Ebook - ICL - Historia Do Movimento Negro No Brasil Vol. 1 - Versao Publicada
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Título do Livro:
História do Movimento Negro no Brasil Vol. I : A Trajetória do Movimento Negro
Autor:
Guilherme Oliveira da Silva
Produção editorial:
Mariana Paulon, Marielly Agatha Machado, André Chacon
Designer gráfico:
Jéssica Teixeira
Capa:
Matheus Braggion
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CEP 09531-190
E-mail: [email protected]
Sumário
Apresentação ................................................................................................................. 6
Introdução ......................................................................................................................... 8
1. Questões introdutórias...................................................................................... 10
1.1 O que é racismo?.......................................................................................................... 10
1.2 O que é o Movimento Negro?............................................................................... 16
2. Escravidão Africana e suas formas de resistência .............. 18
2.1 Os Quilombos ................................................................................................................ 18
2.2 As rotas da liberdade .............................................................................................. 26
2.3 Irmandades religiosas ........................................................................................... 28
2.4 Rebeliões e Revoltas ............................................................................................... 31
2.5 Movimento abolicionista ...................................................................................... 36
3. Indicações cinematográficas ................................................................... 42
3.1 Conexões África e Brasil ......................................................................................... 42
3.2 Fugas, revoltas e quilombos ............................................................................... 42
3.3 Abolição e pós-abolição.........................................................................................43
Referências...........................................................................................................................
44
Sobre o autor........................................................................................................... 49
Apresentação
6
Neste texto, Guilherme de Oliveira da Silva percorre as
lutas do povo negro no Brasil após a abolição formal da
escravidão. Se durante a escravidão a população negra
encontrou diversas formas de resistir à violência colonial e
imperial, buscando a criação de territórios livres e
autônomos e lutando pelo fim da escravidão, no
pós-abolição surgiram novas demandas e novas formas de
luta. O autor divide a história do Movimento Negro do Brasil no
pós-abolição em quatro fases: A primeira do início da
república em 1889 até a ditadura do Estado Novo em 1937, a
segunda de 1945 até o início da Ditadura Militar em 1964, a
terceira de 1978, dada a fundação do Movimento Negro
Unificado, até o fim da Ditadura e a última fase que se inicia
nos anos 1980 e segue até os dias atuais.
Boa leitura!
Suze Piza
7
Introdução
1 FROMÓNT, Cécile (ed). Afro-Catholic Festivals in the Americas: Performance, Representation, and the Making
of Black Atlantic Tradition. Pennsylvania: Penn State University Press, 2019;
2 De acordo com o IBGE, a população negra é formada pela soma das pessoas que se autodeclaram pretas
(tonalidades de pele mais escura) e pardas (tonalidades de pele mais clara). Ver mais em: ATHIAS, Leonardo.
“Investigação étnico-racial no Brasil: entre classificação e identificação”. In: SIMÕES, André, ATHIAS, Leonardo,
BOTELHO, Luanda (org.) Panorama nacional e internacional da produção de indicadores sociais: grupos
populacionais específicos e uso do tempo. Rio de Janeiro: IBGE, 2018;
8
Dos 500 anos de história do Brasil, quase 400 foram
marcados pela escravização de pessoas africanas e
1
9
1. Questões introdutórias
10
Entre os séculos XVIII e XIX, com o
surgimento de correntes de
pensamento como o Iluminismo,
Positivismo e Darwinismo, essa
crença nas diferenças entre as raças,
foi utilizada para justificar uma
suposta superioridade europeia
perante outros povos, com um
caráter científico, dando origem a
ideologia que conhecemos como
racismo (ALMEIDA, 2019, p. 18-22). Na
visão do homem europeu, a Europa
era o continente mais civilizado do
mundo, portanto deveria levar a
civilização para os outros
continentes, cheios de povos
inferiores e selvagens. A arte, a
religião, as formas de organizações
políticas e sociais dos povos
indígenas e africanos foram
consideradas diabólicas,
pecaminosas e cientificamente
atrasadas diante do progresso
europeu, sendo justificável
destruí-las.
11
O racismo científico, como ficou conhecido esse período
de estudos científicos sobre as raças, acreditava que a
evolução humana ao longo do tempo teria tornado as
pessoas brancas mais evoluídas, inteligentes e aptas a
dominar o mundo (ALMEIDA, 2019, p. 21-22). Derivada das
ideias de Darwin, surge a eugenia, que tinha como objetivo
central argumentar que as pessoas não-brancas) deveriam
parar de se reproduzir a fim de tornar o mundo mais evoluído.
Segundo os eugenistas, quanto mais branco era um país,
mais chances ele teria de progredir socialmente e
economicamente. Já países africanos ou com uma presença
maciça de pessoas de origem africana e miscigenadas,
como o Brasil, seria um país atrasado e sem progresso.3
A Redenção de Cam, 1895. Modesto Brocos. Óleo sobre tela, c.i.d. 166,00 cm x 199,00 cm. Foto: Reprodução
fotográfica César Barreto. Fonte: Itaú Cultural, 2022
3 Ver mais em: SOUZA, Vanderlei Sebastiao de. A eugenia brasileira e suas conexões internacionais: uma
análise a partir das controvérsias entre Renato Kehl e Edgard Roquette-Pinto, 1920-1930. História, Ciências,
Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.23, supl., dez. 2016, p.93-110.
12
Como forma de impedir uma ascensão política e social
de pessoas negras, que eram vistas como inferiores na
sociedade, diversos países do Ocidente criaram leis que
segregavam e marginalizavam a população de origem
africana. Nos Estados Unidos foram criadas as leis Jim Crow,
que além de impedir pessoas negras de terem o direito ao
voto eleitoral, por exemplo, também estabelecia espaços e
instituições como escolas, hospitais e bairros exclusivos para
pessoas negras (NASCIMENTO, 2019, p. 103-143). No Brasil,
nunca tivemos a criação de leis específicas que proibiam
pessoas negras de votarem ou de habitarem determinados
espaços, mas ao longo do século XX, no pós-abolição, a
população negra foi paulatinamente marginalizada, excluída
dos espaços de poder, fazendo com que fosse criada uma
imensa desigualdade socioeconômica entre a população
negra e branca no Brasil que perdura até hoje.4
4 Ver mais em: NASCIMENTO, Abdias do. O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um racismo mascarado.
Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1978.
5 IBGE. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais. 2019.
6 Ver mais em: Ipea - Atlas da Violência v.2.7. Acesso em: 17 fev. de 2022.
13
As desigualdades raciais também estão presentes nas
condições de moradia, tanto na distribuição espacial das
moradias quanto na qualidade de vida que elas oferecem. O
Censo Demográfico de 2010 verificou que, nos dois maiores
municípios brasileiros, São Paulo e Rio de Janeiro, a chance
de uma pessoa negra residir em um aglomerado subnormal
era mais do que o dobro da verificada entre as pessoas
brancas. No Município de São Paulo, 18,7% das pessoas pretas
ou pardas residiam em aglomerados subnormais, enquanto
entre as pessoas brancas esse percentual era 7,3%. No
Município do Rio de Janeiro, 30,5% das pessoas pretas ou
pardas residiam em aglomerados subnormais, ao passo que
o percentual registrado entre as pessoas brancas foi 14,3%.7
7 IBGE. Quilombolas no Brasil. In: Diretoria de Pesquisas, Coordenação de População e Indicadores Sociais.
14
Nas palavras do intelectual Silvio Almeida,
O racismo é uma forma sistemática de
discriminação que tem a raça como fundamento,
e que se manifesta por meio de práticas
conscientes ou inconscientes que culminam em
desvantagens ou privilégios para indivíduos, a
depender do grupo racial ao qual pertençam
(ALMEIDA, 2019, p. 22).
15
1.2 O que é o Movimento Negro?
8 Ver mais em: DOMINGUES, Petrônio. Movimento Negro Brasileiro: alguns apontamentos históricos, Tempo 12
(23), 2007, Rio de Janeiro: EDUFF, p.100-122; GOMES, Nilma Lino. O Movimento Negro educador: Saberes
construídos nas lutas por emancipação. Petrópolis: Editora Vozes, 2017.
16
O ativista judeu Joseph L. Rauh, Jr. marchando ao lado de Martin Luther King, durante um protesto em 1963.
Fonte: U.S. National Archives and Records Administration, 2004.
17
2. Escravidão Africana e suas formas de resistência
2.1 Os Quilombos
18
Nos séculos XVI e XVII, Pernambuco e
o nordeste brasileiro de modo geral,
concentravam as principais
atividades econômicas do Brasil
colônia, sendo proporcionalmente a
região que mais recebeu
escravizados. Nesse período, a
maioria dos africanos que chegaram
ao Brasil eram oriundos da África
Central, dos países que atualmente
conhecemos como: Angola,
República do Congo e República
Democrática do Congo (HEYWOOD e
THORNTON, 2007, p. 268).
19
Rainha Jinga Ambande soberana dos reinos do Dongo e Matamba, uma das principais lideranças políticas e
militares da África Central no século XVII. Centenas de seus súditos foram escravizados no Brasil, sendo a luta
da rainha contra os portugueses a inspiração para o movimento “ginga” da capoeira. Foto: Achille Devéria,
impresso por François Le Villain, publicado por Edward Bull, publicado por Edward Churton, segundo artista
desconhecido. Fonte: National Portrait Gallery, Londres.
9 Na África Central, quilombos eram os acampamentos dos guerreiros imbangalas, chamados pelos
portugueses de jagas. No Brasil, quilombos se tornaram espaços organizados por africanos e seus
descendentes, tornando-se ao longo da história do Brasil, símbolo da resistência anti-escravocrata. Ver mais
em: THORNTON, John K.Les États de l’Angola et la formation de Palmares (Brésil). In: Annales. Histoire, Sciences
Sociales, v. 63 (4), 2008, pp. 769-797.
20
Palmares não era simplesmente um aglomerado de
indivíduos africanos fugindo da escravidão que se isolaram
em meio a mata. Na verdade, o Quilombo dos Palmares é
considerado uma continuidade dos reinos do Congo e Dongo,
dois dos maiores reinos da África Central no século XVII, pois
os líderes palmarinos reconstruíram as sociedades dos sobas
e manis (líderes políticos ambundos e bacongos). As
10
10 Ambundos e bacongos são dois grupos étnicos da África-Central, dos atuais países Angola, República do
Congo e República Democrática do Congo. Ver mais em: PARREIRA, Adriano. Dicionário glossográfico e
toponímico da documentação sobre Angola, séculos XV-XVII. Lisboa, 1990;
11 Relação das guerras feitas aos Palmares de Pernambuco no tempo do governador dom Pedro de Almeida
de 1675 a 1678. M. S. offerecido pelo Exm. Sr. Conselheiro Drummond). Revista do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, 22 (1859): 303-329
21
Palmares foi crescendo entre as primeiras décadas de
1600, e acabou se tornando objeto de grande preocupação
para as autoridades coloniais, pois o Quilombo passou de
uma pequena aglomeração de africanos para uma grande e
forte sociedade auto organizada, que se articulava com
escravizados das senzalas de Pernambuco e cada vez mais
diminuía a mão-de-obra dos canaviais de açúcar. Um dos
últimos e mais importantes líderes de Palmares, foi Gana
Zumba, que era reconhecido como um rei e fora do Quilombo
(GOMES; LAURIANO; SCHWARCZ, 2021).
22
tropas lideradas pelo bandeirante Domingos Jorge Velho.
Zumbi conseguiu fugir, mas acabou sendo capturado e morto
em 20 de novembro de 1694. A data da morte do último líder
da maior resistência anti-escravocrata da história do Brasil,
foi escolhida como o Dia da Consciência Negra, em
homenagem à resistência e luta da população negra ao
longo da história brasileira (DOMINGUES, 2007, p. 115).
13 Ver mais em: Relembrando Palmares: Do Quilombo Histórico à Memória do Povo Negro. In:
https://artsandculture.google.com/story/QQVxHr3UDLY8JQ?hl=pt-BR. Acesso em: 06 de mar. de 2022
23
Estátua do Zumbi dos Palmares em Salvador. Foto: Jefferson Peixoto/Secom. Fonte: Portal G1. 2019.
24
maior número de localidades quilombolas, 3.171. Logo em
seguida vem a região Sudeste com 1.359 quilombos. As
demais regiões têm os menores números: Norte (873), Sul
(319) e Centro-Oeste (250).14
11
Figura: Base de Informações Geográficas e Estatísticas sobre Indígenas e Quilombolas. Fonte: IBGE, 2019.
14 Dados do IBGE. In: Quilombolas no Brasil | Educa | Jovens – IBGE. Acesso: 11 de mar. de 2022.
15 Para o conceito de quilombos na atualidade ver mais em: EUGÊNIO, Benedito Gonçalves; MATOS, Wesley
Santos de. Comunidades quilombolas: elementos conceituais para sua compreensão. PRACS: Revista
Eletrônica de Humanidades do Curso de Ciências Sociais da UNIFAP
https://periodicos.unifap.br/index.php/pracs ISSN 1984-4352 Macapá, v. 11, n. 2, p. 141-153, jul./dez. 2018;
25
2.2 As rotas da liberdade
26
Foto: Reprodução Jornal Correio Paulistano, 1886. Fonte: São Paulo Antiga, 2013.
27
As fugas apontam para um forte nível
de organização logística dos
escravizados, pois envolviam o
planejamento do melhor momento
para fugir, os caminhos a serem
percorridos para a liberdade e muitas
vezes elas geravam uma rede de
ajuda que perpassava por outros
escravizados, negros livres e pessoas
brancas aliadas, mobilizando uma
grande quantidade de pessoas.
Mesmo que em muitos casos os
escravizados acabaram capturados,
o ato de resistir a escravidão fugindo
de seu local de cativeiro não deixa de
ser uma das mais importantes
formas de organização da população
negra em prol da liberdade no período
da escravidão (ALBUQUERQUE; FILHO,
2006, p.117).
29
Historicamente, as igrejas de Nossa Senhora do Rosário,
assim como as de São Benedito e Santa Efigênia, tiveram
uma forte ligação com a população africana e
afrodescendente. Isso porque esses 3 santos foram
escolhidos para a evangelização dos africanos na África
Central desde os primeiros contatos estabelecidos entre
portugueses e o reino do Congo, e consequentemente
trazidos pelos escravizados ao Brasil, estando presente em
solo brasileiro desde o período colonial (REGINALDO, 2011). No
século XVIII, temos o surgimento da lenda de Chico Rei em
Minas Gerais, região sudeste do Brasil. Segundo a tradição,
Chico Rei se chamava Galanga e era um importante líder
político do Congo. Ele, sua esposa, filhos e outros membros da
elite do Congo, foram sequestrados e enviados para Ouro
Preto em Minas Gerais, que no século XVIII se tornou a
principal região econômica da colônia, através da
exploração de ouro e diamantes. Galanga foi reconhecido
como um importante líder do Congo pela população local,
formada por uma maioria de centro-africanos. Com o passar
do tempo, o monarca juntou ouro o suficiente para comprar a
sua alforria e de outros escravizados do Congo, passando
então a viver como um verdadeiro rei.
31
Outra importante forma de
organização política e social da
população negra escravizada foram
as revoltas, que muitas vezes
resultaram em assassinatos de
senhores de escravizados,
instaurando um forte medo na
minoria populacional branca
(ALBUQUERQUE, 2006, p. 135-138). As
revoltas ocorriam tanto nas áreas
rurais quanto urbanas, eram
planejadas a longo prazo ou surgiam
instantaneamente em um momento
oportuno. Durante as revoltas, os
escravizados se utilizavam de
ferramentas como enxadas, pás,
foices, facas e em alguns casos
armas de fogo, se juntavam para
matar capatazes, feitores, seus
proprietários, as forças policiais, em
um ato de legítima defesa para
destruir de uma vez por todas seus
cativeiros. As revoltas poderiam
resultar em fugas para quilombos e
centros urbanos ou em prisões,
castigos, mortes e deportações para
os participantes (ALBUQUERQUE,
2006, p. 139).
32
A maior e mais importante revolta urbana de
escravizados no Brasil e nas Américas foi a Revolta dos Malês,
ocorrida em 1835 na cidade de Salvador, Bahia. Essa revolta
foi protagonizada por africanos muçulmanos, livres e
escravizados, oriundos da região do norte da África, onde
hoje se localizam os países Nigéria, Benin e Serra Leoa. Entre o
fim do século XVIII e início do XIX, boa parte dos africanos que
foram levados para a Bahia, foram provenientes da região
norte do continente africano. Essa região tinha forte
influência muçulmana, consequentemente entrou um
relativo número de africanos muçulmanos no Brasil (REIS,
1986, p. 110-111).
33
tempos, para planejar o melhor momento para tomar o poder
em Salvador (ALBUQUERQUE, 2006, p. 137).
34
debates sobre a escravidão e o tráfico de escravizados da
África. Afinal, havia um contingente populacional negro
muito superior a população branca em praticamente todo o
país, e mantê-los sobre controle estava cada vez mais difícil.
Talvez fosse a hora de abolir o tráfico de escravizados.
16 Ver mais em: SILVA, Ãngela Fileno da. Brasileiros em Lagos: identidades no contexto da colonização britânica.
Tese de Doutorado. São Paulo: USP, 2016.
35
Livro contendo trechos do alcorão encontrado preso ao pescoço de um negro morto durante a revolta dos
Malês na Bahia, em 1835. Era comum os africanos muçulmanos carregarem bolsinhas com trechos do alcorão
e amuletos religiosos, os famosos patuás. Foto: BRASIL + 500 Mostra do Redescobrimento. Negro de Corpo e
Alma. Fonte: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2022.
17 Ver mais em: SILVA, Ãngela Fileno da. Brasileiros em Lagos: identidades no contexto da colonização britânica.
Tese de Doutorado. São Paulo: USP, 2016.
36
Apesar das leis abolicionistas terem
sido aprovadas e assinadas pelas
autoridades imperiais, a abolição no
Brasil é fruto e conquista da luta da
população negra, e não benevolência
da Princesa Isabel ou qualquer outra
pessoa da elite política nacional. Foi a
organização política das
comunidades negras no Brasil
Império que pressionaram a abolição
do regime escravocrata no Brasil.
37
Nesse período, uma das personalidades negras de
maior influência no abolicionismo foi Luiz Gonzaga da Pinta
Gama, mais conhecido como Luiz Gama. Ele nasceu em
Salvador, Bahia, em 1830 e possivelmente era filho da relação
entre Luiza Mahin, uma africana livre que participou da
revolta dos malês, com um homem branco. Em 1840, Luiz
Gama foi vendido ilegalmente como escravizado por seu pai
e embarcou para a região Sudeste. Após desembarcar em
Santos e percorrer o interior de São Paulo passando por
Campinas e Jundiaí, Luiz Gama foi vendido para um
comerciante da capital paulista. Segundo suas memórias,
aos 17 anos teve os primeiros contatos com a escrita e leitura,
auxiliado por um hóspede de seu dono. Nessa época, Gama
conseguiu provar que era livre por ser filho de um homem
branco com uma mulher forra, e foi trabalhar na Guarda
Municipal Permanente. Nos seis anos em que esteve nas
forças policiais, Gama aprimorou a prática da leitura e
escrita, tornando-se oficialmente um funcionário público no
cargo de escrivão do estado (GOMES, 2021, p. 340-341).
38
Outra grande personalidade negra abolicionista
contemporânea de Luiz Gama foi André Rebouças. Nascido
em Cachoeira, Bahia, em 1838, Rebouças aprendeu a ler e
escrever com seu pai autodidata, e posteriormente ao seu
mudar para o Rio de Janeiro, ele e seu irmão Antônio
passaram a frequentar colégios em Petrópolis (GOMES, 2021,
p. 51). Entre 1854 e 1855, os irmãos Rebouças estudaram
engenharia na Politécnica e ingressaram no serviço militar.
Além de engenheiro militar, André ainda se formou em
ciências físicas e matemáticas, atuando em importantes
obras de engenharia do governo imperial. Em 1861, recebeu
uma bolsa de estudos para cursar engenharia civil na França.
Ao retornar, Rebouças participou de projetos que visavam a
modernização do Brasil através da construção de ferrovias.
Também foi professor na Politécnica e tornou-se membro do
Clube de Engenharia e da Associação Brasileira de
Aclimação. O engenheiro negro mantinha forte amizade com
a família imperial, e se tornou peça fundamental na
campanha abolicionista (NEVES, 2014, p.52-56).
39
Há diversas outras personalidades negras do
movimento abolicionista no século XIX, cujas trajetórias
constituíram marcos na luta pelo fim da escravidão.
Destacam-se ainda, Claudina Fortunato Sampaio, José do
Patrocínio, José Ferreira de Menezes, Machado de Assis,
Quintino de Lacerda, Tobias Barreto, e tantos outros
intelectuais e pessoas comuns cujos nomes desconhecemos
mas que sem dúvidas tiveram contribuições significativas
para a abolição. Apesar da abolição não ter rompido
efetivamente com a desigualdade socioeconômica e com o
racismo no Brasil, ela foi um marco fundamental para a
sociedade brasileira, sendo importante entendê-la como
uma conquista histórica da luta da população negra.
Retrato de André Rebouças. Foto: Rodolfo Bernardelli. Fonte: Museus Brasileiros, edição Banco Safra.
O líder abolicionista e ex-escravo brasileiro Luiz Gama, numa imagem por volta de 1880. Fonte: Autor
desconhecido.
40
Em suma, enquanto houve escravidão houve
resistência. Desde fugas e revoltas, a formação de quilombos,
da construção de irmandades religiosas a inserção nas
esferas políticas e sociais do Império, a população negra
encontrou diversas formas de organização política, social e
cultural.
41
3. Indicações cinematográficas
42
3.3 Abolição e pós abolição
43
Referências Bibliográficas
44
FROMÓNT, Cécile (ed). Afro-Catholic Festivals in the
Americas: Performance, Representation, and the Making of
Black Atlantic Tradition. Pennsylvania: Penn State University
Press, 2019.
45
LARA, Silvia Hunold. Depois da Batalha de Pungo Andongo
(1671): O Destino Atlântico dos Príncipes do Ndongo. In: Revista
de História, n. 175, 2016. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rh/a/WwjgYpXN3FZY6HLYkgrRsyL/ab
stract/?lang=pt. Acesso: 06 jun. de 2022.
46
PEREIRA, Mariana Morena. O Movimento Negro e as
Revoluções de 1968: uma análise da relação e ressignificação
do negro e o histórico do movimento no Brasil. In: Revista
Movimentos Sociais e Dinâmicas Espaciais, Recife v. 8, n. 1,
2019.
47
SOUZA, Alissa Galdino de. Gênero, escravidão e
deslocamentos: diálogos entre fugas e tráfico interprovincial
(1871 - 1875). Projeto de Conclusão de Curso. Campinas: PUC,
2021.
48
Sobre o autor
E-mail: [email protected]
49