PUDOR LF Veríssimo
PUDOR LF Veríssimo
PUDOR LF Veríssimo
Mas experimente dizer "silfo". Não voou, certo? Ao contrário da sua mulher,
"silfo" não voa. Tem o alcance máximo de uma cuspida. "Silfo", zupt, plof. A própria
palavra "borboleta" não voa, ou voa mal. Bate as asas, tenta se manter aérea mas
choca-se contra a parede. Sempre achei que a palavra mais bonita da língua
portuguesa é "sobrancelha'. Esta não voa mas paira no ar, como a neblina das
manhãs até ser desmanchada pelo sol. já a terrível palavra "seborreia" escorre pelos
cantos da boca e pinga no tapete. "Trilhão" era uma palavra pouco usada,
antigamente.
Uma pessoa podia nascer e morrer sem jamais ouvir a palavra "trilhão", ou só
ouvi-la em vagas especulações sobre as estrelas do Universo. O "trilhão" ficava um
pouco antes do infinito. Dizia-se "trilhão" em vez de dizer "incalculável" ou "sei lá".
Certa vez (autobiografia) tive de responder a uma questão de Geografia no colégio.
Naquele tempo, a pior coisa do mundo era ser chamado a responder qualquer coisa
no colégio. De pé, na frente dos outros e - o pior de tudo - em voz alta.
"A senhora quer dizer neste exato momento?", dando a entender que, como o
que mais acontece na China é nascer gente, uma resposta exata seria impossível.
Mas meu espírito não estava ali. Meu espírito ainda estava em casa, dormindo.
"Então, senhor Verissimo, qual é a população da China?" E eu respondi: - Numerosa.
Ganhei zero, claro. Mas "trilhão", entende, era sinônimo de "numeroso".
Não era um número, era uma generalização. Você dizia "trilhão" e a palavra
subia como um balão desamarrado, não dava tempo nem para ver a sua cor. E hoje
não passa dia em que não se ouve falar em trilhões. O "trilhão" vai, aos poucos, se
tornando nosso íntimo. É o mais novo personagem da nossa aflição. Quantos zeros
tem um trilhão? Doze, acertei? Se os zeros fossem pneus, o trilhão seria uma
jamanta daquelas de carregar gerador para usina atômica parada. Felizmente vem aí
uma reforma e outra moeda, com menos zeros e mais respeito. Senão chegaríamos
à desmoralização completa. - E o troco do meu tri? - Serve uma bala?
Extraído do livro de crônicas Comédias para se ler na escola, de Luís Fernando Veríssimo.
1)Faça uma lista das palavras que você não conhece, procure o significado no dicionário e
resuma-o ao lado de cada palavra no seu caderno.
2) Explique qual o sentido que o Veríssimo traz ao falar que, a palavra “trilhão” ficava pouco
antes do infinito.
4) Justifique porque o Veríssimo diz que “a mente brasileira não está preparada para o
Quatrilhão”.
5) Agora é sua vez: faça uma lista com as três palavras mais bonitas da Língua Portuguesa para
você e as três mais diferentes/esquisitas ou interessantes para você. Ao lado de cada uma,
explique os motivos de sua escolha.
6) Percebeu que há palavras sublinhadas no texto, certo? São as palavras que servem para
ampliar o sentido, qualificar, expôr características, ou seja, adjetivos (palavras que se juntam
ao substantivo para modificar o seu significado, acrescentando-lhe noções de qualidade, natureza,
estado etc.). Sobre isso, faça o que se pede abaixo.
a) Copie os adjetivos sublinhados e a palavra a que eles se ligam no texto. Uma linha
para cada adjetivo e sua respectiva palavra.
b) Agora, utilize sinônimos (palavra, locução ou expressão) para cada adjetivo copiado
acima, deixando sentido igual ou parecido com o original. Ou seja, sem fazer grande
modificação de sentido no texto. Pode usar o dicionário para isso.