consequente reagrupamento dos procedimentos
na folha de decomposição. De seguida, analisou-se cada resposta dada, no interior de cada
grupo etário, o que permitiu encontrar alguns subgrupos consoante as problemáticas que
haviam sido elaboradas, ou seja, a partir do modo como os sujeitos percepcionaram a rapariga
e a sua relação com o personagem bebé/boneco e a personagem que representa a figura
materna.
3. Procedimento
Procedeu-se ao contacto com as escolas, em que foi entregue pessoalmente uma carta de
consentimento (Anexo B), explicando-se aos responsáveis qual era o teor e o conteúdo do
estudo para que as participantes, no momento de realização do teste, tivessem conhecimento
do que iria ocorrer e voluntariamente participassem, ou não, no estudo, garantindo sempre a
confidencialidade dos dados.
Procedeu-se à distribuição entre as alunas nas condições requeridas pelo estudo, de uma
declaração de consentimento informado (anexo C) a ser devolvida pelos encarregados de
educação. O teste foi aplicado no Serviço de Orientação e Psicologia (S.P.O.) e em sala de
aula, a um indivíduo de cada vez. Durante a aplicação do teste estava apenas presente o
investigador e o sujeito, não tendo existido qualquer tipo de interrupção.
Apresentação e Discussão de Resultados
a) Escotomia
b) Conflito
Observam-se, na generalidade das respostas destes sujeitos, três tipos de conflito que são
projectados na rapariga em relação à figura materna; a si própria; e ao bebé/boneco. Esses
conflitos são: o conflito edipiano, como no caso do sujeito 101, em que a rapariga após o
acesso à sexualidade e à maternidade, faz uma regressão devido aos sentimentos de culpa por
ter acedido à sexualidade, e por reconhecer a sua imaturidade, procura o apoio da mãe ou dos
pais, mas esta/estes, ou a rejeitam, ou apenas a aceitam se ela não mantiver uma sexualidade
adulta, acabando por encontrar apoio na mãe ideal; o conflito intrapsíquico entre a autonomia
e a dependência, como no caso dos sujeitos 102, 103, e 114, em que a rapariga após aceder à
maternidade, se sente imatura e incapaz de desempenhar a função materna, hesita entre
assumir o papel adulto ou regredir, optando por este último mantendo-se no papel de filha,
delegando na mãe a função materna.
Por um lado, a rapariga permanece no papel de filha porque é o papel ao qual já está
habituada, por outro lado, devido à sua imaturidade, poderá pensar que não é capaz de ser
uma boa mãe, como a sua própria mãe, e por se sentir culpada ao ter ocupado o lugar desta,
prefere delegar-lhe essa função. Todavia, há uma excepção, no caso dos sujeitos 108 e 112,
em que a rapariga assume a sua função materna; Por fim, há o conflito devido à rivalidade
fraterna, como é o caso dos sujeitos 106, 107, 109, 110 e 111, em que a rapariga rivaliza com
o bebé, sendo este seu irmão ou imã, por achar que este(a) lhe usurpou o seu lugar na relação
com a mãe, e também que a própria mãe a traiu, uma vez que teve outro filho, que está a
ocupar o seu lugar, e por a obrigar a substitui-la nos cuidados maternos, retirando-lhe assim, a
sua infância.
c) Relação de identificação
Os sujeitos 106, 110 e 111, que percepcionaram a rapariga enquanto substituta materna
contrafeita, em relação ao irmão ou irmã, sendo obrigada a identificar-se à mãe para a
substituir. Os sujeitos 107, 109 e 113, em que a rapariga se identifica à mãe, porém,
permanece no papel de filha, rivalizando com o irmão ou irmã pela atenção da mãe.
Finalmente o sujeito 105, que percepcionou o bebé/boneco enquanto boneca, e o sujeito 104
que escotomizou este personagem, elaboraram as histórias mais regressivas uma vez que, a
rapariga ainda não se consegue assumir enquanto mãe, mantendo-se apenas enquanto menina,
infantil e dependente da mãe, numa relação dual.
2 - A maternidade
Os sujeitos 101, 102, 103, 108, 112 e 114 percepcionaram a rapariga, enquanto mãe. De um
modo geral, a rapariga acedia à sexualidade e à maternidade, que era vivenciada com
sentimentos de culpa, havendo o reconhecimento da sua imaturidade, o que conduz a uma
regressão (com excepção na resposta dos sujeitos 108 e 112, em que a rapariga se assume
como mãe), procurando o apoio da mãe e mantendo-se na sua posição de filha delegando ou
partilhando a função materna com a mãe ou com o seu equivalente simbólico (“vizinha”,
“empregada”, “senhora”).
Os sujeitos 106, 110 e 111 centraram as suas histórias em torno da rapariga enquanto
substituta materna, havendo, porém, uma diferença. Enquanto nas histórias dos sujeitos 106 e
110 a rapariga desempenha essa função contrafeita, porque é “obrigada” a assumir esse papel
devido à negligência ou abandono da mãe, revelando, assim, a sua imaturidade. No caso do
sujeito 111, tal não acontece, porque a rapariga deseja assumir esse papel, ou seja, substituir a
mãe nos cuidados maternos. Observa-se assim, a fantasia de ser mãe, e a identificação ao
modelo materno. Contudo, a rapariga só desempenha tal função na ausência da mãe, uma vez
que a figura materna é denominada “avó”, de modo a evitar um possível conflito.
3 - O bebé/boneco
a) Escotomia
O sujeito 104 centra a sua história na relação entre a mãe e a rapariga, escotomizando o
bebé/boneco. Esta escotomia deve-se, à grande culpabilidade e à imaturidade da rapariga, em
percepcionar o bebé enquanto filho ou enquanto irmão, porque em qualquer dos casos teria de
abandonar a sua posição infantil e a relação dual com a mãe. Poder-se-á pensar, que caso
percepcionasse este personagem como um bebé, tal lhe despertaria fantasias insuportáveis,
necessitando por isso, de recusar a realidade.
b) Boneco
O sujeito 105 percepciona o bebé/boneco enquanto uma “boneca”, deste modo, desvitaliza
este personagem e reforça a imaturidade e infantilidade da rapariga. A rapariga ainda é
imatura para assumir a função materna, não se identifica com a mãe, e deseja manter-se
enquanto criança.
c) Bebé
Os sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto mãe, nomeadamente os sujeitos 101, 102,
102, 108, 112 e 114, caracterizam o bebé enquanto um obstáculo em relação aos projectos e
desejos que a rapariga tinha para o seu futuro. A maternidade é vivenciada com sentimentos
de culpa e de imaturidade, o que leva a rapariga a não assumir a sua função materna,
delegando os cuidados do bebé na própria mãe, com a excepção dos sujeitos 108 e 112. Os
sujeitos 107, 109 e 113 centraram as suas histórias na rivalidade fraterna, havendo inclusive
manifestações de agressividade face a este, por parte da rapariga, nas histórias dos sujeitos
107 e 109. De um modo geral, a rapariga sente ciúmes e rivalidade em relação ao bebé (que
neste caso é o irmão ou irmã), porque este lhe usurpou o seu lugar face à mãe. No caso do
sujeito 113, há a negligência e rejeição da mãe para com a rapariga, uma vez que apenas dá
atenção ao bebé, fomentando assim, a rivalidade. Os sujeitos que percepcionaram a rapariga
enquanto substituta materna também, manifestam essa rivalidade face ao bebé, sobretudo no
caso dos sujeitos 110 e 111, em que a rapariga é obrigada a cuidar do irmão. O bebé é
percepcionado como rival, que lhe roubou a infância e como um obstáculo porque está no
meio da relação com a mãe.
Conclusões
Pode-se observar, através das respostas dadas pelos sujeitos de 12 anos que, de uma forma
geral, se evidenciam dois movimentos distintos. Por um lado, quatro sujeitos (106, 107, 109,
113) elaboraram o conflito colocando a rapariga numa posição de rivalidade fraterna em torno
da mãe. Colocam a rapariga na posição de filha, muito dependente da mãe, procurando obter a
sua total atenção, dedicação e amor, mas devido ao facto de terem um(a) irmão/irmã mais
novo(a), tal atenção é partilhada com o bebé. O facto de a mãe ter tido um outro(a) filho/filha,
leva-a a zangar-se com esta, e a percepcionar o bebé enquanto um intruso, que lhe usurpou o
seu lugar, e enquanto um obstáculo, porque está no meio da relação dela com a mãe. De certa
forma, sente-se traída pela própria mãe, porque teve outro filho, e também, porque este lhe
veio roubar a infância, porque, por vezes, tem de substituir a mãe nos cuidados maternos.
Deste modo, há uma rivalidade fraterna, acentuada nos dois casos de agressão directa,
enquanto que nos restantes casos é mais dissimulada.
Num outro movimento, mais evoluído, seis sujeitos (101, 102, 103, 108, 112, 114) conseguem
percepcionar a rapariga enquanto mãe, ou seja, há a tentativa de assumir o papel materno mas
esta regride ao papel de filha, imatura, infantil e dependente devido à intensa culpabilidade
sentida face à mãe (com excepção nos sujeitos 108 e 112). Ainda não consegue elaborar o luto
da imago materna, individuar-se e autonomizar-se, porque receia o conflito com a mãe, e as
consequentes mudanças na relação, optando por permanecer na função à qual já está
habituada e na qual se sente segura. Progredir obriga a uma separação e a uma maior
autonomização para a qual a rapariga ainda não se encontra totalmente preparada,
necessitando do apoio que a mãe lhe fornece. Não existe na grande maioria dos sujeitos, a
capacidade de assumir a função materna, delegando ou partilhando tal função com a mãe ou
equivalente simbólico (“vizinha”, “empregada”, “senhora”), mantendo-se infantil e
dependente desta, ou seja, mantém-se enquanto filha.
a) Escotomia
O sujeito 123 escotomizou a figura materna, tal facto poderá justificar-se, devido à grande
ansiedade sentida pelo sujeito face ao cartão, que terá recordado uma história, que não é muito
elaborada. Observa-se um choque em relação à imagem, do qual não se consegue recompor e
a recusa da função materna face à precocidade do acesso à maternidade. O facto de ser “ (...)
uma criança que teve outra criança” suscita para além da angústia, também sentimentos de
culpabilidade, imaturidade e infantilidade, assim como, uma grande ambivalência ao tentar
dar dois finais diferentes, mas expressando apenas o final negativo. Este acesso prematuro à
maternidade, é vivenciado como um choque abrupto no desenvolvimento, que obriga a
personagem a perder a sua inocência e a sua infância, para adoptar um papel adulto. Se a
personagem escotomizada fosse referida e designada mãe, poderia haver um conflito entre as
personagens e aumentaria o sentimento de culpa. Porém, essa mesma escotomia poderá ser
reveladora de uma imago materna má ou insuficiente, que não possui capacidade de
contenção e compreensão, não havendo assim, a procura de auxílio.
b) Conflito
Em relação aos sujeitos 122, 124, 126 e 127 que percepcionaram a rapariga enquanto mãe, o
conflito que é manifestado nas respectivas histórias é intrapsíquico, ou seja, a rapariga face à
sua maternidade precoce sente-se culpada, imatura e incapaz de assumir totalmente a função
materna, necessitando do apoio da mãe ou dos pais. Nas histórias destes sujeitos (com
excepção do sujeito 122) há também, uma tentativa de não elaborar a maternidade da
rapariga, não a manifestando inicialmente ou fazendo uma recusa da mesma. Os sujeitos 122,
124 e 127 revelam uma ambivalência, no primeiro caso, entre a fantasia de ser mãe e a
realidade de tal ter acontecido precocemente, no sujeito 124 ao colocar inicialmente a rapariga
enquanto irmã do bebé e depois enquanto mãe, assim como, no sujeito 127 que coloca o bebé
primeiramente, enquanto irmã e depois enquanto filha da rapariga. Deste modo, nenhuma
rapariga se assume verdadeiramente enquanto mãe, delegando ao papel materno na sua mãe,
embora, o sujeito 124 revele o desejo de a rapariga aprender a ser mãe.
Os sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto substituta materna, elaboraram três tipos
de conflitos, nomeadamente, o conflito entre a rapariga e a mãe, como no caso dos sujeitos
129 e 132, em que a rapariga é obrigada a substituir a mãe nos cuidados à irmã, devido à
ausência desta, tendo assim de abdicar da sua infância para suprir as dificuldades da mãe; o
conflito intrapsíquico da rapariga, nas histórias dos sujeitos 130 e 131, devido ao
reconhecimento da imaturidade para cuidar do irmão; e a ausência de conflito, como no caso
dos sujeitos 128 e 134, em que a rapariga cuida do bebé, com o consentimento da mãe, ou
seja, está a aprender a desempenhar a função materna. Os sujeitos 121 e 125 percepcionaram
o bebé/boneco enquanto boneco, porém, enquanto o sujeito 121 não elabora um conflito, o
sujeito 125 fá-lo, sendo o conflito entre mãe e filha motivado por uma tentativa de fuga da
rapariga ao controle materno.
c) Relação de identificação
Nas histórias dos sujeitos 129 e 130, a rapariga não se identifica com a mãe, sendo esta
percepcionada enquanto uma má mãe, negligente e ausente, sendo obrigada a substitui-la,
embora o seu desejo seja permanecer infantil. No caso dos sujeitos 131 e 132 a rapariga
identifica-se à mãe mas obrigada, uma vez que tem de cuidar do(a) irmão/irmã contrafeita,
devido à ausência da mãe. No caso dos sujeitos 121 e 125, que percepcionaram a rapariga
enquanto filha, que brinca com o seu boneco, em ambos os casos a mãe tenta impor a sua
vontade em relação à filha, todavia, esta deseja manter-se infantil. Deste modo, a mãe é
percepcionada como insuficiente e com a qual a rapariga se identifica contrariada, embora a
fantasia de ser mãe possa estar latente no facto de brincar com o boneco, ainda é uma fantasia
muito edipiana. O sujeito 123 escotomiza a figura materna, de modo a evitar a um possível
conflito entre as personagens, o que aumentaria o sentimento de culpabilidade. Contudo, essa
mesma escotomia poderá revelar uma má imago materna ou insuficiente, que não possui uma
capacidade de contenção e compreensão. Finalmente o sujeito 133, escotomiza o
bebé/boneco, experiencia a imago materna enquanto insuficiente, e incapaz de a conter, ao
transmitir-lhe um vínculo desadequado e infantil.
2 - A maternidade
Em relação aos sujeitos 122, 124, 126, e 127, que elaboraram o conflito tendo percepcionado
a rapariga enquanto mãe, têm em comum, o facto de a maternidade ser vivenciada com
sentimentos de culpa e de imaturidade, tendo as personagens regredido ao papel de filha.
Contudo, observam-se nas respostas destes quatro sujeitos, dois movimentos diferentes, por
um lado, há um movimento mais infantil e regressivo, porque apesar de a rapariga aceder à
sexualidade e à maternidade, não consegue assumir a sua função materna, delegando tal
função na mãe. Deste modo, a rapariga mantém-se enquanto filha, infantil e imatura, adiando
o papel materno. Por outro lado, nas histórias dos sujeitos 122 e 124, embora a rapariga
reconheça a sua imaturidade, há a preocupação em aprender a desempenhar a função materna.
Na maioria há o desejo latente de ser mãe mas apenas no futuro, o facto de tal acontecer de
momento conduz a esta ambivalência e à delegação ou partilha da função materna com a mãe.
Observa-se dois movimentos distintos, por um lado, os sujeitos 129, 130, 131 e 132 têm em
comum o facto de a rapariga desempenhar o papel de substituta materna contrafeita, ou seja, é
percepcionada enquanto imatura e infantil, que se vê obrigada a tomar conta do bebé, e por
consequência tem de abdicar da sua infância para assumir um papel adulto, materno e
contentor, papel esse para o qual não ainda não está preparada, e o qual não desejava assumir.
Por outro lado, nas respostas dos sujeitos 128 e 134, a rapariga desempenha o papel de
substituta materna na presença da mãe e tem esse desejo de aprender a cuidar do bebé.
Embora no caso do sujeito 134 a rapariga mantenha uma relação com a mãe ainda muito
edipiana, como se se tratasse de um casal homossexual.
3 - O bebé/boneco
a) Escotomia
b) Boneco
Quer o sujeito 121, como o sujeito 125, elaboraram uma problemática semelhante, em que a
figura materna está a transmitir ensinamentos à rapariga, que se mantém no papel de filha, que
ignora tais ensinamentos preferindo brincar com o “boneco” ou “boneca”. A rapariga ainda se
vê como uma criança revelando, assim, a sua infantilidade e imaturidade, evitando crescer e
ouvir os conselhos da mãe. Todavia, enquanto na história do sujeito 121 a rapariga não está a
dar atenção ao que a mãe relata, continuando a brincar, tal não conduz a um conflito, na
história do sujeito 125 conduz, uma vez que a rapariga rejeita o controle materno, tendo de se
afastar fisicamente da mãe.
c) Bebé
Conclusões
De um modo geral, as respostas dadas pelos sujeitos de 13 anos, revelam alguns movimentos
distintos. Os sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto substituta materna, apresentam
dois movimentos diferentes, por um lado, nas histórias dos sujeitos 129, 130, 131 e 132, a
rapariga substitui a mãe nos cuidados ao irmão/irmã contrafeita, tendo de abdicar da sua
infância precocemente para assumir um papel adulto. Por outro lado, no caso dos sujeitos 128
e 134, a rapariga desempenha esse papel na presença da mãe, havendo o desejo de aprender a
cuidar do bebé. São dadas duas escotomias, uma do bebé/boneco, em que a rapariga se
mantém como filha, não havendo de momento o desejo de desempenhar a função materna, e a
escotomia da figura materna, porque só retirando a mãe é que a rapariga pode assumir a
maternidade.
Nesta faixa etária, salienta-se a grande ambivalência que é dada em relação a colocar a
rapariga enquanto mãe ou irmã do bebé, existe assim um movimento regressivo e progressivo
constante, que se poderá dever ao facto de, na sua maioria, os sujeitos estarem
fisiologicamente aptos para consumar uma relação sexual adulta, da qual poderia advir a
maternidade. Face à real possibilidade de tal acontecer, e devido a identificarem-se com a
rapariga, que na generalidade dos sujeitos, é percepcionada enquanto adolescente hesitam em
colocar tal personagem enquanto mãe, devido quer à culpabilidade quer ao reconhecimento da
imaturidade e incapacidade em desempenhar o papel materno.
a) Escotomia
O sujeito 141 escotomiza a rapariga, manifestando unicamente a relação mãe/filho, o que se
poderá dever ao facto de o bebé ser percepcionado enquanto filho dessa personagem,
obrigando-a a crescer e a ocupar um papel adulto, para o qual ainda não está preparada. Ou
enquanto irmão, de quem poderia ter de cuidar, substituindo a mãe, o que a levaria também a
crescer e a abandonar precocemente a sua infância e a estreita ligação com a mãe, pois, este
iria ocupar o seu lugar.
b) Conflito
Em relação aos sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto mãe, observa-se dois tipos
de conflito. Por um lado, o conflito intrapsíquico, como no caso dos sujeitos 144, 147, 151 e
152, em que a maternidade é vivenciada com sentimentos de culpa, de arrependimento, de
imaturidade e alguma incapacidade em assumir o papel materno. Por outro lado, os sujeitos
149 e 150, que elaboraram um conflito entre a rapariga e a mãe. No caso do sujeito 149 a mãe
não queria que a filha se tornasse autónoma, ou seja, a mãe é uma força de bloqueio que não a
deixa evoluir, e o sujeito 150, o conflito deve-se ao facto de a rapariga se assumir como mãe,
rejeitando identificar-se com a própria mãe. Os sujeitos 145 e 146 que percepcionaram a
rapariga enquanto substituta materna, não elaboraram um conflito, uma vez que a
problemática se centra n transmissão de conhecimentos maternos.
Os sujeitos 142, 143 e 154 não manifestam um conflito, embora no caso do sujeito 142, haja
uma agressividade dirigida à “boneca”. O sujeito 141 escotomizou a rapariga, não sendo
elaborado um conflito, apenas é expresso a relação entre a mãe e o bebé destituída de afecto.
Os sujeitos 148 e 153 escotomizaram o bebé/boneco, em ambos os casos o conflito elaborado
é intrapsíquico, porém, enquanto o sujeito 148, a rapariga hesita entre a autonomia e a
dependência, o sujeito 153, por sua vez, expressa conflito intrapsíquico da rapariga, que é
obrigada a lidar com a sua realidade, que a desilude e na qual é infeliz, não podendo viver na
fantasia concedida através do imaginário materno.
c) Relação de identificação
Em relação aos sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto mãe, observam-se dois
movimentos, por um lado, nas histórias dos sujeitos 144, 147, 149, 151 e 152, a rapariga
identifica-se com a mãe mas contrariadas (com a excepção do sujeito 147), por que não
desejavam assumir o papel materno tão precocemente. Por outro lado, na história do sujeito
150 a rapariga não identifica com a mãe, porque a rapariga se assume como mãe numa relação
especular, em que apenas ela sabe desempenhar a função materna. Os sujeitos 145 e 146 que
elaboraram a história tendo a rapariga o papel de substituta materna, esta identifica-se à mãe,
estando a prender com ela a cuidar do irmão/irmã. Relativamente, aos sujeitos 142, 143 e 154,
que percepcionaram a rapariga mantendo-se no papel de filha, pode-se observar dois
movimentos, no caso dos sujeitos 142 e 143 a rapariga identifica-se com a mãe devido à
dependência face a esta e à sua imaturidade, enquanto que no caso do sujeito 154, a rapariga
não se identifica com a mãe, uma vez que coloca ambas as personagens como mulheres
adultas, se haver diferenciação de idades e sem ser estabelecida uma relação entre elas.
2 - A maternidade
Relativamente aos sujeitos 144, 147, 149, 150, 151 e 152 que percepcionaram a rapariga
enquanto mãe, de um modo geral, a maternidade foi vivenciada com sentimentos de culpa,
arrependimento e tristeza, por se tratar de uma gravidez precoce. A rapariga reconhece a sua
imaturidade, faz uma regressão ao procura o apoio da mãe (ou do seu equivalente simbólico),
na qual delega ou partilha a função materna. Contudo, há algumas diferenças nomeadamente,
na história do sujeito 150, a rapariga acede à maternidade assumindo-a plenamente, e
estabelece com o bebé uma relação especular, na qual tanto a “empregada” como o “pai” do
bebé são rejeitados. Desta forma, a rapariga assume-se como mulher adulta, mãe e contentora.
No caso do sujeito 151, a rapariga acede à maternidade, também é ainda imatura para assumir
totalmente a função materna, tendo o apoio a mãe, com a qual partilha essa mesma função,
mas devido a falta de recursos financeiros pondera dá-lo a alguém. É a mãe que a impede,
sacrificando-se para manter a filha e o seu neto unidos, o que acontece. Deste modo, há uma
espécie de triangulação constituída pela mãe, a filha e o neto, não havendo mais espaço para
outros elementos. Finalmente o sujeito 152 elabora uma história em que a rapariga acede à
maternidade, o que conduz a sentimentos de culpa, remorsos e a um estado de desorientação,
indo procurar a mãe, mas apenas enquanto último recurso. Porém, acaba por assumir a
maternidade e fica com o “pai” do bebé.
3 - O bebé/boneco
a) Escotomia
O sujeito 143 elabora a história, estando a mãe a relatar uma história à filha baseada numa
menina da idade desta, ou seja, está a ensinar a filha como comportar-se na sua idade, através
de uma relação especular. Porém, a rapariga não lhe está a dar atenção preferindo brincar com
os “bonecos/bonecas”, i.e., prefere manter-se infantil, adiando crescer, mas acaba por se
submeter à vontade da mãe. Finalmente o sujeito 154 não faz distinção de idades entre as
personagens, referindo tratar-se de “ (...) duas mulheres (...)”, dá o anonimato das personagens
e faz uma telescopagem de papéis relativamente às mesmas, estando ambas alheadas, num
estado narcísico, não havendo uma relação entre elas. O bebé/boneco é denominado de
“boneca”, o que revela imaturidade e incapacidade para colocar a personagens enquanto
mães, embora as caracterize como adultas.
c) Bebé
O sujeito 144 elabora uma história, tendo a rapariga acedido à maternidade, que é vivenciada
com alguma tristeza, sendo neste momento um obstáculo em relação aos projectos que tinha
planeado. O sujeito 147 começa por nomear a personagem de “Joana”, que inicialmente é
descrita como filha, mas de seguida essa mesma personagem é descrita como sendo a mãe
adolescente do bebé.
Conclusões
Na maioria das respostas dos sujeitos de 14 anos, pode-se verificar três movimentos
diferentes. Por um lado, o movimento mais regressivo, em que os sujeitos 142 e 143
percepcionaram a rapariga enquanto filha, e o bebé/boneco enquanto “boneco” ou “boneca”.
Deste modo, a rapariga mantém-se infantil, imatura e dependente da mãe, numa relação dual,
não havendo de momento a fantasia da maternidade. O sujeito 154 não faz a distinção de
idades entre as personagens, caracterizando-as como duas mulheres adultas, sem estabelecer
alguma relação entre elas. Salienta-se nas respostas dos sujeitos, de uma forma geral, que a
rapariga quando é colocada enquanto mãe, se identifica com a própria mãe contrariada, i.e., há
o desejo de se diferenciar e de se autonomizar que não é concretizado devido à maternidade
precoce, e à incapacidade desta em desempenhar tal função, por ser imatura. Todavia, quando
a rapariga desempenha o papel de substituta materna, esse papel é aceite, há o desejo de
aprender a cuidar do irmão para assumir essa função no futuro.
Por outro, os sujeitos 145 e 146 percepcionaram a rapariga enquanto substituta materna,
baseiam a relação entre mãe e filha na transmissão de conhecimentos maternos, ou seja, a
rapariga está a aprender a cuidar do irmão, não só para substituir a mãe nessa tarefa, como
também, para se preparar para assumir essa função no futuro. Finalmente, os sujeitos 144,
147, 149, 150, 151, e 152 que percepcionaram a rapariga enquanto mãe do bebé, elaboraram a
problemática centrando-se na maternidade precoce, sendo esta vivenciada com sentimentos de
culpa, arrependimento, e de imaturidade. Embora haja a fantasia da maternidade, tal era
projectada apenas no futuro, desta forma, a rapariga regride ao papel de filha, delegando na
mãe a função materna, devido à sua imaturidade (com excepção do sujeito 150). Nas histórias
destes sujeitos, a rapariga faz uma identificação à mãe mas contrariada (excepto o sujeito
150), i.e., é obrigada a identificar-se com a função materna.
Conclusão
Verifica-se neste estudo, de uma forma geral, algumas diferenças importantes quer no interior
de cada grupo quer entre os três grupos, nomeadamente, aos doze, treze, e catorze anos.
Quanto às diferenças existentes no interior de cada grupo, como haviam sido apresentadas
anteriormente, optou-se por apresentar nesta fase, apenas as diferenças entre os sujeitos de
grupos diferentes, ou seja, de faixas etárias diferentes.
Por outro lado, os sujeitos que elaboraram as histórias mais evoluídas, em que a rapariga foi
colocada no papel de mãe, o movimento predominante é a hesitação entre a autonomia e a
dependência. Confrontada com a maternidade precoce, a rapariga hesita entre tornar-se
autónoma, assumindo a função materna e por consequência o papel adulto, ou manter-se no
papel de filha, fazendo uma regressão e delegando essa função na sua mãe. Na generalidade
dos casos, a rapariga faz uma tentativa de assumir o papel materno mas regride quase
automaticamente, devido à sua imaturidade e à culpabilidade, por ter acedido ao mesmo papel
que a mãe. Autonomizar-se implica abandonar a infância, separar-se do objecto infantil e
assumir um papel adulto, para o qual não ainda está preparada. A rapariga mantém-se
dependente da mãe da infância, que necessita enquanto figura de suporte, não há assim, uma
identificação à mãe enquanto mulher nem enquanto mãe.
A imago materna deste subgrupo de sujeitos, que percepcionaram a rapariga enquanto mãe, é
experienciada como a da infância, ou seja, permanece ou clivada havendo a identificação da
rapariga apenas com a boa imago materna (mãe ideal); ou superegóica e pré-edípica, da qual
ainda está dependente ou “presa”, embora haja o desejo de se diferenciar; ou ainda, enquanto
uma boa imago materna.
Nesta faixa etária, evidencia-se uma estrutura ainda infantil, semelhante à estrutura de
crianças do período de latência, porque predomina a dependência à imago materna, do
período pré-edipiano. Este resultado vai ao encontro do que Blos (1962, 1966) havia referido,
ou seja, que quando a rapariga entra na pré-adolescência, tem a mesma estrutura interna que a
do período de latência, mas nesta fase essa estrutura é desadequada porque o seu ego não pode
ser suportado pelo ego parental, e porque há a reemergência da sexualidade que é sentida
como culpabilizante a vários níveis. As pré-adolescentes enfrentam os impulsos com as
instâncias que têm, que são preenchidas por imagos parentais arcaicas, i.e., pelas imagos que
se formaram ao longo da infância, e que são inflexíveis, rígidas e punitivas. Nas pré-
adolescentes há uma imago materna genital, má e severa, sendo mais severa do que a mãe na
realidade é. Há assim o risco de as pré-adolescentes ficarem presas na relação pré-edipiana, há
o perigo da homossexualidade e da não diferenciação (Blos, 1962, 1966).
Para Klocars e Sirola (2001) a rapariga durante a adolescência, devido à reactivação da
situação edipiana, tem de ser capaz de abandonar o objecto de amor pré-edipiano, i.e., a mãe
interna, e voltar-se para o pai-homem interno. Porém, se a rapariga não tiver sido capaz de se
identificar com a mãe, regressa a uma fase anterior na sua relação entre mãe e filha, voltando
a mãe-mulher a ser o seu objecto de amor.
Relativamente à fantasia da maternidade, observa-se que esta, na generalidade dos casos, está
ainda ao nível das fantasias das crianças do período de latência, i.e., os sujeitos ainda não
conseguem autonomizar-se e diferenciar-se da mãe da infância, de modo a procurarem novos
objectos de amor e também de identificação, em grupos extrafamiliares. Assim, o acesso à
função materna é considerado culpabilizante, por significar equiparar-se à mãe, ou seja,
desempenhar o papel desta.
Em relação ao grupo constituído por sujeitos de treze anos, também se evidenciam dois
movimentos diferentes. Por um lado, há quatro sujeitos que colocaram a rapariga no papel de
substituta materna, porém, nas histórias de dois deles, a rapariga desempenha essa função
contrafeita, uma vez que é imatura e se vê obrigada a abdicar da sua infância para cuidar do
irmão ou irmã assumindo, assim, um papel adulto para o qual não está preparada e que não
desejava assumir. Contudo, nas histórias dos outros dois sujeitos, a rapariga substitui a mãe na
presença desta, havendo o desejo em aprender a desempenhar o papel materno, para o assumir
no futuro. Desta forma, a rapariga não só agradava à mãe, por estar a cumprir o seu desejo,
como também, a podia substituir com a sua autorização, não havendo assim um conflito.
Por outro, os sujeitos que colocaram a rapariga no papel de mãe, na generalidade dos casos,
há uma tentativa de não elaborar a maternidade, porque é vivenciada com sentimentos de
culpa e há o reconhecimento da imaturidade e da incapacidade em desempenhar o papel
materno. O movimento que se destaca é uma grande ambivalência, em colocar o bebé
enquanto filho(a) ou irmão/irmã da rapariga, ambivalência essa que se poderá dever à
culpabilidade, à imaturidade e à incapacidade em desempenharem a função materna, assim
como, ao facto de já haver uma identificação com a mãe, numa fase em que há o desejo de se
diferenciar desta. Observa-se uma alternância entre um movimento regressivo e progressivo
constante. Num movimento mais regressivo, a rapariga regride, mantendo-se no papel de
filha, adiando a sua função materna que é delegada na mãe.
Todavia, no movimento mais evoluído, embora a rapariga reconheça a sua imaturidade, e a
sua incapacidade em desempenhar o papel materno, deseja aprender com a mãe a fazê-lo.
Verifica-se a existência do desejo da maternidade, mas tal era projectado no futuro. O facto de
ter acontecido nesta altura, conduz à tentativa de não elaborar a maternidade, por ser
percepcionada enquanto um obstáculo, por ser causadora de angústia, e por haver o
reconhecimento da imaturidade. Nenhuma rapariga se assume verdadeiramente como mãe,
porque delega na sua mãe esse papel, mantendo-se infantil.
Nas histórias dos sujeitos de 13 anos, embora haja o desejo, por parte da rapariga, de se
diferenciar da mãe, ou seja, uma luta entre a dependência e a autonomia, com o acesso à
maternidade precoce e perante a incapacidade em desempenhar a função materna, vê-se
compelida a identificar-se a esta, e a permanecer dependente, através da regressão. Deste
modo, acaba por se identificar à mãe quer enquanto mulher quer como mãe, para aprender a
desempenhar a função materna. De acordo com Blos (1962, 1966), por volta dos treze anos,
as raparigas rivalizam com a mãe e fazem uma tentativa no sentido de se afastarem,
diferenciarem e tornarem-se autónomas face a esta, i.e., as raparigas afirmam-se enquanto
mulheres. Observa-se assim, a uma remodelação do mundo interno das pré-adolescentes,
tendo por base a remodelação das imagos parentais da infância. Por sua vez, a utilização da
regressão, permite reparar o que não foi vivido de maneira adequada e desligar-se dos
objectos infantis. A tarefa fulcral desta fase é o desligamento das imagos parentais, que irá
permitir a individuação, e a procura de novos objectos de amor no meio extra familiar (Blos,
1962, 1966).
A mãe nesta fase, já não é considerada apenas enquanto figura de suporte da qual a rapariga
necessitava, mas enquanto um bom objecto de identificação enquanto mulher e enquanto mãe,
do qual, à posteriori, se poderá diferenciar e tornar-se autónoma. A ambivalência surge
precisamente porque já há uma identificação com a mãe, numa fase em que há o desejo de ser
diferente desta. Segundo Dahl (1995) a rapariga, tem de alcançar um sentido de self integrado,
porém, tem de se conseguir diferenciar psiquicamente da sua mãe, sem contudo, abandonar as
representações das relações de objecto precoce. Pode-se observar um desenvolvimento na
organização das representações de objecto materno, cuja função é a reemergência das
fantasias pré-edípicas e edípicas e a sua contribuição para a resolução do conflito interno que
está ligado com o desenvolvimento na adolescência. Essas fantasias são construídas sob a
pressão da exigência intrapsíquica da adolescência, e são criadas para resolver conflitos
internos originados pela exigência do corpo sexual maduro, pelo reacordar do desejo
incestuoso, pela restrição do superego e pela adaptação à realidade exterior. Estas fantasias
contêm representações de vinculação à mãe, sendo esta utilizada na representação do corpo,
das pulsões, e dos medos específicos de retaliação e punição (Dahl, 1995).
Observa-se nesta faixa etária, uma estrutura que corresponde à pré-adolescência, ou seja, há
tentativas de diferenciação face à imago materna, assim como, de identificação, sendo que o
movimento que mais predomina é a ambivalência. Blos (1962, 1966) considera que na pré-
adolescência há o reaparecimento da ambivalência, uma vez que o pré-adolescente deseja ser
independente face às figuras parentais, porém, permanece muito dependente destas. As
relações de objecto infantil, quando revividas na adolescência tendem a surgir na sua forma
original, ou seja, através do estado ambivalente. De facto, a última tarefa da adolescência é
precisamente fortalecer as relações de objecto pós-ambivalente.
Quanto ao grupo constituído por sujeitos de catorze anos, também se observa dois
movimentos distintos. Por um lado, os sujeitos que percepcionaram a rapariga enquanto
substituta materna, baseiam a relação entre mãe e filha na transmissão de conhecimentos
maternos, ou seja, a rapariga está a aprender a cuidar do irmão, e a preparar-se para assumir
essa função no futuro. Dessa forma, embora haja a fantasia da maternidade e a aprendizagem
dos cuidados maternos, tal é adiada e projectada apenas no futuro A imago materna é assim,
experienciada enquanto um bom objecto de identificação.
Por outro, nas histórias dos sujeitos que colocaram a rapariga no papel de mãe, observa-se o
problema de identificação antagónica. A rapariga tem necessidade de se diferenciar da mãe,
mas ao aceder à maternidade é obrigada a identificar-se com esta, devido à sua imaturidade, o
que a obriga a regredir e a manter-se no papel de filha. Deste modo, a identificação à mãe
existe, mas contra a vontade da rapariga, cujo desejo era tornar-se autónoma. A maternidade
precoce é vivenciada com sentimentos de culpa e de arrependimento, e é considerada um
obstáculo, porque impediu a concretização do desejo de autonomia e de diferenciação por
parte da rapariga.
Deste modo, verifica-se nos sujeitos a fantasia da maternidade, mas tal fantasia seria
projectada apenas no futuro, uma vez que nesta fase há uma tentativa de diferenciação face à
mãe e de identificação a novos objectos extrafamiliares. Face à maternidade na maioria dos
casos, há uma regressão à mãe, delegando na mãe o papel materno.
Segundo Klocars e Sirola (2001) é ao longo da adolescência que a rapariga redescobre a mãe,
de uma forma mais realista, sendo esta diferenciada da representação interna da mãe da
infância. A adolescente ao manter relações extrafamiliares interage com outras mulheres que
poderão ser novos objectos de identificação, alargando assim, as fantasias de mulher, de
feminilidade e de maternidade. Mãe e filha tornam-se diferenciadas, inclusive nas suas
fantasias, embora, a relação de identificação com a feminilidade lhes conceda a possibilidade
de continuarem o seu compromisso de amor mútuo (Klocars & Sirola, 2001).
No grupo constituído por sujeitos de catorze anos, observa-se uma estrutura que corresponde
à adolescência, em que há uma identificação antagonista face à mãe, há a tentativa de
diferenciação face a esta, mas que não é totalmente concretizada porque já há uma
identificação. De acordo com Blos (1966), a rapariga durante a adolescência tem a difícil
tarefa de se desvincular da mãe da infância, i.e., tem de se diferenciar e procurar novos
objectos de identificação e de amor, em relações extrafamiliares, e defender-se de uma
possível regressão à mãe pré-edipiana. O processo adolescente é, segundo o autor, constituído
por uma tensão dialéctica entre a primitivização e a diferenciação, e entre posições regressivas
e posições progressivas.
Poder-se-á afirmar a confirmação das questões de investigação elaboradas neste trabalho, uma
vez que nos três grupos, foram apresentadas mudanças na imago materna, na identificação a
esta, e na fantasia da maternidade.
È importante salientar que nos três grupos, ou seja, nas três faixas etárias, existem sujeitos que
não conseguiram colocar a rapariga no papel de mãe, nem de substituta materna. Deste modo,
a rapariga manteve-se apenas como filha, imatura, infantil e dependente da mãe, sem haver a
fantasia de assumir, pelo menos de momento, a maternidade. Relatam assim histórias muito
regressivas do período pré-edipiano. Este resultado vai no sentido da afirmação de Cordeiro
(1988), que durante a adolescência existem discrepâncias entre a maturidade sexual e a
maturidade psico-afectiva.
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CARTA DE CONSENTIMENTO
De forma genérica, posso afirmar que este trabalho tem como objectivos:
A percepção da representação materna
A compreensão de um aspecto da pré-adolescência e da adolescência
Em termos práticos, o trabalho será constituído pela a aplicação de uma imagem de um teste
qualitativo. Venho desde já solicitar a vossa colaboração e autorização nesta investigação,
bem como auxílio numa pré-selecção dos indivíduos para este estudo, segundo os seguintes
critérios: raparigas de doze, treze e catorze anos de idade. Todos os elementos fornecidos
estão sujeitos a confidencialidade e sigilo.
FORMULÁRIO DE CONSENTIMENTO
Data ____/____/____
Assinatura
____________________________
ANEXO D
ANÁLISE DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS
Sujeito 101 – 5” Isto é uma menina que engravidou muito cedo, e quando soube que tava
grávida ficou muito triste, depois foi falar com o rapazinho que a engravidou, e ele disse que
já não a queria mais, então foi procurar apoio da parte dos pais, mas eles disseram que não a
queriam porque era muito irresponsável e porque ela não era pura. Depois foi procurar apoio
numa vizinha muito amiga dela, ela contou a história como aconteceu, disponibilizou ajuda e
que com ela podia fazer tudo à vontade, que ela fazia tudo, até ter idade de fazer o que devia.
E ficou tudo bem. 2`57”
Procedimento: inicia a resposta com um baixo tempo de latência, com a entrada directa na
expressão (B2 1). Centra a história na personagem com a qual se identificou projectivamente,
a “menina”, dando o anonimato da mesma (C/Fo3), e através de uma fantasia pessoal (B1 1).
Aborda o afecto depressivo, através de afectos expressos à mínima (A2 18), ao saber da sua
gravidez. Introduz um personagem que não figura na imagem, o “rapazinho” (B1 2), que é
denominado de um modo infantilizado e inferiorizante, o qual a rejeita (B2 5). Faz uma
regressão ao recorrer aos “pais”, introduzindo outro personagem, o pai (B1 2), tentando
manter-se na posição de filha, mas é novamente rejeitada e abandonada (B2 5, A2 18, B2 4).
Introduz uma nova figura que não consta da imagem, a “vizinha” (B1 2, B2 2), na qual é
projectada a mãe ideal, dando também uma confusão de identidades (E11), “ (...) com ela
podia fazer tudo à vontade, que ela fazia tudo, até ter idade de fazer o que devia”. A “vizinha”
aparece como a única pessoa que aceita a sua sexualidade e maternidade, identificando-se
empaticamente com ela. Conclui a história com a realização mágica do desejo (B2 7).
Análise: o sujeito 101 inicia a sua resposta com uma entrada directa na expressão, dando o
anonimato da rapariga “ (...) uma menina (...)”, que acedeu precocemente à sexualidade e à
maternidade, o que a leva a abordar o sentimento depressivo. Deste modo, revela alguma
imaturidade, culpabilidade e incapacidade em assumir a função materna. Ao saber da sua
condição, procura o apoio e contenção no “rapazinho”, mas este rejeita-a “ (...) já não a queria
mais (...)”. Ao ver-se sozinha faz uma regressão, indo procurar o apoio dos seu “pais”, porém,
estes também a rejeitam, culpabilizam e a abandonam, devido à sua irresponsabilidade e por
já ter acedido à sexualidade “ (...) era muito irresponsável e porque ela não era pura”. Estando
novamente sozinha, procura o auxílio da sua “vizinha”, que se disponibiliza para a ajudar, a
contém e aceita. O sujeito faz uma confusão de identidades entre a “menina” e a “vizinha”,
porque “ (...) com ela podia fazer tudo à vontade, que ela fazia tudo, até ter idade de fazer o
que devia”, a ideia de poder fazer tudo é culpabilizante e acaba por se censurar a si própria.
O sujeito conclui a história com a realização mágica do desejo “e ficou tudo bem”, ou seja,
consegue aprender com a ajuda da “vizinha” a ser mãe. O conflito expresso nesta história
deve-se ao facto de, a “menina” ter acedido precocemente à maternidade, sendo esse o motivo
da sua dupla rejeição, pelo “rapazinho” e pelos “pais”, e a consequente solidão, que só é
superada através da ajuda da “vizinha”. A história termina, tendo como solução a realização
mágica do desejo, e a solução do conflito por ajuda de dependência exterior, permitindo que a
“menina”, assuma o papel materno embora com ajuda. Os mecanismos de defesa utilizados
pelo sujeito são, a idealização, da “menina” por parte dos seus “pais” que consideram a
maternidade precoce desta, uma falha e uma irresponsabilidade da sua filha perfeita; a
regressão, uma vez que, a “menina” ao ser rejeitada pelo “rapazinho”, e ao ver-se sozinha,
regride à posição de filha procurando a ajuda dos “pais”; e a clivagem da figura materna,
projectando na “mãe” a má imago e na “vizinha” a mãe ideal, ou seja, a boa imago materna.
Sujeito 102 – 15” Eu não sou muito boa para histórias. Era uma vez, uma menina que
engravidou não é, e que não podia fazer o que ela mais queria, teve sorte que a mãe não a
expulsou de casa e que a ajudou, e tava triste. (?) Um final triste, ela não podia fazer as coisas
que ela queria fazer porque tinha de cuidar da menina ou do menino, não sei. 2`02”
Procedimento: começa o relato com uma crítica a si própria (C/N9). Faz um afastamento
têmporo-espacial (A2 4) e dá o anonimato da rapariga, “uma menina” (C/Fo3), seguido de um
comentário pessoal (B2 8). O facto de a “menina” ter engravidado, obrigou-a a crescer e a não
poder seguir os seus desejos, nem permanecer infantil, sendo a maternidade vivenciada com
tristeza (A2 18), rejeição e culpabilidade (A2 17). Faz um comentário pessoal (B2 8) acerca
do destino da rapariga, dando uma ambiguidade, a mãe apoiou-a, embora houvesse a fantasia
de poder ser rejeitada e abandonada por ela, dando em seguida o sentimento depressivo (A2
18). Deste modo, há isolamento das personagens, que não são colocadas em relação (A2 15).
Conclui a história, com o sentimento depressivo ligado à maternidade precoce da rapariga,
que é vivenciada de forma negativa, quer devido à sua imaturidade como pelo facto de mudar
o seu estilo de vida, impedindo-a de fazer o que gostava de fazer. A gravidez aparece como
um obstáculo. Dá uma instabilidade de género quanto ao bebé (B2 11). Termina com uma
denegação “não sei” (A2 11).
Análise: o sujeito 102 inicia o relato com uma crítica de si, fazendo um afastamento têmporo-
espacial e dando o anonimato da rapariga “ (...) uma menina (...)”, que havia engravidado,
fazendo de seguida um comentário “ (...) não é (...)”, quase como se fizesse um crítica
depreciativa. A maternidade além de ser vivenciada com sentimentos de culpa e de
imaturidade, é também percepcionada enquanto um obstáculo, porque não permite que a
“menina” continue infantil. Há quase uma rejeição do bebé, que só é suplantada através do
apoio da mãe, que a ajuda a cuidar deste. Aborda o sentimento depressivo, face à maternidade
precoce, ao afirmar “ (...) e tava triste”, reforçando a imaturidade e a incapacidade desta em
assumir tal função. O sujeito isola os personagens, não os coloca em relação. Após
questionado sobre que fim daria à história, o sujeito conclui dando um fim negativo, tendo a
“menina” de ser obrigada a assumir a função materna, abdicando dos seus desejos e cuidando
“ (...) da menina ou do menino (...)”, dando assim uma instabilidade de género ao bebé,
provavelmente porque ela própria se sente ainda indefinida.
O sujeito termina fazendo uma denegação do que havia dito, sendo indicador da angústia que
sente face à imagem e à história que elaborou. O conflito apresentado nesta história é
intrapsíquico, deve-se à maternidade precoce da “menina”, e à sua incapacidade e imaturidade
para desempenhar o papel materno, o qual é vivenciado como uma fantasia negativa,
delegando tal função na sua “mãe”. Desta forma, adia a função materna, podendo se manter
no papel de filha e dependente da “mãe”. O modo utilizado para resolver o conflito é, através
da solução directa do conflito, terminando a rapariga a cuidar do bebé, como se fosse obrigada
a fazê-lo, estando implícito o sentimento depressivo e alguma rejeição face a este papel, e
através da solução por ajuda de dependência exterior, porque nunca chega a assumir
completamente a sua função materna, necessitando sempre do auxilio da sua “mãe”.
B2 1; B1 1; A1 3; A2 3; B1 2; A2 18; B2 7; B1 2;
Procedimento: inicia o relato com uma entrada directa na expressão (B2 1), referindo-se à
personagem de forma depreciativa “miúda”. Constrói a história à volta de uma fantasia
pessoal (B1 1), com referências sociais (A1 3) quanto à contracepção, “a miúda não teve
cuidados (...)”. Verifica-se um sentimento de culpabilidade pelo facto de não conversar com a
mãe, não seguindo os seus conselhos, tendo engravidado. O sujeito utiliza uma precaução
verbal (A2 3) para introduzir o tema da sexualidade e da maternidade, introduzindo um
personagem que não figura na imagem (B1 2), o “rapaz”, o qual a rejeita (A2 18). Como
término da história, dá a realização mágica do desejo (B2 7), uma vez que a jovem acaba bem
junto dos pais, introduzindo assim também a figura do pai (B1 2) como contentor.
Análise: o sujeito 103 inicia a história, com uma entrada directa na expressão, identificando-
se projectivamente com a rapariga, que denomina de “miúda”, de modo a denegri-la,
desvalorizá-la e a atribuir-lhe imaturidade. A “miúda” foi imprevidente, porque não ouvia os
conselhos da “mãe”, tentando diferenciar-se desta, e engravidou, acede assim à culpabilidade,
porém a “mãe” aceitou a gravidez da filha, e “ (...) tentou ajudá-la o máximo que podia (...)”,
dando, assim, uma formação reactiva. O sujeito introduz um personagem que não consta na
imagem, o “rapaz”, de quem teria engravidado, que a rejeita e a abandona, conduzindo-a à
solidão. O sujeito conclui a sua história, dando a realização mágica do desejo, tendo a
“miúda” aceitado a sua maternidade, e aprendendo a cuidar do bebé com a ajuda dos seus
“pais”, e sem o filho ter conhecido o pai, “ (...) sem saber quem é o pai”, há assim um corte na
relação com o “rapaz” devido à sua rejeição. A “miúda” ao sentir-se rejeitada e só, procura o
apoio dos seus “pais”, que a aceitam enquanto mãe, desde que ela não tenha uma vida sexual
activa, deste modo, faz uma regressão mantendo-se enquanto filha, para ser aceite e obter
auxílio.
Está inerente a projecção da rejeição da maternidade no “rapaz”, que é o único que acaba por
assumir essa rejeição, uma vez que, a “miúda” devido à culpabilidade sentida e à sua
imaturidade, acaba por aceitar a maternidade, mas através da dependência aos pais. O conflito
expresso nesta história é intrapsíquico, centra-se na maternidade precoce da “miúda”, e na
consequente rejeição do “rapaz” face a esta. A maternidade é vivenciada com sentimentos de
culpabilidade, por não ter seguido os conselhos da “mãe”, imaturidade e dependência face aos
“pais”. A “miúda” faz uma regressão, de modo a manter-se no papel de filha, abdicando da
sua sexualidade activa, para ser aceite pelos “pais”. A solução utilizada é a realização mágica
do desejo e a solução por dependência de ajuda exterior, porque necessita ter sempre uma
figura de suporte. Os mecanismos de defesa utilizados são, a formação reactiva, porque a mãe
aceita a maternidade da filha sem nenhum tipo de conflito, dando o seu total apoio; e a
regressão, mantendo-se a “miúda” no papel de filha, embora assuma a função materna, mas
sempre com o apoio dos “pais”.
Sujeito 104 – 8” Era a mãe que estava a contar uma história à filha, e a rapariga estava a
pensar na história, estava a olhar através da janela. (?) Não sei. 1`12”
B2 1; A2 3; C/Fa1; A2 13; A1 1; E1; A2 11;
Procedimento: inicia o discurso com uma entrada directa na expressão (B2 1) e com uma
precaução verbal (A2 3), apegando-se ao conteúdo manifesto (C/Fa1) descrevendo a imagem
sem indicar um conflito e estabelecendo uma relação mãe/filha meramente intelectual (A2
13), destituída de afectos e sendo uma história construída através do tema banal (A1 1). A
“rapariga” olha através da janela como se estivesse a olhar para a liberdade. Escotomiza o
bebé/boneco (E1) devido à culpabilidade. Termina com uma denegação (A2 11), de modo a
não elaborar nenhum conflito.
Problemática: é uma história destituída de afectos e sem relação. A filha olha para a janela
como se estivesse a olhar para a sua liberdade e independência da mãe, mas a sua defesa
prevalece, e mantém-se dependente da mãe.
Análise: o sujeito 104 inicia o seu relato, com uma entrada directa na expressão, através de
uma precaução verbal, construindo uma história próxima do tema banal. Estabelece uma
relação baseada na intelectualização, entre as personagens, tratando-se de “mãe” e “filha”. A
“rapariga” está a reflectir sobre a história, e a olhar para a janela como se olhasse para a
liberdade, vislumbrasse a autonomia, porém, mantém-se ligada à “mãe”, no seu papel infantil.
O bebé/boneco é escotomizado, devido à grande culpabilidade sentida e à imaturidade da
“rapariga”. O sujeito conclui o seu relato, com uma denegação, poder-se-á pensar que, o
bebé/boneco lhe despertaria fantasias insuportáveis, tendo de recusar a realidade, ou seja,
escotomizando-o. Não há verdadeiramente um conflito, uma vez que, a “rapariga” escotomiza
o bebé/boneco e mantém-se dependente da “mãe”, evitando assim, um possível conflito com
esta. Observa-se por um lado, há tentativa de autonomia e individuação face à “mãe”, que não
se chega a concretizar devido à defesa, mantendo-se enquanto “filha” e ligada à sua “mãe” e
ao imaginário desta.
E por outro lado, há escotomia do bebé/boneco, devido à imensa culpabilidade sentida, para o
percepcionar enquanto filho ou irmão, porque dessa forma, teria de abandonar a sua posição
infantil e a sua posição privilegiada face à mãe. Não é dada uma solução do conflito, ou seja,
a angústia e a culpabilidade é tão grande, que acaba por fazer uma negação do que havia dito
por não a conseguir suportar. O mecanismo de defesa utilizado pelo sujeito é a negação,
porque necessita anular o que havia elaborado, numa tentativa de afastar as fantasias
insuportáveis que a imagem lhe suscitou. A rapariga é designada de “filha”, sendo
percepcionada enquanto infantil e dependente da mãe, embora vislumbre a possibilidade de se
individuar, opta por permanecer dependente desta. A figura materna é denominada de “mãe”,
estando implícito de que se trata de uma boa imago, uma vez que, a “filha” opta por
permanecer consigo e consegue fantasiar a partir do imaginário materno. Não se observa uma
fantasia de ser mãe, embora se identifique com a sua mãe, é como se essa possibilidade, pelo
menos, para já estivesse arredada.
Sujeito 105 – 1” Era uma vez, a mãe estava a contar a história à filha, que não estava
interessada em ouvir a história, tinha uma boneca na mão e estava vestida com um vestido,
sentada no sofá. Acho que é só. (?) Então depois a mãe no final, pedia-lhe para fazer um
resumo e metia-lhe de castigo, porque ela não estava atenta. 1`48”
Problemática: assiste-se a uma mãe superegóica, que tenta uma aproximação à filha mas é
extremamente castradora e culpabilizante, quando a filha não lhe dá atenção, não suportando,
deste modo, a rejeição. A rapariga tenta-se distanciar da mãe, procurando não se identificar
com ela contudo, não consegue pois é impedida pela mesma, sendo castigada por essa
tentativa falhada de fuga. Há um conflito entre o não se querer identificar com a mãe, e querer
permanecer infantil, sendo por isso punida pela mãe superegóica, à qual se sente presa.
Análise: o sujeito 105 começa a sua história, com uma entrada directa na expressão, através
de um afastamento têmporo-espacial, construindo uma história próxima do tema banal, e
estabelecendo uma relação entre as personagens, tratando-se de “mãe” e “filha”. A “mãe”
relatava uma história à filha, transmitindo-lhe assim, alguns conhecimentos, porém, a “filha”
“ (...) não estava interessada em ouvir a história (...)”, há assim, um corte na relação e uma
recusa, em ouvir o que a “mãe” lhe quer contar. O sujeito continua a história, descrevendo a
“filha”, apegando-se ao conteúdo manifesto, infantilizando-a e desvitalizando o bebé/boneco,
que percepciona enquanto uma “boneca”. Faz uma tentativa de recusa, e após lhe ser
questionado sobre que fim daria à história, o sujeito conclui, tendo a “mãe” pedido um resumo
da história que lhe havia contado, e ao se aperceber que a “filha” não tinha estado atenta,
pune-a, colocando-a de castigo. O sujeito relata uma história, cujo conflito remete para a
hesitação entre defesa e a individuação, o que conduz ao conflito face à imago materna.
A “mãe” está a ensinar à “filha” como esta se deve comportar na sua idade contudo, esta
rejeita identificar-se à mãe e ao modelo que esta lhe estava a transmitir. Deseja ser diferente,
mas continua a querer ser criança, ou seja, há um desejo de se individuar mas que não é
alcançado, permanecendo infantil e presa à “mãe”. Não é dada uma solução do conflito, uma
vez que, a “mãe” acaba por punir a “filha”, colocando-a de castigo, devido ao seu
desinteresse. Os mecanismos de defesa utilizados foram, a intelectualização, de modo a evitar
a projecção, a expressão de afectos e as pulsões agressivas, embora no fim se tenha
desmoronado, com a revelação de uma mãe agressiva e punitiva; e a regressão, embora haja
um movimento, no sentido da individuação, a defesa consegue-se impor, e a “filha” mantém-
se infantil e dependente. A rapariga é denominada apenas de “filha”, sendo percepcionada
enquanto infantil, imatura e dependente, embora já haja uma tentativa de se individuar. A
“mãe” é percepcionada enquanto superegóica, punindo a “filha”, por não seguir o seu modelo,
deste modo não se identifica a esta.
Sujeito 106 – 9” Sobre isto? Então... não sei. Era uma vez, uma mãe que tinha dois filhos e
que trabalhava como explicadora, um dia pediu à filha mais velha para tomar conta do
pequeno bebé. Enquanto a mãe tentava ganhar mais algum dinheiro, a pequena rapariga não
estava a conseguir dar conta do recado, pois, o bebé não parava de chorar. Depois procurou
uma fralda, molhou-a e pôs açúcar, funcionou como chucha até que o bebé se calou. O bebé
tinha adormecido, depois a mãe conseguiu arranjar mais uma aluna e voltou após uma hora e
a filha pôde finalmente ir para a escola. 2`42”
Problemática: centra-se na rivalidade fraterna, uma vez que, o irmão lhe vem retirar a
infância, ao ter de substituir a “mãe” nos cuidados maternos, zangando-se com esta por a
obrigar a assumir um papel, para o qual ainda não está preparada.
Análise: o sujeito 106, começa por fazer um pedido de ajuda ao clínico, em relação à história
que teria de elaborar a partir do material, faz uma precaução verbal, um silêncio intra-relato e
uma denegação. O sujeito revela alguma ansiedade face à imagem, colocando-se numa atitude
anaclítica. Começa a história através de um afastamento têmporo-espacial, dando o anonimato
da figura materna, que denomina de “ (...) uma mãe (...)”, que trabalha, sendo os outros dois
personagens seus “filhos”. Após um novo afastamento têmporo-espacial, a “mãe” delega na
sua “ (...) filha mais velha (...)” os cuidados do bebé, para que pudesse ir trabalhar. Durante o
tempo em que a “mãe” trabalhava, a “ (...) pequena rapariga (...)”, sendo ainda infantil, tem
algumas dificuldades em conter o “bebé”, porém, conseguiu fazê-lo. Quando o bebé já está a
dormir, a “mãe” chega a casa, e a “filha” pode finalmente voltar a ser criança.
O conflito manifestado nesta história centra-se no facto de a “rapariga” ter de crescer, para
substituir a “mãe” nos cuidados maternos, zangando-se com esta, ou seja o irmão retira-lhe a
sua infância. A solução utilizada é a realização mágica do desejo, podendo a “rapariga” voltar
a ser criança, e a solução por compromisso viável, ao agradar à “mãe”, para depois poder
voltar a ser criança. Os mecanismos de defesa utilizados são, a negação, porque a imagem lhe
suscita algumas fantasias insuportáveis, como o facto de perder a sua infantilidade e
imaturidade; e a ruminação, o sujeito centra o seu conflito na rivalidade fraterna e na zanga
face à “mãe” que a obriga a substitui-la nos cuidados maternos, i.e., impede-a de permanecer
infantil, como é o seu desejo.
A rapariga é denominada de “ (...) filha mais velha (...)” e de “ (...) pequena rapariga (...)”,
sendo percepcionada enquanto infantil, imatura e tendo algumas dificuldades em se colocar
enquanto substituta materna, desempenhando tal função contrafeita, porque não deseja
crescer. A figura materna é denominada de “mãe”, sendo percepcionada enquanto ausente,
abandónica, não estando disponível para os filhos, e incapaz de se aperceber da imaturidade e
das dificuldades da “filha” em desempenhar tal papel, logo, é percepcionada enquanto uma
má imago materna. O “bebé” é percepcionado enquanto um obstáculo, porque lhe retira a sua
infância, ao ser obrigada a cuidar dele. É importante realçar que ambos os filhos são pequenos
e imaturos, “ (...) pequeno bebé”, “ (...) pequena rapariga (...)”.
Sujeito 107 – 13” Deixou cair o bebé, depois a mãe chateou-se muito com ela e pô-la de
castigo. Passados alguns dias, ela estava muito arrependida e foi dizer à mãe que não devia ter
feito isso e a mãe tirou-a de castigo e nunca mais deixou pegar o bebé ao colo. 1`44”
B2 1; B2 5; B2 4; A2 4; B2 4;
Procedimento: inicia a história, com uma entrada directa na expressão (B2 1), com alguma
dramatização (B2 5), retratada no facto de a rapariga ter deixado cair o bebé. Continua com
uma expressão de afectos fortes (B2 4), pois, a mãe “chateou-se muito” com a rapariga tendo-
a castigado. Após um afastamento têmporo-espacial (A2 4), verifica-se um sentimento de
culpa e a necessidade de desculpar a sua acção à mãe, embora esteja subentendido alguma
agressividade face ao bebé, pois, a justificação é “não devia ter feito isso”, o que pressupõe
alguma intenção e não um acidente. A mãe retira-lhe o castigo mas impede-a de pegar no
bebé, de modo a proteger este último, com receio que a rapariga o deixasse novamente cair.
Análise: o sujeito 107 começa a relatar a sua história, com uma entrada directa na expressão,
através de um acto agressivo, em que alguém deixou cair o “bebé”, sabendo-se em seguida,
que a protagonista de tal agressão, é a rapariga. Contudo, não se sabe se o bebé é seu filho ou
seu irmão. A figura materna, que é denominada de “mãe”, após tal acontecimento, “ (...)
chateou-se muito com ela (...)”, tendo-a punido, colocando-a de castigo. O sujeito faz um
afastamento têmporo-espacial, de modo a dar uma continuidade no tempo, a filha revela estar
“ (...) muito arrependida (...)” do que fez, e pede desculpa à “mãe”, que a retira do castigo.
Porém, a filha arrepende-se, não do seu acto agressivo, mas pelo facto, de a “mãe” se ter
zangado com ela, estando por isso, com receio de ser abandonada ou rejeitada. A “mãe” não a
deixa pegar mais no bebé, ou seja nunca mais a deixa desempenhar o papel materno.
O conflito manifestado nesta história, é a agressão que a rapariga dirigiu ao “bebé”, deixando-
o cair, contudo, o verdadeiro alvo de tal agressividade é a “mãe”. Essa agressão é dirigida à
“mãe”, como forma de revelar a sua zanga, pelo facto de ter tido outro filho, que ocupa o seu
lugar. O sujeito utilizou a solução directa do conflito, através do pedido de desculpa da filha,
tendo a “mãe” a perdoado mas, impedindo-a de voltar a pegar no bebé, desta forma, a mãe
permanece superegóica, castrando-a e mantendo-a infantil. Os mecanismos de defesa
utilizados nesta história foram, o deslocamento, tendo dirigido a sua agressividade para outro
objecto, que não a “mãe”; a formação reactiva, porque após a agressividade surge o
arrependimento e a regressão, mantendo-se filha e também rivalizando com a “irmã”
reforçando a infantilidade.
Sujeito 108 – 14” Invento? Esta é a empregada? Ai não sei! Ela teve um filho muito cedo, e a
mãe tá-lhe a ensinar a tomar conta do bebé e ela tá arrependida. (?) Ela... não tá desenvolvida,
a mentalidade dela não é suficientemente boa para ela ser mãe, teve de crescer cedo, teve de
crescer rápido. 2`52”
Análise: o sujeito 108 começa a sua resposta com um pedido de ajuda ao clínico, como se
perguntasse se podia ser livre, se podia contar o que quisesse, e de seguida pergunta se a
figura materna seria a “empregada”, desvalorizando-a e distanciando-a. Faz uma denegação, e
prossegue o seu relato, identificando-se projectivamente com a rapariga, que havia acedido à
maternidade precocemente “ (...) muito cedo (...)”. Todavia, a sua defesa não se consegue
manter, e acaba por denominar a figura materna de “mãe”, que aceita a maternidade da filha,
ajuda-a e ensina-a a cuidar do bebé, deste modo, identifica-se com o modelo materno desta. A
rapariga está “ (…) arrependida (…)” e sente-se culpada, pelo facto de ter engravidado. Após
o sujeito ser questionado sobre que final daria à história, faz um silêncio intra-relato.
Continua a sua história dizendo, que a rapariga é imatura sendo, por isso, obrigada a crescer,
de modo a desempenhar a função materna “ela… não tá desenvolvida, a mentalidade dela não
é suficientemente boa para ela ser mãe, teve de crescer cedo, teve de crescer rápido”. Este
comentário final é dado, quase sobre a forma de crítica, de culpabilização pelo facto de ter
engravidado precocemente. O conflito expresso nesta história é o conflito intrapsíquico, que
se centra na maternidade precoce da rapariga, que é vivenciada com sentimentos de culpa e
tristeza, reconhecendo a sua imaturidade. A solução utilizada pelo sujeito é a solução do
conflito por dependência de ajuda exterior, uma vez que, permanece com a sua “mãe”, no
sentido de aprender com esta, a desempenhar a função materna.
O mecanismo de defesa utilizado nesta história é a negação, revelando, deste modo, alguma
angústia e ansiedade. Relativamente às denominações das personagens, o sujeito 108, não
atribui uma designação em relação à rapariga, tratando-a simplesmente por “ela” sendo uma
forma de distanciamento e de não identificação. Esta personagem é percepcionada enquanto
imatura, necessitando do apoio da “mãe”, para aprender o papel materno, embora se assuma
enquanto “mãe”. Está implícita uma crítica, no facto de a personagem ter engravidado,
realçando que “ela teve um filho muito cedo (...)”. A figura materna, começa por ser
designada de “empregada”, no pedido de ajuda que o sujeito faz ao clínico, de modo a
desvalorizá-la e enquanto defesa, mas esta defesa acaba por sucumbir e designa-a de “mãe”.
A personagem “mãe” é percepcionada enquanto uma boa imago, apoiante e contentora, com a
qual a filha se identifica.
Sujeito 109 – 10” A mãe está a contar-lhe uma história, e a rapariga estava a segurar pronto a
irmã, e distraiu-se e deixou cair a bebé. A mãe ficou zangada e pôs a filha de castigo. Disse
que ficava de castigo até que lhe apetece-se. A filha tentou provar que estava arrependida e
para a mãe acreditar nela. Passado algum tempo a mãe acreditou nela e ficou tudo bem. 1`59”
B2 1; A2 13; B2 8; C/M3; B2 4; B2 5; A2 4; B2 7;
Procedimento: inicia o relato com uma entrada directa na expressão (B2 1), numa relação
entre mãe e filha através da intelectualização (A2 13), descrevendo a rapariga com o bebé ao
colo, seguido de uma exclamação “pronto” (B2 8), e faz uma pirueta (C/M3) ao deixar cair o
bebé. Expressa afectos fortes (B2 4), na reacção da mãe que acaba por punir a rapariga, de
modo dramatizado, durante um tempo indefinido (B2 5). Contudo a mãe após um afastamento
têmporo-espacial (A2 4) perdoa a filha. Verifica-se um sentimento de culpabilidade da
rapariga e o seu arrependimento face a tal situação porque a mãe se zangou com ela e não
pelo facto de ter agredido a irmã. Termina a história com a realização mágica do desejo (B2
7), em que mãe e filha fazem as pazes.
Análise: o sujeito 109 começa a sua resposta com uma entrada directa na expressão,
estabelecendo uma relação entre “mãe” e “filha” baseada na intelectualização, destituída de
afectos. A “rapariga” agride a “irmã”, também deixando-a cair, embora haja uma
intencionalidade neste acto, está implícito também a sua imaturidade, porque ao dar atenção à
“mãe”, e ao que esta estava a relatar “ (...) distraiu-se e deixou cair a bebé”. Como se a “mãe”
estivesse a contar uma história a ambas as filhas e a “rapariga” deixasse cair o bebé, sem que
a “mãe” se apercebesse, para poder ter esta só para si, como se pudesse fazer com que a sua
“irmã” desaparecesse, para permanecer numa relação dual. Por outro lado, também é a forma
que utiliza para poder castigar a “mãe”, demonstrando a sua zanga e revolta por ter tido uma
outra filha, é como se esta, a tivesse substituído, retirando-lhe assim, o amor e atenção.
Ressalta-se facto, de dar uma hesitação, antes de colocar o bebé/boneco enquanto “irmã”.
A solução utilizada pelo sujeito foi a realização mágica do desejo, tendo terminado tudo bem,
sendo restabelecida a harmonia na relação entre “mãe” e filha. Os mecanismos de defesa
utilizados pelo sujeito são, a formação reactiva, por ter deixado cair a “irmã” devido a uma
distracção, tentando dissimular a sua intencionalidade, colmatado por um final idílico da
história; o deslocamento, uma vez que, não pode agredir directamente a “mãe”, opta por
castigar a “irmã”; e a regressão, porque além de a “rapariga” se manter enquanto filha,
também rivaliza com a “irmã”, como se estivesse ainda na infância. A rapariga é denominada
de “rapariga”, sendo percepcionada enquanto infantil, imatura, e dependente da figura
materna, rivalizando com a “irmã” pela atenção e amor desta. A figura materna é denominada
de “mãe”, que é percepcionada enquanto superegóica, ao puni-la de modo austero, castradora,
e culpabilizante para a filha. A “irmã” é considerada pela “rapariga”, uma rival, um obstáculo,
que a separa da atenção e amor total da figura materna, simultaneamente, indicia uma recusa
da própria maternidade.
Sujeito 110 – 10” Contar uma história? Começa-se era uma vez ou coisa assim? Era uma vez,
uma mãe muito irresponsável, ela não, não fazia as suas responsabilidades, dizia sempre para
a sua filha fazer as suas responsabilidades. Um dia, a mãe estava a ler uma história, a ler um
livro, e a sua filha a pegar no irmão quando ele começou a chorar, a mãe ficou no seu lugar e
não disse nada. A filha olhou para ela com um ar, uma cara muito chateada. Disse a filha para
a mãe: “mãe o menino tá a chorar, o que faço?” mas a mãe não disse nada, continuou na
mesma. A filha ficou muito chateada e levou o irmão para o quarto. A mãe reparou que a filha
não lá estava e foi ter com ela. A mãe perceber que a filha tava a fazer todas as tarefas dela e a
partir daí ajudou-a. 4`10”
Procedimento: começa a sua história, com dois pedidos de ajuda ao clínico (C/C2), seguida
de um afastamento têmporo-espacial (A2 4), denegrindo a personagem mãe. Faz um novo
afastamento têmporo-espacial (A2 4), introduzindo um afastamento entre a mãe e os filhos,
uma vez que está a ler um livro (A2 13), mas é estabelecida uma relação entre a rapariga e o
bebé afectuosa. São expressos afectos fortes (B2 4) da parte da filha, quando o bebé chora e a
mãe não o contém, introduzindo um relato em diálogo (B2 3) procurando o apoio da mãe que
continua a ler (C/N4), não contendo o filho e permanecendo desinteressada, tendo a sua filha
de o acalmar e conter, substituindo a mãe nessa tarefa, continuando “muito chateada” (B2 4).
Após verificar que estava sozinha é que se apercebeu da sua negligência e foi ter com a filha,
ajudando-a nas tarefas que seriam suas. Termina com a realização mágica do desejo (B2 7).
Análise: o sujeito 110 inicia a sua resposta, com um pedido de ajuda ao clínico, colocando-se
numa atitude anaclítica, faz um afastamento têmporo-espacial, dando o anonimato da figura
materna, que é caracterizada enquanto “ (...) uma mãe muito irresponsável (...)”. A “mãe”
delega todas as suas responsabilidades na “filha”, inclusive a função materna. O sujeito faz
um afastamento têmporo-espacial, a “mãe” está a ler, quando o bebé começa a chorar, esta
manteve-se no seu lugar, sem expressar alguma reacção e sem conter o bebé. A sua “filha”,
fez um ar recriminatório, ficando zangada com a passividade e desinteresse da “mãe”,
perguntando-lhe o que haveria de fazer para conter o bebé, “mãe o menino tá a chorar, o que
faço?”, porém, não obteve resposta. Há uma inversão de papéis, relevante tanto para o facto
de se entender aqui uma má imago materna (abandónica e negligente) como para o facto de se
verificar a projecção da capacidade materna e de contenção, que colmatam, muito em jeito
também de rivalidade materna, a ausência e as falhas da figura materna.
O mecanismo de defesa utilizado é a regressão, assiste-se quase que a uma troca de papéis,
entre “mãe” e “filha”. A rapariga é denominada de “filha”, sendo ela que tem de desempenhar
as funções da sua “mãe”. Desse modo, é percepcionada enquanto hipermadura, responsável e
capaz de assumir a função materna, ao ter de substituir a “mãe” nos cuidados maternos. A
“filha” não se identifica com a “mãe”, há um jogo de culpabilizações mútuas. A figura
materna é denominada de “mãe”, sendo caracterizada enquanto uma má imago, irresponsável,
dependente, passiva, ausente, e negligente. Há uma tentativa de reparar a má imago materna,
mas a projecção agressiva é tão forte que essa reparação é insuficiente, a “mãe” não assume
por completo o seu papel, tendo de necessitar do auxílio da filha. Por outro lado, poder-se-á
dizer que há também alguma rivalidade entre mãe e filha, porque a filha é descrita com uma
hipermaturidade, é idealizada, e quando finalmente a “mãe” quer assumir o seu papel tem de
permanecer com a ajuda da filha, está inerente a ideia de que a filha consegue suplantar a
“mãe” nos cuidados maternos.
Sujeito 111 – 12” Era uma avó que tava a contar uma história à menina e enquanto a avó
contava a história, a menina embalava o bebé, supostamente é isso. (?) O bebé é da mãe desta
menina que está aqui. (?) A avó acabava de contar a história e a menina ia pôr o bebé naquela
coisa como se chama, não é carro, berço. 1`53”
B2 1; A2 4; C/Fo3; B2 8; B1 1; B1 2; C/Fa2; B2 2; B2 8;
Procedimento: inicia a história com uma entrada directa na expressão (B2 1), faz um
afastamento têmporo-espacial (A2 4), faz um anonimato da personagem mais velha (C/Fo3)
que descreve enquanto avó, numa posição relacional, uma vez que está a contar uma história
aos netos, enquanto a rapariga continha o bebé a seu colo, fazendo um comentário (B2 8), e
construindo uma história à volta de uma fantasia pessoal (B1 1). Descreve o bebé como sendo
da mãe da rapariga, introduzindo desta forma um personagem que não figura na imagem (B1
2). Termina o relato com uma fabulação fora da imagem (B2 2), descrevendo que após o fim
da história da avó, o bebé é colocado no berço, fazendo um comentário (B2 8) por
inicialmente não se conseguir lembrar do termo correcto.
Problemática: não é dado um conflito, uma vez que a “menina” desempenha a função de
substituta materna, na presença da sua “avo”, figura esse na qual é projectada a mãe ideal, de
modo, a não haver rivalidade nem culpabilidade.
Análise: o sujeito 111 inicia a sua resposta com uma entrada directa na expressão, dando uma
precaução verbal e o anonimato da figura materna, que denomina de “avó”. A “avó”, relatava
uma história à “menina”, enquanto esta, por sua vez, embalava e continha o “bebé”, deste
modo desempenhava o papel de substituta materna, fazendo o sujeito de seguida, um
comentário. O sujeito refere que o “bebé” é irmão da “menina”, deste modo, não há
culpabilização, nem conflito. O sujeito termina a história, tendo a “avó” acabado a sua história
e a “menina” colocando o irmão no berço. Não é dado um conflito nesta história, porque o
“bebé” é irmão da “menina”, e a figura materna é a “avó” e não a mãe da “menina”,
permitindo que possa desempenhar o papel de substituta materna. Dessa forma, também não é
dada uma solução.
O mecanismo de defesa utilizado é o deslocamento da figura materna para a avó, que permite
colocar-se no lugar da mãe (entre a avó e o bebé), sem que tenha de haver a rivalidade com a
mãe, e ao mesmo tempo que permite também substituir a mãe pela avó, indiciando a
insuficiência relacional da primeira. A rapariga é denominada de”menina”, sendo
caracterizada enquanto imatura, e infantil deseja assumir o papel materno, identificando-se à
“avó” e também à sua mãe, embora só o consiga assumir na ausência desta, está inerente o
desejo de a substituir nos cuidados maternos. A figura materna é denominada de “avó”, de
modo a haver um distanciamento, para que a “menina” possa assumir o papel materno na
ausência da sua mãe, assim não existe culpabilidade nem conflito, ou seja, rejeita a figura
materna substituindo-a pela mãe ideal. Esta substituição da mãe pela “avó” poderá ser
indicador de uma má imago materna ou pelo menos superegóica, tendo a “menina” receio da
retaliação desta.
Sujeito 112 – 24” Era uma vez, uma senhora que tinha uma filha… que já era mãe, e essa
senhora estava a ler um livro para ela saber tratar do filho dela. (?) A mãe punha-a fora de
casa, porque ela não a queria ouvir. 1`59”
Procedimento: começa a história com uma entrada directa na expressão (B2 1), através de um
afastamento têmporo-espacial (A2 4), isolando as personagens (A215) e dando o anonimato
das mesmas (C/Fo3), seguida de uma pausa intra-relato (C/Fo1) de modo defensivo.
Estabelece o tipo de relação funcional entre as personagens, uma vez que, o ensinamento é
dado através do livro (A2 13), indicando a transmissão de conhecimentos maternos, de outrem
para a mãe e desta para a sua filha. Conclui havendo uma mudança brusca no decurso da
história (A2 14) de forma dramatizada e coma expressão verbalizada de afectos fortes (B2 5,
B2 4) com rejeição da mãe perante o desinvestimento da filha.
Análise: o sujeito 112 começa a sua história, com uma entrada directa na expressão, através
de um afastamento têmporo-espacial, e dando o anonimato da figura materna, que designa de
“ (...) uma senhora (...)” e da rapariga “ (...) uma filha (...)”. Estabelece uma relação entre as
personagens, tratando-se de “mãe” e “filha”, dando em seguida um silêncio intra-relato,
revelando alguma ansiedade. Continua a sua história, dizendo que a rapariga já havia acedido
à maternidade, estando a sua “mãe” a transmitir-lhe o ensinamentos de como cuidar do bebé,
através de um livro, observa-se assim, um distanciamento. Verifica-se uma tentativa por parte
da “mãe”, em tentar que a “filha” siga o seu modelo materno, ou seja, seja uma mãe como ela.
Após lhe ser questionado que fim daria à história, o sujeito conclui tendo a “mãe” punindo a
“filha” expulsando-a de casa, porque esta não estaria interessada em a ouvir.
Observa-se uma ambivalência na imago materna, uma vez que, no início do relato a mãe
surge como uma figura presente e apoiante, que ajuda a cuidar nos cuidados maternos, no
entanto, essa imagem é alterada, numa mudança brusca de registo, do controlo
intelectualizado para o impulso da agressividade da mãe para a filha, que evidenciam uma
imago materna repressiva e castradora. O conflito manifestado nesta história, é entre mãe e
filha, devido ao desejo de a “mãe” querer que a “filha”, seguisse o seu modelo materno, i.e.,
fosse uma mãe igual a si, e a “filha” que se recusa a identificar e a seguir esse mesmo modelo,
preferindo assumir a função materna de modo diferente. Essa diferença de modelos conduz à
rejeição da “filha”, por parte da sua mãe”, como forma de castigo, por não aceitar a sua
dissemelhança na função materna. Há assim uma posição mais autónoma e adulta, porque a
personagem central assume a função materna, querendo ser uma mãe diferente da sua.
Não é dada uma solução para resolver o conflito, ou seja, sujeito não é capaz de reparar a
relação entre “mãe” e “filha”. O mecanismo de defesa utilizado pelo sujeito é a
intelectualização, uma vez que, embora seja estabelecida uma relação entre os personagens,
esta é destituída de afectos, e centrando-se no modo de pensar e no comportamento a seguir.
A defesa intelectual falha no final do relato, dando espaço para o impulso agressivo numa
projecção que no início do relato não surgia explícito, e que se refere à intencionalidade de
fuga e separação da filha em relação à mãe, e da sua fantasia de rejeição perante o seu desejo
de individuação. O sujeito denominou a personagem rapariga de “filha”, que se recusa a
identificar com a sua “mãe” na função materna, assumindo por isso, essa função plenamente,
colocando-se num papel adulto, autónomo e independente. A figura materna é denominada de
“senhora”, de modo a haver um distanciamento e uma não identificação, por parte do sujeito,
face a esta personagem.
Sujeito 113 – 6” (ri) É um bebé ao colo? A mãe está a contar uma história ao filho para
adormecer, não sei. Esta rapariga parece um bocado chateada por estar ali, se calhar é filha da
senhora e tá com ciúmes por ser tão nova, não sei! (?) A filha ou a empregada está a contar a
história ou a mãe para adormecer. 1`50”
Análise: o sujeito 113, começa por utilizar a defesa maníaca, e faz um pedido de ajuda ao
clínico, devido à angústia sentida, referindo-se ao bebé/boneco. Começa a relatar a sua
história, estabelecendo uma relação entre a figura materna, que é denominada de “mãe”, e o
bebé/boneco, que é denominada de “filho”, baseada na intelectualização e destituída de
afectos, no sentido de o conter e o adormecer, fazendo em seguida uma denegação. Refere
que a rapariga, “ (...) parece um bocado chateada por estar ali (...)”, sente-se excluída da
relação entre a “mãe” e o irmão, ficando com “ciúmes”, devido à sua imaturidade, fazendo
uma nova denegação. Conclui, dando uma confusão de identidades, sobre quem adormeceria
o bebé, inserindo uma personagem que não consta na imagem, a “empregada” de modo a
denegrir e a desvalorizar a “mãe”, por ter tido um outro filho, que a substituiu.
Os mecanismos de defesas utilizados são, a defesa maníaca, o riso, surge logo no início como
reacção à angústia que a imagem lhe suscita; e a negação, porque a rivalidade, os ciúmes e a
zanga em relação à “mãe” é tão forte, que tem necessidade de negar o que elaborou, para se
conseguir conter. A rapariga é denominada de “rapariga”, sendo percepcionada enquanto
imatura, infantil, tendo dificuldades em aceitar o irmão. A figura materna é denominada de
“mãe”, sendo percepcionada enquanto abandónica e negligente, não estabelece uma relação
com a filha, apenas está interessada no bebé, ou seja, enquanto uma má imago materna. A
“rapariga” sente-se excluída, concluindo a história colocando a “mãe” num papel de
empregada, inferiorizando-a. O irmão é percepcionado enquanto um intruso, que vem ocupar
o seu lugar, em relação à mãe.
Sujeito 114 – 9” Parece uma menina nova, com um bebé nos braços, uma senhora a ajudá-la e
a menina parece preocupada... mais... a senhora estava a contar uma história para adormecer o
bebé, para ajudar a menina. (?) O bebé acho que é da menina. A menina fica feliz com o bebé
e tem todas as ajudas que precisar. 2`07”
Procedimento: inicia o discurso com uma precaução verbal (A2 3), faz o anonimato das
personagens (C/Fo3), a personagem central é descrita enquanto infantil “ (...) menina nova
(...)” e a personagem mais velha “ (...) uma senhora (...)”, que implicitamente seria a mãe da
rapariga. Continua estabelecendo uma relação funcional entre as personagens (“menina” e
“senhora”) face ao bebé, faz uma expressão de afectos à mínima por parte da “menina” (A2
18), seguida de duas pausas intra-relato (C/Fo1) de modo defensivo. Faz uma
intelectualização (A2 13) de modo a estabelecer uma relação entre a senhora e o bebé, para o
poder adormecer e também para auxiliar a “menina”, quase no sentido de conter o bebé, visto
que a personagem jovem não consegue ou é incapaz de o conseguir. Conclui com a realização
mágica do desejo (B2 7), com o apoio da “senhora”, ela consegue cuidar do bebé e ser feliz,
está quase implicitamente o desejo de após o consentimento da mãe e com o seu auxilio ela
consegue finalmente identificar-se com o papel materno e desempenhá-lo.
Problemática: centra-se na rapariga, que foi mãe precocemente, sentindo-se culpada por tal
ter acontecido, e também está subentendido a incapacidade e a imaturidade da “menina”, em
cuidar do bebé, necessitando do auxílio da mãe (senhora).
Análise: o sujeito 114 inicia a sua história com uma entrada directa na expressão, dando uma
precaução verbal e o anonimato da rapariga que denomina de “ (...) uma menina nova (...)”,
evidenciando a sua infantilidade e imaturidade. A “menina” está a segurar “ (...) um bebé
(...)”, e tem “ (...) uma senhora a ajudá-la (...)”, deste modo, isola as personagens, não
estabelecendo uma relação entre elas, de modo a distanciar-se e a evitar se identificar com as
mesmas, tornando tudo banal. A “ (...) menina parece preocupada (...)”, porque se sente
imatura e incapaz de assumir o papel materno, necessitando de apoio, que encontra nessa
“senhora”. O sujeito faz um silêncio intra-relato e um comentário, como se estivesse a tentar
lembrar-se do que poderia acrescentar, e continua o seu relato, dizendo que a “senhora” estava
a conter o bebé e a adormecê-lo, para ajudar a “menina”, revelando uma vez mais, a
incapacidade e imaturidade desta.
O sujeito indica que o “bebé” pertence à “menina”, e conclui a sua história, com a realização
mágica do desejo, permanecendo ambos felizes, tendo sempre o apoio de um outro objecto,
provavelmente da “senhora”. Desta forma, a “menina” mantém-se no seu papel de filha,
delegando a função materna na sua mãe, que designa de “senhora”, e não se assume
totalmente enquanto mãe, uma vez que esta a ajuda. O conflito expresso nesta história é
intrapsíquico, face à maternidade precoce da “menina”, que se assume enquanto imatura para
assumir o papel materno, delegando tal função na “senhora”. A solução utilizada pelo sujeito
é a realização mágica do desejo, ficando mãe e a filha felizes, e a solução de conflito por
ajuda de dependência exterior, porque necessita de manter uma relação baseada na
dependência da “senhora”. Os mecanismos de defesa utilizados são, o isolamento, uma vez
que, entre os personagens não é estabelecida uma relação, com a excepção da “menina” e do
“bebé”; e a regressão, mantendo-se a “menina” infantil no lugar de filha, delegando a sua
função materna na “senhora”, que a ajuda incondicionalmente.
Sujeito 121 – 4” Talvez uma casa velha, a mãe estava a contar uma história à filha, enquanto
ela brincava com um boneco ou uma boneca, não sei, parece. Acho que é mais ou menos isso.
(?) A mãe estava a ler-lhe uma história. 1`04”.
A2 3; A2 1; A1 1; A2 11; A2 3; C/Fo5;
Procedimento: inicia o relato fazendo uma precaução verbal (A2 3), descrevendo um
pormenor raramente evocado (A2 1) – a casa – que descreve como sendo velha,
desvalorizando-a e distanciando-a. Continua com uma história próxima do tema banal (A1 1).
A “filha” revela um desinteresse face à história da “mãe”, preferindo brincar com o boneco,
fazendo de seguida, uma denegação (A2 11) e uma precaução verbal (A2 3). O sujeito faz
uma tentativa de recusa (C/Fo5), em relação ao fim da sua resposta, porém, conclui com uma
imposição da “mãe”, que continua a contar-lhe a história.
Problemática: a “filha” está mais centrada em brincar com a sua boneca, ocupando um papel
infantil, enquanto a “mãe” lhe relata uma história à qual a rapariga não presta atenção, quase
como se a “mãe” não fosse nessa altura um objecto interessante. Observa-se uma tentativa de
distanciamento em relação à “mãe”.
Análise: o sujeito 121 começa por dar uma precaução verbal, e por fazer referência à “casa”,
que descreve como frágil, e deteriorada, ou seja, faz um deslocamento. A “mãe” está a relatar
uma história à “filha”, mas esta não está a dar-lhe atenção, preferindo brincar com o seu
“boneco” ou “boneca”, i.e., recusa os conhecimentos da “mãe”, de modo, a permanecer
infantil, evitando crescer. O sujeito dá novamente uma precaução, e faz uma tentativa de
recusa, concluindo a sua resposta, continuando a “mãe” a ler a história à “filha”. Observa-se
assim, uma tentativa de imposição da “mãe”, que quer a atenção da “filha”, ignorando a
vontade desta. Não é elaborado o conflito, embora haja uma tentativa de recusa dos
ensinamentos maternos, de modo, a evitar crescer, não sendo, por isso dada a solução do
conflito, apenas a imposição e insistência da “mãe”, em continuar a relatar a história.
O mecanismo de defesa utilizado é a negação, sendo elaborada uma história muito restritiva.
A figura materna é denominada de “mãe”, sendo percepcionada enquanto pouco contentora,
distante e persistente, tentando impor a sua vontade à “filha”, de modo subtil. A rapariga é
denominada de “filha”, sendo imatura e infantil, tentando adiar crescer, e para isso, não dá
atenção ao que a “mãe” lhe tenta transmitir, estando a brincar com o seu boneco, sendo
também uma forma de evitar um possível conflito com esta.
Sujeito 122 – 12” É para contar uma história sobre isto? Era uma vez, uma menina que tinha
uma filha, mas ainda era muito nova. Parecia estar muito triste, porque foi uma gravidez
indesejada. Como só tinha a ajuda da mãe, ficava muito preocupada sem saber... sem saber
como criar a filha. (?) Por um lado está muito contente, por outro não, porque foi mãe muito
nova. 2`15”
Análise: o sujeito 122 inicia o seu relato, com um pedido de ajuda ao clínico. Faz um
afastamento têmporo-espacial, dá o anonimato da rapariga, que designa de “ (...) uma menina
(...)”, que havia acedido à maternidade precocemente “ (...) era muito nova”. O sujeito faz
uma precaução verbal, ao abordar o sentimento depressivo, devido à maternidade indesejada,
sendo esta, considerado um obstáculo em relação aos desejos da “menina”. A “menina”,
revela uma dupla preocupação, relativamente à sua maternidade, por um lado, apenas tem o
apoio da sua “mãe”, que surge enquanto último recurso, o que poderá indicar, que esta é
insuficiente, incapaz de conter, e com a qual, não se identifica. Por outro lado, a maternidade
conduz a sentimentos depressivos, de culpabilidade, de rejeição e de incapacidade, por ser
ainda imatura, levando-a ao conflito intrapsíquico.
O sujeito conclui a sua história, dando uma ambivalência entre a realidade e a fantasia, ou
seja, entre o facto de ter de assumir o papel materno, tendo de cuidar da sua “filha”, e o seu
desejo de não querer crescer. Está latente o desejo de ser mãe, mas no futuro, o facto de tal ter
ocorrido precocemente, leva-a a sentir-se incapaz de assumir tal responsabilidade, tendo de
abandonar a sua infância. O conflito presente nesta história é intrapsíquico, motivado pela
gravidez precoce, sendo vivenciado por sentimentos depressivos, de imaturidade e
culpabilidade, preocupando-se com a capacidade de desempenhar o papel materno. A solução
encontrada é dada através da dependência de ajuda exterior e da ambivalência, entre a fantasia
e a realidade, ou seja, entre o desejo que tinha em ser mãe, e a realidade de ter acedido à
maternidade precocemente, o que a leva a questionar a sua capacidade materna.
Sujeito 123 – 3” Ai meu Deus, não sei! Isto faz-me lembrar uma história de uma criança que
teve outra criança!... (?) Não sei, não sei a sério! Não sei. (?) Por um lado era mau, porque ela
é muito criança, não sei qual é o final. 1`53”
Procedimento: o tempo de latência é muito baixo, começa com uma exclamação (B2 8),
exagerada (B2 4) e dramatizada (B2 5). A imagem leva-a a recordar de uma referência
pessoal (B1 1) que não é explicada, e que a deixa muito perturbada, revelando também
imaturidade empregando de seguida um silêncio intra-relato (C/Fo1). Faz uma denegação (A2
11) e uma tendência à recusa (C/Fo5), enquanto defesa, sentindo-se incapaz de elaborar a
história. Termina indicando uma hesitação entre interpretações diferentes (A2 6), mas refere
apenas o lado negativo, enfatizando novamente a incapacidade e imaturidade da personagem e
a sua incapacidade face a material que sente enquanto muito angustiante. Faz uma
escotomização da figura materna (E1), poder-se-á dizer que devido a ser percepcionada
enquanto mau objecto, porque não contem e não serve de suporte. Verifica-se uma
desorganização e dificuldade em dar uma resposta, identifica-se maciçamente com a
personagem com grande ansiedade. A rapariga é vista como muito infantil, que não sabe
tomar conta do bebé, ainda está muito dependente do mau objecto materno. Verifica-se uma
ambivalência e uma angústia muito grande ao longo do discurso.
Análise: o sujeito 123 começa a história com uma entrada directa na expressão, e com uma
interjeição dramatizada, revelando uma grande angústia face ao cartão, seguida de uma
denegação. O sujeito continua, fazendo uma alusão, a uma história que conhecia, “ (...) de
uma criança que teve outra criança!...”, ou seja, a rapariga denominada de “criança” acedeu à
maternidade precocemente o que conduziu a uma angústia muito grande. Há uma
identificação projectiva muito grande face à personagem, o que a impediu de desenvolver
mais a história. A maternidade é vivenciada enquanto um corte no desenvolvimento normal
da “criança”, o que a obrigaria a crescer e assumir o papel adulto, para o qual ainda não
estaria preparada. A maternidade é percepcionada com muitos fantasmas, que poderão estar
relacionados com o facto de nesta idade haver a reemergência pulsional e o consequente
acesso há sexualidade.
A solução utilizada foi a ambivalência, tenta dar dois finais diferentes, mas expressa apenas o
final negativo, manifesta assim o choque e a recusa da função materna, face à precocidade do
acesso à maternidade. Os mecanismos de defesa utilizados pelo sujeito foram, a negação,
tentando evitar a elaboração do que havia imaginado; e a regressão, porque embora haja a
escotomização da figura materna, a rapariga é percepcionada enquanto “criança”. O sujeito
denomina a rapariga de “ (...) muito criança”, reforçando a sua infantilidade, imaturidade,
ingenuidade e incapacidade para assumir o papel materno. O bebé também é designado de
“criança”, no sentido de colocar ambas as personagens inseridas ainda na infância, realçando
que são ambas muito novas. É devido a esta diferença mínima de idades que se verifica o
choque e a desorganização desta resposta. A figura materna é escotomizada, provavelmente
de modo a não haver uma maior culpabilidade face à maternidade precoce.
Sujeito 124 – 17” Isto é o quê? Um boneco ou um bebé? A mãe deve estar a falar com a filha,
não sei ou a dar conselhos. Não sei mais. (?) Feliz (?) A miúda tinha um bebé e a mãe ajudava
e depois dava-lhe conselhos 2`10”
Problemática: a mãe surge como função anaclítica em que ensina a filha a ocupar um papel
materno face ao bebé. Há uma ambivalência em relação à posição mãe ou filha.
Análise: o sujeito 124 começa a sua resposta, com um pedido de ajuda ao clínico, referindo-se
ao bebé/boneco, de modo, a confirmar se se trata de um bebé ou de um boneco. Inicia a sua
história, estabelecendo uma relação entre as personagens, tratando-se de “mãe” e ”filha”,
estando a primeira a transmitir alguns conselhos a esta última. O sujeito faz uma tentativa de
recusa, mas conclui a história dizendo que as personagens iriam ter um final “feliz”, fazendo
deste modo, uma formação reactiva. A sua defesa não se consegue manter e revela, que a
“miúda” havia acedido à maternidade e que a mãe lhe estaria a dar conselhos, para que
pudesse aprender a cuidar do bebé, e a desempenhar o papel materno., ou seja, estava a
aprender a ser mãe.
Não é elaborado um conflito entre mãe e filha, uma vez que, a mãe a está a aconselhar, mas
há um conflito intrapsíquico, implícito pelo uso da defesa de denegação e a recusa “ (…) não
sei (…)”, “não sei mais”, na tentativa de não elaborar a maternidade, revelando uma
culpabilidade, que se poderá dever ao facto de ter de abandonar precocemente a sua infância
para desempenhar um papel adulto. A solução utilizada é a solução do conflito por
dependência de ajuda exterior, porque a “miúda” necessita do apoio da “mãe” para aprender a
ser mãe e a cuidar do bebé, identificando-se com o modelo materno desta. Os mecanismos de
defesa utilizados são, negação, de modo, a evitar expressar a maternidade da “miúda”; a
formação reactiva, em relação a ser um final feliz; e a regressão, porque a “miúda” permanece
enquanto filha, dependente do auxílio materno.
O sujeito 124 designa a rapariga, inicialmente de “filha”, mantendo-se numa posição infantil e
dependente, e posteriormente de “miúda” ao revelar a maternidade desta, de modo, a manter a
infantilidade e a imaturidade, mas também desvalorizando-a. A figura materna é denominada
de “mãe”, sendo percepcionada enquanto uma boa imago, ajudando a filha a cuidar do bebé e
transmitindo-lhe o seu modelo materno. É dada uma ambivalência em colocar a rapariga
enquanto filha ou enquanto mãe. Embora inicialmente, não assuma completamente a sua
função materna, porque carece do auxílio da mãe, devido à sua imaturidade, está implícito a
preocupação em aprender a desempenhar totalmente tal papel, logo, há a fantasia da
maternidade. Há um movimento progressivo, no caso do sujeito 124, em que apesar de a
rapariga regredir ao papel de filha, tal deve-se à necessidade de apoio e ao facto de querer
aprender a desempenhar o papel materno, para depois o assumir plenamente, está assim
implícito o desejo de ser mãe e de desempenhar tal papel, não delega tal função na mãe. Deste
modo, tal regressão não é para se manter simplesmente enquanto filha, mas um recuar para
poder progredir, ao aprender com a sua mãe a ser mãe, assumindo uma posição adulta.
Sujeito 125 – 32” Estão a ler não estão? Elas estão a ler, a mãe parece estar a contar uma
história à filha, mas a filha parece estar um bocadinho a leste da história que a mãe está a
contar. Parece não estar a gostar muito. A mãe está a ficar um bocadinho aborrecida com o
comportamento da filha, mas vai continuar a contar a história até ao fim. Quando acabar, vai
tentar começar outra do livro, mas a filha não vai deixar porque já está farta de ouvir a mãe a
contar histórias, porque acha que já é suficientemente grande para estar a ouvi-las. Depois sai
da sala e vai brincar para o jardim com o boneco talvez. Então aí a mãe fica furiosa. 3`34”
Procedimento: inicia a resposta com um tempo de latência alto (C/Fo1), e com um pedido de
ajuda ao clínico (C/C2). Há uma relação baseada na intelectualização (A2 13), porém,
verifica-se uma falha na comunicação, tendo cada personagem tem um desejo diferente (B2
6), sendo confirmado esse desinteresse pela postura da “filha” (C/N4). Há uma tentativa de
afastamento da “filha” em relação à “mãe”, o que indicia o processo de individuação (C/Fa3),
e uma expressão de afectos à mínima (A2 18) por parte da “mãe” em relação ao desinteresse
da “filha”, embora continue a relatar a história. Após ter concluído a história, a mãe tenta
relatar outra na tentativa de obter a atenção da filha, contudo, tal tentativa é rejeitada (B2 6),
havendo uma expressão de afectos fortes (B24) da parte da filha, sendo assim projectada
alguma agressividade no sentido da individuação face à mãe. Embora a “filha” recuse as
histórias, mantém-se infantil ao ir brincar com o boneco para o jardim (B2 2), sendo dado em
seguida uma precaução verbal (A 2 3). A história termina com um a expressão de afectos
fortes (B 2 4), por parte da mãe.
Análise: O sujeito 125 começa por fazer um pedido de ajuda ao clínico. Coloca as
personagens a ler, mas de seguida, rectifica estando apenas a “mãe” a relatar uma história à
“filha”, baseando a relação entre as personagens na intelectualização. A “filha” além de estar
desinteressada, revela também o seu desagrado face à história, e a “mãe” embora se aperceba
e fique “aborrecida” insiste em continuar o relato, e inclusive em começar uma outra história.
A “filha” recusa ouvir esse novo relato, considerando que este é desadequado e infantil, o que
a leva a ir para o “jardim” brincar com o seu “boneco”, ou seja, permanece infantil, apenas
necessita de se afastar do controle materno e dos conselhos maternos, porque a imago é
insuficiente e dependente. Observa-se assim, a um conflito entre “mãe” e “filha”, motivado
pela tentativa de fuga desta ao controle materno, através do afastamento espacial, uma vez
que, vai sozinha para o jardim, e não o movimento de autonomia, porque esta quer manter-se
infantil. A imago materna é percepcionada como dependente, zangando-se ao ser rejeitada.
Não é dado uma solução, apenas a reacção da “mãe” face à rejeição da “filha”. A figura
materna é denominada de “mãe”, sendo percepcionada enquanto dependente, que deseja
impor a sua vontade, mesmo indo contra a da “filha”, e ao ser rejeitada, fica “furiosa”, ou seja
não é capaz de suportar a rejeição. A rapariga é denominada de “filha”, infantil e imatura, que
rejeita os ensinamentos e o controle maternos, desejando manter-se infantil. Não se observa,
uma identificação à mãe na sua função materna, embora a fantasia de ser mãe possa estar
latente no facto de brincar com o boneco, sendo ainda uma fantasia muito edipiana.
Sujeito 126 – 11” O que é que quer que eu lhe diga? Não sei! Uma rapariga com um bebé ao
colo. Parece que tem uma mãe ao lado com um chapéu na mão, estão sentadas num sofá. A
rapariga parece tar pouco interessada com aquilo que tem na mão. (?) Não sei! Talvez a miúda
ficasse com o bebé, ficasse mais interessada, com os pais a ajudarem. 2`19”
Procedimento: inicia a resposta com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), talvez no sentido
defensivo face a alguma ansiedade face ao cartão. Continua revelando uma incapacidade em
continuar (C/Fo5), dando de seguida uma resposta em que começa com uma precaução verbal
(A2 3) e o anonimato das personagens (C/Fo3), “ (...) uma rapariga (...)”, “ (...) um bebé (...)”
e “ (...) uma mãe (...)” que não a sua, prossegue evocando um pormenor mal percepcionado
(A2 16) e isola as personagens (A2 15). Dá uma precaução verbal (A2 3) e uma descrição
com apego a pormenores raramente evocados (A2 1) e introduz um elemento que não consta
da imagem o “chapéu”.
Dá novamente uma precaução verbal (A2 3) e centra-se na postura da personagem para
justificar o afecto presente (C/N4). Contudo, coisifica o bebé ao mencionar “aquilo que tem
na mão”, demonstrando dessa forma o desinteresse e a rejeição da rapariga em cuidar do bebé,
desvalorizando a importância deste e rejeitando a função materna. Após a questão do clínico
sobre o fim que daria à história, dá uma precaução verbal (A2 3) e regride a personagem da
rapariga para a de “miúda”, de modo a torná-la mais imatura e infantil. Termina com a
possibilidade de um investimento e interesse face ao bebé, introduzindo a personagem do pai
que não figura no cartão (B1 2) como mediador do conflito com a mãe, e salientando a
relação anaclítica em relação aos pais (C/M1).
Análise: o sujeito 126 inicia o seu relato com um pedido de ajuda ao clínico, seguida de uma
tentativa de recusa. Começa a relatar a história propriamente dita, dando o anonimato da
rapariga, que designa de “ (...) uma rapariga”, e do bebé/boneco que denomina de “bebé”. Faz
uma precaução verbal, e o anonimato da figura materna, que denomina de “ (...) uma mãe”, e
introduz um elemento que não consta da imagem o “chapéu”. A “rapariga” não demonstra
interesse pelo “bebé”, acedeu à sexualidade e à maternidade, sentindo-se imatura e culpada,
rejeitando o bebé, quase que através de uma negação de que ele existisse, o que se pode
observar na expressão “ (...) aquilo que tem na mão”, não o denomina, de modo a não o tornar
real.
O sujeito conclui a história, podendo a “rapariga” interessar-se pelo bebé, se os seus “pais” a
ajudassem e a apoiassem. A “rapariga” expressa o desinteresse e rejeição face ao bebé,
estando latente a possibilidade de o entregar a alguém. A “rapariga” faz uma regressão ao
papel de filha, não assumindo a função materna, delegando nos “pais” tal função, deseja
manter-se infantil. Há o desejo expresso à mínima de ser mãe, que é ao mesmo tempo
desorganizador, levando à negação do bebé. O sujeito 126 elabora o conflito, tendo a
“rapariga” acedido à maternidade, mas tal é vivenciado com culpabilidade, imaturidade,
desinteresse e rejeição. Utiliza a solução de conflito por ajuda de dependência exterior. O
mecanismo de defesa utilizado é a regressão, uma vez que, a “rapariga”, se mantém no papel
de filha, adiando a função materna.
O sujeito 126 denomina inicialmente a personagem na qual se projectou de “rapariga” e
posteriormente de “miúda” ao manifestar o acesso à maternidade, deste modo, desvaloriza e
denigre-a, colocando-a num papel mais infantilizado. A figura materna é denominada de
“mãe”, surgindo de modo a ensinar a filha a aceitar e cuidar do bebé, sendo percepcionada
enquanto boa, mas numa relação de anáclise. O bebé é rejeitado pela “rapariga/miúda”, sendo
inicialmente descrito enquanto “ (...) aquilo que tem mão (...) ”, há uma coisificação do bebé,
não o nomeando de modo a negá-lo e a não o tornar num ser real, que depende dela. O bebé é
considerado um obstáculo face ao seu desejo da “rapariga/miúda” em permanecer infantil e
ocupando apenas o papel de filha.
Sujeito 127 – 4” Isto é um bebé? Mas é uma história como? É pa dizer o que tá na imagem? É
uma mãe com a filha, não! Isto não é uma mãe, é uma empregada. Tão no sofá, a empregada
parece que tem um livro na mão, deve tar a contar uma história ao bebé que tá na mão da
rapariga. E... a rapariga parece tar triste e pensativa, acho que já tá. (?) Então, não sei. O que é
que eu hei-de dizer? Se calhar a irmã, o bebé ou então ela é adolescente e teve uma filha e não
tá feliz porque perdeu a adolescência. 3`02”
Procedimento: após um reduzido tempo de latência, inicia a resposta com dois pedidos de
ajuda ao clínico (C/C2) e uma necessidade de questionar (C/Fo5), em relação ao bebé/boneco
no sentido de obter uma confirmação e em relação à história. De seguida isola os personagens
(A2 15) desvalorizando a figura materna, que passa se “mãe” a “empregada” e faz uma
descrição (A2 1) mas denega tal afirmação (A2 11). Prossegue descrevendo a imagem (A2 1)
sem elaborar um conflito (C/Fa1). Dá algumas precauções verbais (A2 3) e um silêncio intra-
relato (C/Fo1), descreve a rapariga através da postura significante de afectos (C/N4), há um
anonimato das personagens (C/Fo3) não se sabendo o tipo de relação entre a rapariga, o bebé
e a empregada, e o motivo da tristeza da rapariga não é evocado (C/Fo4), concluindo com
uma expressão de alívio (B2 8).
Após a questão do clínico, dá uma precaução verbal (A2 3), e tem uma necessidade de
questionar (C/Fo5). Continua com uma precaução verbal (A2 3), uma instabilidades nas
identificações (B2 11) e uma pirueta (C/M3), com alteração brusca no decurso da história (A2
14) em que o bebé seria da rapariga e esta estaria triste (A 2 18) com a sua situação, dando
deste modo acento aos conflitos intrapessoais (A2 17).
Análise: o sujeito 127 começa a sua história com um pedido de ajuda ao clínico, colocando-se
numa atitude anaclítica. Começa por estabelecer a relação entre as personagens, como “mãe”
e “filha”, fazendo de seguida uma denegação, afirmando se tratar de “ (...) uma empregada
(...)”, desvalorizando-a. A “empregada”, relata uma história ao “bebé” que a “rapariga”
segura, dando-lhe assim, a sua atenção. O sujeito faz um silêncio intra-relato, e continua,
dizendo que “ (...) a rapariga parece tar triste e pensativa (...)”, deste modo, aborda o
sentimento depressivo e o conflito intrapsíquico. O sujeito faz uma tentativa de recusa, e um
pedido de ajuda ao clínico, concluindo a história revelando que, o “bebé” é da “rapariga”
tendo, esta perdido a sua adolescência, apesar de ainda tentar colocar o “bebé” enquanto irmã.
O sujeito 127 manifesta o conflito intrapsíquico da “rapariga” ao ser mãe do bebé, apesar de
tal apenas ser mencionado no fim da resposta, e após a ter dado enquanto irmã, o que revela
uma tentativa de fuga, sentimentos de culpabilidade e tristeza pela adolescência perdida. O
bebé é percepcionado enquanto um obstáculo ao seu desenvolvimento normal e à vida que
desejava para si. Não é dada uma solução do conflito, uma vez que a “rapariga” fica
conformada com o facto de ter de adoptar um papel adulto. A maternidade é vivenciada com
sentimentos de culpabilidade, imaturidade e tristeza, porque como consequência perdeu a sua
adolescência, sendo obrigada a crescer precocemente, embora esteja latente o desejo de ser
mãe.
A figura materna, também sofre uma mudança de designação, sendo inicialmente dada
enquanto “mãe”, passado de seguida para “empregada”, de modo a denegri-la e a desvalorizá-
la, para poder colocar a “rapariga” enquanto mãe, assim não é elaborado nenhum conflito,
nem rivalidade entre as personagens. A imago materna é percepcionada enquanto insuficiente
e desvalorizada. O “bebé”, passa de irmã a “filha”, devido à defesa que não se consegue
manter. O facto de ser dada enquanto “filha” pode querer significar uma identificação
especular, de modo a facilitar a aproximação entre mãe e filha, uma vez que, inicialmente é
rejeitada, por roubar a adolescência da mãe.
Sujeito 128 – 3” Acho que se trata de uma família pobre, em que a irmã toma conta do irmão
mais pequeno, enquanto a mãe olha para ver se o bebé está contente, está bem enquanto lhes
conta uma história. (?) Que a miúda era responsável porque a mãe tinha... tinha confiança
nela. 1`27”
Procedimento: após um tempo de latência muito reduzido, inicia a resposta com uma
precaução verbal (A2 3), descrevendo a imagem (C/Fa1), em que a rapariga substitui a “mãe”
nos cuidados maternos, revelando desse modo um acento inscrito no fazer (C/Fa3). A “mãe”
dá atenção ao bebé de modo a ver de este se encontra bem (A2 18), voltando de seguida à sua
leitura (A2 13). Não há conflito e os sentimentos são expresso à mínima. Conclui com uma
precaução verbal (A2 3) e com a prerrogativa da irmã mais velha, que deseja aprender a
desempenhar as funções maternas.
Problemática: a imago materna é percepcionada enquanto boa, uma vez que a ensina e
permite que a filha a substitua nos cuidados maternos. A rapariga considera uma honra o facto
de a mãe a considerar responsável, permitindo que esta a substitua.
Análise: o sujeito 128 inicia a reposta com uma precaução verbal, identificando os
personagens como pertencendo à mesma família, caracterizando-a enquanto “pobre”, o que
poderá significar pobreza emocional, falta de afectos. A rapariga está a fazer de substituta
materna, sob o olhar da “mãe”, desta forma não há conflito, nem rivalidade porque a “mãe” se
encontra presente e está-lhe a ensinar a cuidar do “irmão”. Observa-se, uma preparação da
função materna, a “irmã” identifica-se à “mãe” neste papel, seguindo os seus conselhos, deste
modo, há a gratificação da filha que pode ocupar o lugar da mãe, e o facto desta deixar é
considerado uma honra, porque a considera responsável. Em relação ao conflito, este não é
verdadeiramente expresso, uma vez que, apesar de a filha estar a cuidar do seu “irmão”, fá-lo
sobre o olhar atento da “mãe”, não havendo assim um abandono ou negligência da parte desta.
Contudo, esta substituição dos cuidados maternos, por parte da filha, por um lado, leva-a a
desempenhar um papel adulto, mas que ela já consegue desempenhar, podendo-se considerar
uma hipermaturidade, sendo que ela é ainda nova, e assim consegue agradar à “mãe”. Por
outro lado, também satisfaz o seu desejo de substituir o lugar da mãe, com o consentimento
desta, preparando-se para aprender assumir esta função no futuro. A conclusão da história,
revela essa confiança, e responsabilidade da parte da “mãe” em relação à filha, e a
hipermaturidade desta. Verifica-se assim, a prerrogativa da “irmã” mais velha, que gosta de
substituir a “mãe” nos cuidados maternos em relação ao bebé. Todavia, é importante realçar a
pobreza que é mencionado no início da história, que poderá indicar a falta de afectos
existente, tendo a “irmã” o desejo de assumir o papel materno, para colmatar essa carência
emocional do bebé e, simultaneamente a sua, uma vez que a mãe, baseia a sua relação na
intelectualização, e dá atenção apenas ao bebé, e aos cuidados que este está a receber.
O sujeito designa a rapariga inicialmente de “irmã”, que cuida do bebé, sendo responsável, e
capaz de assumir tal função, identificando-se com o seu modelo materno, seguindo os
conselhos da “mãe”. Na conclusão da história denomina a personagem de “miúda”, quase
como se após a identificação projectiva, o sujeito se quisesse distanciar e até denegrir esta
hipermaturidade. A figura materna é denominada de “mãe”, estando a relatar uma história a
ambos, embora esteja a prestar mais atenção ao bebé. A “mãe” encontra-se presente, contudo,
não demonstra nenhuma relação de afecto para com os filhos.
Sujeito 129 – 8” Pode ser... uma mãe que...não! Uma menina que tem de tomar conta da sua
filha porque a mãe... tem de ser uma história história? Então tem uma mãe que não lhes toma
muita atenção. Que é que eu posso dizer mais? (?) eles... pronto a mãe mais gosta mais,
prefere ler em vez de tomar atenção à filha. Não têm pai, quer dizer, podem ter pai mas não
está cá, o pai pode tar a trabalhar, e a mãe em vez de tomar atenção às filhas prefere ler. (?)
Que a mãe depois, a certa altura percebia que tinha de dar mais atenção às filhas, para
aproveitar o crescimento delas, iam passear, muitas coisas. 3`41”
A2 3; C/Fo1; A2 11; C/Fa1; A2 15; C/Fo1; C/C2; C/M3A2 18; C/Fo1; A2 13; C/N1; C/Fo5;
C/Fo1; A2 13; B1 2; A2 8; B2 7;
Procedimento: inicia o relato com uma precaução verbal (A2 3) e dois silêncios intra-relato
(C/Fo1), seguida de uma denegação (A2 11), demonstrando dúvidas. Continua descrevendo a
imagem com apego ao conteúdo manifesto (C/Fa1), isolando as personagens (A2 15),
revelando da parte da “menina” um sentimento de culpa, devido à maternidade precoce,
dando mais um silêncio intra-relato (C/FO1), colocando uma questão ao clínico (C/C2).
Retoma a história, fazendo uma pirueta (C/M3), lamentando a falta de atenção da mãe
demonstrando afectos exprimidos à mínima (A2 18) e acento inscrito na vivência subjectiva
(C/N1), tem uma necessidade de questionar (C/Fo5) seguida de um silêncio intra-relato
(C/Fo1), dá uma intelectualização (preferindo a mãe se abstrair). Introduz um personagem que
não consta na imagem (pai) que é percepcionado enquanto abandonante, seguido de mais uma
precaução verbal (A2 3) e a justificação da ausência deste, e volta a ruminar (A2 8) face ao
desinteresse da mãe, que é vista como abandonante e egoísta. Conclui a história com a
realização mágica do desejo (B2 7).
Problemática: observa-se uma ambivalência, a “menina” que passa de mãe a irmã devido à
culpabilidade. A “mãe” é percepcionada enquanto abandonante e negligente, tendo a
“menina” de a substituir nos cuidados maternos, sendo a forma encontrada para desempenhar
a função materna.
Análise: o sujeito 129 começa o seu relato dando uma precaução verbal, dando um silêncio
intra-relato, o anonimato da figura materna, que denominou de “ (...) uma mãe (...)”, faz
novamente um silêncio intra-relato, e uma denegação. O sujeito dá o anonimato da rapariga,
denominando-a de “ (...) uma menina (...)”, que já é mãe, tendo de cuidar da “filha”, depois
faz um novo silêncio intra-relato, uma denegação, e um pedido de ajuda ao clínico, revelando
uma enorme ansiedade face à imagem. Continua a sua história dizendo que a “mãe” não lhes
dá atenção, desta forma, coloca o bebé/boneco, enquanto irmã, da “menina”, ou seja, regride-a
ao infantilizá-la. Faz um novo pedido de ajuda ao clínico, um silêncio intra-relato e refere que
a “mãe” prefere o prazer intelectual a dar atenção à “filha”. Introduz um personagem que não
consta da imagem, o “pai”, dando inicialmente como morto, mas depois, rectifica e afirma
que está ausente, reforçando novamente o abandono.
O sujeito conclui a sua história, com a realização mágica do desejo, como se a “mãe” tivesse
passado por uma transformação mágica, apercebendo-se de que era uma má mãe, ausente,
negligente e egoísta, e passasse a dar atenção às filhas. O sujeito 129, inicia a resposta dando
uma ambivalência face à “menina”, que é dada enquanto mãe do bebé, porém, de seguida,
coloca tal personagem enquanto irmã, que está a substituir a mãe nos cuidados maternos
devido à negligência desta. O motivo de tal ambivalência, deve-se à culpabilidade sentida em
colocar a “menina” enquanto mãe, o que levaria a um conflito com a sua “mãe”, deste modo,
ao negar essa função, colocando a personagem apenas enquanto irmã, o conflito elaborado,
deixa de ser em relação à maternidade precoce da filha, passando para a negligência da
“mãe”. A solução utilizada, foi a realização mágica do desejo, a “mãe” apercebe-se da sua
negligência e começa a dedicar mais atenção às suas filhas, acompanhando o seu crescimento.
Sujeito 130 – 8” Uma história inventada por mim? Pode ser um rapariga adolescente... (ri)
que vivia numa aldeia e que não tinha dinheiro para comer, vivia numa casa sem condições
nenhumas. Vivia só com a sua mãe e a sua avó, pois, o pai se tinha suicidado, devido aos
problemas alcoólicos que tinha. O pai tinha deixado a mãe abandonada e com dois filhos para
cuidar. Então enquanto a mãe contava histórias ao pequeno bebé... a rapariga mais velha
agarrava-o cuidadosamente... cuidadosamente... enquanto a avó se estava a fazer o jantar com
os poucos ingredientes que tinham embora fossem muito pobres, tinham muito amor para dar.
Acho que é só isto, não sei mais. (?) Eles continuavam com esta vida de pobre mas
continuavam felizes, porque em vez de dinheiro tinham muito amor para dar. 4`18”
Análise: o sujeito 130 começa a resposta, com um pedido de ajuda ao clínico, seguido de uma
precaução verbal, e dando o anonimato da personagem que denomina de “ (...) uma rapariga
adolescente (...)”. Faz um silêncio intra-relato, utiliza a defesa maníaca, e continua a sua
história, contextualizando o sítio onde a “rapariga” vivia, e as suas condições socio-
económicas. A “rapariga” vivia apenas com a “mãe”, e com a “avó”, pois, o “pai” já havia
morrido, introduzindo assim, estas duas últimas personagens, que não figuram na imagem. A
“mãe” estava a contar histórias ao “bebé”, enquanto a “rapariga” o agarrava e continha,
estando a “avó” a preparar a refeição. O sujeito faz algumas formações reactivas,
nomeadamente, no facto de a “rapariga” agarrar o “bebé” “ (...) cuidadosamente...
cuidadosamente... (...)”, e no facto de que “ (...) embora fossem muito pobres, tinham muito
amor para dar”.
O sujeito faz uma tentativa de recusa, mas conclui, com a realização mágica do desejo, dando
um fim idealizado, através de uma formação reactiva, permanecendo todos os personagens
felizes, com muito amor, revelando a permanência da carência afectiva e uma identificação
massiva com a “rapariga”. O conflito centra-se na necessita de amor, e atenção, por parte da
“rapariga”, devido ao seu vazio interior, o que a leva quase a comparar-se com a necessidade
de atenção e amor de um bebé, e ao mesmo tempo, desempenha a função de substituta
materna. A solução utilizada é a solução de conflito por ajuda de dependência exterior, uma
vez que, necessitam permanecer juntos e dependentes, para conseguirem sobreviver. Os
mecanismos de defesa utilizados são a ruminação e a formação reactiva, uma vez que, a
“rapariga” sente muita necessidade de amor, e de atenção, que a sua família não lhe dá, mas
que era o seu desejo receber.
Sujeito 131 – 5” Era uma vez, uma menina que... que tinha um irmão mais novo e que
enquanto a mãe lhe contava histórias, ela pegava nele. Ia ajudando a mãe a cuidar do irmão,
ou porque gostava ou porque a mãe não tinha muito tempo para o irmão e ela tinha e
acarinhava-o e tinha de o amar. (?) A mãe, quando o menino cresceu agradeceu à mãe e à
irmã por ter cuidado dele, devido que a mãe não tinha muitas posses e a mãe tinha de
trabalhar. 2`12”
A2 4; A2 15; C/Fo1; C/Fa1; A2 13; C/Fa3; A2 6; C/M1; A2 10; C/M2; B2 11; A2 13; C/Fo4;
Problemática: a rapariga sente-se imatura para desempenhar a função materna, mas tem de a
assumir e cuidar do irmão, de modo a manter uma relação harmoniosa com a “mãe”.
Análise: o sujeito 131 começa a sua história com uma entrada directa na expressão, através de
um afastamento têmporo-espacial, e dando o anonimato da rapariga, que denomina de “ (...)
uma menina (...)”. O sujeito faz um silêncio intra-relato, e uma hesitação face ao tipo de
relação entre a “menina”, e o bebé, talvez devido a colocar este enquanto filho ou irmão,
decidindo-se por esta última hipótese, que é menos culpabilizante, evitando um conflito com a
figura materna. Continua a sua história, dando o anonimato do bebé/boneco, que é
denominada de “ (...) um irmão mais novo (...)”. A “menina” segurava no seu “irmão”,
enquanto a “mãe” lhe relatava histórias. A “menina” estava a desempenhar o papel de
substituta materna, “ (...) ou porque gostava ou porque a mãe não tinha muito tempo para o
irmão (...)”, ou seja, está latente a ideia de que não há mais ninguém que pudesse tomar conta
do bebé.
Por um lado, é obrigada a cuidar do irmão, tendo de abandonar a sua infância para assumir
um papel adulto, indo contra a sua vontade, sendo a única pessoa disponível para tomar conta
dele, por outro lado, ao obedecer à mãe, mantém com esta uma relação mais próxima, e pode
com a sua autorização, desempenhar o papel desta. O sujeito faz uma formação reactiva, ao
afirmar que a “rapariga” “ (...) tinha de o amar”, ou seja, era obrigada a gostar, cuidar e conter
o “irmão”, não sendo por vontade sua. O sujeito termina a sua história, dando uma confusão
de identidades, começa por referir a “mãe”, mas depois refere que o “menino”, quando
cresceu agradeceu a ambas, por terem cuidado dele. Deste modo, há uma idealização das
figuras maternas, por parte do “menino”, e o reconhecimento do esforço da “menina”, que foi
obrigada a assumir uma posição adulta. Porém, tal também se pode considerar uma formação
reactiva, visto ser reforçado a ausência da “mãe”.
Sujeito 132 – 11” Era uma vez, uma mulher que dava explicações e uma filha com 15 anos e
um com um mês. E quando a mãe tinha que dar explicações, deixou a outra filha a tomar
conta da outra filha. E essa filha não sabia o que fazer à bebé. Passado alguns minutos o bebé
começou a chorar e a irmã não sabia o que fazer, até que a mãe dela chegou a casa, e depois a
mãe dela foi ver, que a bebé tinha a fralda suja e mudou. (?) Não sei. 3`08”
Problemática: a “mãe” é percepcionada enquanto abandónica, uma vez que deixa ambas as
filhas sozinhas. A “filha” mais velha é considerada infantil, incapaz de tomar conta da irmã,
verifica-se uma relação funcional destituída de afectos. A rapariga desempenha o papel de
substituta materna contrafeita, sem recursos para cuidar do bebé, e a mãe não se apercebe
disso.
O conflito presente nesta história, é entre “mãe” e “filha”, sendo a “mãe” uma pessoa ausente,
que não tem tempo para cuidar dos filhos, tendo a “filha” de cuidar da irmã. A “mãe” não
reconhece a imaturidade e incapacidade da “filha” para desempenhar a função materna. A
solução utilizada é a solução do conflito por dependência de ajuda exterior, devido à
imaturidade e incapacidade de contenção da “filha” face ao bebé, a “mãe” quando chega tem
de o conter. O mecanismo de defesa utilizado é a ruminação, à volta da imaturidade e
incapacidade da “filha”, há assim uma banalização do conflito. A rapariga, é denominada de
“filha”, que assume o papel materno forçadamente, porque é ainda muito imatura e infantil,
não tendo recursos para cuidar da “irmã”. A figura materna é denominada de “mãe”, sendo
percepcionada enquanto abandónica, ausente e insuficiente.
Sujeito 133 – 11” O que é isto (aponta para o boneco/bebé)? Então... pode ser uma menina
que tem tristezas e que se agarra às suas coisas mais valiosas, para tentar tirar a raiva que tem
dentro dela, e depois a sua mãe tenta acalmá-la lendo-lhe uma história (ri). A menina vira a
cara para o lado, porque o que lhe tá a apetecer não é ouvir uma história, mas sim resolver o
problema dela. (?) O fim? Ela diz à mãe que precisa de resolver o problema e depois enfrenta-
o. 2`17”
Procedimento: inicia o relato com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), seguida de uma
precaução verbal (A2 3) e de um silêncio intra-relato, podendo revelar alguma angústia, e
outra precaução verbal (A2 3). Prossegue identificando-se projectivamente com a rapariga
abordando o seu aspecto depressivo (A2 18) tendo necessidade de se agarrar às suas “coisas
valiosas” para se conter, face à raiva que sente (A2 17). A figura materna tenta acalmá-la (B2
6) recorrendo a uma intelectualização (A2 13), dá uma defesa maníaca (C/C1). Continua
descrevendo a imagem (A2 1) e a ruminar (A2 8) em torno de um conflito que não é indicado
(C/Fo4). Após a questão do clínico sente necessidade em questionar (C/Fo5), coloca o acento
inscrito nas relações interpessoais (B2 3), terminando novamente a ruminar (A2 8) face o
conflito não indicado (C/Fo4).
Problemática: devido a conflitos intrapessoais que a rapariga tem para resolver nem a sua
mãe consegue contê-la, transmite-lhe um vínculo desadequado, não a ajudando a resolver o
problema, verificando-se desse modo uma relação com a imago materna inadequada.
Análise: o sujeito 133 inicia o seu relato com um pedido de ajuda ao clínico, seguido de uma
precaução verbal e de um silêncio intra-relato. Continua, dando uma precaução verbal, e o
anonimato da rapariga, que designa de “ (...) uma menina (...)”, abordando o sentimento
depressivo e a pulsão agressiva, uma vez que “ (...) se agarra às suas coisas mais valiosas (...).
A sua”mãe” tenta conte-la, lendo-lhe uma história (o sujeito utiliza a defesa maníaca), porém,
a “menina” rejeita tal contenção, porque considera ser demasiado infantil, e o que deseja é
resolver o seu problema. O sujeito conclui, fazendo um pedido de ajuda ao clínico, indo a
“menina” solucionar o seu conflito, que não é manifestado. O sujeito faz a escotomia do
bebé/boneco, contudo, coloca um pedido de ajuda ao clínico, no sentido de confirmar se é um
bebé real ou um boneco, mas depois não o refere na sua história, de modo manifesto.
O bebé/boneco, encontra-se porém, de modo latente na sua história, uma vez que a “menina”
aborda o sentimento depressivo e vivencia um conflito intrapsíquico (que não é revelado)
procurando contenção, uma vez que “ (...) se agarra às suas coisas mais valiosas (...)”. Essa
riqueza à qual se agarra pode ser, por um lado, o boneco, que representaria o objecto
transitivo infantil, mantendo-se no papel de filha, infantilizada e, por outro lado, o bebé real,
seu filho que representaria um prolongamento de si ou um bom objecto de amor. O facto de a
“mãe” lhe tentar contar uma história para a conter e esta recusar, por não ser o vínculo
adequado, sendo muito infantil, poderá indicar que, de facto o bebé/boneco é percepcionado
enquanto seu filho, e que o conflito existente é devido a essa maternidade precoce, embora a
aceite.
Inicialmente consegue percepcionar o bebé/boneco, mas durante a história opta por não o
referir expressamente, apenas de forma latente, talvez de modo a evitar o conflito com a
figura materna, e evitando também uma maior culpabilização. O conflito existente é
intrapsíquico, não sendo expresso, e a solução utilizada, a solução directa do conflito. A
rapariga é denominada de “menina”, salientando deste modo a imaturidade e infantilidade
desta, embora recuse a contenção da mãe, por ser um vínculo desadequado e infantil. A figura
materna é denominada de “mãe”, sendo percepcionada enquanto insuficiente, e incapaz de a
conter. Há a escotomia do bebé/boneco, para a evitar o conflito com a figura materna,
evitando também uma maior culpabilização.
Sujeito 134 – 16” Elas vivem só as duas, e a mãe teve outro filho e a menina quando pode,
ajuda a cuidar dele. Acho que é só. (?) Depois quando ele crescesse ficavam os três muito
felizes. 1`16”
Procedimento: inicia a história com uma entrada directa na expressão (B2 1), descreve a
imagem (C/Fa1), isola os personagens (A2 15) e coloca o acento inscrito no quotidiano
(C/Fa2). Dá uma tendência à recusa (C/Fo5), termina a história com um fim com valor
mágico do desejo (B2 7).
Problemática: relação anaclítica entre mãe e filha, em que a filha ocuparia o seu lugar na sua
ausência. Parece um investimento homossexual, pode ser uma fuga à cena primitiva para ficar
só ela, a mãe e o bebé.
Análise: o sujeito 134 começa a sua história, com uma entrada directa na expressão,
descrevendo e isolando as personagens “mãe” e “menina”, que viviam sozinhas, e que a
“mãe” teria tido um “outro filho”. O facto de viverem sozinhas, e de não ser introduzido um
outro personagem, ou de não haver pelo menos referência a uma relação heterossexual,
conduz a uma negação do papel masculino. Há quase que um investimento homossexual entre
“mãe” e filha, que funcionam como casal parental do bebé, uma vez que, a “ (...) menina
quando pode, ajuda a cuidar dele”, ou seja, quando ela deseja fazê-lo e quando a sua mãe lhe
permite que esta ocupe o seu lugar. Conclui a história com a defesa maníaca, tendo ficado os
três personagens juntos e felizes, é dada uma relação anaclítica entre mãe e filha, que se irá
propagar no futuro, juntamente com o irmão. Não é permitida a entrada de outras pessoas,
nem a autonomia e independência destes personagens.
O sujeito 134 também não expressa um conflito, uma vez que, estabelece uma relação de
casal homossexual e anaclítica entre mãe e filha, negando ou excluindo a figura masculina,
que viria a romper o laço afectivo privilegiado que a “menina” tem com a sua “mãe”. Deste
modo, a “menina” por um lado, mantém-se enquanto filha e numa relação anaclítica com a
mãe, e por outro, ajudaria a mãe, substituindo-a nos cuidados maternos com o bebé, ao
mesmo tempo que satisfazia o seu desejo de possuir um bebé como a mãe, de seguir o modelo
materno da mãe. A conclusão da história, é dada através do fim mágico do desejo, em que
quando o bebé crescesse, os três ficariam juntos e felizes, há assim uma tentativa de manter
este triângulo familiar unido, sem que possa haver separações ou a inclusão de outros
objectos.
Sujeito 141 – 8” Eu não percebo é a imagem. O que é que é isto? (apontando para o
bebé/boneco) Pode ser uma senhora que está a contar uma história ao filho, não sei! Não
sei! Irem dar um passeio. Não sei! 3`55”
C/Fo5; C/C3; C/C2; A2 3; C/Fo3; C/Fo5; A2 11; B2 2; E1;
Procedimento: inicia o relato com uma tendência de recusa (C/Fo5), criticando o material
(C/C3) e com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), revelando uma atitude anaclítica e
alguma ansiedade face ao cartão. Continua com uma precaução verbal (A2 3), dando o
anonimato da personagem “ (...) uma senhora (...)” (C/Fo3), de modo a distanciar-se da
mesma. Estabelece uma relação entre mãe e filho baseada na intelectualização, uma vez que
esta lhe conta uma história. Faz novamente a uma tendência à recusa (C/Fo5) e uma
denegação (A2 11), manifestando sempre uma grande ansiedade. Conclui a história fazendo
uma fabulação fora da imagem (B2 2) ao “irem dar um passeio”, deste modo faz uma fuga à
imagem, que é causador de angústia e de ansiedade. Escotomiza rapariga (E1), talvez devido à
culpabilidade e de modo a evitar um conflito, não conseguindo assumir o papel desta,
baseando a sua história meramente na relação mãe/ filho. Observa-se uma paragem no tempo,
devido ao alto nível de ansiedade. Não se verifica nenhum afecto nesta relação entre mãe e
filho.
Análise: o sujeito 141 começa a sua resposta com uma crítica ao material e um pedido de
ajuda ao clínico, numa atitude anaclítica, de modo a confirmar se o bebé/boneco é um bebé
real ou um boneco. Inicia a sua história, com uma precaução verbal, no sentido de não se
identificar e se distanciar das personagens, dando o anonimato da figura materna que
denomina de “uma senhora”, que está a contar uma história ao “filho”. Estabelece, desse
modo, uma relação entre ambos os personagens, baseada na intelectualização, escotomizando
a rapariga. De seguida, faz uma denegação do que havia contado, revelando alguma ansiedade
face à imagem, concluindo a sua história através da fabulação fora da mesma, ao “irem dar
um passeio”, ou seja, há uma fuga face ao conteúdo latente do cartão, que lhe causa algum
angústia, que pode ser observada no facto de voltar a denegar a sua história.
Parece haver uma identificação com a rapariga, a qual é imediatamente escotomizada, sendo
apenas referida a relação entre mãe e filho, revelando uma incapacidade em assumir o papel
dessa personagem. A causa da ansiedade que é manifestada ao longo da sua resposta, assim
como, o motivo da escotomia da rapariga poder-se-á dever a duas hipóteses, por um lado,
poderá ter percepcionado o bebé, enquanto filho desta, o que causaria um conflito com a mãe
e sentimentos de culpabilidade, porque já havia acedido à maternidade, assumindo-se como
mulher e como mãe, estando ao mesmo nível desta, e questionando-se sobre como iria
desempenhar a função materna. Por outro lado, se percepcionasse o bebé como seu irmão,
poderia ter desencadeado sentimentos de rivalidade, sendo este considerado um obstáculo que
não conseguiria ultrapassar, porque sendo ainda bebé, retirar-lhe-ia a atenção e a relação
privilegiada com a mãe, e sentir-se-ia excluída, uma vez que, o bebé está ao colo da rapariga e
a mãe dirige a sua atenção apenas para ele, e depois leva-o a passear.
O facto de ter colocado o bebé enquanto rapaz, poderá reforçar a ideia de distanciação e não
identificação com o seu filho ou de exclusão de si própria na relação privilegiada que a mãe
mantinha com o irmão. Observa-se uma ausência de conflito, sendo expresso apenas uma
relação entre mãe e filho, destituída de afectos. Contudo, o sujeito não é capaz de elaborar e
desenvolver a história, sendo o bebé, o possível causador da sua ansiedade e angústia, o que
conduz à escotomia da rapariga e ao conflito latente, que poderá ser o conflito com a mãe ou a
rivalidade fraterna. O mecanismo de defesa presente ao longo desta resposta é a negação,
também é importante salientar o pedido de ajuda inicial ao clínico, que revela uma atitude de
dependência e a grande ansiedade que é sentida pelo sujeito.
Procedimento: começa o relato com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), quase como
perguntando se este tem tempo para si, seguido de uma defesa maníaca (C/C1) e de um
silêncio intra-relato (C/Fo1). Descreve as três personagens (C/Fo3) sendo que uma delas (a
boneca) se parte, abordando a agressividade (embora não mencionando quem a parte), o
sentimento depressivo (A2 18) e a culpabilidade. A “mãe” para a conter relata uma história
baseada na rapariga, observa-se desta forma uma relação em espelho (C/N7). Faz uma
precaução verbal (A2 3), e a hesitação entre interpretações diferentes. Após uma hesitação e a
defesa maníaca (C/C1), a boneca reparada fica com a rapariga ao longo do seu
desenvolvimento até à sua morte, quase como se houvesse uma relação de dependência, de
anáclise (C/M1).
Problemática: história de dependência entre mãe e filha, que não é superada ao longo da vida
adulta desta. Há uma permanência na posição de filha sendo destacada a infantilidade,
imaturidade e dependência da “rapariga”, não se vislumbrando uma possível autonomização.
Análise: o sujeito 142 começa por fazer um pedido de ajuda ao clínico “tem tempo?”,
colocando-se numa atitude anaclítica, como se perguntasse se este teria tempo para si, para o
ouvir. Quando tenta começar a sua história dizendo “então” como se se estivesse a preparar
para o que se seguiria, utiliza a defesa maníaca e faz um silêncio intra-relato, revelando
alguma dificuldade em elaborar a história e alguma ansiedade face ao cartão. Inicia a sua
história identificando-se projectivamente com a rapariga, e dando o anonimato da mesma “
(...) uma rapariga (...)”, dando também o isolamento das personagens. Estabelece a relação
entre as personagens, tratando-se de “mãe” e filha, que teriam recentemente comprado uma
“boneca”. Evidencia-se a infantilidade e imaturidade da “rapariga”, que permanece apenas
enquanto filha. Pouco tempo após terem comprado a “boneca” esta “ (...) partiu-se (...)”, não
sendo referido quem a partiu, porém, salienta-se o facto de se tratar de um acto agressivo.
A “rapariga” ficou “ (...) muito triste (...)” com a danificação da sua “boneca”, o sujeito
aborda assim, o sentimento depressivo. A “mãe” tenta contê-la relatando-lhe uma história que
é baseada na história daquela “rapariga”, deste modo, há uma relação especular uma vez que a
“rapariga” se espelha na história que a “mãe” lhe conta. O sujeito faz um silêncio intra-relato,
e continua a história dando uma hesitação entre interpretações diferentes, começa por referir
que a “mãe” iria comprar-lhe outra boneca, mas depois denega tal afirmação e refere que a
“mãe” lhe iria arranjar a “boneca”, e que por isso não precisava continuar triste. Desta forma,
é feita a reparação do objecto mas pela “mãe”, a “rapariga” coloca-se como uma criança
infantil e incapaz de reparar, continuando dependente da “mãe”. Após ser questionado sobre o
fim que daria à história, o sujeito utiliza a defesa maníaca e conclui dizendo que, após a
reparação da “boneca”, a “rapariga” permanecia com esta até à sua morte, ou seja, mantém a
lembrança da “mãe”, sendo a “boneca” é utilizada no sentido transitivo e anaclítico.
O conflito presente nesta história não é revelado, havendo contudo, uma manifestação da
agressividade face à “boneca”, não se sabendo quem a partiu, poder-se-á pensar que terá sido
a “rapariga” e daí ter ficado a sentir-se triste e culpada. A história termina continuando a
“rapariga” dependente mas da sua “boneca”. Os mecanismos de defesa utilizados nesta
resposta foram, a negação, ao optar por reparar a boneca em vez de comprar uma nova; a
formação reactiva, caso tenha sido a “rapariga” a danificá-la; e a ruminação, uma vez que a
história do sujeito gira à volta da “boneca”. O sujeito denominou a rapariga de “rapariga”,
sendo imatura, infantil e dependente, que se coloca no lugar do bebé necessitando que a
“mãe” a contenha, a repare por ela. O facto de poder ter sido a “rapariga” a partir a “boneca”
poderá transmitir a imaturidade em ser mãe, e a dificuldade de se identificar com o papel
materno.
Sujeito 143 – 4” Uma história? Uma senhora estava a contar à sua filha uma história sobre
uma menina da sua idade, da sua filha … hum … a filha não estava a prestar muita atenção,
pois, não estava a mostrar muito interesse, não estava muito interessada na história. A menina
queria ir brincar com os seus bonecos, as suas bonecas em vez de ouvir a história. Mas esta
história seria talvez importante para a menina, pois, tinha um final de moral. Não sei mais. (?)
Que a menina ficava a ouvir para aprender mais sobre a vida. 2`37”
Procedimento: inicia a resposta com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2). Prossegue com o
anonimato da figura materna (C/Fo3) a contar uma história à “filha”, há desta forma uma
relação especular (C/N7), contudo esta revela pouco interesse e atenção ao que a sua “mãe”
tem para lhe contar (A2 18), preferindo ir brincar, dando uma instabilidade de género ao
boneco (B2 11). Contudo, enfatiza a importância da história sendo esta de conteúdo moral que
incide numa jovem da sua idade, mas que a personagem desvalorizou inicialmente. Termina
com uma crítica de si (C/N9), e após uma alternância entre a expressão pulsional e a defesa
acaba por se submeter ao desejo da “mãe”, devido à culpabilidade sentida de ouvir a história e
de aprender a lição que esta tinha subentendida.
Análise: o sujeito 143 começa a sua resposta fazendo um pedido de ajuda a clínico “uma
história?”. Começa a sua história com uma entrada directa na expressão, dando o anonimato
da figura materna, que denomina de “uma senhora (...)”, estabelecendo uma relação entre esta
personagem e a rapariga, tratando-se de mãe e “filha”. A “senhora” relata à sua “filha” uma
história baseada numa “menina” da sua idade, ou seja, está a ensinar a esta como se comportar
nessa idade. A mãe funciona como um espelho para a “filha”, uma vez que baseia a história
na sua própria experiência, desse modo, verifica-se uma relação especular entre ambas as
personagens. O sujeito faz um silêncio intra-relato, e continua a história, referindo que a
“filha” não estaria a dar atenção ao que a “mãe” lhe contava, porque preferia ir brincar com os
“bonecos/bonecas”. Evidencia-se, desta forma, a imaturidade e infantilidade da “filha” que
deseja se manter criança, evitando crescer e se individuar.
Todavia, a história que a mãe lhe relatava “ (...) seria talvez importante para a menina, pois,
tinha um final de moral”, i.e., embora queira prolongar a sua infância, evitando crescer, seria
através desta transmissão de conhecimentos que aprenderia a comportar-se e a fazer as
melhores opções no futuro. O sujeito faz uma tentativa de recusa e após lhe ser questionado
sobre que final daria à história, conclui tendo a “menina” se submetido à vontade da mãe,
ouvindo a história até ao fim. O conflito expresso nesta história, centra-se entre a defesa da
“menina” ao evitar crescer e se individuar e na vontade da mãe para que esta se autonomize,
tendo sempre como modelo o seu. Verifica-se uma relação especular entre mãe e “filha”,
através da transmissão de conhecimentos, no sentido da individuação. A solução encontrada é
a por compromisso viável, uma vez que a “menina” acaba por se submeter à vontade da mãe e
houve a história, podendo brincar após esta estar concluída, o que permite agradar à mãe
(superego) e a si (id).
O mecanismo de defesa utilizado nesta resposta foi a regressão, uma vez que a “menina” se
mantém infantil apesar da mãe a estimular para a autonomização. O sujeito denominou a
figura materna de “uma senhora”, de modo a se distanciar da personagem, que é a mãe da
“menina”, estando a transmitir os seus ensinamentos à “filha”, sendo ignorada inicialmente
mas esta acaba por lhe dar a devida atenção. A rapariga é denominada de “filha” e de
“menina”, sendo percepcionada enquanto imatura, infantil, que deseja adiar o crescimento de
modo a permanecer criança, ligada à mãe da infância, sendo esse o motivo do seu desinteresse
pela história da sua mãe. Contudo, a “menina” acaba por se submeter aos desejos da mãe,
talvez devido à culpabilidade que sente ao não dar atenção ao que esta lhe quer transmitir, que
seria importante para a sua vida.
A questão da autonomização e da separação-individuação está latente nesta resposta, com
toda a sua valência de culpabilidade e resistência, contrabalançada com alguma infantilidade,
na qual a boneca é o objecto infantil do qual a rapariga ainda é dependente. Observa-se uma
relação especular mãe/filha, i.e., a mãe funciona como um espelho da filha, mostrando a esta
como ela (mãe) era e como se é na idade da filha.
Sujeito 144 – 8” Era uma vez, uma menina que morava com os seus pais e era educada da
melhor forma. Um dia, estava a passear e conheceu um rapaz …hum …como tinha sido
educada perto de raparigas nunca tinha conhecido um rapaz. Passado algum tempo,
apaixonou-se por ele, mas não tomou as melhores decisões. Passado algum tempo, a rapariga
que era e que se ia tornar numa boa mulher de casa ficou grávida …hum … com a sua
maternidade jovem. A mãe apesar de desiludida ajudou-a no que ela precisou e tomou conta
da criança com ela. (?) Hum … a rapariga não teve o futuro que queria mas aprendeu uma
lição de vida. 3`18”
Análise: o sujeito 144 inicia a sua resposta com um afastamento têmporo-espacial, dando o
anonimato da rapariga “uma menina”, contextualizando-a face às pessoas com quem morava
os “pais” e a sua educação “ (...) era educada da melhor forma”, ou seja, faz alusão a um ideal
narcísico, a família, a filha e a educação perfeita. Continua a sua história, fazendo um novo
afastamento têmporo-espacial, uma fabulação fora da imagem, ao ir dar um passeio, e
introduzindo personagens que não figuram na imagem, nomeadamente, o “rapaz” que é o seu
objecto de desejo, e as “raparigas”, com quem tinha sido educada. Devido à sua educação
ideal, apenas se havia relacionado com raparigas “ (...) nunca tinha conhecido um rapaz”, o
que revela alguma ingenuidade, imaturidade e grande protecção parental.
Após um novo afastamento têmporo-espacial, a “menina” “ (...) apaixonou-se por ele, mas
não tomou as melhores decisões”, i.e., devido à sua educação, quer familiar quer escolar, e à
ausência de conhecimentos da sua parte, o envolvimento na relação heterossexual e o
consequentemente acesso à sexualidade, culmina na gravidez precoce. Evidencia-se uma
passagem no tempo, desde a altura em que se conhecem, até ao envolvimento numa relação
heterossexual. Contudo, está inerente o facto de que ficou grávida não por sua causa, mas por
causa do “rapaz”, e também da própria educação que recebeu, que a sobre-protegeu. A
“rapariga” que era idealizada, “ (...) e que se ia tornar numa boa mulher de casa ficou grávida
(...)”, comete essa falha, que obriga à quebra desse ideal narcísico, e do futuro que lhe estaria
planeado. A “mãe” fica desiludida com a falha da filha, que deixa de ser ideal, porque aparece
a sexualidade, mas ajuda-a a cuidar do bebé, numa relação anaclítica. Como se o mãe e ter
sexualidade, ofendesse a sua “mãe”, tendo de submeter-se a esta, deste modo, faz uma
regressão para não a perder.
A mãe é percepcionada na sua função de anáclise, aparece como uma boa mãe, contentora e
algo idealizada, da qual vai depender para educar o bebé, ou seja, projecta no futuro essa
mesma dependência. A rapariga vê-se forçada a identificar-se com a função materna, mas não
a assume totalmente, sendo a mãe quem toma conta do bebé, ou seja, a rapariga não chega a
ocupar totalmente o papel materno. O sujeito termina a história, dando-lhe um final moralista,
manifestando a frustração da “rapariga” em relação ao futuro, que a sua família e ela própria
havia desejado para si, e à sua realidade actual. Verificam-se dois conflitos nesta história, por
um lado, o conflito intrapsíquico da “rapariga”, ao engravidar, sentindo-se imatura e
sobretudo culpada, devido às expectativas que ela própria ambicionava. Por outro lado, é
manifestado o conflito com a “mãe”, devido à quebra desse ideal, ao ter acedido à sexualidade
e à maternidade precocemente, não seguindo o futuro que lhe haviam destinado. Não só sente
que falhou o ideal familiar, como o seu próprio ideal narcísico.
A solução utilizada para solucionar o conflito foi a solução moralista, i.e., apenas há a
satisfação do superego, uma vez que, ao cometer aquela falha, tem de assumir as suas
responsabilidades, tendo de abdicar do futuro que havia sonhado. Faz também uma formação
reactiva, ao aprender “ (...) uma lição de vida”, ou seja, embora não tenha o futuro desejado,
enfrenta a sua realidade apenas pelo lado positivo. Os mecanismos de defesa, utilizados ao
longo desta resposta foram a idealização, da “rapariga”, da família e da sua educação, era tudo
narcísico, ideal, perfeito. O sujeito utiliza a regressão, a “rapariga” acede à maternidade, o que
conduz ao conflito com a “mãe”, e para não a perder, regride mantendo-se como filha,
infantil, cuja vida está dependente das decisões da sua “mãe” e tem de abdicar da sexualidade
adulta. O sujeito utiliza também a formação reactiva, na conclusão da história, ao manifestar o
lado positivo dos acontecimentos, sendo o contrário do que realmente sente e deseja, ou seja,
a “rapariga” aprende uma lição de vida com o erro que cometeu, porém fica feliz, embora
esteja latente a sua frustração e a sua culpabilidade.
Sujeito 14 5 – 5” Uma história como? Então é uma mãe com duas filhas, numa sala de estar, à
noite e a mãe está a dizer à filha mais velha como pegar na bebé, neste caso não sei! Não sei
mais o que posso dizer mais daqui. (?) ++ Passado uns anos, a filha mais velha já bem mais
crescida teve um filho e lembrou-se de todos os conselhos que a mãe lhe deu sobre tomar
conta de bebés. 2`09”
Procedimento: inicia o relato com um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), uma precaução
verbal (A2 3) e descreve a imagem (C/Fa1), dando o anonimato e o isolamento das
personagens (C/Fo3, A2 15), revelando a imaturidade da “filha”. Faz um comentário (B2 8) e
uma tentativa de recusa (C/Fo5) de uma forma defensiva, criticando o material (C/C3). Após
um longo silêncio intra-relato (C/Fo1), faz um afastamento têmporo-espacial, através da
fabulação fora da imagem (A2 4, B2 2), introduz um personagem que não figura na história
(B1 2) (o filho da rapariga) e identifica-se com a “mãe”, na sua função materna. A “mãe” que
transmite os ensinamentos maternos assemelha-se à relação edipiana, da qual a “filha” tem
dificuldades em se desvincular.
Análise: o sujeito 145 inicia a sua resposta colocando-se numa atitude anaclítica, fazendo um
pedido de ajuda ao clínico, em relação ao tipo de história que este pretende. Começa a sua
história, através de uma precaução verbal, apoiando-se no material, descrevendo as
personagens, e dando o anonimato “ (...) uma mãe com duas filhas (...)” e o isolamento das
mesmas. Descreve também o contexto em que estas estão inseridas “ (...) numa sala de estar, à
noite (...)”, estando a “mãe” a transmitir os ensinamentos maternos, à “filha mais velha”,
sobre como cuidar e pegar na bebé, neste caso sua “irmã”. O sujeito faz um comentário, e
uma tentativa de recusa. Após lhe ser questionado sobre que fim daria à história, faz um longo
silêncio e conclui através de um hiato temporal, quando a “filha mais velha” já tinha o seu
filho e que seguia o modelo materno da sua “mãe”, ou seja, identifica-se com a mãe na função
materna.
Verifica-se uma ausência de conflito, uma vez que, a história se baseia na transmissão de
conhecimentos, referentes à maternidade, os quais a rapariga irá utilizar quando for mãe. O
mecanismo de defesa utilizado ao longo da história é a negação. A figura materna é designada
de “mãe”, sendo percepcionada enquanto uma boa imago e um bom objecto de identificação
materno. A rapariga é denominada de “filha mais velha”, sendo percepcionada enquanto
imatura, estando a aprender a cuidar da irmã, preparando-se também para no futuro
desempenhar a função materna. Observa-se uma percepção de si no presente, enquanto
imatura, mas há o desejo e a fantasia de ser mãe no futuro, estando para isso interessada em
aprender o que a “mãe” lhe tenta ensinar, desta forma identifica-se com esta. Posteriormente,
é dada uma projecção de si no futuro, enquanto mãe, seguindo o modelo materno que havia
aprendido.
Sujeito 146 – 22” É uma rapariga, numa sala com a mãe...hum... e a mãe está-lhe a ler
algumas dicas sobre tomar conta do bebé, que neste caso, é o irmão que a rapariga tem ao
colo. A rapariga não está a prestar muita atenção. O que é que eu?... Não é preciso dizer mais
nada ou é? Depois quando ela foi mais velha, quando o irmão tiver crescido, ensina-lhe
também o que a mãe lhe ensinou quando ela era mais nova. 2`37”
Análise: o sujeito 146 inicia a sua resposta com a entrada directa na expressão, apegando-se
ao conteúdo manifesto, dando o anonimato e isolando as personagens “ é uma rapariga, numa
sala, com a mãe (...)”. Faz um silêncio intra-relato, estando a “mãe” a ler para a filha,
ensinando-a como cuidar do “irmão”, deste modo, há a passagem de conhecimentos e a
preparação para o papel materno. Contudo, a “rapariga” não está interessada em tais
ensinamentos, não dando atenção ao que a “mãe” lhe está a relatar. O sujeito faz um pedido
de ajuda ao clínico, e uma tentativa de recusa, revelando alguma dificuldade em continuar a
sua história. Conclui fazendo um avanço temporal, estando a “rapariga” a transmitir os
ensinamentos maternos da sua “mãe” ao “irmão.
Sujeito 147 – 8” Ai meu Deus! Hum... posso fazer uma pergunta sobre a imagem? Isto é um
bebé? Joana é o nome da filha, não consigo! Joana estava sentada agarrando o filho recém-
nascido, tinha apenas 15 anos (ri). Isto é tão difícil! Enfrentava os problemas actuais da
gravidez na adolescência. A sua empregada, que era a sua melhor amiga e conselheira, olhava
para o bebé. Joana olhava para o abstracto, pensando nos problemas que iria ter de enfrentar e
como poderia ter pensado melhor. Sabia que tinha sido apenas um erro mas que... (ri). Acho
que chega. A sua conselheira dizia que podia ajudar naquilo que pudesse, e que durante os
dias de semana ficava a tomar conta do bebé para que a rapariga pudesse estudar. (?)
hum...hum... a Joana com a ajuda da sua empregada tinha conseguido acabar o curso e podia
dar uma vida melhor à sua filha. 4`43”
Procedimento: inicia com uma exclamação (B2 5), um equivalente choque que revela alguma
ansiedade, faz uma pausa intra-relato (C/Fo1), e solicita a ajuda do clínico (C/C2). Constrói a
história dando um nome à raparia, “Joana”, através de uma fantasia pessoal (B1 1) e numa
identificação total a esta. No entanto, corta o relato com uma crítica de si, revelando alguma
incapacidade (C/N9), uma tentativa à recusa (C/Fo5), voltando de novo à sua história.
Descreve um acto materno, através da postura significante de afectos (C/N4), dando uma
precisão numérica (A2 5), relativamente à idade da “Joana”, utiliza a defesa maníaca (C/C1) e
faz um comentário (B2 8), reforçando a sua incapacidade em elaborar a história (C/N9).
Justifica a situação através do apego à realidade (A1 3), com referências culturais e
intelectuais (a gravidez na adolescência).
Análise: O sujeito 147 inicia a sua resposta, através de uma exclamação, seguido de um
silêncio intra-relato, e de um pedido de ajuda ao clínico, em relação ao bebé/boneco. Verifica-
se desta forma, alguma dramatização e um equivalente de choque, que através do pedido de
ajuda, se percebe que está relacionado com o bebé/boneco. Começa a relatar a sua história,
atribuindo um nome a uma personagem, que inicialmente é descrita enquanto filha, de
seguida, faz uma crítica de si e uma tentativa de recusa. Designa a rapariga com esse mesmo
nome, “Joana”, com quem se identifica projectivamente. Continua a sua história, dando uma
posição significante de afectos, através de um acto materno e contentor, ao agarrar o filho,
numa fantasia de gravidez na adolescência, dada através da precisão numérica, o que vem
salientar uma identificação projectiva explícita, uma vez que a personagem teria uma idade
muito próxima à sua, o que suscita alguma ansiedade e a defesa maníaca.
Faz um comentário “isto é tão difícil”, o que vem reforçar a ansiedade e angústia sentida pelo
sujeito face à imagem e à história que elaborou, e numa tentativa de se distanciar insere uma
referência social, em relação à maternidade precoce. Denomina a figura materna de
“empregada”, de modo a denegrir a sua imagem, e colocando-a numa posição social inferior à
sua, embora inicialmente tenha afirmado que “Joana” seria “ (...) o nome da filha (...)”, a mãe
desta não aparece, é eliminada e substituída pela “empregada”, evitando o conflito e o
aumento da culpabilidade face à gravidez. No entanto, é essa mesma personagem que a apoia,
como uma melhor amiga, dando conta de alguma dependência em relação à mãe, ou seja, esta
personagem é inicialmente desvalorizada mas em seguida é idealizada, porque é a substituta
materna onde é projectada a mãe ideal, daí não abordar o conflito. Há uma intelectualização
do conflito intrapsíquico, ao abordar as dificuldades que podem advir da maternidade precoce
e do que poderia ter feito para evitar tal situação “sabia que tinha sido apenas um erro mas
que...”, retirando-se, da relação com o bebé e com a “empregada”.
Sujeito 148 – 6” Ok. (ri) Isto é um bebé ou um nenuco? Isto é uma empregada de uma
rapariga de boas famílias, que lhe está a contar a sua vida e as dificuldades da vida. A rapariga
está a tentar imaginar a história e o que vai para lá da sua história e dos seus horizontes, no
mundo. E desde pequena estão a tentar ensinar-lhe os valores da vida e a lei da vida, para ela
com a sua idade não perdesse a sua inocência, que consiga sonhar e imaginar mas para que
também fosse realista, não sei, não sei! (ri) (?) A história que ela tava a contar ou mesmo? A
rapariga ficou com mais vontade de conhecer o mundo e de fazer qualquer coisa, sem tar
parada. Não queria ouvir mais histórias ou ficar a contar histórias como a empregada, mas
viajar pelo mundo e coiso. 3`44”
Procedimento: Após um tempo de latência reduzido, começa o relato com uma exclamação
(B2 8) de modo a aliviar a sua ansiedade face à imagem, seguida da defesa maníaca (C/C1) e
de um pedido de ajuda ao clínico (C/C2), como se não soubesse se o terceiro personagem era
um bebé real ou um boneco. Continua a resposta descrevendo as personagens, dando o
anonimato das mesmas (C/Fo3), e introduzindo referências sociais (A1 3) de modo a
caracterizar as vivências da “empregada”. A personagem que simboliza a mãe é descrita
enquanto “empregada”, numa tentativa de denegrir a imagem desta ou de a inferiorizar face à
“rapariga”. Estabelece uma relação de desigualdade de poder entre as personagens, baseada
na transmissão de valores e na vivência subjectiva (C/N1) da “empregada”, que leva a
“rapariga” a sonhar e a imaginar tais situações (A1 2). Continua fazendo uma denegação da
história que havia contado (A2 11), seguida da defesa maníaca (C/C1) e após o clínico
efectuar uma questão relativamente ao fim da história, responde com um pedido de ajuda
(C/C2), não sabendo se se trata do fim da história que a “emprega” está a relatar ou a sua
própria história. Conclui, com a necessidade da “rapariga” se autonomizar e se diferenciar da
“empregada”, mas apenas no futuro, não se identificando com esta, alternando entre a
progressão e a regressão (A2 7). Escotomiza o bebé/boneco (E1), desenvolvendo a sua
história baseando-se na imaginação e nos desejos da “rapariga”.
Análise: O sujeito 148 inicia a sua resposta utilizando a defesa maníaca, e fazendo um pedido
de ajuda ao clínico, no sentido de comprovar se o terceiro personagem é um bebé real ou um
boneco. Começa a contar a sua história, descrevendo as personagens, sendo a mais velha
designada de “empregada”, e a personagem central de “rapariga de boas famílias”. Deste
modo, desvaloriza e denigre a personagem que representa a figura materna, colocando-a numa
posição de poder inferior à “rapariga”. A “empregada” está a relatar à “rapariga” as
dificuldades por que passou na sua vida, tentando desse modo, transmitir-lhe uma lição de
vida, estando a “rapariga” a fantasiar com a história e a distanciar-se da mesma. A
transmissão de valores, ocorre desde que a “rapariga” era “pequena”, de modo a que esta
tenha uma visão realista da vida, mas também que possa fantasiar, sem nunca perder “ (...) a
sua inocência (...)”. Está latente a referência implícita da sexualidade, havendo uma restrição
por parte da “empregada”, que deseja que a “rapariga” se mantenha infantil e inocente como
até agora.
O sujeito de seguida faz uma negação do que havia dito, utiliza novamente a defesa maníaca,
revelando alguma ansiedade face à imagem e à história que elaborou. Após o clínico lhe ter
questionado, qual o fim que daria à história, o sujeito responde com um novo pedido de ajuda,
porque se projectou tão massivamente no personagem central, que ele próprio teve
dificuldades em separar a sua história, da história que a “empregada” contava, sentindo-se
confuso “a história que ela tava a contar ou mesmo?”. Ao não obter resposta, conclui a sua
história, tendo a “rapariga” vontade de conhecer e explorar o mundo, não ficando parada,
como a sua “empregada”. Desta forma, a “rapariga” está numa encruzilhada, não quer perder
a inocência mas viver, há uma progressão e uma regressão permanente. Desvaloriza mãe que
ficou parada no tempo e ela quer progredir mas sem perder a inocência, procura experienciar.
A imago materna é desvalorizada, a “rapariga” não se identifica com ela, rejeita esse modelo,
porque sente necessidade de expandir o seu conhecimento e a sua realidade, há quase a
necessidade de suplantar os conhecimentos e experiências que a “empregada” tem, de modo a
diferenciar-se. Observa-se o problema da identificação, de continuar infantil regredindo ou
progredir, contudo, mantém-se parada no tempo, viajar é só no futuro. O bebé/boneco é
escotomizado, porque é factor de ansiedade, simbolizando a sexualidade adulta e o seu papel
enquanto mãe, com o qual a jovem ainda não fantasia e não se identifica. O conflito que é
elaborado pelo sujeito 148, é intrapsíquico, estando a “rapariga” a sentir, por um lado, a
necessidade de se autonomizar e se diferenciar da mãe que ficou parada no tempo, procurando
descobrir e explorar um novo mundo e uma nova realidade da vida, desempenhando um papel
adulto. Por outro lado, a regressão, querendo manter-se inocente, infantil e ligada a esse
objecto infantil, todavia, face a esta alternância mantém-se também parada no tempo, uma vez
que só pretende explorar no futuro. Faz uma identificação à mãe (empregada), para depois se
querer diferenciar do seu modelo. Os mecanismos de defesa utilizados por este sujeito são a
defesa maníaca, a negação, e a regressão.
O sujeito denominou a personagem, mais velha de “empregada” de modo a desvalorizá-la,
denegri-la, estabelecendo uma relação baseada na diferença de poderes. A personagem central
é designada de “rapariga de boas famílias”, ou seja, inocente, infantil e ideal. A “rapariga”
começa por se identificar com a “empregada”, para depois se poder diferenciar da mesma,
recusando seguir o mesmo modelo. A imago materna é desvalorizada, e rejeitada, havendo
uma certa rivalidade por parte da “rapariga” de modo a suplantar os conhecimentos maternos.
Embora o sujeito tenha feito um pedido de ajuda ao clínico, em relação ao terceiro
personagem, este depois não é referido. Tal escotomização poder-se-á dever ao facto, de o
percepcionar enquanto filho, o que levaria a um possível conflito com a figura materna, e à
necessidade de assumir um papel adulto, para o qual não está preparada, uma vez que, deseja
manter a sua “inocência”. Desse modo, não se observa para já, a fantasia de ser mãe, e há a
rejeição de identificação ao modelo materno.
Sujeito 149 – 8” Ai a senhora vai escrever? Era uma menina, que tinha uma filha e deve ser a
mãe não é? E a mãe... e a mãe não tava muito contente por ela ter sido mãe muito cedo, mas a
mãe ajudava no bebé, mas andavam sempre chateadas uma com a outra, mas depois fizeram
as pazes e ficava tudo bem. 1`44”
Procedimento: Inicia o relato com uma questão ao clínico, mostrando-se surpresa e talvez um
pouco preocupada com o que este poderia escrever, começando em seguida a história. Faz um
afastamento têmporo-espacial (A2 4), dando o anonimato das personagens (C/Fo3), isolando-
as (A2 15), dá uma precaução verbal (A2 3) e faz um pedido de ajuda ao clínico (C/C2). Faz
um silêncio intra-relato (C/Fo1), continua justificando a reacção da mãe (A2 18) face à
maternidade precoce da filha, e manifesta um conflito entre ambas as personagens (B2 6),
com afectos expressos à mínima (A2 18). Termina a história com o fim mágico do desejo (B2
7), uma vez que esse conflito é superado e ambas fazem as pazes.
Problemática: conflito entre mãe e filha, baseado na maternidade precoce desta, e no facto de
se assumir enquanto mulher adulta.
Análise: O sujeito 149 começa a sua resposta revelando alguma curiosidade e ansiedade face
ao clínico. Inicia a sua resposta através de um afastamento têmporo-espacial, dando o
anonimato das personagens “ (...) uma menina (...)”, “ (...) uma filha (...)”, isolando-as e
fazendo um pedido de ajuda ao clínico em relação à personagem mais velha. Mantém esta
personagem enquanto “mãe”, de seguida faz uma pausa intra-relato, mas continua a sua
história, revelando que esta não se encontrava “ (...) muito contente por ela ter sido mãe muito
cedo (...)”. Verifica-se alguma resistência e ansiedade em colocar a “mãe” na imagem, uma
vez que, seria um elemento que causaria conflito, porém manteve-a. A “mãe” estava
descontente com a maternidade precoce da filha, por ainda a considerar uma criança, mas
ajuda-a a cuidar do bebé. O sujeito conclui a sua história, dando a relação entre mãe e filha
como conflituosa e ambivalente mas que no futuro iria melhorar, e se tornar mais harmoniosa.
O conflito expresso nesta história, é um conflito entre “mãe” e filha, face à maternidade
precoce desta, sendo a “mãe” uma força de bloqueio que não a deixa evoluir.
A “mãe” está descontente por a “menina” ter crescido e se ter assumido como mulher adulta,
quando a sua vontade era que esta permanecesse infantil e inocente. O modo de solucionar tal
conflito foi através da realização mágica do desejo e do compromisso viável, havendo a
aceitação por parte da mãe, face ao crescimento e autonomia da filha, e o apaziguamento da
relação “ (...) ficava tudo bem”. O sujeito utilizou o mecanismo de defesa a formação reactiva
no fim da história. O sujeito denominou a rapariga de “menina”, atribuindo-lhe assim
infantilidade e imaturidade, que já havia acedido à maternidade, função com a qual se
identifica e que assumiu. A figura materna é denominada de “mãe”, sendo percepcionada
enquanto pouco contentora, intrusiva e culpabilizante. A relação entre mãe e filha é baseada
numa relação funcional e ambivalente, uma vez que há da parte da mãe alguma resistência em
aceitar a sua filha enquanto uma mulher adulta, por isso poder-se-á pensar numa má imago
materna. A imago materna sobrepõe-se à imagem que a “menina” tem de si enquanto mãe,
uma vez que a relação entre esta e o bebé não é referida, o bebé surge como o factor de
separação e conflito entre mãe e filha.
Sujeito 150 – 8” Ai tenho de contar uma história sobre ela? Eu não sei! É a mãe e o filho, é
isso? É a mãe e o filho, sei lá e essa deve ser a empregada que tá a olhar para o bebé. Ela tá a
olhar para a porta, deve ter alguém a chegar, sei lá! Tem de ser mais? Não sei o que eu falo!
Chega o pai do filho uma coisa assim! (?) O bebé assusta quando o pai chega e chora e depois
a mãe faz ele dormir, não sei. 3’10’’
B2 5; C/C2; C/Fo5; C/N9; C/C2; B2 8; C/Fo5; A2 3; A2 15; A2 3; B2 8; C/Fo5; C/C2; C/N9;
B1 2; C/Fa3; C/N9;
Análise: o sujeito 150 começa a sua resposta fazendo um pedido de ajuda ao clínico,
identificando-se com a rapariga, seguida de uma tentativa de recusa e um novo pedido de
ajuda ao clínico, face ao tipo de relação estabelecida entre esta personagem e o bebé. Ao não
obter resposta, inicia a sua história, mantendo a relação entre os personagens como mãe e
filho, numa relação destituída de afectos, seguido de uma exclamação, e denominando a
figura materna de “empregada” que está a dar atenção ao bebé, isola assim os personagens.
Refere que “ela tá a olhar para a porta (...)”, não se sabendo inicialmente, de qual personagem
se trata, como se o clínico soubessem a quem se referia. Essa personagem trata-se da “mãe”do
bebé, que está à espera de alguém, ou seja, embora refira a figura materna, a mesma é retirada
em seguida como se deixasse de existir. Após uma nova exclamação e um novo pedido de
ajuda ao clínico, numa tentativa de recusa, refere que é o “pai” do bebé que está a chegar a
casa, introduzindo assim um personagem que não figura na imagem, e faz mais uma
exclamação.
Conclui a sua história, tendo o “pai” assustado o bebé, fazendo-o chorar, tendo a mãe de o
conter até o adormecer, e faz uma denegação. O conflito elaborado pelo sujeito, não é
referido, estando latente a dificuldade na relação com a mãe, designada na história por
“empregada”, e com o personagem do sexo masculino, com a qual também não é estabelecida
verdadeiramente uma relação. A relação que é dada, é a de mãe e filho, que é baseada na
relação especular, o bebé é o seu duplo, e no qual se pode projectar. A solução utilizada foi
por retraimento narcísico, contento e adormecendo o bebé, permanecendo nessa díade. O
sujeito coloca-se numa atitude anaclítica, faz vários comentários e algumas tentativas de
recusa, devido à ansiedade que a imagem lhe provoca. Utiliza como mecanismos de defesa a
negação, e o isolamento, uma vez que apenas estabelece uma relação com o bebé, tanto a
“empregada” como o “pai” do bebé são retirados da história.
A rapariga foi denominada de “mãe”, desta forma, o sujeito assume-a como mulher adulta,
contentora e na sua função materna. A figura materna é designada de “empregada”,
desvalorizando-a, e colocando-a numa posição social inferior à sua, sendo substituída quase
de imediato. O sujeito introduz um personagem que não está inserido na imagem, o “pai” do
bebé, que vem substituir a “empregada”, mas o facto de este assustar o bebé e de o fazer
chorar, revela que há uma rejeição da figura masculina, e que tudo que é exterior à sua relação
com o bebé é considerado perigoso e assustador, incluindo a relação heterossexual. O “pai” é
colocado de modo a separá-la da “mãe”, mas rejeita ambos os personagens. Apenas a “mãe” é
capaz de conter, transmitir calma e tranquilidade ao bebé, apenas ela sabe desempenhar o
papel materno, tanto a “empregada” como o “pai” não o sabem fazer, sendo perigosos.
Sujeito 151 – 11” Bem, aqui parece que é uma senhora mais velha, que é a mãe desta
rapariga, e ela foi mãe há pouco tempo. Ela é nova e ainda não sabe tomar conta dela e a mãe
ajuda. Parece que ela não sabe pegar mesmo no bebé. Elas viviam as duas sozinhas, o pai
morreu há pouco tempo, elas passavam dificuldades mas mesmo assim cuidavam do filho,
tinham para o filho. Agora esta história, tenho de inventar um fim! Não sei! A mãe e ela
passaram dificuldades, mas quando ela foi mais velha e tinha de arranjar trabalho para ajudar
e para sustentar o filho. Ela queria deixar o filho com uma senhora rica mas a mãe não deixou,
a mãe casou com um senhor rico que já andava atrás dela há algum tempo, para ela ajudar a
cuidar do bebé, e não deixar a filha entregar o filho à senhora rica. Depois o senhor morre, e
deixa a fortuna a elas, e passam a viver muito bem e felizes, e passam a cuidar do filho. 4`20”
Procedimento: inicia o relato com uma precaução verbal (A2 3), dá o anonimato da figura
materna (C/Fo3) e isola as personagens (A2 15). Descreve a rapariga enquanto “nova”,
imatura, e com algumas incapacidades em assumir plenamente a função materna, refere que a
“mãe” a ajuda a cuidar do “filho”, realçando a relação funcional (C/M1) e pouco emotiva. Faz
uma precaução verbal (A2 3) seguida de um comentário (B2 8) acerca dessa mesma
dificuldade em conter o bebé, numa postura de alguma ironia e crítica face à “rapariga”. Faz
uma pirueta (C/M3) introduz a figura paterna para o matar (B1 2), reforçando a ideia de
dependência face à mãe, fantasia que se expande numa alusão ao futuro. Faz outro comentário
pessoal (B2 8), seguido de uma denegação (A2 11), tentativa de recusa ou de incapacidade
(C/Fo5). É feito um salto temporal, sendo a “rapariga” mais velha que procura um modo de
sustentar o filho, solucionando a situação com a introdução de uma “senhora rica” (B1 2) a
quem poderia entregar o bebé, mas tal não acontece e de uma nova personagem masculina
(B1 2) que também é eliminada. Termina a história com um fim mágico do desejo (B2 7),
uma vez que permanecem com a riqueza deste, juntas e felizes (C/M1).
Análise: o sujeito 151 inicia o relato com uma precaução verbal, dando o anonimato da figura
materna que designa de “senhora” e isolando os personagens, sendo esta “mãe” da rapariga,
que por sua vez “ (...) foi mãe há pouco tempo”. São dadas as três gerações, sem as colocar
em relação e não sendo abordado nenhum afecto. Descreve a rapariga como sendo “ (...) nova
e ainda não sabe tomar conta dela (...)”, fica a dúvida se se estaria a referir ao bebé ou a ela
própria, revelando imaturidade, algumas dificuldades em desempenhar a função materna, e
dependência necessitando da ajuda da “mãe”. Faz uma nova precaução verbal, e um
comentário em relação à incapacidade de a “rapariga”pegar do bebé “parece que ela não sabe
pegar mesmo no bebé”. Faz uma contextualização do meio familiar, a “mãe” e a filha moram
sozinhas, introduz uma personagem que não figura na imagem “ (...) o pai morreu há pouco
tempo (...)”, estando elas a passar por algumas dificuldades, porém “ (...) tinham para o filho”.
A figura masculina é introduzida mas já não está presente, fica inerente que seria o “pai” o
provedor de sustento da família, e as poucas posses que têm são para o bebé, sacrificam-se
para o bem-estar deste. O sujeito faz um comentário, como se estivesse a pensar alto, sobre o
fim que daria à história, seguido de uma denegação. O sujeito faz um salto temporal, tendo a
“rapariga” já mais velha, de arranjar um trabalho para sustentar o “filho”, todavia há a
tentativa desta, entregar o seu filho, a uma “senhora rica”, porque não tinha capacidades nem
dinheiro para ficar com ele, introduz assim uma personagem que não consta da imagem. A
sua “ (...) mãe não deixou (...)”, tendo esta optado por se casar com um “senhor rico”, de
modo a poder ajudar a “rapariga” e a evitar que esta desse o seu “filho”. A “mãe” faz um
sacrifício em troca do bem-estar da sua filha e do seu neto. A história termina, tendo o
“senhor” morrido, e deixado a fortuna a ambas, “ (...) que passam a viver muito bem e felizes
(...)” a cuidarem do bebé.
As figuras masculinas são introduzidas apenas como sustento, sendo eliminadas de seguida,
observa-se uma recusa do Édipo, e o desejo de manter uma relação dual regressiva. A relação
heterossexual surge à parte, a “rapariga” não se quer separar da sua “mãe” e deseja que esta a
ensine e ajude a ser mãe. É dada, de certa forma, uma espécie de triangulação constituída pela
“mãe”, a “rapariga” e o “filho” desta, como se ela e a “mãe” fossem um casal, que dedicam
toda a sua atenção e amor ao bebé, não havendo espaço para mais ninguém entrar. O conflito
expresso nesta história é a ausência de capacidades e de dinheiro para manter esta família. A
“mãe” aceita a maternidade da filha, não havendo nenhum conflito entre ambas, nem um
conflito intrapsíquico da “rapariga”. Existe a possibilidade de dar o bebé a outra pessoa, mas
não porque haja uma rejeição do mesmo, apenas porque a ”rapariga” não tem capacidades
nem dinheiro para o sustentar, e a pessoa a quem o iria dar era”rica”. Todavia, a “mãe” não
permitiu que tal acontecesse, tendo-se casado com um “senhor rico”, que acaba por morrer, à
semelhança do “pai” da “rapariga”, deixando-lhes a sua fortuna.
A solução utilizada pelo sujeito é a realização mágica do desejo, permanecendo os três felizes
e unidos, mantendo assim a relação de dependência que está inerente e a solução do conflito
por ajuda exterior, através da introdução de personagens que apenas surgem, de modo a
garantir o sustento da família e sobretudo do bebé. Os mecanismos de defesa, utilizados pelo
sujeito 151 foram a ruminação, uma vez que o conflito anda sempre à volta da ausência de
dinheiro e de condições para cuidarem e sustentarem do bebé; e a regressão porque mantêm a
relação dual entre “mãe” e filha, sendo o bebé quase que um prolongamento de ambas. Este
sujeito denominou a figura materna de “ (...) uma senhora mais velha, que é mãe (...)”, desta
forma estabeleceu uma diferença significativa de idades entre as personagens, e permitiu se
distanciar a si própria desta personagem. A rapariga foi denominada de “rapariga” que “ (...)
foi mãe há pouco tempo”, evidencia a imaturidade desta personagem, assim como, as suas
incapacidades em assumir o papel materno, necessitando da ajuda da “mãe”, sendo a relação
entre ambas baseada na dependência.
O sujeito 151 introduziu três personagens que não figuram na imagem, nomeadamente, o
“pai” da “rapariga” que havia falecido há pouco tempo, e que seria o provedor de sustento da
família; a “senhora rica” a quem a “rapariga” queria entregar o bebé, devido às posses desta,
mas que a mãe não permitiu; e o “senhor rico” com quem a “mãe” casou, devido às posses
deste, e que viria a morrer, deixando-lhes a fortuna. Estas três personagens, apenas foram
introduzidas devido ao sustento que poderiam dar, sobretudo ao bebé. As figuras masculinas
são eliminadas, para que se mantenha a relação dual entre “mãe” e filha. Assim, mãe e filha
sacrificam-se para cuidar do bebé, o que pressupõe uma boa imago materna e a imagem da
mãe algo idealizada, porque é capaz de superar todos os problemas. Ela não quer separar-se
da mãe, querendo que esta a ajude e a ensine a ser mãe. Recusa o Édipo, querendo manter a
relação dual, e para isso regride eliminando os homens. Contudo, há uma espécie de
triangulação, como se ela e a mãe fossem um casal, trata-se de um Édipo invertido. Poder-se-á
dizer que se trata de uma relação anaclítica entre mãe e filha uma vez que não se conseguem
separar.
Sujeito 152 – 50” A menina ficou grávida, não sabe por onde ir, teve de ficar com a mãe, não
sei! (?) Pode acabar bem ou mal...o fim é que ela acabava com o pai dessa criança. 2`01”
C/Fo1; B2 1; A2 15; A 2 11; A2 6; C/Fo1; B1 2; B2 7;
Procedimento: inicia com um grande tempo de latência (C/Fo1), o que indica que o cartão
suscitou uma grande ansiedade, no entanto, entra directamente na expressão (B2 1), com a
gravidez da personagem central. Caracteriza a personagem através do estado de confusão e
desorientação, perante o facto de ser mãe precocemente, demonstrando imaturidade e
infantilizando-a. A “mãe” surge como último recurso da “menina”, quase como se tivesse de
seguir o modelo materno não sendo esse contudo, o seu desejo. Faz uma denegação (A2 11) e,
quando é questionado quanto ao fim da história, hesita entre interpretações diferentes (A2 6)
e, após um silêncio intra-relato (C/Fo1), termina a história introduzindo um personagem que
não figura na imagem, o “pai” do bebé, ficando os três juntos, ou seja conclui com o fim
mágico do desejo (B2 7).
Análise: o sujeito 152 começa por dar um grande tempo de latência (50”), o que indica uma
grande ansiedade face ao cartão, e relata uma história muito restritiva. Inicia a história com
uma entrada directa na expressão, identificando-se projectivamente com a rapariga, que
denomina de “menina” manifestando, deste modo, a sua infantilidade e imaturidade, porém já
havia acedido à maternidade. A maternidade conduz a “menina” a sentimentos de culpa e
remorsos, e a um estado de confusão e desorientação perante o facto de ser mãe
precocemente, e de ser ainda muito nova, ao estar só vai procurar apoio na “mãe”, mas apenas
como último recurso “ (...) teve de ficar com a mãe (...)”, não sendo esse o seu desejo. De
seguida, o sujeito faz uma denegação do que havia dito, por lhe causar alguma angústia.
Quanto questionado quanto ao fim da história, este hesita entre duas interpretações diferentes
“pode acabar bem ou mal (...)”, faz um silêncio intra-relato e conclui com o fim mágico do
desejo, introduzindo um personagem que não figura na imagem o “pai” do bebé, ficando os
três juntos.
O conflito expresso nesta história é intrapsíquico devido à maternidade precoce da “menina”,
que a leva a sentir-se culpada, arrependida e só, não sabendo para onde ir e em quem procurar
apoio, optando por ficar com a “mãe. A maternidade é geradora de alguma angústia, confusão
e solidão. A solução utilizada pelo sujeito é a realização mágica do desejo e a ajuda da
dependência exterior, uma vez que, inicialmente a “menina” procura o apoio da “mãe” mas
termina por ficar com o “pai” do bebé. Os mecanismos de defesa utilizados foram, a negação
tendo o sujeito negado o que havia dito quando refere a gravidez da personagem; o
isolamento, porque ao longo da história não é estabelecida uma relação entre as personagens;
e a regressão, ficando inicialmente a “menina” com a “mãe”, mantendo-se assim no papel de
filha, dependente e infantil. O sujeito denominou a rapariga de “menina”, infantil, imatura e
incapaz de assumir o papel materno plenamente, o que conduz a uma desorganização e
solidão, e à procura de apoio na única pessoa disponível, a “mãe”.
Sujeito 153 – 4” Uma mulher, uma senhora a ler uma história à rapariga... A rapariga imagina
que está na história...que vive noutro país e que acaba por ter um final feliz. Passado algum
tempo acaba por se aperceber que tudo o que ela tinha sonhado não tinha acontecido. 3`22”
Procedimento: o tempo de latência é muito curto, sinal de impulsividade. Inicia com entrada
directa na expressão (B2 1), dá o anonimato da personagem (C/Fo3), através da designação
“mulher”, a qual é imediatamente substituída pelo termo de carácter social mais respeitável
“uma senhora”, retirando-lhe, deste modo, o carácter sexual e atribuindo-lhe uma
característica intelectual e relacional, ler para a rapariga, o que é também uma forma de
intelectualização (A2 13), aparentemente não há nenhum tipo de relação entre elas.
Procede uma pausa intra-relato (C/Fo1). O imaginar que está na história e ter um final feliz é
uma retirada narcísica de um presente que não é de todo agradável e suficiente, como uma
fuga, ou seja, há um conflito que não é abordado mas que está implícito, uma vez que sente a
necessidade de partir da história que está a ser contada para se projectar, alcançando um final
feliz, dessa forma a rapariga vive através do imaginário materno, é melhor a fantasia que a
realidade, e ao acordar e se aperceber que não tinha acontecido sofre uma desilusão (C/N1).
Escotomiza o bebé/boneco (E1).
Análise: o sujeito 153 inicia a história com a entrada directa na expressão, dando o anonimato
da personagem mais velha “uma mulher, uma senhora (...)”, não estabelecendo uma
verdadeira relação entre as personagens, há uma ligação baseada meramente na
intelectualização. O sujeito faz um silêncio intra-relato e retoma a narração, dizendo que a
personagem central se identifica com a história, ao imaginar que ela própria faz parte da
mesma, é dado um novo silêncio intra-relato, para depois continuar a fantasia de que a
“rapariga” vive num outro país e “ (...) acaba por ter um final feliz”. O sujeito conclui,
fazendo um afastamento têmporo-espacial, em que a “rapariga” se apercebe que tudo não
passava de um sonho, de uma fantasia sua.
Observa-se uma identificação da “rapariga” com a história que está a ser relatada, esta vive
através do imaginário materno, poder-se-á mesmo dizer que vive presa no imaginário
materno, uma vez que é muito feliz nessa fantasia, mas quando enfrenta a realidade, recusa-a
por ser uma desilusão. A fantasia é melhor que a realidade, de tal maneira que é nessa ilusão
que consegue atingir “ (...) um final feliz”. O sujeito escotomiza o bebé/boneco. O conflito
existente nesta história, trata-se do conflito intrapsíquico e deve-se ao facto de a “rapariga” ter
de lidar com a sua realidade, que a desilude e na qual não se sente feliz, não podendo viver na
sua fantasia, que é concedida pelo imaginário materno. O mecanismo de defesa utilizado nesta
história é o isolamento, não sendo dada verdadeiramente uma relação entre as personagens,
pois a única ligação existente entre elas é através da intelectualização.
O sujeito denominou a personagem mais velha de “uma mulher, uma senhora (...)”, de modo a
poder se distanciar da mesma através da diferença de idades, não referindo que tipo de relação
estabelece com a outra personagem, e só é referida no inicio da história, depois acaba por
desaparecer. A personagem central é denominada de “rapariga”, que se projecta
massivamente na história que lhe está a ser relatada, de tal modo que fica desiludida ao se
aperceber que tudo não se tratava de uma fantasia. Há assim, uma dependência da “rapariga”
face à mãe e ao seu imaginário, sendo a única forma desta se sentir segura e feliz. Assiste-se a
um paralelismo, por um lado parece não haver inicialmente nenhum tipo de relação entre
ambas, não se sabendo se são mãe e filha, por outro, projecta-se na história que é relatada, i.e.,
vivendo no imaginário materno, dando uma boa imago materna. O bebé/boneco é
escotomizado sendo dado apenas a relação dual, com uma grande dependência da “rapariga”
face à personagem mais velha, possivelmente a mãe, talvez devido à infantilidade e
imaturidade da “rapariga”, que apenas consegue viver através da mãe, não havendo espaço
para mais nenhum elemento.
Sujeito 154 – 35” São duas mulheres, aquilo é um boneco ou um bebé? Com uma boneca,
estão sentadas, está a olhar para a janela. (?) Ela tem ali um livro não tem? E acho que não tá
a ligar nenhuma porque não está a olhar para ele (?) Acaba ela a não ouvir a história. Acho
que é só! 2`52”
Procedimento: inicia a história com um longo tempo de latência (C/Fo1). Não faz a distinção
entre as duas figuras femininas, igualando-as quanto à idade e posição, são ambas mulheres.
Coloca uma questão ao clínico, como um pedido de ajuda (C/C2), interrogando-o sobre o
bebé/boneco, concluindo que é uma boneca, porque não tem maturidade para ser mãe. No
anonimato das personagens, confunde-as (E11), referindo-as sem ordem, partindo do
pressuposto de que o clínico sabe do que ela está a falar, uma posição centrada em si. Por um
lado, uma está a ler, e, por outro, a outra não está a tomar atenção, ignora-a, não
estabelecendo assim uma relação, é como se não vivessem, estando ambas alheadas. É um
estado narcísico, em que cada uma está com os seus pensamentos, tornando tudo anónimo e
impessoal. Termina com uma rejeição.
Problemática: a relação mãe/filha não é estabelecida, ao mesmo tempo que há uma confusão
de identidades.
Análise: o sujeito 154 inicia a história após dar um longo tempo de latência (35”), com uma
entrada directa na expressão, não fazendo distinção de idades entre as duas personagens, “são
duas mulheres (...)”, e dando o seu anonimato. Faz um pedido de ajuda ao clínico, no sentido
de saber ou confirmar se o terceiro personagem é um boneco ou um bebé real, termina
dizendo que é uma “boneca”. Ambas as personagens estão sentadas, estando uma a olhar para
a janela, não se sabendo de qual se trata, há uma telescopagem de papéis, ao referir
inicialmente as duas e depois apenas uma. Após o sujeito ser questionado sobre que fim daria
à história, este conclui fazendo um pedido de ajuda ao clínico, sobre que objecto a
personagem mais velha segura, e referindo que esta não está interessada no mesmo “ (...)
porque não está a olhar para ele”, e possivelmente a personagem central a não ouvir a história
“acaba ela a não ouvir a história”, dando uma tentativa de recusa.
Não é manifestado um conflito, ambas as personagens estão a olhar, alheadas cada uma para o
seu lado, num estado narcísico, cada uma está cm os seus pensamentos, não há relação entre
elas, como se não vivessem. As posturas assumem o papel do diálogo, é um diálogo mudo,
dando conta de uma má imago materna, sendo que a relação quando é abordada é pela
rejeição ou simbiose e pela confusão de papéis. O olhar pela janela pode ser uma procura de
algo que a contenha ou a satisfaça longe da relação. O discurso é todo impessoal e anónimo.
Os mecanismos de defesa utilizados são o isolamento, não é estabelecida uma relação entre as
personagens, nem há uma distinção relativamente à idade de cada uma, igualando-as quanto à
idade e posição; a regressão, porque toda a história é muito regressiva, não há relação, afectos,
diferenciação entre as personagens, por vezes o sujeito confunde as identidades das
personagens como uma fosse o prolongamento da outra, numa relação simbiótica.