Artigo Disfonia Infantil

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COMUNICAÇÃO

Da garganta vem a voz: um projeto


de educação para a saúde

From the throat comes the voice: a


vocal healtheducationproject

De la garganta viene la voz: un proyecto


de educación para la salud vocal

Maria do Rosário Dias*


Ângela Maria Rodrigues Oliveira**
Ana Catarina Monteiro Medina Bastos**

Resumo

A disfonia infantil é caracterizada por uma perturbação vocal que tem o seu “veículo comunicativo”
prejudicado, comprometendo assim a mensagem verbal e a paralinguagem. Os nódulos vocais são a
principal causa de disfonia em crianças de ambos os sexos. Nas escolas, as ações educativas têm sido
apontadas como espaços sociais inovadores para a promoção da saúde vocal, no entanto são escassos
os relatos de experiências de campo deste tipo com crianças. Este projeto de educação para a saúde,
denominado “Da garganta vem a voz!”, também direcionado para pais e educadores, tem como objetivo
atuar no âmbito da promoção de saúde vocal junto de crianças em idade pré-escolar e alertá-las para a
importância de uma voz saudável, para o processo de fonação, bem como para os comportamentos que
induzem a disfonia e os que promovem a qualidade vocal. É um programa inovador que inclui diversos
recursos didáticos como uma dramatização de uma peça de teatro infantil por meio de fantoches, uma
música, um boneco, pictogramas alusivos ao tema e um guia informativo direcionado para os pais.
Conclui-se que para que os sintomas inerentes à disfonia infantil possam ser detectados e compreendidos
em tempo adequado por crianças, pais e educadores, torna-se necessário a intensificação da realização
de ações educativas de promoção da saúde que abordem o tema da voz. qualificados.

*
Psicóloga; Professora Associada na Egas Moniz, Cooperativa de Ensino Superior; Coordenadora do Egas Moniz Centro de In-
vestigação Multidisciplinar em Psicologia da Saúde; Doutorada em Psicologia clínica,Lisboa,Portugal.
**
Terapeuta da Fala. Investigadora no Centro do Egas Moniz Centro de Investigação Multidisciplinar em Psicologia da
Saúde,Lisboa,Portugal.
Contribuição dos autores: MRD: Conceituou e projetou o estudo e o instrumento de coleta de dados , elaborou o manuscrito
inicial, e aprovou o manuscrito final apresentado.ÂO Realizou as análises, uma revisão crítica e na revisão do manuscrito, e
aprovou a redação final para submissão. Coordenou a coleta de dados e uma revisão crítica do manuscrito.CB: Realizou a análise,
elaborou o manuscrito inicial, e aprovou o manuscrito final apresentado. Coleta de dados coordenada / supervisionada, com uma
revisão crítica do manuscrito.
Autora Responsável:Maria do Rosário Dias
Endereço para correspondência:Cooperativa Egas Moniz - Centro de Investigação Multidisciplinar em Psicologia da Saúde,
Campus Universitário, Quinta da Granja, Monte de Caparica. Caparica - Portugal. 2829-511.E-mail :[email protected]
Recebido: 26/07/2014 Aprovado: 26/10/2014

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Da garganta vem a voz:
um projeto de educação para a saúde vocal

COMUNICAÇÃO
Palavras-chave: Fonoaudiologia; voz; promoção da saúde; educação em saúde.
Abstract

The childhood dysphonia is a voice disorder characterized by having its “communicative vehicle”
harmed, thereby undermining the verbal message and paralanguage. Vocal nodules are the main cause of
dysphonia in children of both sexes. In schools, educational activities have been identified as innovative
in promoting vocal health social spaces, however are few reports of field experiments of this kind with
children. This education project for health, ‘From throat comes the voice “, also directed to parents and
educators, aims to act in the pursuit of vocal health among children of preschool age and alert them to the
importance of a healthy voice to the process of phonation, as well as the behaviors that lead to dysphonia
and promoting voice quality. It is an innovative program that included a variety of teaching resources
such as a dramatization of a piece of children’s theater through puppets, a music, a doll, pictograms
depicting the theme and an informative guide for the parents. We conclude that for symptoms related
to the childhood dysphonia can be timely detected and understood by children, parents and educators,
it is necessary to intensify the implementation of educational measures for health promotion to address
the issue of voice.

Keywords: Speech, Language and Hearing Sciences; voice; health promotion; health education.
Resumen

La disfonía infantil se caracteriza por una perturbación vocal que tiene su “vehículo comunicativo”
comprometiendo así el mensaje verbal y emocional. Los nódulos vocales son la principal causa de disfonía
en niños de ambos los sexos. En las escuelas, las actividades educativas han sido identificadas como
espacios sociales innovadores para la promoción de la salud vocal, sin embargo, hay pocos informes de
este tipo de experiencias de campo con niños. Este proyecto de educación para la salud, llamado ‘De
la garganta viene la voz!”, también dirigida a los padres y educadores, tiene como objetivo actuaren
la promoción de la salud vocal entre los niños de edad preescolar y alertarlos sobre la importancia de
una voz saludable, sobre el proceso de la fonación, así como sobre los comportamientos que conducen
a la disfonía y a la promoción de la calidad de voz. Es un programa innovador que incluye diversos
recursos didácticos como una dramatización de una pieza de teatro infantil con títeres, una música, una
marioneta, pictogramas que representan el tema y una guía informativa dirigida a los padres. Se concluye
que para que los síntomas relacionados con la disfonía infantil puedan ser detectados y entendidos
oportunamente por los niños, padres y educadores, es necesario intensificar la realización de acciones
educativas acerca de la promoción de la salud que enfoquen el tema de la voz.

Palabras clave: Fonoaudiología; voz; promoción de la salud; educación en salud.

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Maria do Rosário Dias;Ângela Maria Rodrigues Oliveira;Ana Catarina Monteiro Medina Bastos
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Introdução humano, de modo a promover o empowerment


A voz depende da modulação do som, de dos indivíduos6,7.
ajustes da intensidade, da altura e ressonância, Higiene é um termo amplo relacionado a
sendo responsável pela competência comunicativa, comportamentos necessários à promoção da saúde.
transmitindo aspectos emocionais ao mesmo tempo Quando relacionado com a voz, o termo utilizado é
que possibilita a caracterização da personalidade da higiene vocal, consistindo em normas básicas que
criança1. É importante comunicar o que se deseja auxiliam a promover a saúde vocal. Estas normas
sem esforço, com prazer, fluência e habilidade2. devem ser seguidas por todos, particularmente
Como a voz é uma das formas de expressão por aqueles que apresentam tendência a alterações
mais importantes do ser humano e a principal fer- vocais como as crianças. O ponto básico da higiene
ramenta para a comunicação, a sua alteração pode vocal é compreender como a voz é produzida e
ter diferentes repercussões. A disfonia é entendida quais os órgãos envolvidos nesse processo. Em
segundo lugar, é importante compreender quais
como um enfraquecimento de todos os parâmetros
são os determinantes que prejudicam e colocam em
vocais, apresentando várias modificações na quali-
risco a saúde vocal. Por último, é importante saber
dade do som, como na altura ou na intensidade1.Na
quais são os comportamentos básicos para manter
infância, a disfonia pode apresentar consequências
uma emissão saudável8.
nefastas ao nível do desenvolvimento da capaci-
dade de comunicação socialmente adequada ou Um dos fatores que mais predispõe e agrava
mesmo no desenvolvimento afetivo-emocional1. o quadro clínico de disfonia infantil por nódulos
Se não for precocemente detectada poderá não vocais é a utilização de hábitos vocais inadequa-
ser possível a reabilitação completa e a criança dos1. A aprendizagem e uso de hábitos vocais
perpetuará a disfonia na idade adulta3. inadequados ocorrem durante o desenvolvimento
da criança, em ambiente escolar, em socialização
As crianças, por possuírem um trato vocal
com os pares, na prática de desportos coletivos,
com uma geometria e fisiologia delicada e imatura,
em casa com os seus familiares ou mesmo quando
apresentam uma predisposição anatomofuncional
brinca sozinha. São hábitos definidos pelo uso
para o desenvolvimento de disfonias4.
incorreto da voz que incluem comportamentos
A principal causa de alteração vocal infantil bruscos que podem ser traumáticos, tais como: gri-
tem uma origem funcional, podendo, ou não, estar tar, falar excessivamente ou em sussurro, competir
associada a alterações orgânicas secundárias, mais com os sons de fundo, realizar um ataque vocal
especificamente a nódulos vocais bilaterais3-5. A brusco, chorar prolongadamente, pigarrear, tossir,
presença de nódulos vocais determina uma série imitar vozes, cantar sem técnica, não manter uma
de alterações ao nível da fisiologia da dinâmica hidratação adequada, ingerir bebidas muito frias
fonatória, tais como vibrações aperiódicas e irre- ou quentes, ausência ou escassez de momentos de
gulares das pregas vocais, devido ao desequilíbrio repouso vocal adequado ou a exposição a mudanças
entre as forças mioelásticas da laringe e as forças de temperaturas e ambientes com fumo3,8.
aerodinâmicas pulmonares. A laringe infantil, de Uma maneira de se evitar a prática de hábitos
modo geral, apresenta nódulos maiores onde as vocais inadequados é fornecer alternativas aos
pregas vocais têm dificuldade em realizar uma mesmos, isto é, ensinar os comportamentos básicos
coaptação completa à fonação, havendo escape de de higiene vocal para se manter uma emissão sau-
ar não sonorizado, o que, por sua vez, pode levar a dável da voz. Os hábitos vocais considerados como
uma tentativa de compensação através do aumento adequados são: ingerir água à temperatura natural
de tensão muscular e de intensidade vocal, compli- ao longo do dia, limpar diariamente o nariz com
cando o quadro clínico1. soro fisiológico para facilitar a respiração nasal,
O objetivo da promoção da saúde é desen- deglutir água ou saliva quando se tem vontade
volver e maximizar uma saúde geral ótima e os de pigarrear ou tossir, falar com uma articulação
recursos das comunidades, isto é, indicar um olhar ampla, utilizar a linguagem corporal, apitos ou
abrangente e positivo para o desenvolvimento assobios para comunicar em situações de ruído,

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um projeto de educação para a saúde vocal

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recorrer a pausas durante o discurso e ao repouso identificação de um caso de disfonia infantil seja
noturno num mínimo de oito horas por noite8. a sinalização para Terapia da Fala13.
Nas escolas, a realização de ações educativas As crianças não têm consciência dos fatores
tem sido apontada como uma atividade interessante que desencadeiam, agravam e perpetuam a disfonia
para a promoção da saúde vocal, no entanto escas- infantil e estudos evidenciam que os pais e educa-
sos são os relatos de tais experiências de voz com dores dão pouca importância às alterações vocais na
crianças nas escolas9. A implementação de serviços infância, o que pode estar relacionado à dificuldade
de intervenção precoce em ambientes de aprendiza- dos mesmos para identificarem e reconhecerem a
gem naturais para a criança, como a escola, é uma disfonia, fatores de risco que podem acarretar tal
prática efetiva e benéfica para a aprendizagem, quadro, bem como as suas implicações na criança2.
crescimento e desenvolvimento da mesma10. Assim, o objetivo geral da publicação desta
comunicação é a descrição de um instrumento
O terapeuta da fala pode oferecer diversos ser-
de educação para a saúde construído no sentido
viços nestas instituições, nomeadamente rastreios,
de levar às crianças, famílias e educadores uma
orientação a pais e/ou professores, participação
ação orientada para a promoção da saúde vocal
no planeamento escolar e atuação promocional de
infantil. A pertinência prende-se com a inexistên-
saúde11. Assim, enquanto promotor de saúde, deve
cia, segundo a revisão da literatura realizada, de
reconhecer a necessidade de um trabalho prévio
instrumentos de educação para a saúde neste tema
de identificação/consciencialização da lógica
especialmente direcionados para grupos de crianças
organizacional das crianças que dê suporte à ação
em idade pré-escolar em Portugal.
em promoção da saúde, baseando a sua prática
num estado cognitivo que resulta numa intrínseca
Descrição
motivação para a ação7.
Deste modo, importa antes de tudo, compreen- Este instrumento tem como população alvo
der os usos que a criança faz da voz nos contextos crianças que se encontrem no período de desen-
quotidianos e, quando se trata do escolar, é desta- volvimento pré-escolar com idades compreendidas
cada a importância da parceria entre o terapeuta da entre os três e os seis anos14. No entanto, a faixa
fala, a família, os educadores e demais membros etária pode ser alargada para crianças já em idade
da comunidade escolar, na realização de ações escolar uma vez que este instrumento tem a van-
educativas para a promoção da saúde na escola9. tagem de poder ser também utilizado em contexto
O desenvolvimento das ações educativas de intervenção terapêutica individual.
voltadas para a promoção de saúde vocal infantil Por se tratar de um instrumento de promoção
deve incluir a participação dos educadores, uma de saúde, pretende-se atuar em faixas etárias ante-
vez que estes profissionais acompanham a vida riores àquelas onde majoritariamente a disfonia
da criança no período em que ela está sob sua res- infantil incide. Um estudo realizado em Espanha
ponsabilidade. Além disso, ao se abordar o tema concluiu que esta patologia representa 6 a 9% das
voz e medidas de promoção de saúde vocal com crianças que estudam no ensino primário, incidindo
educadores, pode-se inserir no trabalho educativo na altura de entrada no mesmo, isto é, em crianças
realizado no contexto escolar estratégias de ensino- com idades entre os seis e os sete anos de idade15.
-aprendizagem que propiciem a estes profissionais O instrumento de intervenção descrito na
a construção de conhecimentos que podem eles presente comunicação denomina-se “Da garganta
próprios adotar, como por exemplo a realização de vem a voz!” e é constituído por três itens princi-
exercícios de aquecimento e arrefecimento vocal12. pais: o boneco “José” e o cenário de teatro infantil,
Ainda, pela revisão da literatura realizada verifica- construídos com o objetivo de serem utilizados
-se que embora haja crianças em idade escolar que em terapia direta; e um guia informativo para pais
estão identificadas com perturbações vocais, a direcionado para a “terapia em diferido” (ena-
maioria delas não é referida ou submetida a terapia bling). Incorporamos no nosso projeto materiais
vocal. Assim, torna-se de extrema importância e atividades lúdicas, uma vez que a ludicidade é
sensibilizar os educadores sobre o importante papel uma necessidade da criança que auxilia a apren-
que a terapia vocal desempenha com crianças com dizagem, o desenvolvimento pessoal, social e
disfonia, de maneira a que o próximo passo após a cultural, colaborando para uma boa saúde mental

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Maria do Rosário Dias;Ângela Maria Rodrigues Oliveira;Ana Catarina Monteiro Medina Bastos
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um desenho, percetível visualmente, usado para


e física. Ainda, o lúdico no meio escolar é um meio
muito eficaz de “entrar” pelo universo infantil transmitir uma informação independentemente da
transmitindo-lhe o melhor do universo adulto, os linguagem. O uso de pictogramas em saúde que
nossos conhecimentos e principalmente a impor- capturem elementos básicos e que transmitam a
tância da comunicação18. Em contextos de saúde, o informação crucial pretendida é um excelente meio
recurso a instrumentos lúdicos e técnicas projetivas de transmissão de uma ideia, logo um veículo de
constitue-se como uma mais-valia19. Estes itens têm comunicação20. Estudos mostram que na prática
como objetivo principal que a criança compreenda
clínica os pictogramas são utilizados para uma
e aprenda qual a importância de uma voz saudável
melhor compreensão e recordação da informação
na sua vida, como decorre o processo de fonação,
quais os órgãos envolvidos e quais os hábitos vocais e devem ser usados acompanhados de orientação
necessários para a sua saúde vocal. verbal prestada pelos profissionais de saúde, facili-
Recorreu-se ainda a atividades que envolvem tando a comunicação entre estes e o paciente, tendo
o brincar, como o faz de conta. A brincadeira é em conta a sua idade e nível de alfabetização21.
universal e própria da saúde, pois facilita o cresci- Os pictogramas deste instrumento, num total de
mento e conduz aos relacionamentos grupais, uma setenta, foram desenhados para ambos os sexos
vez que pode ser uma forma de comunicação con-
(Versão masculina – vm; Versão feminina - vf),
sigo mesmo e com os outros16. Esta é uma situação
privilegiada de aprendizagem infantil que se pode estando divididos em quatro categorias: anatomo-
configurar como um espaço de experimentação e fisiologia da produção vocal (Figura 1) contendo
estabilização de conhecimentos e afetos, por meio seis (6) pictogramas, relaxamento e aquecimento
das interações entre crianças e adultos, possibili- vocais (Figura 2) contendo dezesseis (16), maus
tando a criação de um vínculo com as atividades. É hábitos vocais (Figura 3) contendo trinta e dois
mediante a brincadeira que as crianças se apropriam (32) pictogramas e bons hábitos vocais contendo
do mundo não diretamente, mas ativamente por dezesseis (16) pictogramas (Figura 4). Com recurso
meio da representação, construindo a consciência
a este material pretende-se que seja feita a cons-
da realidade ao mesmo tempo em que já vivenciam
uma possibilidade de modificá-la17. ciencialização e sensibilização para os princípios
O boneco “José” (Figura 1) foi inspirado no de saúde vocal, incentivando a criança a reduzir os
boneco da marca Lego® por ser muito didático e abusos vocais que possivelmente realiza.
ainda muito utilizado pelas crianças no seu quo-
tidiano, facilitando a criação de empatia com o
mesmo. Este instrumento foi construído tendo em
conta os seguintes materiais: uma peruca, caixas de
cartão, madeira contraplacada, papel autocolante,
feltro, velcro, imagens plastificadas dos órgãos
responsáveis pela fonação, uma bola de esferovite,
elásticos, missangas, uma garrafa de plástico e
cola. A produção da voz depende de vários órgãos,
nomeadamente os pulmões, a laringe e o trato
vocal, sendo que cada um destes encontra-se numa Figura 1 – Pictogramas representativos da
parte distinta do aparelho fonador. Por este fato, no
interior do boneco “José” é possível que as crianças categoria “Anatomofisiologia da produção vocal”
visualizem e manipulem os órgãos intervenientes
no processo de fonação, nomeadamente a laringe,
a traqueia, os pulmões e o diafragma. O boneco
possui ainda uma mochila que tem como função
guardar o dossier que contém os pictogramas tanto
do “José” (para as crianças do sexo masculino)
como os da “Maria” (para as crianças do sexo
feminino). O pictograma é definido como sendo

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Da garganta vem a voz:
um projeto de educação para a saúde vocal

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Figura 2 – Pictogramas representativos da

categoria “Relaxamento e aquecimento vocais”

Figura 6 - Cenário de teatro infantil, parte


posterior

Contar uma história permite à criança apren-


dizagens de comportamentos sociais por meio de
imitações de modelos adequados de situações do
seu quotidiano18. Ao apresentarem pistas cogni-
tivas, as histórias demonstram ser um meio com
Figura 3 – Pictogramas representativos da
categoria “Maus hábitos vocais”
potencial para abordar o tema voz, dado que favo-
recem padrões de pensamentos que levam à cons-
ciencialização e mudança vocais, promovendo o
aprendizado de habilidades específicas que podem
ser usadas para o resto da vida22. Entre as brin-
cadeiras realizadas pelas crianças na faixa etária
dos três aos seis anos, o faz-de-conta é a que mais
desperta o seu interesse e permite a comunicação
integrada criando uma zona de desenvolvimento
Figura 4 – Pictogramas representativos da
proximal. É a partir dos três anos que a criança é
categoria “Bons hábitos vocais” capaz de entender o faz-de-conta e usar processos
O cenário de teatro infantil (Figura 5 e 6) foi mentais de forma representacional23. Ela projeta
elaborado com o objetivo de se realizar uma dra- nos seres imaginários os seus próprios problemas e
matização da história infantil “Da garganta vem desejos e é nas suas brincadeiras que comunica ou
a voz” utilizando fantoches e uma música como se transforma neles, mas ao mesmo tempo ela fala
recurso didático, abordando aspectos essenciais à de si mesma, tratando dos seus próprios conflitos
exploração, explicação e educação vocais. Ele foi projetando-os nos seus jogos de faz-de-conta. A
construído pelos materiais: madeira contraplacada, grande fascinação da criança por transformações
dobradiças, papel autocolante, feltro, velcro, tecido, mágicas vem da necessidade que ela tem de, através
elásticos e cola. Os fantoches foram feitos com da ficção, fugir de si mesma e colocar-se no papel
de outra pessoa, sendo este processo facilitado pela
feltro de diversas cores e cola, sendo quatro no
proximidade que a criança sente com outros seres,
total, representando uma menina, um menino, uma
os quais ela humaniza através do seu animismo24, 21.
terapeuta da fala e uma mãe que são as personagens
Para a “terapia em diferido”, foi construído
intervenientes na história.
um “Guia para pais – Promoção da saúde vocal
infantil”, uma vez que a formação do padrão vocal
infantil está intimamente ligada a modelos vocais
presentes no ambiente em que as crianças vivem,
isto é, estudos indicam que, enquanto fator de risco
à saúde vocal, viver num ambiente familiar ruidoso
é significativamente mais referido pelas crianças
disfónicas e pelos seus pais. Por essa razão, pais
e outros membros da família têm papel funda-
Figura 5 – Cenário de teatro infantil, parte mental nas condições vocais das crianças25. Neste
frontal guia estão contidas informações, em linguagem

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Maria do Rosário Dias;Ângela Maria Rodrigues Oliveira;Ana Catarina Monteiro Medina Bastos
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as meninas os pictogramas da “Maria”, de maneira


acessível, acerca do processo de fonação, dos fato-
a que criança se possa identificar com os mesmos) e
res de risco de disfonia infantil, da importância da
promoção da saúde vocal com dicas práticas que respectivos smiles pelas crianças, pedindo-lhes que,
os pais podem utilizar no seu dia-a-dia com os uma a uma, identifiquem os bons e maus hábitos
filhos de modo a aperfeiçoar ou manter a qualidade vocais, pela colocação no pictograma de um smile
vocal. Por fim, foi incorporado um questionário feliz ou um triste, respetivamente, havendo partilha
vocal adaptado de Behlau e Pontes (6) de modo a de opiniões e esclarecimento de dúvidas. Esta é
que os pais, através de onze afirmações, consigam uma estratégia que o terapeuta da fala pode utili-
identificar um possível problema de voz do seu/ zar para obter um feedback sobre as questões que
sua filho/a. Este guia foi plastificado de modo a se devem ser explicadas de forma mais adequada26.
tornar durável e as suas páginas foram unidas com Esta atividade serve também para reforçar todas as
recurso a argolas metálicas em espiral. ideias transmitidas pelas terapeutas e é também por
Quanto ao procedimento, primeiramente pre- si só uma forma de se avaliar se os conhecimentos
tendemos iniciar a abordagem com a solicitação transmitidos até então têm sido compreendidos
às crianças da realização de um desenho temático pelas crianças.
onde elas devem representar o que sabem sobre a Para se evitar que as crianças não se recordem
produção da voz e sobre hábitos vocais saudáveis das informações até então transmitidas, os profis-
e nocivos para a voz, uma vez que este permite a sionais de saúde precisam assegurar que estas as
reflexão das crianças sobre tais fatos e permite-nos compreenderam, oferecendo alguns recursos como
ter uma noção geral do que o grupo sabe antes jogos, incentivando-os a participarem de forma
da ação educativa. Outro desenho será pedido ativa no programa. O fornecimento destes mate-
após a palestra, como meio de autoavaliação dos riais torna a comunicação mais didática e aumenta
conhecimentos adquiridos por parte das crianças e o conhecimento da criança sobre estas questões
como forma de avaliação do sucesso ou insucesso de saúde vocal26. Os resultados da avaliação são
da ação. assinalados numa folha de registo.
Posteriormente, recorre-se à dramatização da Por fim, dá-se a distribuição do “Guia para
história infantil utilizando os recursos didáticos: pais – Promoção da saúde vocal infantil” (Figura
cenário de teatro infantil, fantoches (menino ou 7) como meio de chegar aos pais e familiares, uma
menina, terapeuta da fala e mãe) e a música “Da vez que estes são entidades sociais que rodeiam e
garganta vem a voz” que, na sua letra, aborda tanto que mais influenciam a construção do padrão vocal
aspetos relacionados à produção da voz quanto aos base da criança que são os seus pais e familiares,
hábitos vocais, onde pretendemos que haja uma e dá-se igualmente a distribuição de brindes como
interação com as crianças com explicação e refle- autocolantes alusivos à saúde vocal infantil e de
xão da importância da voz no dia-a-dia, do processo mini garrafas de água, pois permitem efetivar e
de fonação e dos hábitos que podem piorar a sua prolongar o efeito da ação educativa no dia-a-dia
qualidade, dando sempre alternativas que se podem da criança.
adotar ou reforçar. A música tem ainda a função
de ser uma mnemónica sobre o que foi referido ao
longo da história e da ação educativa em si.Durante
a dramatização, vão sendo mostrados pictogramas
numa televisão ao lado do cenário, conforme o que
é mencionado na mesma.
De seguida, dá-se a oportunidade às crianças
de observarem e manipularem o interior do boneco
“José”, como modo de reforçar as ideias já forne-
cidas sobre a anatomofisiologia da fonação, pois a
maioria das crianças aprecia atividades com movi-
mento e são obtidos melhores resultados quando são
oferecidos tais procedimentos23. Continuamente,
distribuem-se aleatoriamente os pictogramas (para Figura 7 - Guia para pais – Promoção da
meninos são dados os pictogramas do “José” e para saúde vocal infantil

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Da garganta vem a voz:
um projeto de educação para a saúde vocal

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Durante a implementação deste projeto, o As ações de educação de promoção de saúde
terapeuta da fala deve valer-se da linguagem não- vocal podem ser melhor exploradas junto à popula-
-verbal de reforços condicionados generalizados ção infantil e configurar-se como um espaço social
que indicam “aprovação” como o sorriso ou importante na consolidação do lugar da Terapia
inclinação da cabeça, que fortalecem o vínculo e a da Fala junto à construção de projetos de escolas
confiança na relação que se está a estabelecer, pois saudáveis ou de promoção da saúde na escola em
sabe-se que quando há uma relação de qualidade Portugal com a criação e aplicação de ferramentas
entre o profissional de saúde e a criança, este se de ensino em saúde como a descrita.
sente mais satisfeito e predisposto a realizar as Atuações desta natureza em escolas demons-
atividades. Deve ainda estar atento às dicas não- tram ser ricas e promissoras, importantes para o
-verbais no comportamento das crianças como desenvolvimento de noções que as crianças têm
expressões faciais ou gestos que emitem dúvida, da sua voz e de conhecimentos sobre hábitos
medo ou preocupação26. saudáveis, além de proporcionar modificações na
Como alcances salienta-se o fato de o instru- qualidade vocal destas.
mento ser completo, isto é, abranger terapia direta A modificação dos comportamentos de saúde
como em diferido, poder ser utilizado tanto em vocal e o ensinamento de novas habilidades
setting de promoção de saúde (em escolas) como comunicativas vocais em contexto pré-escolar
em setting terapêutico (em consultório) e por ser trazem ainda resultados positivos para o sistema de
multissensorial, ou seja, abranger diversas vias
saúde, que reduz os seus gastos graças à redução
sensoriais como a visual, auditiva, tátil e a pro-
do número de consultas e exames realizados pelos
priocetiva; os pictogramas serem diversificados;
pacientes.
haver possibilidade de manipulação de todos os
Salienta-se ainda a utilização de uma lingua-
recursos didáticos que constituem o instrumento
gem clara e acessível pelo terapeuta da fala perante
final; o tamanho do boneco “José” ser idêntico ao
as crianças e ouso de recursos didáticos explicati-
tamanho das crianças da população-alvo.
vos relacionados com a temática a abordar, sendo
Como limites o instrumento apresenta uma
estes exemplos de estratégias utilizadas numa
portabilidade reduzida devido às suas dimensões,
comunicação com qualidade.
demonstrando-se ser uma dificuldade, uma vez que
o objetivo inicial é o seu transporte para escolas;
a forma do boneco “José” ter parecenças com um
robô e isso limitar a antropomorfização; haver ape- Referências Bibliográficas
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perspectiva da promoção da saúde, mais especifica- Rossi D, Silva JTC, Gonzales P, Silva SLSG. Vivência de voz
mente em voz, alertando também pais e educadores com crianças: análise do processo educativo em saúde vocal.
para a importância da saúde vocal. Distúrbios Comun. 2007;19(2):237-46.

Distúrbios Comun. São Paulo, 27(1): 182-191, março, 2015 189


Maria do Rosário Dias;Ângela Maria Rodrigues Oliveira;Ana Catarina Monteiro Medina Bastos
COMUNICAÇÃO

10. Dunst CJ, Bruder MB, Trivette CM, Hamby DW.Everyday História “Da garganta vem a voz”
activity settings, natural learning environments, and early inter- (dramatização com recurso de fantoches e
vention practices.J Policy PractIntellect Disabil. 2006;3(1):3-10. pictogramas – versão masculina)
11. Ribeiro ANR. Atuação fonoaudiológica em escolas. Cader-
nos da Fucamp [periódico na Internet]. 2002 [acesso em 2014 Cenário da escola
Jul 20];1(1):[aproximadamente 7 p.]. Disponível em: http://
Era uma vez um menino, o José, que
fucamp.edu.br/editora/index.php/cadernos/article/view/38/3.
andava na escola. O José adorava brincar e
12. Focesi E. Uma nova visão de saúde escolar e educação em
saúde na escola. Rev Bras Saúde Esc 1992;2(1):19-21. conversar com os seus amigos, imitar vozes de
13. Dias MR, Pedrosa, CS. “King Archie, who was quite grou- animais e cantar as músicas dos seus desenhos
chy” – a vocal dysphonia health education project. Rev CEFAC. animados preferidos ao longo do dia.
2013;15(1):172-8. O José ansiava sempre pela hora do
14. Papalia DE, Olds SW, Feldman RD. O mundo da criança. recreio! Gritava muito quando conversava e
Lisboa: McGraw Hill; 2001.
brincava com os seus amigos e notou que a voz
15. LeHuche F, Allali R. A patologia vocal de origem funcional.
começava a falhar um pouco e que a garganta
São Paulo: Artmed Editora; 2005.
lhe doía, mas nada o fez parar de brincar! A sua
16. Winnicott DW. O brincar: uma exposição teórica. In:
Winnicott DW. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago professora começou a notar que ele andava mais
Editora; 1975. p. 59-77. rouco e achou por bem aconselhar os seus pais a
17. Wajskop G. O brincar na educação infantil. Cad. Pesq. levarem-no a uma consulta de Terapia da Fala! E
[periódico na Internet]. 1995 [acesso em 2014 Jul 20]; (92):62- assim foi…
69. Disponível em: www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/
arquivos/742.pdf. Cenário da Terapia da Fala
18. Salomão HAS, Martini M. A importância do lúdico na Antes de tudo, o menino José
educação infantil: enfocando a brincadeira e as situações de
ensino não direcionado. [acesso 2007 Set 14]. Disponível em:
teve de ir a uma consulta ao médico de
http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0358.pdf. Otorrinolaringologia onde estava presente
19. Dias MR, Soares FA, Carrão LM. O bafo do gigante: um também a Terapeuta da Fala. Nessa consulta
projecto de ludoterapia em educação para saúde. In Ribeiro JP, realizou um exame para se poder ver o interior
Isabel L, Jesus SL (Eds.). Actas do 6º Congresso Nacional de da sua garganta, mais especificamente as suas
Psicologia da Saúde.Lisboa: ISPA.;2006.p.667-72.
pregas vocais.
20. Kim H, Tamayo D, Muhkin M, Kim J, Lam J, Ohno-
-Machado L, Aronoff-Spencer E. Pictogram evaluation and au-
- Olha para aquela televisão, José! O
thoring collaboration environment. 11th International Congress que estás a ver são as tuas pregas vocais! Sabes o
on Nursing Informatics; 2012 June 23-27; Montreal, Canada. que são? – Pergunta a terapeuta da fala ao José!
Montreal: Nurs Inform; 2012. - Pregas vocais? Humm... nunca ouvi
21. Dias MR, Cruz J, Martins N. Eu sou favolas: um instrumento falar! - Responde confuso o menino José.
de educação para a saúde em dentistria. RevBrasCresDesenvolv
Hum. Forthcoming 2014.
- As pregas vocais são as que nos
22. Gasparini G, Azevedo R, Behlau M. Experiência na elabo-
fazem produzir a nossa voz, estando dentro de
ração de estórias com abordagem cognitiva para tratamento de um tubo que se chama laringe. Para as sentires,
disfonia infantil. R CiMédBiol2004;3(1):82-8. basta colocares a tua mão na parte da frente do
23. Queiroz NLN, Maciel DA, Branco AU. Brincadeira e de- teu pescoço e dizeres por exemplo a vogal /a/
senvolvimento infantil: um olhar sociocultural construtivista. prolongada e vais sentir uma vibração nos teus
Paidéia. 2006;16(34):169-79.
dedos! Experimenta para veres como é giro! –
24. Rodrigues BGA. Representações da infância e o fantástico
no filme “onde vivem os monstros” [monografia] Brasília (DF):
Exclama a terapeuta da fala.
Universidade de Brasília; 2011. - /aaaaaaaa/ - Produz o menino José.
25. Paixão CLB, Silvério KCA, Berberian AP, Mourão LF, Estou a sentir! Faz uma espécie de cócegas nos
Marques JM. Disfonia infantil: hábitos prejudiciais à voz dos meus dedos! – Exclama o José super contente.
pais interferem na saúde vocal de seus filhos?. Ver CEFAC. - Quando sentes essa vibração as pregas
2012;14(4):705-13.
vocais estão juntas, pois estás a produzir um
26. Müller MR. Aspectos relevantes na comunicação em saúde.
Psicologia IESB [periódico na Internet]. 2009 [acesso a 20
som. Quando respiramos elas abrem para deixar
Jul 14]; 1(1):72-9. Disponível em: php.iesb.br/ojs/index.php/ o ar passar para os pulmões, como podes ver aqui
psicologiaiesb/article/download/11/12. nesta imagem! – A terapeuta da fala mostra o
pictograma à criança!
Durante esta explicação, o exame
continuou a decorrer e a Terapeuta da Fala e o

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Da garganta vem a voz:
um projeto de educação para a saúde vocal

COMUNICAÇÃO
médico verificaram que o menino José tinha nas como o menino pode seguir esses possíveis maus
suas pregas vocais umas saliências avermelhadas exemplos e adaptá-los como seus.
chamadas de nódulos vocais, causadas por o José A terapeuta da fala no fim entrega à mãe
ter alguns comportamentos de mau uso vocal. e à criança informações importantes para não se
- José, vês aqui estas duas saliências esquecerem do que foi mencionado na terapia
que estão nas tuas pregas vocais? – Pergunta a bem como perguntas para saber se entenderam a
Terapeuta da Fala, apontando para os nódulos na informação transmitida pela mesma.
televisão. - Para terminarmos esta sessão vou-te
- Sim, parecem duas bolinhas. – Afirma ensinar uma linda canção para que fixes bem
o José. como é importante cuidar da tua voz, boa? –
- Exato! Essas duas bolinhas chamam- Pergunta a Terapeuta da Fala.
se nódulos vocais e são elas que fazem a tua voz - Boa! – Responde muito animado o
ficar assim mais rouca! – Explica a terapeuta da menino José.
fala.
Música – Da garganta vem a voz!
- E como é que eu fiquei com essas
A voz é especial,
bolinhas? – Pergunta preocupado o José.
Por isso temos de a cuidar,
- Estas bolinhas apareceram por
Vamos ser bem-educados,
não cuidares da tua voz, ou seja, tens
A falar sem gritar.
comportamentos que a prejudicam, que nós
chamamos de comportamentos de mau uso
Para uma voz bonita,
vocal! – Explica novamente a Terapeuta.
Vamos nos empenhar,
- E que comportamentos de mau uso
Aprender a portar bem,
vocal são esses? – Pergunta novamente o José.
Não estar sempre a chorar!
- Por exemplo, quando gritas, falas
muito alto por cima de muito barulho para te
Refrão (2x)
fazeres ouvir, quando falas durante muito tempo
Vamos aprender a cuidar da nossa voz
e muito depressa, tossir muito, chorar muito,
Cantar e falar com harmonia
imitar sons de animais ou ruídos, cantar sem
Vem, junta-te a nós!
cuidados, beber água muito fria, entre outros. Por
isso é importante que aprendas a cuidar da tua
Da garganta vem a voz,
voz e que uses comportamentos adequados! –
E gosta de estar molhada,
Afirma a Terapeuta.
Água natural é bom,
- Então o que posso fazer para cuidar
Mas não pode ser gelada!
bem da minha voz? – Pergunta o José.
- É importante que bebas muita água à
A voz é diferente em cada um,
temperatura natural, não gritares e se precisares
Mas rouca não deve estar,
de chamar alguém tenta-te chegar mais perto dela
Ela gosta de estar sempre igual,
ou assobiar. Deves também respirar mais pelo
Por isso vozes não deves imitar!
nariz, andar sempre com uma postura direitinha
Cenário em casa
e vou-te ensinar uns exercícios muito bons e
A mãe, após preencher o questionário e ler as
divertidos para melhorares essa voz e usares
informações do folheto que lhe foi fornecido
sempre os comportamentos que só fazem bem à
pela terapeuta, fez por ajudar o seu filho,
tua voz! – Afirma a terapeuta. – Agora vamos ali
alertando todos lá em casa na mudança dos
para o meu consultório para falar com a mãe e
comportamentos que eram prejudiciais à sua voz
dar umas informações importantes para tratarmos
e por corrigi-lo sempre que necessário!
esses nódulos, pode ser? – Pergunta a Terapeuta
O José com mais algumas sessões em
da Fala.
Terapia da Fala e com a sua força de vontade
- Sim, vamos! – Exclama muito
conseguiu eliminar os nódulos e voltar a ter uma
contente o menino José.
voz saudável
A terapeuta falou com a mãe sobre os
comportamentos que lá em casa os familiares e
Vitória, vitória… acabou-se a nossa história!
outros acompanhantes do José podem realizar e

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