Guerreira - Zeferina - Valdeck - Almeida - de - Jesus20190830 80688 5jd7mm With Cover Page v2
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Revista Cotoxó
A luta pela independência do Brasil tem muitos capítulos, vários deles iniciados na Bahia,
estado por onde começou a invasão portuguesa em 1500, e onde também o país se
libertou do jugo português, através de um movimento iniciado em 19 de fevereiro, cujo
desfecho foi em dois de julho de 1822. A guerra por liberdade teve a participação efetiva
das mulheres, dentre elas Joana Angélica, Maria Felipa, Anita Garibaldi, e outras.
As mulheres sempre tiveram participação efetiva na vida brasileira. “Na cultura brasileira,
e mais especificamente a nordestina, as mulheres de tradição africana, do campo e das
periferias, são depositárias de poderes extraordinários” (BARBOSA, 2015, apud
GEBARA, 1991). Guerreira Zeferina é uma dessas mulheres, da qual pouco registro
existe. A tradição oral informa que ela fundou e liderou o Quilombo do Urubu até 1826, em
Salvador, Bahia, na região onde atualmente está o bairro de Pirajá e Parque São
Bartolomeu, lugar de resistência e religiosidade afrobrasileira. Sua luta por liberdade é
admirável e tem características da luta do Brasil pela independência!
De acordo com a escritora angolana Dye Kasembe, nas famílias em África a mulher
detém o comando. E esta característica é determinante para se compreender o espírito de
organização e comando da Guerreira Zeferina. Estava no DNA, fazia parte de sua
vivência diária, herança de ancestrais. Em menor ou em maior proporção, esta chama de
luta por liberdade permeava as comunidades e o ser feminino ali se fez presente,
refletindo na construção de toda a sociedade, com suas batalhas, vitórias e derrotas, ao
longo da história africana e das mulheres daquele continente.
A escravização não apagou o espírito e a memória. Pelo contrário, reacendeu os laços
familiares, a alma comunitária e despertou, no caso particular, em Guerreira Zeferina, as
forças necessárias para lutar contra a opressão imposta a si e aos seus. Renasceu
naquela mulher as mais remotas memórias de mãe, esposa, companheira, amiga e
principalmente responsável por tomadas de decisões e avanços políticos, sociais e
econômicos.
Por falar em inspiração, dentre tantas memórias ancestrais, na capital baiana uma das
inspirações é o Coletivo ZeferinaS, de poetas que mantém a luta por empoderamento
feminino; outra é a Associação de Mulheres Negras Quilombo Zeferina, em Pirajá, que
realiza trabalhos de conscientização e fortalecimento das mulheres em luta por respeito;
Biblioteca Zeferina Beiru, com oficinas de arte, leitura etc; há, também, um curso pré
vestibular batizado como Quilombo Urubu, no bairro Cajazeiras, que prepara jovens para
conquistar espaço em universidades do estado; e mais recentemente um bairro fundado e
conhecido como Cidade de Plástico foi reestruturado e batizado de Comunidade
Guerreira Zeferina.
Por vezes o questionamento gira em torno de quem foi a mãe, a esposa ou apenas o ser
feminino que forjou a imagem do herói que se fez e faz presente com tamanha
intensidade em cada página da história que nos são apresentadas.
Ao longo do tempo a mulher resiste, desenvolve estratégias que evidenciam o seu papel
histórico, sua capacidade de reinvenção, fugindo de estereótipos moldados para ser
apenas excluída socialmente e ter apagado seus feitos enquanto protagonista inteligente
e forte, muitas vezes tratando o termo “guerreira” como uma exceção e não como regra
de sua existência.
Ao tomarmos como base a trajetória de Zeferina e sua luta por justiça e liberdade,
reconhecida hoje ainda com poucos registros – porém, viva, graças à tradição oral -,
temos uma mulher, negra, escravizada e agindo estrategicamente para transformar a sua
realidade e a de tantos no seu entorno.
E Zeferina não foi uma única mulher. Ela foi o reflexo de todas as demais que vieram
antes de si, como sua mãe Amália, responsável pela formação da menina Zeferina, cujo
empoderamento se deu a partir das histórias de outras mulheres que sua mãe lhe
contava, da forma como seu povo ancestral se organizava e respeitava a liberdade.
Como não lutar pela liberdade se as que vieram anteriormente souberam fazer e defender
seu povo? A formação do Quilombo era uma possibilidade de recriar o universo que
Zeferina conheceu a partir dos relatos de antepassados e, através da oralidade, outras
mulheres, homens, meninas e meninos foram acreditando na liberdade que deveria ser
construída a partir da sua própria luta. A mensagem passada para a menina Zeferina
através da tradição oral lhe inspirou a ser como suas ancestrais, mulher negra, heroína,
guerreira que jamais perdeu a fome de liberdade - ainda que sobrevivendo ao ambiente
insalubre destinado aos escravizados. Revolucionária, lutou em defesa do seu povo,
liderou e se fez protagonista em favor da dignidade, visibilidade e cidadania.
Sua disposição a lutar por liberdade se fortaleceu em 1826 ao receber, de uma casa de
candomblé, os títulos de rainha, chefe, quilombola e guerreira, na região do Quilombo do
Urubu. Lutou contra as forças policiais, acabou sendo presa e faleceu na prisão. “Seus
restos mortais foram sepultados em algum lugar do Cabula” (BARBOSA, 2015).
De acordo com Davi Nunes, em artigo publicado no blogue Ungareia (2016), “Zeferina foi
uma líder com muito poder, a qual todos a reverenciava e seguia as suas estratégias de
luta. Ela organizou índios, escravizados fugidos, ou melhor, homens e mulheres que
cunharam a sua liberdade com coragem, e libertos, no geral, que queriam a libertação
para todos os negros da província do Salvador”.
O levante aconteceria no natal, dia 25 de dezembro de 1826, mas foi antecipado porque
em 17 de dezembro o Quilombo do Urubu foi surpreendido por capitães do mato, que
foram derrotados. Alguns escaparam e se juntaram ao comandante de tropa, José
Baltazar da Silveira, com doze soldados e um cabo, e mais de vinte soldados das milícias
de Pirajá que empreenderam novo ataque. Zeferina, com arco e flecha os confrontou,
mas foi vencida, amarrada e levada à Praça da Sé, onde foi insultada por escravocratas
(NUNES, 2016).
A morte de Zeferina no Forte do Mar não arrefeceu os ânimos pela luta contra a
escravização. Ao contrário, fortaleceu a chama da liberdade e a Guerreira Zeferina se
tornou um símbolo da luta contra a dominação.
Há muitas outras mulheres na Bahia, cada uma com sua contribuição na luta por
afirmação, em outros tempos, como Tia Ciata, Luísa Mahin. A história, antes contada pelo
opressor, hoje começa a ser reanalisada, reescrita e ressignificada, rendendo
homenagens àquelas heroínas anônimas (ARRAES, 2017), a todas as mulheres que
tiveram atuação de extrema importância para a conquista da liberdade feminina e
consolidação da independência do Brasil. Falar da luta de Zeferina é reconhecer a
importância das mulheres e denunciar a morte histórica e epistemológica de cada uma
delas. Para cada nome apagado, para cada silenciamento, um grito de Guerreira Zeferina
Vive!
Referências Bibliográficas:
ARRAES, Jarid. Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis. São Paulo: Pólen, 2017.
La lucha por la independencia del Brasil tiene varios capítulos, muchos de los cuales ini-
ciaron en el estado de Bahía, lugar al que llegó la invasión portuguesa en 1500, dando fin
al yugo, sólo hasta el año de 1822, a través del movimiento libertario que inició el 19 de
febrero y finalizó el 2 de julio del mismo año. La guerra por la libertad tuvo la participación
efectiva de las mujeres, como Joana Angélica, Maria Felipa, Anita Garibaldi, entre otras.
Las mujeres siempre han tenido una participación efectiva en la vida brasileña. "En la
cultura brasileña, y más concretamente al noreste, las mujeres de la tradición africana, el
campo y los suburbios, son depositarias de poderes extraordinarios" (Barbosa, 2015,
apud GEBARA, 1991). La Guerrera Zeferina, de la cual existen pocos registros, fue una
de ellas. La tradición oral informa que la Guerrera Zeferina fundó y lideró el Quilombo del
Urubu hasta 1826 en Salvador, Bahía, en la región donde actualmente se encuentra el
barrio de Pirajá y Parque San Bartolomé, lugar de resistencia y religiosidad
afrobrasileña. ¡Su lucha por la libertad es admirable y tiene características de la lucha por
la independencia de Brasil!
En la primera mitad del siglo XIX, ya en la condición de esclava, Zeferina fue traída en los
brazos de su madre, Amalia, desde Angola" (Barbosa, 2015).
De acuerdo con la escritora angoleña Dye Kasembe, en las familias africanas, la mujer
tiene el mando, una característica determinante para comprender el espíritu de
organización y mando de la Guerrera Zeferina. Estaba en su ADN, formando parte de su
vivencia diaria, como herencia de sus ancestros. En menor o en mayor proporción, esta
llama de lucha por la libertad, permeaba a las comunidades. El ser femenino entonces
hizo presencia, reflejado en la totalidad de la construcción social, con sus batallas,
victorias y derrotas, a lo largo de la historia africana y de las mujeres del continente.
Hay mujeres que aún, luchan inspiradas por su imagen inspiradora entre tantas memorias
ancestrales, como el Colectivo ZeferinaS, conformado por poetas que defienden el
empoderamiento femenino; La Asociación de Mujeres Negras Quilombo Zeferina, en
Pirajá, realiza trabajos de concienciación y fortalecimiento de las mujeres, en la lucha por
el respeto; Biblioteca Comunitaria Zeferina Beiru, con talleres de arte, lectura, etc; El
curso pre vestibular bautizado como Quilombo Urubu, en el barrio Cajazeiras, prepara a
los jóvenes para conquistar espacio en universidades del estado; y más recientemente un
barrio fundado y conocido como Ciudad de Plástico, fue reestructurado y bautizado como
Comunidad Guerrera Zeferina.
A veces el cuestionamiento gira en torno a quién fue la madre, la esposa o apenas el ser
femenino que forjó la imagen del héreo que se hizo y hace presencia, con tanta
intensidad, en cada página de la historia que nos es mostrada.
Y Zeferina no fue una sola mujer. Fue el reflejo de todas las demás que estuvieron antes
de sí misma, como su madre Amália, responsable de la formación de la niña Zeferina,
cuyo empoderamiento se dio a partir de las historias de otras mujeres, que su madre le
contaba, sobre la forma como su pueblo ancestral se organizaba y respetaba la herencia
de la libertad.
¿Cómo no luchar por la libertad si estas mujeres ancestrales supieron construir un pueblo
y además defenderlo? La formación del Quilombo era una posibilidad de recrear el
universo que la Guerrera Zeferina conoció a partir de los relatos de antepasados y, a
través de la oralidad, otras mujeres, hombres, niñas y niños fueron creyendo en la libertad
que debía ser construida a partir de su propia lucha. El mensaje transmitido a la niña
Zeferina a través de la tradición oral, la inspiró a ser como sus antepasados, mujer negra,
heroína, guerrera, con insaciable hambre de libertad, aunque sobreviviendo en la miseria
prodigada a los esclavos. Como revolucionaria, luchó en defensa de su pueblo, lideró y se
hizo protagonista en favor de la dignidad, la visibilidad y la ciudadanía.
La muerte de Zeferina en el Fuerte del Mar, no enfrió los ánimos por la lucha contra la
esclavitud. Al contrario, fortaleció la llama de la libertad y la Guerrera Zeferina se convirtió
en un símbolo de la lucha contra la dominación.
Hay muchas outras mujeres de Bahía, cada cual con su contribución en otros tiempos,
como Tia Ciata o Luisa Mahin. La historia, antes contada por el opresor, hoy comienza a
ser reanalizada, reescrita y resignificada, rindiendo homenaje a aquellas heroínas
anónimas (ARRAES, 2017), a todas las mujeres que fueron extremadamente importantes
para el logro de la libertad de las mujeres y la consolidación de la independencia de
Brasil. Hablar de la lucha de Zeferina es reconocer la importancia de las mujeres y
denunciar la muerte histórica y epistemológica de cada una de ellas. Para cada nombre
borrado, para cada silenciamiento, un grito de Guerrera Zeferina Vive!
Referencias bibliográficas:
ARRAES, Jarid. Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis. São Paulo: Pólen, 2017.
BARBOSA, Sílvia. O poder de Zeferina no Quilombo do Urubu. Site Est, 2005.
Disponível em:
<http://www.est.com.br/periodicos/index.php/identidade/article/viewFile/2263/2158>.
Acesso em 30, abril 2019.
LIMEIRA, José Carlos. Insônias. Autores baianos: um panorama, Antonio Brasileiro et al.
Organização Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB)._ Salvador: P55, 2014.